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domingo, 1 de junho de 2025

Guiné 61/74 - P26871: Recordações de um furriel miliciano amanuense (Chefia dos Serviços de Intendência, QG/CTIG, Bissau, 1973/74) (Carlos Filipe Gonçalves, Mindelo) - Parte VI: o pesadelo do tenente-coronel: as batatas e o frango congelado!...



Foto nº 1


Foto nº 2


Foto nº 3

Fotos > Legendas > 

Foto nº 1 >   Quartel de transmissões, em Santa Luzia, Bissau, com edifícios no estilo da ChefInt e outros do QG/CTIG;  

Foto nº 2 > Viaturas Berliet e Unimog utilizadas nas colunas de reabastecimento ao interior; 

Foto nº 3 > LDG (Lancha de Desembarque Grande),  utilizada nos reabastecimentos ( esta é a no. 101)


(Cortesia do Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné)


1. Continuação de "Recordações de um Furriel Miliciano, Guiné 1973/74":



O Carlos Filipe Gonçalves, Kalu Nhô Roque (como consta na sua página no facebook):

(i) nasceu em 1950, no Mindelo, ilha de São Vicente, Cabo Verde; 

(ii) foi fur mil amanuense, ChefInt, QG/CTIG, Bissau, 1973/74; 

(iii) ficou em Bissau até 1975; 

(iv) radialista, jornalista, historiógrafo da música da sua terra, escritor, vive na Praia;

(v) membro da nossa Tabanca Grande desde 14 de maio de 2019, nº 790; 

(vi) tem 2 dezenas e meia de referências no nosso blogue.(*)


Recordações de um furriel miliciano amanuense (Chefia dos Serviços de Intendência, QG/CTIG, Bissau, 1973/74) (Carlos Filipe Gonçalves, Mindelo) (*)

Parte VI:  o pesadelo do tenente-coronel: as batatas e o frango congelado!...



Depois da minha chegada, tive de me adaptar ao calor intenso, descobri a cidade Bissau, conheci muita gente. 

Hoje descrevo: o trabalho, a rotina no dia-a-dia, o ambiente de guerra que se vivia na calma aparente de Bissau

O tempo passa e paira sobre nós o ultimato do tenente-coronel, para esvaziar as prateleiras dos mais de mil “autos de víveres e artigos de cantina” que estavam ali numa estante. Por isso, tenho de aprender depressa e logo iniciar o trabalho de minutar a análise e propostas de decisão.

O alferes vai-me ajudando a escrever a respectiva “informação” para despacho superior. O colega furriel veterano também me ajuda, dá-me uns toques e assim vou aprendendo a linguagem jurídica; mas o que considero um trabalho de aprendizagem, foi logo submetido ao chefe, sem que eu ainda tivesse a necessária experiência. Não tarda, o tenente-coronel chama-me ao gabinete para me admoestar: “Então, nosso furriel? Como é que é?” E blá blá blá… etc.

O alferes lá me desculpava, assumia os erros… e assim fui apanhando traquejo e experiência.

Neste ambiente de guerra e mortes, a tropa no mato, tem quase tudo do bom, para manter o moral e boa disposição! As cantinas disponibilizam boas bebidas, desde whiskies (de qualidade) a licores Glayva, Tríplice, aguardente velha, etc., vinhos engarrafados (do melhor), muita cerveja, os mais diversos artigos de toilete, etc. etc. E são enviados os mais variados produtos para a confecção da alimentação diária. 

A quebra, destruição deste «stock» devido à manipulação aquando do embarque e descarga e transporte, bombardeamentos, etc. dá origem aos autos que são enviados para apreciação na «Secção de Autos» onde trabalho…


A CHEFINT resolve ainda autos de fardamento, controla os consumos de víveres, fiscaliza a contabilidade das unidades, enfim tudo e mais alguma coisa. Manuel Amante, um velho amigo e colega do liceu que foi colocado no final de 1973 na Chefia da Intendência, explica:

“Nós fornecíamos material e equipamentos e tudo… aliás a Manutenção Militar estava sob a coordenação ou orientação da… Chefint – Chefia da Intendência) e eu fui colocado na secção que… vá lá, digamos, a «secção funerária», onde nós é que geríamos os caixões, portanto, eu fui chefe dessa pequena secção onde nós geríamos os caixões de chumbo, de madeira, de zinco, consoante a naturalidade de quem tivesse morrido, assim se distribuía.

 Portanto, eu, mais ou menos nessa altura, eu tinha uma ideia de como é que eram as operações. Apesar dos quartéis terem um stock de caixões, quando faltavam, eles requeriam e nós dispensávamos isso."


Com o passar dos dias sinto-me integrado na secção d
e autos de víveres, onde o ambiente é de conversa e conhecimento mútuo. Os três civis, colegas de serviço são: o Demba Baldé, que tem uma cara horrível, toda desfeita por queimaduras…, é ele quem trata do arquivo; há um vivaço chamado, Issa Baldé que é o dactilógrafo; o Claudino, trata de expedientes administrativos, é um homem na casa dos 30 anos, de pele clara, tem um bigodaço, parece ser cabo-verdiano.

O alferes comenta a brincar: 

“Olha, na Guiné são todos: Mané, Baldé, Turé… Camará, Embaló, Djaló, Dabó… Eu confundo sempre os nomes!”

Apesar de muitos terem apelidos homónimos, não são, nem familiares, nem parentes. Há mais civis nas outras secções, a maioria guineenses, mas também há descendentes de cabo-verdianos.

O Demba ao me ver sair várias vezes para ir beber e voltar todo molhado em suor – acho que sentia pena de mim – certo dia ao me ver assim, não resistiu e disse: 

“Oh! Gonçalves, assim não vais poder aguentar a comissão! Tens de te adaptar ao calor! Toma lá, põe na boca, um pedacinho chega!"

Estendeu a mão com algo e diz:

"Vai ajudar-te a controlar a sede!”

Perguntei o que é isso, ele responde:

“Noz de cola! Põe isso num canto da boca!”

Desconfiado, tomei o pedacinho daquele fruto verde por fora, branco por dentro, a textura parecia a de um pedaço de tâmara meio verde, mas não meti na boca. Aceitei a oferta por cortesia. Demba também não comentou a minha atitude. Passados uns dias, vendo a minha aflição, Demba voltou a alertar-me:

“Põe o pedacinho de cola na boca e a sede vai acabar!”

Assim fiz, senti então uma sensação de frescura na boca e na cara, a saliva aumentou… Agora o meu problema é: ir frequentemente cuspir na casa de banho! Passadas umas semanas, comecei a adaptar-me ao calor intenso da Guiné, já nem utilizava a noz de cola, bebia normalmente.

Demba Baldé é muçulmano, reza todos dias às 11 da manhã e à tarde às 17 horas; ele levanta-se, vai a um canto, estende um pequeno tapete no chão e faz as suas orações. 

Demba, notou o meu espanto por ele estar muitas vezes a rezar com um rosário nas mãos enquanto trabalhava; por isso ele tomou a iniciativa de me explicar os preceitos da fé muçulmana, um mundo que eu desconhecia: no Ramadão, tinham de rezar todo o dia e fazer jejum, só comiam à noite; quem pode frequentar a mesquita; peregrinação a Meca, quem lá foi, passa a ter título de «El Haaj», ou “Aladje”; e isso e aquilo… etc. e tal.

Curioso, perguntei apontando, o que era aquele rosário que ele tinha nas mãos? Fez-se de desentendido, não insisti. Prosseguiu explicando que nomes da Bíblia que se diz, serem cristãos, vêm do árabe: Abraão é Ibrahim, José vem de Youssef, etc. 

Quanto ao rosário, a explicação veio pelo Issa Baldé: chama-se “tashby”. O Issa diz que também é «Fula», explica que o seu nome significa «Jesus» em árabe, aliás fez questão de sublinhar, «Issa» é que é o verdadeiro nome de Jesus! 

Mas, este nosso dactilógrafo, embora muçulmano, não era praticante, fumava muito e dava-se muito bem com o Claudino,  outro grande fumador,  gozava com o Demba, quando ele me contava estas estórias de religião ou da etnia «Fula».

Demba também me explicou que é da etnia «Fula» com orgulho diz: 

“Nós somos diferentes das outras etnias da Guiné porque sabemos ler e escrever, temos o nosso próprio alfabeto!"

O ex-militar Manuel Dinis, comentou anos mais tarde: 

"Os fulas, ardentes propagandistas do islão, propagavam a escolaridade em árabe. A população manifestava-se algo colaborante, mas assumia uma posição neutra em relação ao IN (inimigo) de maneira a, agradando a uns, não desagradar aos outros.”

Comecei então a ter uma outra noção da Guiné e da sua diversidade. Ao mesmo tempo tentava descobrir alguma ligação minha, com esta terra e com a sua gente. Minha mãe, dizia sempre que a avó dela, era da Guiné, que era filha de um régulo «Fula»! Ou era «Papel»? 

Bem, não importa… Desde pequeno que ouvia contar que a minha bisavó tinha sido levada da Guiné para Cabo Verde pelo meu bisavô, um «badio» branco, filho de metropolitano,  natural de Vilar de Mouros, norte de Portugal,  que se casou com uma branca da Ilha do Fogo (ela foi sepultada no cemitério da Praia em 1700 e tal… e lá estão outros membros da família “Abreu Rodrigues Fernandes”),

Mamã contou-me, naquela época, foi um escândalo na cidade da Praia, quando o director da alfândega (o meu bisavô),  branco loiro, olhos azuis, apareceu amantizado com uma preta da Guiné, onde esteve destacado em serviço. 

Mamã dizia que ela cozinhava aquelas comidas da Guiné e contava aquelas «estórias» fantásticas do mato e animais selvagens… Explicou: foi vovô (meu bisavô) quem a ensinou a ler e escrever, ter boas maneiras, comprava-lhe roupas caras! Viveram felizes até quando já velhinhos a morte os separou.

Mas, nunca contei esta minha história ao pessoal da repartição de autos, nem a qualquer outra pessoa em Bissau! Conto hoje, pela primeira com a devida vénia e orgulho…

Enquanto se trabalhava no duro para limpar as prateleiras, daqueles mais de mil autos e outras tantas dezenas que iam entrando todos os meses, falávamos uns com os outros e havia muita camaradagem, mas com o devido respeito pela hierarquia e funções de cada um. 

O alferes era quem brincava muito e gozava com as coisas mais simples, era uma forma de se manter moral alto e passarmos o tempo menos angustiados. Porque, não podíamos fugir dos acontecimentos do dia-a-dia, sempre sangrentos, que nos chegavam, ora sob a forma de «relatos» comentados à boca fechada, ou nos relatórios que acompanhavam alguns autos, como justificativa de ataques e flagelações…

Havia também informações que chegavam através da ERG (Emissor Regional da Guiné) nos programas «Guiné Melhor» entre as 19 e 20 horas. Em crioulo, português e línguas nativas, apresentava-se a visão oficial dos acontecimentos no teatro de operações (TO). Muitas vezes havia relatos de militares ou de outras pessoas sobre os ataques a colunas de transporte, emboscadas, etc. seguidos de comentários por gente da emissora.

De passagem por Bissau, vinham do mato muitos militares, uns a caminho de férias na metrópole, outros por evacuação médica, outros simplesmente enviados, para uns dias de folga para descansar, porque já estavam «marados» e tinham comportamentos estranhos… 

Toda esta malta trazia novidades, tinha «estórias» para contar, que esclareciam muitos boatos que circulavam… No fundo não eram boatos, mas sim notícias truncadas ou distorcidas de acontecimentos reais. A malta da companhia de transportes estava muito perto de nós, num quartel ao lado do QG. Quando voltavam das missões de reabastecimento contavam as ocorrências.

Recorde-se, Bissau está cercada por um campo de minas, por arame farpado e pela guerra! Não se pode ir a nenhum lugar no interior porque é perigoso! Nhacra, uma localidade muito próxima, é atacada com uma certa regularidade. 

Eu consegui ir uma vez a um pouco mais perto, a Safim… foi em maio de 1973, fui comer umas ostras frescas, mas era perigoso. Havia lá um restaurante, fui logo apresentado ao dono e à esposa, ambos com um excesso de peso que salta à vista, mas são muito simpáticos, sabem receber os fregueses. Decorreu, então, um agradável petiscar de ostras, claro, muita conversa, nem me passou pela cabeça a guerra, ou qualquer perigo, que estava ali perto.

A circulação pelo território da Guiné nesta altura só é feita através de colunas militares e pelas LDG (as lanchas militares de desembarque  grandes) também usadas nas operações de reabastecimento; os barcos civis muitas vezes são escoltados. Os meios aéreos destinam-se às operações militares, algumas vezes fazem operações urgentes de reabastecimento... lançamentos de víveres em paraquedas, caso do frango congelado e rações de combate.

Nos relatórios «confidenciais» que acompanhavam os autos e passavam pelas minhas mãos, vinham muitas vezes descrições dos ataques e a lista dos danos causados, claro, a mim só interessava a lista dos artigos de cantina destruídos: tantas centenas/caixas de garrafas de cerveja partidas, tantos disto e daquilo… destruído, molhado, etc. 

Impressionava-me a menção final da quantidade de munições utilizadas na resposta ao IN: disparados tantos mil cartuchos de tantos milímetros, lançadas tantas granadas, etc. etc.


O termo "svenska schack", em sueco,   quer dizer  "xadrez sueco": lê-se no tabuleiro em cima da mesa... Presume-se que tinha sido uma oferta ao PAIGC, pelo Estado Sueco ou por uma associação sueca que apoiava a causa do partido de Amílcar Cabral...  A foto deve ser c. início dos anos 70. Em primeiro plano, uns óculos de sol e a ponta de uma arma (talvez uma Kalash) (Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné)


Casa Comum | Instituição:Fundação Mário Soares e Maria Barroso | Pasta: 05222.000.141 | Título: Júlio de Carvalho, Tchifon, Cláudio Duarte e Valdemar Lopes | Assunto: Os combatentes caboverdianos Júlio de Carvalho [Julinho], Tchifon, Cláudio Duarte e Valdemar Lopes [da Silva] jogando xadrez numa base do PAIGC | Data: 1963 - 1973 | Observações: Valdemar Lopes da Silva foi professor no Centro de Instrução Política e Militar (CIPM) do PAIGC, a partir de 1970 | Fundo: DAC - Documentos Amílcar Cabral | Tipo Documental: Fotografias


Citação:
(1963-1973), "Júlio de Carvalho, Tchifon, Cláudio Duarte e Valdemar Lopes", Fundação Mário Soares / DAC - Documentos Amílcar Cabral, Disponível HTTP: http://hdl.handle.net/11002/fms_dc_43496 (2025-5-31)

(Reproduzido com a devida vénia...)



Um dia chamou-me a atenção num desses relatórios a alusão a um tal «JJ» que era descrito como um cabo-verdiano que andava por aí com um bigrupo do PAIGC cujos ataques, dizia-se, eram destemidos e implacáveis. Parecia uma desculpa para tanta destruição descrita! Outra vez, vi uma referência a um tal «Chifon» que juntamente com o «JJ» fizeram um grande ataque, houve dificuldades na resposta ao IN. 

[ Nota do editor LG: Esse JJ seria o Júlio de Carvalho, "Julinho" ? Ou o Jaime Mota, morto em Canquelifá, em 7 de janeiro de 1974 ? Ou ainda o Joaquim Pedro Silva, "Baró" ?.Ou, mais provavelmente, o João José Lopes da Silva ?... Por outro lado, no Arquivo Amílcar Cabral, há uma foto, que reproduzimos acima em que aparece o "Tchifon", seguramente nome de guerra, a observar uma partida de xadrez.]

Dizia-se claramente naqueles relatórios que os cabo-verdianos e cubanos é que eram culpados ou lideravam ataques tão violentos, isso parecia uma justificação. Lia essas informações, mas nunca comentei com ninguém. Documentos classificados é ler e esquecer. 

Algum tempo depois, pelos autos que íamos resolvendo daquela pilha dos mil e dos outros tantos, que iam chegando, saltava à vista: a «batata» era o grande e maior problema na logística. Devido ao clima, apodreciam toneladas de batata, que constituíam perdas enormes! A tropa gostava de batata e era reticente no consumo de feijões e massas, que requisitavam, mas iam comendo aos poucos, logo, muitas vezes, acabavam por exceder o prazo, apodreciam, constituindo mais perdas e claro, dando origem a autos…

O tenente-coronel andava preocupado, por isso me solicitou um gráfico sobre perdas de batata por meses desde o ano anterior. Para evitar o apodrecer de toneladas e toneladas de batata, até tinham sido instalados aparelhos de ar condicionado em muitos armazéns!

Depois da batata, o pesadelo do tenente-coronel era o frango congelado. É que o pessoal no mato não cumpria as regras de descongelamento estipuladas nas NEP, logo, quilos e mais quilos de frango ficavam impróprios para o consumo… O calor encarregava-se do resto… eram elaborados autos e mais autos… cuja decisão era quase sempre: a pagar pelo pessoal responsável!

(Revisão / fixação de texto, negritos: LG)

____________________

Notas do editor:

(*) Último poste da série > 27 de maio de 2025 > Guiné 61/74 - P26853: Recordações de um furriel miliciano amanuense (Chefia dos Serviços de Intendência, QG/CTIG, Bissau, 1973/74) (Carlos Filipe Gonçalves, Mindelo) - Parte V: aqui sinto-me em casa, encontro tias, primos, vizinhos, colegas de escola e do liceu...

(**) Vd. poste de de 31 de dezembro de 2022 > Guiné 61/74 - P23935: Antologia (88): Cabo Verde: história das suas forças armadas, constituídas a partir de um núcleo de antigos combatentes do PAIGC (excertos de artigo de Pedro dos Reis Brito, "Revista Militar", n.º 2461/2462, de fev / mar 2007)

16 comentários:

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Kalu, tens aqui observações interessantes, de um militar, como tu, que via a guerra a partir de Santa Luzia, Bissau... No meu tempo (1969/71), a malta ia Nhacra, mas tu dizes que já era perigoso, em maio de 73 (só arriscavas ir a Safim, para comer ostras)... Mas Nhacra tinha tropa e o posto emissor da ERG... (Sim, as instalações da ERG chegaram a ser flageladas, o que é diferente de serem atacadas.)

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Quanto aos géneros alimentícios que se estragavam ou deterioravam com facilidade (batata, frango congelado, etc.), gostava de ouvir os nossos vagomestres...

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Carlos, pela foto do Arquivo Amílcar Cabral, que publico, vê se descobres quem era, na realidade, o "Tchifon"... E o JJ ?... Tens alguma pista ?... A guerra acabou há muito, há perguntas que não devem ficar sem resposta... Mas, acabo de ler numa parede, grafitada, uma grande verdade: "Quando a gente acha que tem todas as respostas, vem a vida e muda todas perguntas"...

Antº Rosinha disse...

O Carlos é um dos três ou quatro (?) caboverdeanos que aparece neste blog tão apelativo para quem tenha passado pela guerra do Ultramar, principalmente pela Guiné, mas não só.

É que serão historiadores caboverdeanos que um dia deixarão à maneira deles, a mais completa história desta guerra e e da colonização portuguesa em África em geral.

É que os caboverdeanos estiveram em todos campos da guerra e da colonização.

Eram os caboverdeanos que estavam espalhados por todas as colónias integrados desde a administração colonial, na tropa, na restauração, no desporto, e na guerra 1961-1974, assistiram do princípio ao fim.

E se não aparece mais gente a escrever sobre o assunto, não se podem desculpar com analfabetismo, porque foi naquelas ilhas que mais rápido efeito teve a campanha contra o analfabetismo em todo o território português.

E havia uma actividade colonial em que muitíssimos tiveram uma visão privilegiada, eram eles que compunham grande parte das tripulações dos navios da CUF que faziam as viagens com mercadorias desde o Porto da Beira em Moçambique, Lourenço Marque, Cabo, portos de Angola, Bissau, São Tomé, Caboverde, Metrópole, Vigo e iam até Roterdão, Amsterdão e Hamburgo.

E muitos ficavam por essas terras, mas sempre em contacto uns com os outros, (em crioulo).

Vão ser os caboverdeanos a escrever um dia a "nossa, deles" história africana, mas só quando eles se desinibirem.

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Kalu, o JJ é o João José Lopes da Silva (1947-2015)... Era do Fogo, morreu na Praia...Vê se sabes algo mais sobre a atividade dele na guerrilha, na Guiné...

https://www.barrosbrito.com/19665.html

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Já pedi ao Aníbal José da Silva, Fur Mil Vagomestre da CCAV 2483/BCAV 2867, Nova Sintar e Tite, 1969/70) , para comentar este poste:

(...) Aníbal: nunca nenhum vagomestre, como tu, veio até aqui descrever e explicar os problemas da sua função nos quartéis do mato... Muito tenho aprendido contigo. Ainda não tive tempo de me debruçar sobre os balancetes da gestão da cantina de Nova Sintra, que me mandaste e que são uma preciosidade para se conhecer melhor o consumo, a tipologia e os preços dos artigos...

Há outra coisa de que sabemos pouco: os autos mandados instaurar por perda e deterioração de géneros alimentícios (batata, frango congelado, etc.). Bem como as vossas relações com a Intendência...

Dá uma vista de olhos a este relato do Carlos Filipe Gonçalves que, sendo dos serviços auxiliares, foi colocado como fur mil amanuense na ChefInt (Chefia de Intendência) do QG/CTIG, em Santa Luzia.. Aparentemente, era uma "tropa porreira", mas lidar com centenas e centenas de autos devia dar cabo da mona a qualquer artista.

Tens toda a autoridade para comentar e acrescentar o que bem entenderes sobre este assunto. De resto, tratavas estas coisas diretamente com o teu capitão e com o teu 1º...Agradeço o teu contributo...Podes responder por email... Um abração, Luis

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Rosinha, agradeço o teu contributo...Tens mantido a ponte do diálogo com os nossos amigos e camaradas de Cabo Verde...Concordo que podiam ser mais... Mas compreendo que há (ou pode haver) ainda algumas barreiras...Ao fim destes anos todos, o Kalu é o primeiro a vir aqui partilhar as suas memórias da guerra da Guiné... O primeiro não, o segundo ou o terceiro, depois do António Medina (1939-2025) e do Manuel Amante da Rosa... (Cito de cor, pode haver mais...).

O Kalu tem todo o meu apreço e gratidão...A guerra tem de ser vista, da terra, do ar, do mar...e também de Bissau, e também de Cabo Verde, e também do Terrreiro do Paço, e até de Conacri e de Havana... Com a malta de Cabo Verde é mais fácil a gente entender-se...A Tabanca Grande não tem portas nem janelas, nem arame farpado, nem cavalos de frisa, bunkers, valas, espaldões... De qualquer modo, se não foram os antigos combatentes a deixar os seus testemunhos escritos (em papel ou formato digital), não tenho dúvidas que a narrativa dos historiadores será sempre mais pobre, e corre até o risco de ser enviesada... A nossa Tabanca Grande vai cumprindo, modestamente, o seu papel... que é pôr a malta a partilhar as suas memórias...

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Queria dizer: "temos mantido a ponte do diálogo"...

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Também não faço a mínima ideia (,mas gostava de saber..:) quantos foram os combatentes, de um lado e do outro, que passaram pela Guiné... Conhecemos uma mão cheia de gente que lutou no lado do PAIGC, mas a grande maioria dos jovens fez o serviço militar obrigatório, como o Kalu e o Medina (e o Manuel Amante, que, creio, nasceu na Guiné, de pai cabo-verdiano, tal como o Amílcar Cabral) e não tinha, como nós, grande escapatória...

E sabemos que, de um lado e do outro, houve bons combatentes...

paulo santiago disse...

Luís,a minha memória tem brancas.Não consigo lembrar-me do nome do filho do Inácio Soares de Carvalho,um dos primeiros membros do PAIGC. Há meia dúzia de anos,o filho daquele antigo guerrilheiro escreveu para o Blogue a pedir autorização para a publicação de uma foto minha tirada em Bambadinca. O livro,"Memórias da Luta Clandestina" de Inácio Soares de Carvalho,foi-me oferecido,editado em CV,e na pág 141 vem a tal foto com crédito fotográfico a Paulo Santiago e Luís Graça & Camaradas da Guiné

paulo santiago disse...

Penso que o Carlos Filipe Gonçalves conhece o filho do Inácio Soares de Carvalho

Anónimo disse...

1. Mensagem que o nosso editor LG enviou ontem ao Zé Belo

Como vais, José ?...

Olha, gostava que pudesses comentar, com tempo, vagar e pachorra , as fotos que junto em anexo (2), e que publiquei neste poste... Há uma caixa de um tabuleiro de xadrez que deve ter sido oferta sueca ao PAIGC...O xadrez era só para alguns daqueles homens... (na foto, todos cabo-verdianos)... Ab, Luis


2. Resposta imediata do nosso querido camarada (e)terno régulo da Tabanca da Lapónia de Um Homem Só:

Data - domingo, 1 jun 2025, 23:02
Assunto - Barreira Cultural ?

Caro Luis

A caixa da fotografia é de facto uma caixa de xadrez de marca muito conhecida na Suécia.

Eram muitos,e diversos,os fornecimentos efectuados pela Suécia ao PAIGC.

Curiosamente ,em talvez milhares de fotografias dos Camaradas da Guiné por nós observadas,não existe uma única com um tabuleiro de xadrez.

Matraquilhos,poker de dados,damas ,lerpa,e talvez uma pseudo sofisticada partida de bridge no Clube Militar de Santa Luzia em Bissau ou … em resguardados Comandos de Batalhão .

Mas xadrez?

Ficaria para os “turras”?

Abraço do J.Belo

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Zé Belo, boa pergunta, melhor observação... "Fronteira cultural ?"...Eu sei que o xadrez era cultivado na Suécia com grande entusiasmo ...Na guerra, nos sítios por onde passei, não me lembro de facto de ver um tabuleiro de xadrez... Mas isso não faz ciência...O mais vulgar eram os jogos de cartas, a lerpa, a sueca, o king, talvez o bridge... Nunca gostei de jogar cartas... Alegava sempre que era daltónico, não sabia distinguir as copas das espadas...Também não me lembro de ver tabuleiros de damas nos nossos quartéis... (O meu pai, que era um excelente jogador de damas, aprendei em Cabo Verde, quando lá "expedicionário", em 1941/43)...O Movimento Nacional Feminino podia oferecer... Se calhar nunca ninguém pediu à Cilinha...

2. Perguntei a um assistente de IA: "Porque é que não se jogava xadrez em Portugal antes do 25 de Abril ?"

Resposta do Gemini IA / Google:

A afirmação de que "não se jogava xadrez em Portugal antes do 25 de Abril" é incorreta. O xadrez era praticado em Portugal muito antes do 25 de Abril de 1974, e a sua história no país é bastante antiga.

Alguns pontos importantes a considerar:

Clubes e Competições: Já existiam clubes e associações dedicadas ao xadrez antes de 1974. Por exemplo, o Sporting Clube de Portugal tinha uma secção de xadrez desde 1958, e há registos de campeonatos de Lisboa por equipas desde 1940. O Campeonato Português de Xadrez, que determina o campeão nacional, teve a sua primeira edição em 1911 e, a partir da década de 1950, passou a ser realizado anualmente com algumas exceções.

A Federação Portuguesa de Xadrez (FPX): A FPX já existia e organizava atividades. A sua fundação e atuação são anteriores ao 25 de Abril.

Livros e Literatura: O xadrez já tinha uma presença na literatura portuguesa, com a menção de obras e autores desde o século XV, como o português Pedro Damião com "Questo Libro e da Imparare Giocare a Scachi" (1512).

Período do Estado Novo: Embora o Estado Novo (regime anterior ao 25 de Abril) fosse um regime autoritário com censura e repressão, isso não significava que atividades como o xadrez fossem proibidas ou inexistentes. Pelo contrário, as associações e competições, embora talvez com alguma supervisão, continuavam a funcionar. Há até menções de figuras como Álvaro Cunhal, líder do Partido Comunista Português (partido proibido na altura), a jogar xadrez na prisão.

O 25 de Abril de 1974, com o fim da ditadura, trouxe certamente uma maior liberdade e abertura para todas as áreas da sociedade, incluindo o desporto e as atividades culturais. Isso pode ter levado a um crescimento e maior visibilidade do xadrez, mas não significa que este não era praticado antes.

Em resumo, o xadrez tinha uma presença estabelecida em Portugal antes do 25 de Abril, com uma história de clubes, competições e até figuras notáveis ligadas ao jogo. O período pós-25 de Abril pode ter proporcionado um ambiente mais favorável para o seu desenvolvimento e popularização, mas não marcou o seu início no país.

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Pergunta _ Salazar não gostava de xadrez ? Os ditadores não gostam de xadrez ?


Dito pelo ChatGPT:

Aparentemente, não há registos históricos concretos que indiquem se António de Oliveira Salazar gostava ou não de xadrez. A sua vida pessoal era bastante reservada, e não é comum encontrar referências a hobbies ou passatempos que envolvessem jogos intelectuais como o xadrez. O seu foco estava sobretudo na política, na economia e no controlo do regime do Estado Novo.

Quanto à segunda parte da tua pergunta — “os ditadores não gostam de xadrez?” — não se pode fazer uma generalização válida. A relação entre ditadores e o xadrez varia bastante de caso para caso:

Lenine e Trotsky jogavam xadrez, e o jogo era promovido na União Soviética como símbolo da inteligência e superioridade cultural soviética.

Staline, embora não fosse particularmente conhecido como jogador, apoiou o desenvolvimento do xadrez no país por motivos ideológicos e de prestígio internacional.

Hitler, por outro lado, não era conhecido por jogar xadrez e aparentemente não demonstrava interesse pelo jogo.

Mussolini também não é associado a qualquer relação relevante com o xadrez.

Já Fidel Castro gostava bastante de xadrez, e Cuba sempre teve uma tradição forte nesse desporto.

O xadrez é, por natureza, um jogo que exige estratégia, paciência e inteligência — qualidades que nem todos os ditadores valorizam pessoalmente, mesmo que, em termos de propaganda, o jogo possa ser útil.

Assim, não é correcto afirmar que “os ditadores não gostam de xadrez” como regra. Depende muito do perfil pessoal e da cultura do regime em questão. Desejas que aprofunde algum destes casos específicos?

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Pergunta . E o Amílcar Cabral jogava xadrez ? E o Nelson Mandela, na prisão ?


Dito pelo ChatGPT:

Óptima pergunta — ambos, Amílcar Cabral e Nelson Mandela, são figuras marcantes da história africana, e o seu envolvimento com actividades intelectuais, incluindo o xadrez, pode dizer muito sobre os seus hábitos e métodos de resistência.

Amílcar Cabral
Não há registos específicos ou fontes históricas confiáveis que confirmem que Amílcar Cabral jogava xadrez regularmente. No entanto, sabe-se que era um homem de grande inteligência e formação intelectual sólida — engenheiro agrónomo de formação, estratega político, poeta e pensador. Era também um leitor ávido e tinha uma visão estratégica notável, tanto no campo militar como político.
O seu pensamento profundo e racional faria dele um potencial jogador de xadrez competente, mas, até ao momento, não existe documentação clara a indicar que o xadrez fizesse parte da sua vida ou da sua prática quotidiana.

Nelson Mandela
Quanto a Nelson Mandela, sim, há referências mais concretas. Durante o seu longo cativeiro em Robben Island, Mandela e os seus companheiros de prisão procuravam manter-se mentalmente activos. Sabe-se que:

Mandela jogava xadrez na prisão, e o jogo era uma forma de manter o raciocínio afiado, fomentar camaradagem e escapar, simbolicamente, ao controlo total do sistema prisional.

O xadrez era visto por muitos prisioneiros políticos sul-africanos como um acto de resistência intelectual — manter a mente activa era, de certa forma, manter a liberdade interior.

Mandela também praticava outras formas de exercício mental, como a leitura intensa e a meditação. O xadrez era apenas uma das maneiras de preservar a dignidade e a humanidade num ambiente opressivo.

Se quiseres, posso indicar fontes específicas ou passagens biográficas que detalham isso mais a fundo. Gostarias de continuar por essa via?

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Paulo, é o Carlos de Carvalho...Tem 7 referências no nosso blogue...

É filho do falecido Inácio Soares de Carvalho (1916-1994), funcionário do BNU, preso pela PIDE em 1962.. Passou pela Ilha das Galinhas e pelo Tarrafal... Solto em 1965, voltou a ser preso...Libertado a seguir ao 25 de Abril... Temos uma série com as suas memórias (excertos do livro do filho) :

9 de março de 2020 > Guiné 61/74 - P20717: (D)o outro lado do combate (58A): memórias do militante do PAIGC , Inácio Soares de Carvalho, cabo-verdiano, funcionário do BNU - Banco Nacional Ultramarino, em Bissau, detido pela PIDE em 1962, em seguida deportado para o Tarrafal, donde regressa em 1965, sendo colocado na Ilha das Galinhas... Liberto em 1967, é de novo preso em 1972 e 1973... Regressa à sua terra natal, em finais de 1970, afastando-se da vida política ativa... Morreu em 1994 - VI ( e última) Parte (Carlos de Carvalho, Praia, Santiago, CV)