segunda-feira, 11 de novembro de 2013

Guiné 63/74 - P12275: Efemérides (146): Foi há 38 anos que Angola se tornou independente... Meio século depois do início da guerra do ultramar, continuamos divididos quanto à explicação da sua razão, sentido e duração (António Rosinha)


1. Mensagem de António Rosinha [, fur mil em Angola, 1961, foto à esquerda; topógrafo da TECNIL, Guiné-Bissau, em 1979: ou, como ele gosta de dizer, colon, em Angola,  de 1959 a 1974; cooperante na Guiné-Bissau, de 1979 a 1993]:

Data: 10 de Novembro de 2013 às 00:55

Assunto: Mais do que as tribos africanas, nós, "tugas, estávamos e continuamos divididos quanto ao objectivo da guerra do ultramar

Foi muito mau para Portugal ter que fazer esta guerra que aqui mantemos viva na nossa memória. Mas pior ainda terá sido para os povos africanos porque, para eles, a seguir à guerra não veio a paz imediatamente.

Analisando, como nós fazemos aqui constantemente, o que se passou há tantos anos, ainda em Portugal a maioria está dividida quanto às razões e motivações daquela guerra.

Uns dizem que Portugal (Salazar) devia ter preparado a independência ou ter negociado com os movimentos.

E para a maioria ainda hoje pensam e dizem que "aquilo" não era nosso, tínhamos é que nem ter lá ido, ou seja,  "aquilo" nunca lhes disse nada.

Lutar por patriotismo seria a posição de uma minoria, e pouca gente terá na memória qualquer tipo de discurso de Generais ou Coronéis a puxar pelo sentimento pátrio.

Uma maioria relativa era contra a guerra simplesmente por ser contra o Salazar e dizia que a guerra era para defender os interesses dos ricos.

Ou seja, para a maioria do povo português, nada no Ultramar justificava o sacrifício daquela guerra, uns por política, outros por total desconhecimento e desinteresse.

Alguns,  com mais experiência e conhecimento de África, como sejam aqueles que depois foram os  chamados retornados, também tinham ideias muito dispares.

Para muitos, Salazar não deixava explorar à vontade as riquezas naturais, e fazia-se referência quase obrigatória à exploração do ouro da África do Sul, como se fosse um bom exemplo de exploração. E muitos destes chegavam mesmo a pensar que apenas interessava defendermos Angola e o resto, principalmente a Guiné, devia ser entregue aos movimentos independentistas.

E havia, entre retornados mais antigos, quem simplesmente pensava numa independência para todos e que no caso de Angola pensava que seria fácil e natural, pensamento idêntico ao de alguns, dirigentes brancos e mestiços dos movimentos.

Os retornados mais modernos,  pouquíssimo politizados em maioria (como eu e velhos régulos e sobas), pensavam calmamente que, enquanto a tropa e os turras se "entretinham" mutuamente, e enquanto os brancos da Rodésia e África do Sul se aguentassem, estava tudo sobre controle.

Todavia, se com 20 anos havia uma opinião na cabeça de cada um de nós, com influências de quem governava, mas também de quem era "contra" quem nos governava, (dizia-se que tinha sido mais votado Delgado do que Tomáz, 3 anos apenas antes da guerra), porque é que não está ainda explicada a tão longa duração da Guerra do Ultramar pela nossa parte, esta desorganização de país organizado?

Não esquecer que Salazar, para muitos a causa da guerra, caíu da cadeira quase a meio da guerra de 13 anos... Porque  é que [a morte política de Salazar] não parou imediatamente a guerra?

Vai ser difícil e levará muitos anos a escrever a história definitiva e em que haja o mínimo de consenso entre uma maioria de portugueses, sobre a lógica ou falta dela para Portugal insistir em negar aquelas independências, quando França, Inglaterra e Bélgica e Espanha, já tinham concordado com as mesmas.

É que tudo corre tão estranhamente com África e que se reflecte tão directamente com os países do sul europeu, com barcos e aviões de socorro a náufragos ao largo das Canárias e Cabo Verde e de Lampedusa, que nada ajuda a compreender e justificar a colonização e respectiva descolonização que se processou há 50 anos para cá. 

E uma das provas de que facilmente nos deixamos dividir quanto a África, foi a facilidade com que, recentemente, fomos enrolados, desde jornalistas, políticos, empresários, etc., por dois ou três angolanos.

Vai demorar muitos anos a contar uma história consensual, mas aqui  [, no blogue,] devemos continuar divididos, embora respeitando as ideias de cada um, pois até nem somos políticos.

Cumprimentos
António Rosinha
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Nota do editor:

6 comentários:

Anónimo disse...

Olá Camarada
Passados estes anos continuamos a não entender um fenómeno sociológico que se passou no nosso país e que teria de se passar à semelhança de outros que já havia ocorrido no mundo e em África, em particular. Ainda hoje não nos interrogamos com profundidade e rigor científico sobre a independência do Brasil...
É uma forma de pudor? Talvez...
Mas uma certa frieza na apreciação do sucedido não nos faria mal e seria um acto de coragem.
Um Ab.
António J. P. Costa

Luís Graça disse...

Rosinha, estás connosco deste novembro de 2006 (*), e pelo que percebo minimamente confortável, à sombra do poilão da nossa Tasbanca Grande, uma vez quebradas as tuas primeiras "resistências"...

Este é (ou procura ser) um espaço, plural, aberto, franco, leal, afetivo, onde a tua longa experiência e a tua rica vivência de África podem vir (e têm vindo) ao de cima, sobretudo em originais e pertinentes comentários, pontos de vista, achegas...

Pela nossa diferença de idades (que deve de ser menos de 10 anos), calculo que tenhas nascido entre 1937 e 1939... Eu sou de 1947, tinha 14 quando tu eras furriel mil...

Vais para Angola ainda adolescente, no início dos anos 50... És apanhado pela guerra em 1961... Regressas à tua terra (que te é já estranha) em 1974... "Retornado", foi o labéu que alguns te puseram na testa...

O apelo de África leva-te à Guiné, em 1979, donde regressas em 1993, com uma experiência profissional e humana que podia e devia ser passada para o papel,,, (neste caso, para o computador)...

Rosinha, depois do desafio que te fiz para entrar para este blogue, em 2006, faço-te um outro, 7 anos depois: o de organizares e escreveres as tuas memórias, desde Angola...

Fazia-te bem, a ti e a nós. E talento para a escrita não te falta...Sempre foste um atento e arguto observador, mas também viveste! E se viveste!...

A tua história de vida em África pode dar origem uma pequena série (pelo menos 6 postes...). E mais tarde a um livrinho... Temos a obrigação de escrever, para que amnhã não venham outros "aldrabar" a nossa história de vida...

Um abraço fraterno. Luis
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(*) QUARTA-FEIRA, 29 DE NOVEMBRO DE 2006
Guiné 63/74 - P1327: Tabanca Grande (3): António Rosinha, ex-Fur Mi em Angola, em 1961; topógrafo da TECNIL, em Bissau, em 1979


http://blogueforanadaevaotres.blogspot.pt/2006/11/guin-6374-p1327-blogoterapia-7-furriel.html

Tony Borie disse...

Olá Antonio Rosinha.
Descreves tudo, como uma simplicidade deslumbrante, em meia dúzia de linhas, o que ainda hoje, segundo entendo é voz corrente.
Eu, já não vivia aí, no nosso Portugal, em 1974, mas aqui ou ali, nos jornais, que nos chegavam aos nossos clubes de Portugueses, na rádio, depois na televisão fui ouvindo quase tudo o que tão bem explicas, mas o fundo da verdade, nunca iremos saber, talvez os nossos netos ou bisnetos, e como o Luis diz, tu deves ter uma grande "Aventura de Ultramar", pela minha parte, gostava de a ler.
Gostei de te ver dentro da farda "amarela", com aquelas "polainas" por cima das botas!
Olha, hoje dia 11 de Novembro, aqui onde vivo, é "feriado", comemoram o "Veterans Day", dizem que às 11 horas, do dia 11, do mês 11, no longínquo ano de 1918, foi o dia em cessaram temporariamente as hostilidades, entre as Nações Aliadas e os Germânicos, e pensavam que essa data iria ser o FIM, da Primeira Guerra Mundial, a que também chamaram de "The Great War", e que naquela altura diziam que era "the war to end all wars", ou seja mais ou menos isto, "esta guerra era o fim de todas as guerras", o que afinal não foi!.
O mundo irá continuar com conflitos, nós normais pessoas nunca saberemos a verdadeira causa, mas olha, nós combatentes do ultramar, também vivemos o nosso conflito, portanto este dia de hoje, também é em nosso nome.
Bem hajam, todos antigos combatentes!.
Um abraço para ti Antonio Rosinha, companheiro combatente, colono, emigrante, e mais não me lembro do que costumas dizer que gostas que te chamem!
Tony Borie.

Anónimo disse...

Caro "colon" Rosinha

Era uma vez um "botas" tacanho e provinciano,dizem que tinha jeito para os números,vulgo finanças,estabilizou as contas públicas à custa da miséria do "zé povinho"..qualquer semelhança com a actualidade é pura realidade.

Lutou contra a história à custa de todos nós..
Após os "massacres" do norte de Angola..perpetrados pela UPA com o apoio dos "states" cujo o presidente era JFK.. dizem que soube que isso ia acontecer, mas nada fez,depois, só depois.. "para Angola e em força" despertou em todos nós aquele sentimento de patriotismo q.b.

Era proibido emigrar.. e imigrar para os territórios ultramarinos, só com carta de chamada...

Portugal uno e indivisível do Minho a Timor..pois então..pelo meio existia Angola, terra rica sim senhor..ora não se podia ficar ou tentar ficar só com Angola,onde é que estava a coerência..

Nos "entretantos" aproveitou-se a "guerra fria" ..qualquer das partes queria aquilo ..éramos a defesa da civilização ocidental.. pois então..

Até que implodimos..no 25A..lixou-se o "mexilhão"..como sempre..na altura os "ditos retornados" (detesto o termo) e o zé povinho..guerras civis..coiso e tal..
Os "marxistas-leninistas"..passaram a capitalistas.."selvagens"..

Hoje as elites vivem "empanturradas" em milhões de dólares..os "chinocas" tomaram conta do continente africano..os "américas e afins da plataforma continental..alguns "empresários" "tugas" são coniventes..e mais não digo..

Aqui tens meu caro "colon" Rosinha a minha visão da coisa.

Ah...o "mexilhão" continua a levar nas trombas..porque o mar continua a bater na rocha.

Um alfa bravo

C.Martins

admor disse...

Nas lutas de grandes interesses os pequeninos ficam sempre de fora.

Foi ontem, é hoje, será amanhã.

No meio disto tudo o mais inteligente ainda foi o José Bento Ferreira o político que queria vender tudo excepto Angola e S. Tomé e Príncipe.

No resto também é sempre o mesmo circo e o povo é que o paga.

Quanto ao Brasil foi uma guloseima que um nosso rei nos tirou há tantos anos que nos nossos dias já não nos fez diferença nenhuma, como será o que nós andamos hoje a debater em relação aos nossos bisnetos.

Se nós tivessemos seguido a política do Infante D. Pedro em vez da do Infante D. Henrique não teríamos mais ganhos e menos fama.

Enfim se entrarmos pelos ses....

No final das contas o povo é que está sempre mal. Foi com a Monarquia, foi com a Républica, foi com a Ditadura é com a Democracia.

Um grande abraço para todos.

Adriano Moreira

Anónimo disse...

Caro Admor,
Referes que o povo sempre se danou, tanto com a monarquia, como com a república, a ditadura,e a democracia. Ora, neste último período é que a porca torce o rabo.
Quero dizer: nós não vivemos em democracia!
A canalha governante é que se perpetua estribada em eleições de quase nula ligação aos eleitores.
O que acontece, apesar de não sermos um povo praticante da cidadania activa, em número razoável ainda sabemos distinguir as características ideológicas dominantes (socialismo e social-democracia), pelo que os governos subvertem as suas práticas oligárquicas con discursos de argumentação mentirosa, e as coisas vão pegando, porque vão acontecendo, não acontecem de súbito. Repara: estão muito preocupados com a sustentabilidade da S. Social, mas foram eles que introduziram os "recibos-verdes"(de inicio afectavam centenas, hoje afectam milhões), uma condição que desprotege os trabalhadores (falta de vínculos), e torna a mão-de-obra muito mais barata, desde logo porque os patrões deixam de pagar 23,5% dos salários a título de encargos sociais. Então, ao longo do tempo ninguém viu que a projacção do valor das reformas, a prazo, seria afectado? Viram, claro, mas uma regra de ouro entre os poderosos, é protegerem-se entre si. Portanto, os partidos entendem-se muito bem, esmiufram o erário público, estão bem e recomendam-se. Só não perecebo, por que raio o "arco" está a perder as estribeiras, a armar barracas quotidianas, sem vergonha e sem soluções, apesar de sabermos que as barracas de hoje, fazem esquecer as de ontem.
Noutros locais mais oportunos já tenho falado de soluções, coisa inadequada para aqui. Mas democracia, não!
Sobre o texto do Rosinha, quero dar-lhe estímulo para continuar, no sentido de nos relatar outras facetas da experiência "colon" que possam retratar as relações entre portugueses - brancos de 1ª e de 2ª, mulatos e pretos, assim como sobre os modelos de negócio, os papéis dos institutos, e a importância das grandes companhias, essas sim, de carácter colonial. E porque não? sobre a evolução dos sentires das populações residentes, e do boom económico.
Abraços fraternos
JD