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quarta-feira, 4 de junho de 2025

Guiné 61/74 - P26881: Historiografia da presença portuguesa em África (484): A Província da Guiné Portuguesa - Boletim Oficial do Governo da Província da Guiné Portuguesa, de 1922 para 1923, é a era do governador Vellez Caroço (38) (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá, Finete e Bambadinca, 1968/70), com data de 12 de Dezembro de 2024:

Queridos amigos,
Há indícios de progresso nestes tempos de grande penúria, impacto das carestias deixadas pela Primeira Guerra Mundial e a constante instabilidade política que se refletiu em governações incolores até à chegada de Vellez Caroço. A década de 1920 marca a chegada do primeiro voo de Lisboa a Bolama, de que se mostra aqui uma fotografia aérea; e surgiu a Empresa de Viação da Guiné que anuncia em sucessivos Boletins Oficiais o seguinte:
"Com o fim de estabelecer carreiras automóveis para transporte de passageiros entre Bissau e as principais povoações desta colónia acaba de se constituir esta empresa com sede nesta cidade (Bissau). As carreiras serão abertas ao público com dois automóveis, de 1 de outubro próximo em diante. Para serviço de transporte de carga temos em Bissau dois camiões à disposição dos nossos excelentíssimos clientes. Possuímos garagens em Bissau e Nhacra, e para manter com regularidade estas carreiras teremos permanentemente um automóvel Overland nesta última localidade. Passagem e fretes a preços módicos e sem competência, o gerente técnico, Adriano Pinto da Costa."
Velez Caroço terá forte contestação pela questão dos câmbios e sobretudo dos cambiais, tive a oportunidade de desenvolver esta questão no livro sobre o BNU da Guiné, tudo tinha a ver com o estado financeiro do país.

Um abraço do
Mário



A Província da Guiné Portuguesa
Boletim Oficial do Governo da Província da Guiné Portuguesa, de 1922 para 1923, é a era do governador Vellez Caroço (38)


Mário Beja Santos

Nem tudo o que domina a atualidade política e governamental está sob a égide da firmeza do governador Vellez Caroço. Há outros acontecimentos que talvez mereçam a nossa atenção. O Boletim Oficial n.º 51, de 23 de dezembro de 1922, são publicados os estatutos da Associação Desportiva de Bissau, ela tem como finalidade praticar todos os jogos desportivos e recreativos adaptáveis ao meio, futebol, críquete, ténis, jogos atléticos, etc., mas conseguir a união de toda a mocidade de Bissau promovendo passeios e festas, logo que os seus fundos permitam (confesso que não voltei a ouvir falar nesta associação, nem sei mesmo se não passou de uma boa intenção). Antes, em 18 de março, no Boletim Oficial n.º 11, uma singular notícia emanada da Secretaria dos Negócios Indígenas: “Para conhecimento dos interessados e devidos efeitos, faz-se público que na madrugada 16 do corrente se suicidou, cortando as carótidas o régulo da região de Ganadu, área na 9.ª Circunscrição Civil (Bafatá) de nome Iobá Sirá.”

Estamos agora em 1923, no Boletim Oficial n.º 21, de 26 de maio, vamos de novo ouvir falar de Jaime Augusto da Graça Falcão. Ele interpusera recurso junto do Conselho Colonial, nessa altura Falcão era administrador efetivo em Cacheu, fora punido com 30 dias de suspensão. No seu recurso Falcão alega que não houvera propósito de desrespeito, atenda-se à natureza da decisão deste Conselho:
“O motivo da suspensão foi o de o recorrente não dar cumprimento à ordem que contratara alguns indígenas da sua circunscrição para o serviço do tráfego comercial em Bolama, por entender que a ordem era ilegal, por não poder ser engajador de serviçais para particulares, tanto mais que o recorrido sabia que na circunscrição que administrava lhe eram precisos trabalhadores para a construção do edifício para a administração e para a conservação de estradas e ainda era sabido que as casas comerciais costumavam arranjar diretamente os trabalhadores de que necessitavam.
A Secretaria dos Negócios Indígenas sabia bem que aquela ordem era ilegal, tanto assim que lhe a mandou por telegrama em cifra, confirmando-a também em cifra em nota de serviço, e que se tivesse sido ouvido, como manda a lei, teria exposto quais as razões por que não dera cumprimento à ordem, mas que isso podia não agradar aos dimanantes da ordem.


Visto e examinado o processo e tudo mais que dos autos consta e ouvido o Ministério Público:
Considerando que não existem nos autos os termos da nota que a portaria recorrida reputa desrespeitosos;
Considerando que, embora a nota fosse redigida em frase menos respeitosa, isso não constitui motivo para deixar de ser ouvido o arguido, conforme manda a lei, sendo, portanto, uma formalidade legal e indispensável que tinha de cumprir-se;
Considerando que não é boa prática as autoridades administrativas compelirem-se a desempenharem o papel de engajadores, antes lhe cumprindo apenas de facultar o fornecimento de trabalhadores para a respetiva circunscrição e dentro dela, o que é diferente do que ser seu engajador;
Considerando que ninguém pode ser compelido a fazer senão aquilo a que a lei obriga; e
Não restando dúvida de que a ordem dada ao recorrente de forma indicada determinava que angariasse trabalhadores para particulares em Bolama, o que não é justo, dão provimento ao recurso e anulam a portaria recorrida.”


Mas já é tempo de voltarmos às medidas firmes e de autoridade que Velez Caroço vinha assumindo desde o início do seu mandato. No Boletim Oficial n.º 21, de 26 de maio, temos um despacho sob um processo inquérito a acontecimentos que tinham dado em Canchungo, em 20 de julho de 1922, o governador era levado a concluir:
“1.º Que Baticam Ferreira, ex-régulo, residente na Costa de Baixo, é um elemento de discórdia naquela circunscrição, sendo em volta do seu nome e com a sua própria instigação que se deram os atos de indisciplina em Canchungo
2.º Que os indígenas Emcari, irmão do Baticam; e Nhará, não só desobedeceram às ordens diretas do administrador, capitão António José Pereira Saldanha, quando mandava dispersar um numeroso grupo de Manjacos que em frente à administração protestavam contra a nomeação do chefe do Potabo, mas inclusivamente agrediram os agentes das autoridades, quando estes, no uso legítimos dos poderes que lhe confere esta autoridade, empregavam meios mais enérgicos para os compelir a respeitar as suas determinações, agredindo o Emcari e Nhará o próprio administrador;
3.º Que o indígena Vicente Macúta foi o mandatário do Baticam, sendo ele uma pessoa que andou instigando os indígenas a reunirem-se e a vir protestar a administração;

Em vista do exposto determino:
1.º Que ao ex-régulo Baticam Ferreira seja fixada a residência por cinco anos na circunscrição dos Bijagós, ficando ali debaixo da vigilância da autoridade;
2.º Que os indígenas Emcari, Nhará e Vicente Macúta sejam desterrados para a circunscrição dos Bijagós por dez anos, devendo o respetivo administrador fixar-lhes como residência uma ilha diferente daquela em que ficar residindo o Baticam Ferreira;
3.º Para sossego da região o estabelecimento da boa harmonia entre os indígenas, seja desde esta data destituído o chefe de Potabo, deverá, todavia, ser reconduzido, se em uma nova eleição entre os indígenas, a que o atual administrador deve mandar proceder imediatamente, se o seu nome for novamente indicado;
4.º Que o administrador da Costa de Baixo ouça todos os indígenas ou os grandes das regiões onde houver descontentamento com a escolha dos chefes e, em nota devidamente informada, para este Governo, proponha a realização de eleições segundo o costume indígena.”


Para concluir, vejamos agora o teor de uma nota também bastante curiosa publicada no Boletim Oficial n.º 39, de 29 de setembro, trata-se de um aviso da Direção dos Serviços de Marinha, fora encontrado nas praias de Puana e Pidjiquiti um apreciável número de bocados de madeira e sibes inteiros ainda com utilidade, mas abandonados, causando estorvo ao encalho de embarcações, quando podres estes bocados de madeira poderão prejudicar a saúde pública, é conveniente avisar os respetivos donos para procederem à sua remoção. Aviso complementar é o de estado de abandono, nas praias de Bolama e Bissau, de várias embarcações, quase todas inutilizadas, prejudicando serviços de utilidade pública como também funcionando como depósito de dejetos, os seus proprietários eram convidados à reconstrução ou à demolição das mesmas embarcações.
Tenente-coronel Vellez Caroço
Teixeira Gomes é Presidente da República
Vista aérea de Bolama tirada do avião antes de aterrar, em 1928
Um pormenor da estrada de Bissau para Bor, anos de 1930

(continua)
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Nota do editor

Último post da série de 28 de maio de 2025 > Guiné 61/74 - P26859: Historiografia da presença portuguesa em África (483): A Província da Guiné Portuguesa - Boletim Oficial do Governo da Província da Guiné Portuguesa, 1921, começou a era de Vellez Caroço (37) (Mário Beja Santos)

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