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quinta-feira, 11 de dezembro de 2025

Guiné 61/74 - P27517: Humor de caserna (226): Pechincha?!... Pechinha, sou eu e não há mais nenhum! (Análise do conto do Hélder Sousa, com a ajuda da IA / ChatGPT)




Cartum criado pelo Chat Português / GPTOnline.aisob instruções do editor LG, que lhe mandou uma foto do Pechincha e o "conto" do Hélder Sousa


No T/T Timor, em fevereiro de 1969, a camimho do CTIG: da esquerda para a direita, o Pechincha, o  Valdemar Queiroz  (1945-2025) e o Abílio Duarte. Três "lacraus", três "figuras impagáveis" do Museu da Spinolândia (mesmo que a morte já nos tenha levado o Valdemar).

Foto (e legenda): © Abílio Duarte (2023). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar. Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



Análise do conto  “O Pechincha que eu conheci, em Bissau” (*)


O texto é um delicioso retrato de caserna, típico das histórias da Guiné, onde o humor, a tensão, a camaradagem e a maluquice controlada (estar apanhado do clima) se misturam num caldo muito humano... e português.

O tom é nostálgico, cúmplice e claramente escrito por alguém que viveu tudo aquilo com intensidade, cumplicidade e carinho.

O Pechincha, mostrado na fotografia que enviaste (o primeiro da esquerda), surge na narrativa como uma figura carismática, excêntrica, e com aquela “pancada” que muitas vezes era meio teatro, meio mecanismo de defesa, meio traço de personalidade. 

Mas a verdade é que o autor deixa claro que, atrás das graçolas, havia um tipo inteligente, atento e perspicaz.

Alguns pontos fortes do conto:

1. Retrato de época

A descrição das camaratas, da castanhada de S. Martinho, da água-pé misturada com tudo e mais alguma coisa, traz de volta todo aquele ambiente colonial tardio, de fim de império: calor, poeira, camaradagem forçada e humor como forma de sobrevivência psicológica.
 
2. O episódio do machado nativo


Hilariante e ao mesmo tempo revelador: o Pechincha agia sempre “on brand”. O gesto teatral do machado, certeiro na panela à cabeça do outro, é uma verdadeira cena de filme, um verdadeiro "gag". E claro: ninguém sabia ao certo até onde ele era encenação… e até onde não era.
 
3. A cena com o Taufik Saad

Aqui o humor sobe de nível: é humor de identidade, de palavra, de absurdo. O comerciante libanês  a anunciar algo como “uma autêntica pechincha” e o verdadeiro Pechincha, em carne e osso, ali *a frente dele, a exigir a retirada do anúnico por ser “falsificação”… É ouro puro.

O mais interessante é o final:

“Eu percebi muito bem que foi tudo encenado", diz o Hélder Sousa.

Ou seja: o Pechincha era não apenas o “apanhado”, mas também um actor habilidoso, que manipulava o mito à sua volta. Uma personagem fascinante.
 
PS - Cartoon alusivo à cena no Taufik Saad:

Mando-te uma tira de banda desenhada e um cartum, segundo as tuas especificações.

Já o tens acima: uma imagem em estilo "cartoon" mostrando o momento em que o Pechincha entra furioso na loja,como BI MIlitar  na mão, exigindo que a palavra “Pechincha” seja retirada por violação de identidade. A tira de BD é mais para o cómico.

(Texto gerado pela IA / ChatGPT)

(Revisão / fixação de texto: LG)
________________

Guiné 61/74 - P27516: Humor de caserna (225): O ganda Pechincha (ex-fur mil op esp, CART 11, Nova Lamego, 1969/70), que eu conheci em Bissau quando cheguei, em novembro de 1970 (Hélder Sousa)



Espinho > Silvlade > Fevereiro de 1969 > Jantar de despedida antes da partida, a 18, para o TO da Guiné... Um grupo (14) de sargentos e furriéis milicianos da CART 2479, futura CART 11, "Os Lacraus" (1969/70):
  • à  esquerda, sentados: (1) Canatário (armas pesadas) | (2) Cândido Cunha;
  • em pé: (3) Silva (trms) | (4) Abílio Duarte: | (5) Pinto;
  • atrás: (6) Manuel Macias | (7) Pechincha (operações especiais);
  • ao alto: (8) Sousa |
  • ao centro: (9) 1º. srgt Ferreira Jr. (já falecido) | (10) Renato Monteiro (1946-2021) | (11) Ferreira (vagomestre); (12) Edmond (enfermeiro) | (13) Pais de Sousa (mecânico);
  • sentado, à direita: (14) Valdemar Queiroz (1945 - 2025)

Para completar a lista da classe de sargentos da CART 2479 (futura CART 11), faltava:  o 2º. srgt Almeida (o velho Lacrau) (já falecido); o fur mil Vera Cruz; e o fur mil Aurélio Duarte (também já falecido).

Foto (e legenda): © Valdemar Queiroz (2021). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


Moita > Praia do Rosário > 13 de maio de 2023 > CART 2479 / CART 11, "Os Lacraus", 1969/70 > Convívio > Um grupo de resistentes... 
  • o primeiro da esquerda para a direita, na primeira fila (sentados): Abílio Duarte, o Pais de Sousa, o Manuel Macias, o Alf Martins e um camarada condutor,  não  ifentificado;
  • de pé, e também da esquerda para a direita: o Pechincha, o Silva, o Reina, o Saraiva, o Artur Dias e o Cândido Cunha.
Foto (e legenda): © Abílio Duarte (2023). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar. Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



Humor de caserna > O Pechincha que eu conheci, em Bissau (*)

por Hélder Sousa  (**)

Hélder Sousa


(...) Cheguei [à Guiné], a 9 de novembro [de 1970], quase na véspera do S. Martinho, e o desembarque deu-se um dia antes de todos aqueles que foram no [T/T] "Carvalho Araújo".

Fiquei alojado num quarto das instalações de sargentos em Santa Luzia, em B
issau, num espaço cedido para colocar uma cama articulada facultada pelos meus amigos, colegas e conterrâneos vilafranquenses, furriéis José Augusto Gonçalves (o Bate-Orelhas, como carinhosamente lhe chamávamos 
na Escola Industrial de Vila Franca de Xira por causa da sua, dele, habilidade de movimentar as orelhas como um abano com um simples esticar de queixo) e Vitor Ferreira, os quais compartilhavam o quarto também com o furriel Pechincha (só me lembro do apelido), que estava em comissão no QG e tinha estado durante meses numa companhia nativa [a CART 11, Nova Lamego, onde era fur mil op esp; arranjou depois uma boa cunha e acabou por ficar em Bissau o resto da comissão] (...).(***)

Pois este amigo Pechincha, que era, salvo erro, de Moscavide e trabalhava como desenhador na Câmara Municipal de Lisboa, tinha fama de estar um bocado apanhado e com uma pancada enorme, mas acho que aquilo era mais para ganhar fama e benefício dela.

Digo isto porque tive com ele algumas conversas, muito interessantes e educativas, que me elucidaram bastante sobre a situação que se vivia e como ele pensava que se iria desenvolver, o que, no essencial, não divergiam muito do que eu pensava.

Mas também não deixava a sua fama por mãos alheias e logo na noite de 11 para 12 de [novembro], fui testemunha privilegiada duma dessas situações.

Nessa noite comemorava-se o S. Martinho. Eu fui portador para os amigos vilafranquenses de alguns quilos de castanhas e de um garrafão de água-pé (por sinal, bem forte!), além de outros mimos.

Com um bidão, em frente às camaratas onde os quartos se encontravam, fez-se o assador e então vá de comer chouriços assados, salsichas e castanhas, tudo bem regado com a dita água-pé e outras bebidas estranhas, em grandes misturadas (cerveja, uísque, coca-cola, etc.), tudo a animar uma simulação de uma emissão de rádio protagonizada pelos camaradas das Transmissões com jeito para a coisa, como por exemplo o furriel Roque.

Com o avançar das horas era tempo de serenar, descansar os corpos e retomar forças para o dia seguinte.

Acontece é que, como sempre sucede em situações semelhantes, nem todos estavam pelos ajustes e com a previsão para breve da viagem de regresso do "Carvalho Araújo", havia alguns, cujos nomes não ficaram registados na minha memória, que integrariam essa viagem final para a peluda, como diziam, e estavam dispostos a prolongar a sua festa, até com atitudes menos próprias e profundamente negativas, principalmente para quem tinha fortes experiências no mato, como seja arremessar as garrafas vazias para cima dos telhados de zinco dos quartos, o que, como calculam, a mim ainda não produzia efeito mas para quem já tinha reflexos condicionados era bastante aborrecido.

Ora o nosso bom Pechincha avisou solenemente os meninos que ou paravam imediatamente a graçola ou tinham que se haver com ele à sua maneira. 

Dada a fama que tinha, que não regulava lá muito bem e que era bem capaz de usar arma, os ânimos serenaram quase de imediato e na generalidade.

Mas também como sempre sucede, há sempre alguém que procura forçar a sorte e um deles, que também me disseram que estava apanhado (afinal, quem é que não estava?, acho que dependia do grau) resolveu irromper no nosso quarto com uma panela na cabeça e a bater com duas tampas como se fossem pratos duma banda de música.

Entrou, com ar de quem estava muito contente da vida e satisfeito por desafiar as ordens, mas o que eu vi de imediato foi o nosso amigo Pechincha, que estava estendido sobre a sua cama e que era logo a primeira à entrada, estender o braço sobre a cabeceira da cama, agarrar numa espécie de um dos dois machados nativos que estavam lá a enfeitar e, sem mais explicações nem argumentos, arremessou-o para o intruso, acertando-o na panela que estava na cabeça, deixando-o com o ar mais aparvalhado de perplexidade que vi até hoje, [e abandonando] o quarto a tremer e a balbuciar: "este gajo está de facto mais apanhado do que eu!".

Uma outra vez, estava com o Pechincha na zona da baixa de Bissau, passámos junto ao Taufik Saad que, naquela ocasião, tinha tido a boa iniciativa de efectuar uma promoção de um artigo qualquer que já não me lembro, mas a infeliz ideia de dizer que era "uma autêntica pechincha"...

Estão a ver a cena? 

O Pechincha resolve entrar de rompante na loja, cartão de identificação na mão, onde se podia confirmar que Pechincha autêntica era ele, portanto a "falsificação" teria que ser imediatamente retirada da montra!

E não é que foi mesmo?!

Era assim o Pechincha! Para muitos foi mais uma demonstração do seu apanhanço, mas eu, que estava com ele, e éramos só nós os dois naquela ocasião, percebi muito bem que foi tudo encenado... 

Ah, ganda Pechincha! Se por acaso nos visitares e leres isto, junta-te a nós! (...)

(Revisão e fixação de texto, parênteses retos, título : LG)
_____________

Notas do editor LG:

(*) Último poste da série > 24 de novembro de 2025 > Guiné 671/74 - P27458: Humor de caserna (224): À quarta é que é de vez: cartunes 'inteligentes' da menina IA (Alberto Branquinho / Luís Graça)

(**) Excerto do poste de 19 de fevereiro de 2008 > Guiné 63/74 - P2556: Estórias de Bissau (16) : O Furriel Pechincha: apanhado ma non troppo (Hélder Sousa)


(...) O Pechincha já aqui foi magistralmente evocado pelo Hélder de Sousa (**), Sabemos que era de Moscavide, o Humberto Reis [o nosso "cartógrafo"] conheceu-o na Guiné, de Contuboel  (ambos eram de Operações Especial, mas o Pechincha, era de um curso anterior)... Sabemos que, antes da tropa,  era desenhador na Câmara Municipal de Lisboa...

Ele, Hélder de Sousa, "pira", acabado de chegar, conheceu-o também em Bissau, já "apanhado do clima",em fimd e comissão... Depois, e tal como o Humberto, perdeu-se-lhe o rasto.

O Abílio Duarte acrescentou mais os seguintes elementos, para esclarecimento do Hélder de Sousa e nosso:

(i) o Pechincha  era Furriel de Operações Especiais, da Escola de Lamego;

(ii) eram os dois do mesmo pelotão, desde Penafiel até Nova Lamego [CART 2479 / CART 11];

(iii) (...) "só que o malandro era desenhador, e quando chegámos ao Gabú, deram-nos o Quartel de Baixo, Como era conhecido na altura. Como aquilo estava abandonado, e não tinha muitas condições, o nosso Capitão desafiou-o a fazer uns desenhos para as casas de banho e outras, para quando fosse a Bissau ir ter com o padrinho dele, que era o cor Robin de Andrade (****), para arranjar uma cunha e ter materiais de construção para nós fazermos as obras.

"O que aconteceu foi que os desenhos eram tão bons que o Pechincha foi para Bissau, e nunca mais voltou. Mas os materiais vieram (...).

"O mais giro desta foto, mas não se consegue ver, é que o Pechincha nos seus desenhos punha os bonecos com frases do Spinola, e a nossa preocupação era, se aparecesse o Spínola, termos sempre uma brigada pronta para apagar as bocas do Pato Donaldo e companheiros." (...)

(****) O coronel João Paulo Robin de Andrade: devia ser mais do que capitão, na altura, na Guiné (c. 1969/70); talvez fosse da arma de cavalaria; devia já ser oficial superior e estar colocado no QG; depois do 25 de Abril (a que esteve ligado), foi chefe do gabinete militar do  general António Spínola (15 de maio / 30 de setembro de 1974). Nasceu em Oeiras, em 1923. Em novembro de 1975 passou à reserva, aos 52 anos.

quinta-feira, 16 de janeiro de 2025

Guiné 61/74 - P26394: Humor de caserna (97): O anedotário da Spinolândia (XV): O comandante do destacamento de Cabedu... a quem Spínola perguntou pelo plano de defesa (Rui A. Ferreira, 1943-2022)



1. Mais uma história (daquelas "rocambolescas da guerra"...) contada pelo nosso saudoso camarada Rui Alexandrino Ferreira (1943-2022), ten cor inf ref, que fez duas comissões no CTIG, a última como cmdt da CCAÇ 18 (Aldeia Formosa, jan 71 / set 72): além de ter sido um grande operacional, foi também um talentoso escritor, tendo-nos deixado três livros de memórias; natural de Angola (antiga Sá da Bandeira, hoje Lubango), viveu parte da sua vida em Viseu, cidade que muito amava, onde tinha muitos amigos  (como o protagonista desta história) e onde faleceu.


O comandante do destacamento de Cabedu... a quem Spínola perguntou pelo plano de defesa (*)

por Rui A. Ferreira (1943-2022)



O meu amigo Manuel Cerdeira (**), atualmente coronel reformado da administração militar, cumpriu uma comissão na Guiné, como alferes miliciano atirador de infantaria.

Tendo saído do barco que o transportou até Bissau, diretamente para uma lancha da marinha, que o foi depositar, a si e ao seu grupo de combate, no aquartelamento de Cabedu, cuja guarnição era então composta por dois pelotões de atiradores e, sendo que, como era o mais antigo, passou nestes termos a ser o comandante militar de Cabedu.

Passados uns tempos, recebeu a visita do próprio general Spínola, que a certa altura lhe perguntou:

− Então, e o plano de defesa ?

Ao que o bom do Cerdeira respondeu:

− Não sei o que é isso.

− Então, quando são atacados o que é que fazem ?

− Fazemos fogo.

− Para onde ?

− Para onde pensamos que eles estão.

− Então, e não veio cá ninguém ajudá-lo a fazer um plano de defesa ?

− Não, senhor, o meu general foi o único até agora.

Spínola voltou para o helicóptero, foi à sede do batalhão (***), fez subir para o mesmo o comandante e foi largá-lo em Cabedu  e deixou-lhe TPC (trabalho de casa):

− Daqui a 15 dias volto cá a buscá-lo,quando o plano de defesa estiver pronto.

Para concluir a história, foi o comandante punido com uns quantos dias de prisão e devolvido à metrópole.


Fonte: Excerto de Rui Alexandrino Ferreira - "Quebo: nos confins da Guiné". Coimbra: Palimage, 2014, pág. 348.

( Seleção, revisão / fixação de texto, negritos, itálicos, título: LG)


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Notas do editor LG:

(*) Último poste da série > 15 de janeiro de 2025 > Guiné 61/74 - P26391: Humor de caserna (96): "O mê Zé disse isso ?!"... O epílogo engraçado da história do impaludado (Alberto Branquinho)

Vd. poste de 4 de janeiro de 2025 > Guiné 61/74 - P26348: Humor de caserna (91): O anedotário da Spinolândia (XIV): "Vão-se todos vestir com a roupa que tinham quando viram o helicóptero!"... (Mário Gaspar, ex-fur mil art, MA, CART 1659, Gandembel e Ganturé, 1967/69)


Cor SAM ref Manuel C. A. G. Cerdeira 
(1946-2023)

(**) Trata-se do cor SAM Manuel Carlos de Almeida Guerra Cerdeira, natural de Viseu (1946- 2023)(Curso de Saída da AM: 1974); foi alf mil at inf, OE, tendo cumprido uma comissão de serviço no CTIG, em Cabedu,  no subsetor de Catió (1969/70), comandando dois Gr Com da CART 2476  (Catió e Cabedu, 1969/70), setor S3 (Catió, BART 2865).

Ingressou depois  na Academia Militar em outubro de 1970 (Patrono do Curso: “Major Neutel Simões de Abreu”), concluindo a parte curricular do Curso de Administração Militar (AdMil) em 1973, sendo, após frequência do tirocínio na Escola Prática de Administração Militar (EPAM/Lisboa - 1973/1974), promovido a alferes.

Elemento da primeira hora do MFA, integrou o grupo de oficiais que assumiu o comando da Escola Prática de Administração Militar (EPAM/Lisboa) na madrugada de 25Abril74 bem como o grupo de comando que  garantiu a  ocupação e a defesa dos Estúdios da RTP no Lumiar, no âmbito na “Operação Fim de Regime”.

Fez depois a sua normal carreira militar: tenente (1974), capitão (1977), major (1986), tenente-coronel (1994) e coronel (1996). Destaque para uma Comissão de Serviço na Bósnia e Herzegovina, integrado no Destacamento de Apoio de Serviços (DAS) da Força Nacional Destacada “FND-IFOR/BÓSNIA” (1996).

(***) Catió, sector S3, englobando 3 subsetores, Catió, Cufar e Bedanda, e posteriormente (em out69) mais 3, Cacine, Gadamael e Guileje. Nesta altura, a responsabilidade do setor S3 era do BART 2865 (fev 69 / dez 70), que teve dois comandantes: TCor Art Mário Belo de Carvalho e TCor Art António José de Melo Machado.

sábado, 4 de janeiro de 2025

Guiné 61/74 - P26348: Humor de caserna (91): O anedotário da Spinolândia (XIV): "Vão-se todos vestir com a roupa que tinham quando viram o helicóptero!"... (Mário Gaspar, ex-fur mil art, MA, CART 1659, Gandembel e Ganturé, 1967/69)


1. Excerto do poste P12412(*), de Mário Gaspar:

(...)  A CART 1659, "Zorba", só conheceu dois governadores, o General Arnaldo Schulz e o Brigadeiro António de Spínola. Só este último nos visitou – e por duas vezes. – mas, na segunda vez, discursou depois de formada a Companhia:

− Vão-se todos vestir com a roupa que tinham quando viram o helicóptero!

E assim sucedeu, depois de destroçarmos todos, rapidamente surgimos, de calções, tronco nu, chinelos e cabeça destapada.

 Continuou o discurso e, já no fim, um soldado perguntou quando terminávamos a comissão, já que nos tinham prometido sairmos ao fim de 18 meses se terminássemos de fazer o cais, e este já se encontrava funcional há muito tempo. 

António de Spínola respondeu:

Não venho fazer promessas. Venho pedir mais privações e sacrifícios! (...) (**)

______________

Notas do editor:

(*) Vd. poste de 8 de dezembro de 2013 > Guiné 63/74 - P12412: Tabanca Grande (413): Mário Vitorino Gaspar, ex-Fur Mil Art, MA da CART 1659 - Zorba (Gadamael e Ganturé, 1967/68)


Vd, também poste de 19 de junho de 2024 > Guiné 61/74 - P25657: Humor de caserna (68): O anedotário da Spinolândia (XIII): na ilha das Cobras, a ementa hoje é... cabrito com ostras... V. Exas são servidas ?

quarta-feira, 19 de junho de 2024

Guiné 61/74 - P25657: Humor de caserna (68): O anedotário da Spinolândia (XIII): na ilha das Cobras, a ementa hoje é... cabrito com ostras... V. Exas são servidas ?


Palmela > Poceirão > Casa do João Vaz > 2017 > Encontro do pessoal dos Pel Caç Nat 51, 52 e 54 > Petisco:  Ostras do Sado, na grelha, para matar saudades das ostras do tarrafo...

Foto (e legenda): © José Manuel Viegas (2017). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



1. Mensagem do José António Viegas (ex-fur mil do Pel Caç Nat 54, Mansabá, Enxalé, Missirá, Porto Gole; e CIM Bolama, Ilha das Cobras e  Ilha das Galinhas, ago 1966 / set 68):



Do Spínola (sou do tempo dos dois, do Schulz e do Spínola) lembro os dois contactos que tive com ele, um ainda com o Pel Caç Nat 54, em Porto Gole, e outro na Ilha das Cobras, para onde fui destacado, no final da comissão, com um pelotão do CIM de Bolama:

1.1. Algures em 68,  apareceu em Porto Gole, com o Capitão Bruno, pois ia fazer-se uma grande operação no Xime; deu uma preleção à malta, e depois o Capitão Bruno mandou arranjar o Unimog com uma secção para ir ao Enxalé.

Eu disse: 

− Meu Capitão,  temos que picar a estrada...

Respondeu o Spínola:  

− Anda depressa, rapaz, temos mais que fazer...

1.2. Em meados de 68,  apareceu na Ilha das Cobras com o seu staff, a guarnição era toda tropa nativa (1 Pelotão do CIM Bolama), deu uma preleção aos nativos,  a enaltecer os homens, e que eles é que deveriam defender o seu chão, blá-blá...

Era hora de almoço. O Capitão Bruno foi atrás do cheiro até á cozinha, e com muita pena dele (e se calhar do  Spnínola) não ficou para o  almoço: tínhamos apanhado um cabrito nessa noite e estava a ser cozinhado com ostras.

Enfim, coisas da nossa guerra.

José António Viegas
____________

Notas do editor:

Último poste da série > 17 de junho de  2024 > Guiné 61/74 - P25652: Humor de caserna (67): O Spínola teria-se-ia desmanchado a rir, se fosse vivo, e tivesse lido esta história do cabo Abel, contada aqui, em versão condensada, pelo nosso Alberto Branquinho

domingo, 9 de junho de 2024

Guiné 61/74 - P25622: Humor de caserna (64): O anedotário da Spinolândia (XII): o "caco" que foi parar ao caldeirão da cozinha de Guileje...



1. Esta história deliciosa, a do "caco", o monóculo  (que não era graduado, mas sim um simples "ronco")  do "homem grande" de Bissau, caído no caldeirão da cozinha de Guileje, já a conhecia do meu tempo, circulava na 5ª Rep, o Café Bento, quando passei por Bissau,  "periquito"  desembarcado do "Niassa" em 29 de maio de 1969 e logo metido em LDG até ao Xime em 2 de junho...

Anedota ou não, é contada no livro de memórias "O Silvo da Granada", do José Maria Martins da Costa, ex-1º cabo trms, do Pel Caç Nat 51 (Guileje e Cufar, maio de 1968/ julho de 1970). A edição da edição da Chiado Books, 2021, meio milhar de páginas (!).

Sobre o livro o nosso crítico literário, Mário Beja Santos, chamou-lhe "uma invulgaridade da literatura da Guerra da Guiné" , nas quatro notas de leitura que entusiástica e generosamente lhe dedicou (Postes P23121, p23131, p23139 e p23156).

Sabemos pouco sobre o autor, a não ser o que ele nos diz, na sua apresentação:

(i) natural de Roriz, concelho de Santo Tirso, frequentou a escola primária, finda a qual entrou num seminário beneditino;

(ii) saiu no sétimo ano, provavelmente incompleto; 

(iii) foi chamado para a tropa, passou por Tavira e Lisboa,  e  foi mobilizado para a Guiné;

 (iv) no regresso à vida civil,  deve ter tirado "o curso de Filosofia na Universidade do Porto, e ainda o de Latim, Grego e Português, e respetivas literaturas, na Universidade de Coimbra" (Beja Santos interpretou mal; se ele tuvesse o 7º ano ou equivalente, ou fosse licenciado, teria ido frequentar o COM - Curso de Oficiais Milicianos);


Capa do livro, "O Silva
da Granada", de José Maria
Martins Costa, Lisboa,
Chiado Books, 2021. Gostaríamos
de ver o autor, nosso antigo
camarada de armas, a integrar 
 a Tabanca Grande.



(v) entretanto, fixara-se no Porto, onde casou, foi professor e jornalista...
 
Muito poucas são as referèncias existentes na Net a este homem e nosso camarada de arnas. De acordo com as notas do Beja Santos, nunca se chega  
a esclarecer, no livro, as razões por que o autor, tendo frequentado o CSM (Curso de Sargentos Milicianos), em Tavira, acabou por ir para a Guiné como 1º cabo  de transmissões, especialidade que tirou em Lisboa (certamente no quartel da Graça).   

Terá havido aqui, pelo meio, no CISMI, problemas disciplinares,  que explicam a  sua passagem compulsiva ao contingente geral.

Sabemos, isso, sim, é que chegou à Guiné em maio de 1968 ( tendo regressou à metrópole em julho de 1970), ou seja,  na mesma altura em que o brigadeiro António Spínola toma posse como governador e comandante-chefe. 

Foi colocado, em rendição individual, no Pel Caç Nat 51 (Guileje e Cufar, 1968/70).

No livro há apontamentos que são relevantes para a história do Pel Caç Nat 51, do tempo do alf mil Armindo Batata (ligeiramente mais novo, 1969/70),  e que iremos
  resumir, mais tarde. 

Para já, retivemos duas referências a Spínola, a partir dos excertos selecionados pelo Beja Santos (e que vão em negrito e itálico):

(...) Primeiro-cabo Martins já viajou para Guileje, está na fase adaptação, somos levados a supor que este homem que está profundamente impregnado pela cultura clássica, que domina o Latim e alguns dos mais cultores da língua portuguesa,  trabalha nas Transmissões. 

De supetão, arribaram três helicópteros, de um deles saiu Spínola, já percorreu o quartel, conversou com os oficiais e decidiu visitar a cozinha:

“Spínola em corpo e alma e rompeu pela cozinha sem aviso, deixando atónitos, presos aos seus lugares, cozinheiros e forneiro; e, depois das saudações e palavra de circunstância e de circunvagar um olhar indagador como a inspecionar as condições de trabalho e de higiene, avança para os fogões, mete o nariz em tachos e panelas. Eis senão quando – caso nunca visto – cai-lhe o monóculo ao panelão, onde, vaporando fortemente, fervia a cachão o feijão frade. Valeu que à ilharga, atento e venerador, estava o cabo-cozinheiro, que, ato contínuo, introduzindo por entre densos vapores a desembaraçada manápula acostumada a queimaduras e escaldões, retira incólume a luneta”.

Esta cena deve-se ter passado em meados de 1968 (talvez mesmo  logo em 26 de maio de 1968, data da primeira visita a Gandembel), porque, após a rápida passagem por  Guileje,  Spínola partiu  para aquela  aquartelamento que estava em construção há mês e meio.

Uma segunda "cena", que merece registo na nossa série "Humor de caserna", é a de uma outra visita de Spínola a Guileje, um ano depois, em meados de 1969, ao tempo da CART 2410, "Os Dráculas":

(...) E assim se chegou a abril e depois a maio 
[de 1969] , sucedem-se as flagelações, a população continua tranquilamente a sua vida monótona, não deixando de ir cultivas o seu arroz de subsistência, ao amanhecer as viaturas carregadas de bidões vão direito ao poço aberto na brenha, a uns 2 km, operação que requer severa vigilância. Spínola volta a Guileje, assim se descreve o seu regresso:

“Negros como abutres, descrevendo círculos por largo, bem à vista o cano
 saliente do canhão de bordo, os três passarões assenhoreiam-se destes ares; metem respeito e não admira que os guerrilheiros mais que tudo os temam. E, enquanto dois deles vão dando voltas, agora mais fechadas, sobre Guileje, o outro ensaia a operação delicada de vir a terra; um instante imobilizado, roda agora a ganhar posição, inclina um tudo-nada o focinho, cautamente sondando o espaço em baixo onde pousar. E já vai descendo, em volto grossos rolos de pó que revoluteiam furiosamente no ar agitado do voltear estonteante da hélice. O monstro impõe a sua presença aparatosa. Ei-lo em repouso no chão espanado pela ventaneira”.

 

O comandante de Companhia não gostou da discriminação, Spínola passou por meio da pequena multidão e deu de caras com um furriel do  [Pel Caç Nat] 67, cumprimentos efusivos.

“O nome, de todo incomum, ou talvez sobrenome, é o mesmo de uma família da alta roda lisboeta ligada à banca. Coincidência ou não, o certo é que ainda não passaram quinze dias e já o furriel foi de abalada, transferido para zona menos descoberta aos golpes da implacável guerrilha.” (...)

2. Há quem, acrítico e sisudo, não goste de ver as figuras da nossa História (e o marechal Spínola já lá está, na História com H Grande, independentemente dos nossos juízos pessoais, efémeros e transitóriso) serem objeto de anedotas ou caricaturas...  

Achamos, pelo contrário, que é quase sempre um sinal de apreço e até de homenagem: no caso de Spínola, por exemplo, enquanto governador e comandante -chefe do CTIG (1968-1973) não conhecemos anedotas sobre o seu antecessor (gen Armaldo Schulz) ou o seu sucessor (gen Bettencourt Rodrigues). E para mais andeotas que persistem na memória dos antigos combatentes,  mesmo meio século depois.

Fica aqui a nossa declaração de interesses.

(Seleção, revisão / fixação o de texto, negritos e itálicos: LG) (Com a devida vénia ao autor e ao seu crítico literário)

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Nota do editor:

Último poste da sérier > 7 de junho de 2024 > Guiné 61/74 - P25613: Humor de caserna (63): Em 1971, por uns bons 250 contos (equivalente, a preços de hoje, a mais 75 mil euros), um 1º cabo miliciano arranjava um subsituto para ir para o ultramar

Vd. também poste de 20 de maio de 2024 > Guiné 61/74 - P25584: Humor de caserna (60): O anedotário da Spinolândia (XI): "Continua, meu rapaz, salvas-te tu para que este batalhão não seja a merda mais completa" (Um anedota contada pelo saudoso Rui A. Ferreira,1943-2022)

quinta-feira, 30 de maio de 2024

Guiné 61/74 - P25584: Humor de caserna (60): O anedotário da Spinolândia (XI): "Continua, meu rapaz, salvas-te tu para que este batalhão não seja a merda mais completa" (Um anedota contada pelo saudoso Rui A. Ferreira,1943-2022)


1. O nosso saudoso amigo e camarada Rui Alexandrino Ferreira (1943-2022), ten cor inf ref, que fez duas comissões no CTIG, a última como cmdt da CCAÇ 18 (Aldeia Formosa, jan 71 / set 72), foi também um talentoso escritor, tendo-nos deixado três livros de memórias....

Além de ter sido um grande operacional, gostava também de pregar as suas partidas e contar as suas cenas pícaras... Esta é um delas... Anedota ou não, fica bem na série "Humor de caserna"...

Vamos condensá-la e resumi-la: 


Numa visita a uma guarnição no mato (o que era frequente e de surpresa, e muitas vezes a desoras), Spínola deparou com um comandante de batalhão, "trapalhão, pouco esclarecido, desconhecendo muitas das realidadaes do seu próprio quartel", enganando-se várias vezes ao identificar "os sucessivos lugares por onde iam passando" (sic).

A gota de água que fez entornar o copo foi a visita à "casa do piquete": ao abrir-se  a porta, constatou-se que era uma sala de aulas, onde um militar ensinava a uma classe de miúdos. Enfim, tratava-se de um PEM (Posto Escolar Militar).

Atrapalhado, o professor, que não devia ter dado conta da visita do Com-chefe ao quartel, àquela hora, nem muito menos estava à espera de tão ilustre visitante, "desajeitadamente, não sabendo o que fazer, mandou levantar os alunos".

Spínola, mandou-os de imediato sentar, dizendo: "Continua, meu rapaz, salvas-te tu para que este batalhão não seja a merda mais completa.

Comenta o Rui Alexandrino : "Não sei quantos dias levou este , mas lá levar levou" (pág. 350). (Refiria-se, obviamente, ao comandante de batalhão...)

Fonte: Adapt de Rui Alexandrino Ferreira - "Quebo: nos confins da Guiné". Coimbra: Palimage, 2014, 364 pp.
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Nota do editor:

quarta-feira, 24 de abril de 2024

Guiné 61/74 - P25438: Humor de caserna (59): O anedotário da Spinolândia (X): Alferes, cabra de mato!... Pum, pum!!! (David Guimarães, ex-fur mil at art, MA, CART 2716, Xitole,, 1970/72

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David Guimarães, Guiné-Bissau, 2001

1. O David Guimarães (ex-fur mil at inf, MA, CART 2716 / BART 2917, Xitole, 1970/72) é um dos nossos "dinossauros", um dos nossos VCC (velhinhos como o c...).

Ele é do tempo do "blogue-fora-nada", que deu origem ao atual blogue... Ele, o Sousa de Castro, o A. Marques Lopes, o Humberto Reis... foram alguns dos primeiros camaradas que me ajudaram a "exorcizar os meus fantasmas" da Guiné...

Tem 113 referências no nosso blogue.. E hoje faz anos. 77. Entrou tarde para a tropa, quando chegou ao Xitolee tinha já 23, e, quando regressou a casa, 25.

Claro que, ao fim destes anos todos (vinte!), só muito raramente ele aparece agora no blogue... É mais "feicebuqueiro" do que "blogueiro", como tantos outros... Mas a gente não se esquece do seu papel, na "proto-história" da Tabanca Grande. Tenho especial carinho e amizade por ele.

E, neste dia, além de já lhe ter telefonado e mandado "by air", para Espinho, um "balaio" cheio de votos de parabéns e de muita saúde e coragem para o resto da caminhada... (que de minas e armadilhas sabe ele!), vou ressuscitar duas das suas histórias deliciosas, passadas ainda no tempo em que eles "periquitos",o pessoal da CART (chegaram em maio de 1970).. Tem um fino sentido de humor, o David, ou não fosse ele um ex-fur mil at inf, de minas e armadilhas, que viu morrer um sapador (Quaresma) e outro furriel ficar cego (Leones).

Estas duas histórias merecem figurar no "anedotário da Spinolânda"... Diz o Carlos Matos Gomes, no seu novo livro ("Geração D: da Ditadura à Democracia", Lisboa, Porto Editora, 2024), a Guiné sempre foi até ao fim, "uma coutada pessoal de Spínola" 
(pág. 188), ao ponto de querer transformar os comandos africanos numa guarda pretoriana... 

Justa ou injustamente, temos falado aqui na Spinolândia (*), e no seu anedotário (que alimentava o nosso humor de caserna)... Na realidade, o nosso general parecia comportar-se, no CTIG, como se fosse o dono daquilo tudo... E o pessoal também o via como tal... 



Humor de caserna > O anedotário da Spinolândia>  Alferes,  cabra de mato!... Pum, pum!!! 
 
por David Guimarães


(i) Alferes, cabra de mato!


Um dia, novinhos ainda, piras, com as fardinhas novinhas em folha, aí vamos nós. Sai o 1º Grupo de Combate. Patrulha em volta do aquartelamento para os lados de Seco Braima, o que era normal: acampamento IN....

Era bem de manhã. E a certa altura, zás, ouve-se o matraquear de espingardas automáticas:

− Que coisa!... Oh diabo, estão a enrolar…

Os morteiros fixos lá fazem fogo de barragem. Novamente os experientes homens de armas pesadas. E que eficientes! Como eles faziam aqueles morteiros dispar tão amiúde e certeiro... Cessar fogo, tudo silêncio à volta, fora os abutres que logo foram ver o que acontecia.

− Que aconteceu? E agora... Estará alguém ferido ? O que aconteceu ? O que vamos fazer ?

Nenhum deles disse nada... mas voltaram depressa. E nós nem percebíamos ainda porque que é que eles voltaram assim tão rapidamente... Bem, lá regressa, da patrulha, o 1º Grupo de Combate. Ofegantes, e agora dentro do aquartelamento esboçando sorrisos, todos pretos... Que coisa, sempre que havias tiros ficava-se todo preto!

−Que aconteceu ?!...

Lá vem a explicação: o grupo estava a instalar-se, para um tempinho em posição de emboscada. Uma cabra de mato passa em frente... Um soldado diz para o aferes,  muito baixinho:

− Alferes, cabra de mato!
−  Atira-lhe − , responde o Alferes… 

Ah rico tiro, pum, pum!!!

E não é que o IN estava lá emboscado, do outro lado da cabra ? Seriam poucos, mas ao sentirem-se detectados deram uns tiros e fugiram, pois que entretanto também começaram a cair bem perto as granadas do morteiro do aquartelamento....

− Manga de cu pequenino

Olha que sorte, a santa cabra do mato! ... Foi ela, afinal, o nosso anjo da guarda. O Correia voltou com o seu grupo de combate inteiro e o soldado que detetou a cabra... herói. Mais tarde,  foi-lhe proposto e concedido o prémio Governador Geral. Todos achámos muito bem, veio à metrópole. Se não fora assim, nunca iria lá de férias, porque não tinha dinheiro para isso...

Ninguém soube se a cabra morreu ou não, mas os homens, depois de contados, estavam todos... E os abutres também voltaram ao aquartelamento e continuaram a comer o que restava da vaca morta nesse dia...

A guerra tinha disto também, e ainda bem... Como entendê-la ? Só um combatente... Este era o nosso tempo de recreio de guerra dentro da guerra.

(ii) O Caco Baldé no Xitole

Um helicóptero que pousa na pista do Xitole, gente da alta e o Homem Grande (General, Comandante-Chefe e Governador do CTIG - Comando Territorial Independente da Guiné): António de Spinola, ele mesmo, mais conhecido por... Caco Baldé!

Spínola, Governador e Com-Chefe, era conhecido por  Caco, Caco Baldé, Homem Grande de Bissau...

Volta à companhia, verificação da posição das NT dentro do Aquartelamento... Rapidamente se forma um U, cada qual fardado o melhor que podia, era um ver se te avias.... Sua Excelência, de pernas afastadas, mãos atrás das costas, impecavelmente fardado e com seu monóculo começa assim um discurso:

− Tenho péssimas informações do Batalhão [ BART 2917, com sede em Bambadinca ], à exceção desta companhia [ CART 2716 ]... Continuem,  etc., e tal e tal...

E lá foi o homem embora: meteu-se no helicóptero e saiu pelos ares da Guiné, algures no Leste, rumo a Bissau, possivelmente.

− - Porra que elogio, mas para quê? Ele afinal até é bom!

− Porreiro !   −  dizia um...

− Que se foda !  −  dizia outro...

− Bem, sempre é melhor este elogio do que o contrário...

− Que se lixe, já foi...

− Mas seremos assim tão bons para levar este elogia? Tão novos... merda, que se dane!...

Percebemos pouco tempo depois o que ele nos queria a dizer... Tinha-se realizado a Op Abencerragem Candente (Ponta do Inglês, Xime, 25 e 26 de Novembro de 1970, que o Luís e o Humberto já têm aqui evocado várias vezes), com um porrada de mortos e feridos...

Aí percebemos melhor o discurso do General quando na ordem de serviço veio o seguinte (reproduzo de cor): Segue para a Metrópole o tenente coronel de artilharia M. F.,  por ser incompetente para comandar um Batalhão... Em seu lugar nomeio João Polidoro Monteiro, tenente coronel de infantaria, etc. etc. etc... 

Nestas coisas, o Caco Baldé não brincava em serviço, cortava a direito... Não percebo por que é poupou o major A.C. (dizem que foi por ser antigo professor da Academia Militar...).

− Ai,  olha, ele varreu com o Nord Atlas  −   assim chamávamos nós ao M. F. (um bom homem, mas que de guerra efectivamente só deveria saber o que vinha nos livros)... 

Apanhou uma porrada desse nível e, ainda por cima, estava de férias, enquanto o A. C., o principal responsável pelo fracasso dessa operação e o consequente desastre, ficava...
 
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Nota do editor:

(*) Último poste da série > 6 de abril de 2024 > Guiné 61/74 - P25396: Humor de caserna (58): O anedotário da Spinolândia... O "Fugitivo", por Manel Mesquita ("Os Resistentes de Nhala, 1969/71", s/l, ed. autor, 2005, pp. 130/132)

terça-feira, 16 de abril de 2024

Guiné 61/74 - P25396: Humor de caserna (58): O anedotário da Spinolândia (IX)... O "Fugitivo", por Manel Mesquita ("Os Resistentes de Nhala, 1969/71", s/l, ed. autor, 2005, pp. 130/132)


Capa do livro do Manel Mesquita, 
"Os Resistentes de Nhala", ed. de autor, 2005, s/l, 2055, 144 pp. 
(Gráfica: Quadra - Produções Gráficas Lda, Vila Nova de Gaia.)
(Contactos do autor: tel 22 762 07 36 | telem 963 525 912)


1. Não havia só as anedotas do "Caco Baldé", ou do "Gasparinho"... Havia uma Spinolândia, do Cacheu ao Cacine... Naquela guerra, todos os bons pretextos para um gajo se rir ajudavam a passar o tempo e amenizar as agruras do arame farpado e das operações no mato (*)... 

Há "cromos" que ficam para a eternidade, "grafados" no papel. Outros vão desaparecer dos neurónios da nossa memória.  Já aqui citámos alguns dos "heróis" do livro do Manel Mesquita,   "Os Resistentes de Nhala, 1969/71" (ed. de autor,  s/l, 2005, 144 pp.), como por exemplo o Mário...

O Mário já estava farto de estar na Guiné e um dia encheu-se de coragem e interrompeu o general, em plena parada, em Aldeia Formosa, para expor a sua situação: "Vossa Excelência, meu general, dá-me licença ?" (**)...

O general deu-lhe "licença" e o Mário ganhou um "bilhete" para regressar a casa  no primeiro barco... A história foi contada pelo Manel Mesquita, o autor dos "Resistentes de Nhala",  soldado da CCAÇ 2614 / BCAÇ 2892 (Bissau, Nhala e Aldeia Formosa, 1969/71). 

O nosso crítico literário já lhe dedicou em tempos, ao livro e ao seu autor (que conheceu a caminho de Fátima), duas saborosas e generosoas "notas de leitura" (***)

(...) "Este testemunho deixa-me emudecido, o Manel é um coração pacífico, nunca mais esquecerá Nhala. E o que ele vai registar de tipos humanos, camaradas que encontrou, gente inesquecível, é surpreendente." (...) 

Nessa galeria de figuras humanas, do tempo da Spinolândia, está o "Fugitivo"... Merece figurar aqui num poste, na montra grande do nosso blogue. Não sei se o Spínola o conheceu, mas deveria, por certo, de gostar de o conhecer. Nós gostámos e pedimos licença ao Manel Mesquita para partilhar o seu retrato-robô com os nossos leitores. É um retrato feito a traço grosso, convenhamos. Mas o leitor vai-se rir a bandeiras despregadas, como nós rimos. 

É uma figura bem típica da "literatura  pícara" da nossa guerra. Como é nosso timbre, não fazemos juízos de valor sobre os nossos camaradas... A verdade é que "a tropa mandava desenrascar"... E o "Fugitivo" era um militar desenrascado... À letra, desenrascado é alguém que se sabe "livrar de um perigo, de apuros, de dificuldades."...

Reproduzimos aqui, com a devida vénia, essas duas páginas do livro. É também uma homenagem aos "resistentes de Nhala", os bravos da CCAÇ 2614.


O "Fugitivo"

por Manel Mesquita

O "Fugitivo" era natural e residente no concelho de Sintra. Era fisicamente muito baixo e entroncado, um artista a jogar futebol, preferia o lugar de médio atacante.

Quando fomos para a recruta, rodava na televisão uma série com o nome "O Fugitivo". Ele assentou praça com um braço ao peito por fratura. Como havia outro, o outro levou com a alcunha de "Maneta". E o nosso Manuel Pedro M... levou com a alcunha de "Fugitivo". 

Nunca se importou. Era uma pessoa alegre e com sentido de humor. 

(i) A tomar banho, um dia, deu nas vistas o seu curto pénis, foi motivo de chacota durante toda a comissão, principalmente na presença de mulheres africanas. Ele não desarmava, dizia que era proporcional ao corpo.

(ii) Quando veio de férias, gabou-se e passou a constar-se que andava com uma determinada moça jeitosa e com dote. Tinha barba muito forte, uma manhã foi ao barbeiro, todos os cumprimentaram o recém-chegado e deram-lhe a vez. 

Quando o barbeiro lhe passava a navalha de barba pela parte da frente do pescoço, perguntou-lhe:

− Então você é que é o tal que se gaba que anda a comer a minha filha?!

O Manel Pedro (como é lá conhecido) perdeu o sentido de humor, quase perdia a fala:

− Eu?!..., na, na, eu não!... É mentira. Isso é uma grande mentira..., eu até nem gosto de mulheres!!!...

O barbeiro voltou-se para a sua mesa de trabalho, passando a navalha pelo assentador.

O "Fugitivo" mostrou  por que lhe chamavam tal nome: levanta-se da cadeira, larga as toalhas e, junto da porta, grita para dentro:

− Eu... eu até sou paneleiro!

Fugiu da barbearia com a barba meia feita e meia por fazer e toda por pagar, nunca mais  por ali ele quis passar. 

Mostrou, mais uma vez,  que não foi por acaso  que o batizaram como "Fugitivo". Ficou então a saber a que a tal Maria do Carmo era a filha do barbeiro...

(iii) Quando convidado para um petisco, era sempre o primeiro a aparecer. Era um bom garfo! Para trabalhar e para as saídas (para o mato) era sempre o último. Quando preparávamos a saída, o alferes perguntava se estava o "Fugitivo"; se sim, estava tudo, podíamos sair.

Escapava-se,  sempre que podia,  às faxinas e outros serviços de quartel.

(iv) Um dia segredou a um de nós que a namorada se queixava que nos aerogramas e cartas não lhe mandava palavras doces... Então o "Fugitivo" encheu-lhe uma aerograma de palavras como: marmelada, geleia, mel, açúcar, compostas, etc., isto para o pequeno-almoço;  para o almoço: laranjas, tangerinas, etc.; para  o lanche, marmelada, mel, geleias, etc.; para o jantar:  uvas, figos, maçãs, pêras, etc. 

(v) Um colega estava com uma máquina fotográficas na mão, ele meteu-se  todo dentro de um bidão e... pediu-lhe:

− Tira-me uma fotografia de corpo inteiro para mandar à moça.

(vi) Num dos patrulhamentos, parámos para descansar junto à "Bolanha dos Passarinhos". Tirou a carga para descansar e,  quando levantámos, nunca mais se lembrou que deixara ali no chão o cano suplente da HK 21. 

Quando chegou oa aquartelamento deu pela falta. Preocupado, disse a todos a enrascada  em que estava envolvido, que tinha que ir lá  buscar o cano. 

Como raramente falava a sério, ninguém se acreditou. Era noite, preparou-se e começou a ir sozinho. Foi aí que o pessoal se acreditou, e apareceram voluntários a comunicar e a pedir autorização ao capitão para ir ao local.

O "chefe" comprendeu a aflição do soldado e mandou uma viatura. Soubemos que havia correio em Buba, aproveitámos  e fomos lá buscar o que para nós era importante receber. A viatura avariou, e não havia mecânico. Desenrascámo-nos, mas chegámos ao aquartelamento era quase meia-noite, sem jantar e sem comunicações com ninguém, mas já com o cano que era considerado material de guerra.

(vii) Dizem que um dia mandou dizer à mãe (não sei esta é verdade, ele nega; "lerpar" era um calão que queria dizer, para nós, morrer)... Ter-se-á referido a um colega duma aldeia vizinha, nestes termos:

− Minha mãe, o ... (nome do fulano) lerpou. Vai antes do tempo. Um dia destes ele vai chegar aí, num barco.

Na volta do correio, a mãe respondeu-lhe:

− Meu filho, vê se lerpas também, para vires mais cedo daí! 

(Revisão / fixação de texto para efeitos de publicação deste poste no blogue: LG)

Fonte: in Manel Mesquita, "Os Resistentes de Nhala", ed. autor. s/l, 2005, pp. 130/132.
(Gráfica: Quadra - Produções Gráficas Lda, Vila Nova de Gaia.)

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Notas do editor:

(**) Vd. poste de 26 de março de  2024 > Guiné 61/74 - P25308: O Spínola que eu conheci (36): A história do Mário, da CART 2478, contada pelo Manuel Mesquita, da CCAÇ 2614 ("Os Resistentes de Nhala: 1969/71", ed. autor, 2005)

terça-feira, 29 de novembro de 2022

Guiné 61/74 - P23826: Humor de caserna (57): O anedotário da Spinolândia (VIII): "Porra, porra, lá iam lixando o Comandante-Chefe" (Gen Spínola, abril de 1972, quando o seu heli terá aterrado, por engano, numa clareira do mato, cercada de "turras", confundidos com comandos africanos)

Guiné > Algures > s/d (c. 1969) > O alf mil pil heli Al III Jorge Félix (BA 12, Bissalanca, 1968/70) e o gen Spínola (Com-Chefe e Governador Geral, CTIG, 1968/73)...  O Jorge Félix terá sido um dos pilotos de heli, com quem o general mais terá gostado de voar...   E com ele não nenhum susto como o de abril de 1972, uma história insólita contada neste poste...

Foto (e legenda): © Jorge Félix (2010). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



Capa do livro do Rui Alexandrino Ferreira, "Quebo: Nos confins da Guiné" (Coimbra, Palimage, 2014, 364 pp.).


1. Não sei se esta história é verdadeira ou não. Mas tenho que a  tomar como verídica, já que foi contada em primeira mão por um capitão do quadro, comandante da CCAÇ 3399/ BCAÇ 3852 (Aldeia Formosa, 1971/73), o cap inf Horácio José Gomes Teixeira Malheiro, que esteve na "periferia dos acontecimentos" (*).

Temos que admitir que, quando se falava das peripécias do gen Spínola,  no CTIG, muitas vezes se mistura(va)  ficção e realidade.  Daí esta história  vir "engrossar" a nossa série "Humor de caserna" e o "anedotário da Spinolândia" (**). A história do heli  é perfeitamente verosímil e desta vez o general (e os seus acompanhantes) terá apanhado um valente susto...

A história consta do livro do nosso já saudoso Rui Alexandrino Ferreira (1943-2022),  "Quebo: Nos confins da Guiné" (Coimbra, Palimage, 2014, 364 pp.), cuja capa se reproduz acima. 

Vamos reproduzir aqui um excerto do capítulo 10º ("O capitão de Aldeia Formosa, Horácio Malheiro"). É um depoimento do comandante da CCAÇ 3399 sobre a excelente articulação e cooperação, em operações, com o cap inf Rui Ferreira e os seus homens da CCAÇ 18 (pp. 179-196), não obstante os graves incidentes do Natal de 1971, rapidamente ultrapassados e esquecidos (*).

O cap inf Horácio Malheiro (não sabemos que posto tinha em 2014, aquando da publicação do livro, "Quebo"), dá vários exemplos de ações conjuntas que se traduziram em  "êxitos para o Batalhão" (pág. 191).

Uma delas, louvada de resto pelo gen Spínola, terá sido na sequência da Op Muralha Quimérica, em abril de 1972. "uma operação que visava evitar a entrada na Guiné de elementos da ONU que vinham verificar a existência de Zonas Libertadas onde o Exército Português não entrava e assim seriam reconhecidas internacionalmente como legítimas representantes dos Povos da Guiné" (pág. 192).

Decorreu durante 12 dias e envolveu forças  da CCAÇ 3399, CCAÇ 18, paraquedistas, comandos africanos e o Grupo Especial  do Marcelino da Mata. A operação teve como comandante, o ten cor paraquedista, Araújo e Sá, do BCP 12.


2. Um situação insólita em que o Com-Chefe se ia lixando...

por Horácio Malheiro

(...) Lembro-me de uma situação insólita que se passou nessa altura. Estava a minha Companhia de reserva em Aldeia Formosa quando recebo ordens urgentes  para embarcar nos helis, que  estavam estacionados  na pista,  e seria já no voo que teria conhecimento do destino  e missão.

Embarcámos de imediato e quando nos preparávamos  para descolar, soube nessa altura  que a missão era resgatar o general Spínola que presumivelmente teria sido aprisionado  pelo IN quando o seu heli  teria aterrado no meio de forças IN na altura confundidas com os Comandos Africanos.

Na altura da descolagem,  o meu piloto, comandante da  esquadrilha de helis, recebeu, via rádio, uma comunicação do heli do general Spínola informando que já vinha a caminho, pelo que apeámos s e aguardámos a sua chegada.

Quando chegou o heli do general, este saiu todo sujo de fuligem bem como o seu ajudante de campo, capitão Tomás, cujas mãos tremiam descontroladamente ao cumprimentar-me.

O general teve só um comentário ao desembarcar: "Porra, porra, lá iam lixando o Comandante-Chefe", e seguiu para a sede de Batalhão.

Já no bar,  em conversa, soube que o general tinha mandado aterrar o heli numa clareira da mata onde vislumbrou  militares africanos IN de camuflado que confundiu com os Comandos Africanos por terem adoptado no terreno um dispositivo de segurança à aterragem.

Quando aterrou e apeou,  foi recebido a tiro e todos se atiraram ao chão que tinha sido queimado e daí o terem ficado cheios de fuligem. Passado este instante de estupefacção, entraram a correr para o heli que descolou de imediato, debaixo de fogo IN,  que mal adivinhava  que tinha tido ao seu alcance o maior "ronco" da guerra da Guiné, que seria a captura ou abate do (...) Comandante-Chefe  [do Exército Português] " (pp. 192/193).

[Selecção / revisão e fixação de texto / parênteses retos, para efeitos de publicação deste poste: LG]

___________


Notas do editor:

(*) Vd. poste de 26 de novembro de 2022 > Guiné 61/74 - P23817: In Memoriam (463): Rui Alexandrino Ferreira (1943-2022)... Um excerto do livro "Quebo" (2014): Recordando os tristes acontecimentos que ensombraram Aldeia Formosa, na noite de Consoada de 1971, "se não a pior, uma das mais trágicas da minha vida"

quinta-feira, 11 de agosto de 2022

Guiné 61/74 - P23516: Humor de caserna (56): O anedotário da Spinolândia (VII): a outra alcunha do nosso general, Aponta,Bruno! (referência ao seu ajudante de campo, o então cap cav João Almeida Bruno, falecido ontem, aos 87 anos)


Guiné > Região de Cacheu > Bula > Pecuré > Op Ostra Amarga > 18 de outubro de 1969  > Depois da embocada, o general Spínola, ao centro, ladeado à esquerda pelo major João Marcelino (2.º comandante do BCAV 2868, então em Bissau e que apanhou boleia no heli) e o ten cor Alves Morgado, comandante do BCAV 2868 que acompanhou o desenrolar da acção. À direita de Spínola, o seu ajudante de campo, o cap cav Almeida Bruno (que faleceu ontem, 10/8/2022, aos 87 anos) (*), empunhando uma G3, e de costas  o cap cav José Maria Sentieiro, comandante da CCAV 2485 que, por impedimento do comandante da CCAV 2487, foi encarregado de dirigir a Op Ostra Amarga. 

Vd. também o vídeo "Guerre en Guinée" (1969) (13' 50''), imagens da chegada do  Spinola e do Almeida Bruno, 11' 30'' ... Cortesia de INA - Institut National de l' Audividuel.

A foto acima reproduzida (e editada pelo blogue) é do Paris-Match nº 1071, de 15 de novembro de 1969 (Com a devida vénia...). Vd. também o vídeo "Guerre en Guinée" (1969) (13' 50''), imagens da chegada do  Spinola e do Almeida Bruno, ao 11' 30'' ... Cortesia de INA - Institut National de l' Audividuel.


1. Recordando Spínola e o seu mais conhecido ajudante de campo, o então cap cav João Almeida Bruno  (*)... Excertos de um poste, velhinho. de 16 de março de 2006, da autoria do Zé Teixeira (*)

Luís, a propósito do Caco Baldé, toma outra alcunha do gen Spínola (*):

− O Aponta, Bruno... Aí vem o Aponta, Bruno !  dizia logo o pessoal quando se avistava o Héli que o transportava.

Porquê? Toda a zona de Buba, Nhala, Mampatá, Chamarra e Aldeia Formosa esteve uns tempos a comer, ao almoço e ao jantar, arroz com arroz e de vez em quando uma amostra de chispe. A barcaça que levava os mantimentos foi afundada pelos nossos amigos, e ficamos a ver... barcaças !

Isto gerou um mal estar que mais se agravou com o ataque às 5 da matina, como já contei no meu Diário. Devo dizer que a minha companhia estava reduzida a 36 homens operacionais, dado esforço que se estava a fazer com a protecção à nova estrada de Buba para Aldeia Formosa, em que saíamos com o que seriam três pelotões às seis da matina. Regressávamos à tarde, no dia seguinte estávamos de serviço à segurança do quartel e logo de seguida abalávamos de novo para a estrada.

Então o homem chega e começa o discurso:

 Pátria está a exigir de vós um grande esforço e vós sois ... blá, blá, blá. Sei que a comida não tem sido a melhor, mas a Pátria exige sacrifícios... blá, blá,blá. Quando estiverdes a comer feijão ou arroz, sem mais nada, fechai os olhos e imaginai-vos a comer um belo peru recheado ou um grãozinho com bacalhau, lá em Lisboa... blá, blá, blá.

Acompanhava-o um capitão, seu ajudante de campo, que toda a gente conhece e perante as reclamações do Major e do médico, ele só dizia:

− Aponta, Bruno!

Felizmente tínhamos um excelente médico, a quem presto a minha homenagem no Blogue, o Dr. João Carlos de Azevedo Franco, que à mais pequena mazela, muitas vezes resultante do estado psicológico em que vivíamos, dava uma baixa. Recordo que nesse célebre dia do Aponta, Bruno,  o Spínola disse ao médico:

− Estes rapazes o que precisam é de umas picas, vou-lhe mandar uma boa dose de medicamentos... Aponta, Bruno!

 Ao que o médico lhe respondeu:

 O que eles precisam é de uns bons bifes e descanso.

Claro está que o Capitão Bruno não apontou o que o médico disse. Não é que oito dias depois chega a barcaça com mantimentos e duas enormes caixas de medicamentos não solicitados?! Escusado será dizer que foram devolvidas ao remetente, com a informação "medicação não solicitada" e a vida continuou. (...) (***) 
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Notas do editor: