Foto nº 1 e 1A > Guiné > Região de Quínara > Fulacunda > 3.ª CART / BART 6520/72 (Fulacunda, 1972/74) > Vista aérea da pista, do heliporto, do aquartelamento e da tabanca de Fulacunda... São visíveis o perímetro do aquartelamento, os espaldões do obus 14 e outras armas pesadas (que já identificámos noutro poste)... Podem-se contar inclusive as moranças civis e as instalações da tropa... Tinha também valas e abrigos... Assinalada a amarelo, a "morança" que o nosso amigo dr. Henk Eggens, médico, cooperante, neerlandès, habitou em 1980/82 (e que integrava as antigas instalaçóes das NT).
Segundo informação recente do nosso amigo e camarada Jorge Pinto, a população de Fulacunda andaria à volta de 400 pessoas de etnia biafada, em 1972/74 . Havia uma família balanta e outra fula, "Toda esta população tinha familiares nas tabancas do mato que rodeavam Fulacunda e que muitas vezes vinham de visita, nos davam algumas 'informações' sobre o movimento do bigrupo de Bunca Dabó, levando em troca uns quilos de arroz"... Não havia comerciantes, nem colonos... A atividade agrícola era residual,,, "O alimento da população era basicamente o arroz fornecido pela tropa".
Foto (e legenda): © Jorge Pinto (2025). Todos os direitos reservados.[Edição e legendagem complementar: LG/HE]
Foto (e legenda); © Fernando Carolinbo (2025). Todos os direitos reservados.[Edição e legendagem complementar: LG/HE]
A primeira fotografia que mando junto, com círculo a amarelo, mostra onde morei; um ano fiquei sozinho, depois um ano vivi com a minha 'noiva', que depois ficou esposa/companheira de vida durante 26 anos antes de falecer há 19 anos.
A "morança" compostaq de duas casas, nós uma, e o chefe da aldeia, Carlitos, com a sua família na outra.
Não sei quem ocupava este prédio durante a época colonial. Como o prédio era dentro do quartel, seria um oficial do exército português? Ou era um escritório?
A segunda fotografia mostra a nossa casa em 1980, com os meios de transporte disponíveis para nós.
Também achei interessante a fotografia e o comentário sobre filhos de povos mistos (mulheres guineenses e soldados portugueses) (**). O que aconteceu com a maioria destas crianças? Os pais reconheceram a paternidade? Ficaram na tabanca ou foram para Portugal para serem criadas e educadas? Tens informação sociológica sobre este assunto?
Na altura tinha um assistente de laboratório, Manuel, de origem cabo-verdiano, que me ajudava em Fulacunda. O povo lhe chamou de burmedjo. Foi totalmente aceite na tabanca. Mas ... quando houve o golpe de Estado em 1980, liderado por 'Nino' Vieira, com tendências anti-caboverdianas (o presidente Luís Cabral foi preso por um ano depois do golpe), o pobre Manuel ficou em baixo da sua cama por três dias, com medo. Depois tudo voltou ao normal.
Deixa-me, antes de mais dizer-te que lamento que tenhas ficado viúvo tão cedo e com duas filhas órfãos... Tens, no entanto, uma história de vida rica...Vamos "partindo" (partilhando, em crioulo) memórias, boas e más, das nossas "geografias emocionais": é o que eu e todos nós aqui, "amigos e camaradas da Guiné", te podemos oferecer... (***)
(*) Vd. poste de 28 de novembro de 2024 > Guiné 61/74 - P26209: Ser solidário (275): Quatro anos como médico cooperante (1980-1984), em Fulacunda e em Bissau (Henk Eggens, neerlandês, consultor internacional em saúde pública, reformado, a viver em Santa Comba Dão)
Foto nº 2> Guiné-Bissau > Região de Quínara > Fulacunda > 1980 > "Casa do médico, Land Rover do projeto, mota da noiva e carro 404 privado".
Foto: (e legenda) © Henk Eggens (2024). Todos os direitos reservados.[Edição e legendagem complementar: LG/HE]
Foto nº 3 > Guiné > Região de Quínara > Fulacunda > 3.ª CART / BART 6520/72 (Fulacunda, 1972/74) > Uma "peladinha"... em frente à futura casa do dr. Henk Eggens.
Foto (e legenda); © Fernando Carolinbo (2025). Todos os direitos reservados.[Edição e legendagem complementar: LG/HE]
Olá Luís, kuma di kurpu?
Gostei de ver mais fotografias da minha tabanca de então.(**)
A primeira fotografia que mando junto, com círculo a amarelo, mostra onde morei; um ano fiquei sozinho, depois um ano vivi com a minha 'noiva', que depois ficou esposa/companheira de vida durante 26 anos antes de falecer há 19 anos.
A "morança" compostaq de duas casas, nós uma, e o chefe da aldeia, Carlitos, com a sua família na outra.
Não sei quem ocupava este prédio durante a época colonial. Como o prédio era dentro do quartel, seria um oficial do exército português? Ou era um escritório?
A segunda fotografia mostra a nossa casa em 1980, com os meios de transporte disponíveis para nós.
Também achei interessante a fotografia e o comentário sobre filhos de povos mistos (mulheres guineenses e soldados portugueses) (**). O que aconteceu com a maioria destas crianças? Os pais reconheceram a paternidade? Ficaram na tabanca ou foram para Portugal para serem criadas e educadas? Tens informação sociológica sobre este assunto?
Na altura tinha um assistente de laboratório, Manuel, de origem cabo-verdiano, que me ajudava em Fulacunda. O povo lhe chamou de burmedjo. Foi totalmente aceite na tabanca. Mas ... quando houve o golpe de Estado em 1980, liderado por 'Nino' Vieira, com tendências anti-caboverdianas (o presidente Luís Cabral foi preso por um ano depois do golpe), o pobre Manuel ficou em baixo da sua cama por três dias, com medo. Depois tudo voltou ao normal.
Em Cabinda (Angola, onde vivi, de 1976-1978), pessoas de cor mais clara (podiam ser mestiços) eram chamados mwana mundele (na língua Lingala), criança do branco. De vez em quando estas palavras eram utilizadas como insulto.
Bem, mando-te um AB e mantenhas (mantenha-se),
Henk.
PS - Podes publicar este texto no blog se quiseres, na esperança de ter respostas às minhas perguntas.
Bem, mando-te um AB e mantenhas (mantenha-se),
Henk.
PS - Podes publicar este texto no blog se quiseres, na esperança de ter respostas às minhas perguntas.
(Revisão / fixação de texto, pontual: LG)
2. Comentário do editor LG:
Obrigado, Henk, pelo que temos falado, és cidadão do mundo, e um grande "africanista" (cem qualquer conotação colonial)... Para além da Guiné-Bissau, trabalhaste em Angola, Indonésia, etc,. como especialista em medicina tropical, e muito em particular na área da prevenção e controlo da lepra. Tens uma visão integrada e global da saúde pública. E depois escreves muitissimo melhor o meu portuguès do que eu o teu neerlandês...
Deixa-me, antes de mais dizer-te que lamento que tenhas ficado viúvo tão cedo e com duas filhas órfãos... Tens, no entanto, uma história de vida rica...Vamos "partindo" (partilhando, em crioulo) memórias, boas e más, das nossas "geografias emocionais": é o que eu e todos nós aqui, "amigos e camaradas da Guiné", te podemos oferecer... (***)
Acabo de publicar a tua mensagem com a tua autorização. É bom para todos: cá está a tal blogo...terapia, que tu querias saber o que era: tens que acompanhar o nosso blogue...para perceber uma dos "slogans"; "O Mundo é Perqueno e a nossa Tabanca é Grande"... (Tabanca é a nossa tertúlia, ou comunidade virtual, que se se reune à sombra de um simbólico poilão, e onde cabemos todos com tudo o que nos une e até cm aquilo que nos pode separar...)
Sem querer dar uma definição (sempre redutora), direi que esta "terapia" ou "catarse", pela palavra e a imagem, pela partilha de memórias e afetos, num grupo de pares (antigos conmbatentes), funcionou muito bem nos primeiros anos do blogue...
Como sabes, os antigos combatentes são sempre mal tratados em todas as guerras, aqui, na tua terra, em Timor, na Guiné, em Angola, em Moçambique, em França, nos EUA... Como deves imaginar, a guerra colonial, a seguir ao 25 de Abril de 1974, foi silenciada, esquecida,. branqueada, escamoteada... O mesmo aconteceu, pelo menos, aos guineenses que pagaram um elevado "imposto de sangue" na luta pela independência da sua terra (e, por tabela, de Cabo Verde).
Sobre as rivalidades (e graves conflitos) entre os guineenses e a nomenclatura cabo-verdiana do PAIGC, não vou falar agora. Nem sobre os filhos que os militares portugueses deixaram na Guiné (uma estimativa aponta para umas escassas centenas, infelizmente um valor demasiado alto: o Portugal, democrático0, do pós-25 de Abril, não teve nem a coragem nem a lucidez nem a compaixão de reconher estes filhos da guerra, eufemisticamente também conhecidos como "filhos do vento", por analogia com os "dust children" daa guerra do Vietname)...
Ficará a conversa para mais tarde, que os dois assuntos são c0mplexos e delicados.
(Revisão / fixação de texto, superficial: LG)
_____________
Notas do editor:
(***) Último poste da série > 20 de dezembro de 2024 > Guiné 61/74 - P26292: As nossas geografias emocionais (35): Helsínquia, Finlândia (António Graça de Abreu)
1 comentário:
Fulacunda, no início dos anos 80, teria 1300 habitantes (estimativa), 3 vezes mais do que em 1972/74...Parte dessa diferença terá a ver com gente que regressou do "mato"... A região de Quínara foi bastante afetada pela guerra...Depois da independência, não sei como o PAIGC substituiu a tropa no fornecimento de arroz... Não devem ter sido tempos fáceis para os biafadas de Fulacunda.
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