por Rui A. Ferreira (1943-2022)
Tendo saído do barco que o transportou até Bissau, diretamente para uma lancha da marinha, que o foi depositar, a si e ao seu grupo de combate, no aquartelamento de Cabedu, cuja guarnição era então composta por dois pelotões de atiradores e, sendo que, como era o mais antigo, passou nestes termos a ser o comandante militar de Cabedu.
Passados uns tempos, recebeu a visita do próprio general Spínola, que a certa altura lhe perguntou:
− Então, e o plano de defesa ?
Ao que o bom do Cerdeira respondeu:
− Não sei o que é isso.
− Então, quando são atacados o que é que fazem ?
− Fazemos fogo.
− Para onde ?
− Para onde pensamos que eles estão.
− Então, e não veio cá ninguém ajudá-lo a fazer um plano de defesa ?
− Não, senhor, o meu general foi o único até agora.
Spínola voltou para o helicóptero, foi à sede do batalhão (***), fez subir para o mesmo o comandante e foi largá-lo em Cabedu e deixou-lhe TPC (trabalho de casa):
− Daqui a 15 dias volto cá a buscá-lo,quando o plano de defesa estiver pronto.
Para concluir a história, foi o comandante punido com uns quantos dias de prisão e devolvido à metrópole.
_______________
Notas do editor LG:
(*) Último poste da série > 15 de janeiro de 2025 > Guiné 61/74 - P26391: Humor de caserna (96): "O mê Zé disse isso ?!"... O epílogo engraçado da história do impaludado (Alberto Branquinho)
Vd. poste de 4 de janeiro de 2025 > Guiné 61/74 - P26348: Humor de caserna (91): O anedotário da Spinolândia (XIV): "Vão-se todos vestir com a roupa que tinham quando viram o helicóptero!"... (Mário Gaspar, ex-fur mil art, MA, CART 1659, Gandembel e Ganturé, 1967/69)
![]() |
Cor SAM ref Manuel C. A. G. Cerdeira (1946-2023) |
(**) Trata-se do cor SAM Manuel Carlos de Almeida Guerra Cerdeira, natural de Viseu (1946- 2023)(Curso de Saída da AM: 1974); foi alf mil at inf, OE, tendo cumprido uma comissão de serviço no CTIG, em Cabedu, no subsetor de Catió (1969/70), comandando dois Gr Com da CART 2476 (Catió e Cabedu, 1969/70), setor S3 (Catió, BART 2865).
4 comentários:
O Spínola, enquanto governador e comandante-chefe no CTIG, foi e continua ser uma figura "polémica", objeto de amores e ódios patológicos, com admiradores e detratores...O mesmo se passa com Amílcar Cabral (1924-1973) cujo centenário de nascimento, de resto, terá sido mais "comemorado" em Portugal do que nas terras que ele quis "libertar" (Guiné-Bissau e Cabo Verde)... Estranho paradoxo, não ?!
Há quem diga que as "vítimas" do Spínola, a nível de oficiais superiores, comandantes de batalhões, eram "preferencialmente" das armas de infantaria e artilharia... Nunca eram militares de cavalaria... nem antigos alunos do Colégio Militar !...
Não há estatísticas, é apenas a evidência anedótica... A questão que se pode pôr: era Spínola imparcial na aplicação da disciplina e da justiça em relação aos seus subordinados ? Acusavam-no, alguns daqueles que trabalharam com ele ou próximo dele, que, a par das muitas virtudes (carisma, liderança, coragem física e moral, determinaçãio, capacidade de trabalho, etc.), também tinha muitos defeitos (narcisismo, vaidade, ambição pessoal, demagogia, favoritismo...).
Ficou célebre, na nossa cultura de caserna, a expressão "pôr um par de patins"...
Já na Guiné se contava um dos ditos preferidos do general: "Um oficial de cavalaria é bom até prova em contrário. Um oficial de infantaria ou artilharia é mau até poder provar o contrário"....
O "Onze" do Combis também levou um par de patins do Spínola. Quando Bissau foi atacada ou flagelada... O Paulo Santiago acha que era de cavalaria... Exceção que confirma a regra ? LG
Sim, confirmei com o Paulo Santiado... O que dizer que toda a regra tem exceção ("Todo o oficial de cavalaria é bom até prova em contrário; todo o oficial de infantaria ou artilharia é mau até prova em contrário")...
Um dos primeiros comandantes do Combis (Comando de Agrupamento de Bissau, jan 69 /set 74) terá levado com um "par de patins" por parte do Spínola, aquando do ataque ou flagelação do PAIGC a Bissau, que deixou o com-chefe em polvorosa...Por azar o comandante era de cavalaria, o célebre "Coronel Onze" (alcunha pouco abonatória para a sua honra...), o Cor Cav Fernando Rodrigues de Sousa Costa!...
Era o terror dos militares em Bissau, pior que a PM!...Contavam-se muitas histórias dele. Uma das duas vítimas foi o cap inf Vasco Lourenço, teve ir que ao barbeiro duas vezes a cortar a melena...
Uma história já aqui contada pelo nosso saudoso Fernando Magro (ex-cap mil art, BENG 447, Brá, 1970/72).
Enviar um comentário