Rui A. Ferreira, o valoroso e e "bem amado" comandante da CCAÇ 18 (Aldeia Formosa, jan 71 / set 72) |
1. Sabemos que era assim: quem tinha cunhas, dinheiro, património, intimidade com o poder (económico, financeiro, político, militar, religioso...) e outros privilégios, como ser "filho de algo" (dentro da elite do regime) podia, com relativa facilidade, fazer a tropa cá, na "metrópole", a capital do Império, e evitar o incómodo, a maçada, a chatice, de ser mobilizado para o "ultramar" (ou "ir para fora", como dizia o Zé Povinho).
Lemos e tomámos boa nota de mais uma revelação destes casos, de que se pouca fala (contrariamente aos dos faltosos, refratários e desertores): consta de um depoimento de um ex-fur mil, do pelotão de reconhecimento, da CCS/BCAÇ 3852 (Aldeia Formosa, 1971/73), publicado no livro do nosso saudoso Rui Alexandrino Ferreira (1943-2022) , "Quebo: Nos Confins da Guiné" (Coimbra, 2014, pp. 252/253).
Na altura era dinheiro: 250 contos dava para comprar uns quatro automóveis Fiat 127, o carrinho da classe média baixa...Ou um bom andar mobilado na Reboleira, Queluz ou Paço de Arcos do J. Pimenta, pois, pois!
Mas temos que reconhecer que era bem mais caro do que os 10 contos que muito boa gente gente deu, nesse tempo, ao "passador" para poder chegar a Paris, a salto...
Mas o furriel que conta esta história (e que se formou mais tarde em direito), não aceitou as "pressões" nem os "argumentos" da sua querida mãe, viúva há dois anos, e que temia pela sorte do filho. No seu depoimento, de 2008, ele é sincero, dizendo (e honra lhe seja feita!):
"Confesso que andei indeciso, mas sempre com a sensação de que se pagasse a alguém para ir por mim, me arrependeria toda a vida. (...) Hoje conhecendo-me melhor, tenho a certeza de que não me perdoaria". (...) (páqg. 252).
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Nota do editor:
1 comentário:
Este nosso camarada teve a hombridade de falar, em público (neste caso, escrever, num depoimento de homenagem ao seu amigo Rui A. Ferreira), do seu caso pessoal, o de ter sido tentado, pela mãe, a arranjar um substituto para ir, na sua vez, para o ultramar.
A família, de Penalva do Castelo, tinha meios (financeiros) para arranjar os tais 250 contos. Mas esse nosso camarada (cujo nome não precisa de ser citado aqui) acabou por ir na sua vez, e cumprir o seu "dever", E não se arrependeu.
Se ele tivesse aceite aquilo que para ele era, ao que parece, moralmente condenável, não teria conhecido a Guiné, a guerra, a Aldeia Formosa, o Rui A. Ferreira... e nunca teria tido a oportunidade (e muito menos a vontade) de vir a público contar... este "pequeno segredo".
É impossível saber quantos casos houve de militares que, a troco de dinheiro, aceitarem ir para o Ultramar em vez de outrém... Haverá histórias mas nunca estatísticas... Mas também não estou à espera que apareçam, aqui no blogue, a contar a sua história... Foram "combatentes de aluguer" ?... Também não os quero julgar... LG
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