Caixa (em cartão) da Ração Individual de Combate nº 20, Tipo E, que era distribuída aos militares do Exército quando em operações no mato. Ainda não sabemos o significado da classificação "Tipo E" (seria E de Especial ?).
1. Temos ainda relativamente poucas referências à famosa "ração de combate", diabalolizada por uns, incensada por outros... Merece mais algumas informações adicionais (*).
O Exército (que tinha muito pior alimentação que a Força Aérea e a Marinha) dispunha de três tipos de rações (**):
(*) Último poste da série > 5 de fevereiro de 2025 > Guiné 61/74 - P26463: A nossa guerra em números (27): 800 mil portugueses (muito mais, em termos relativos, do que os americanos no Vietname, ou os franceses na Argélia) "contribuiram com o seu esforço e empenho para que o poder político obtivesse uma solução política" para a guerra, (...) "mas este não correspondeu e o tempo da história foi implacável" (maj-gen João Vieira Borges, in "Crepúsculo do Império", 2024)
2 de novembro de 2021 > Guiné 61/74 - P22682: Paz & Guerra: memórias de um Tigre do Cumbijã (Joaquim Costa, ex-furriel mil arm pes inf, CCAV 8351, 1972/74) - Parte XVIII: A ração de combate
(***) Vd. poste de 18 de março de 2025 > Guiné 61/74 - P26595: Vivências em Nova Sintra (Aníbal José da Silva, Fur Mil Vagomestre da CCAV 2483/BCAV 2867) (3): A Alimentação
(****) Vd. poste de 8 de junho de 2016 > Guiné 63/74 - P16177: Memórias de Gabú (José Saúde) (63): O “ventre” de um espólio raramente conhecido. Passagem de bens alimentícios em armazém.
(i) a ração de combate propriamente dita (RC nº 20): era a que se usava em operações, fora do aquartelamento;
(ii) a ração de substituição (RS nº 30), que tinha mais produtos e podia ser consumida no aquartelamento, quando não era confeccionada refeição quente;
(iii) havia havia ainda a Ração de Bolacha (140 gramas, por refeição e por homem, num total 420 gramas por dia): substituia o pão quando este não era distribuido com a RC nº 20 ou a RS nº 30.
2. Cada ração (RC nº 20 e RS nº 30) estava pensada, para um homem, para as 24h / três refeições.
Conteúdo da Ração Individual de Combate (RC) nº 20 , Tipo E (Europeu) - Ementa 1
(iii) havia havia ainda a Ração de Bolacha (140 gramas, por refeição e por homem, num total 420 gramas por dia): substituia o pão quando este não era distribuido com a RC nº 20 ou a RS nº 30.
2. Cada ração (RC nº 20 e RS nº 30) estava pensada, para um homem, para as 24h / três refeições.
(i) Pequeno almoço: leite condensado | queijo | pão ou bolacha (140 gramas);
(ii) Almoço: caldo de carne | conmserva de peixe | carne de vaca | nougat c/ amendoím | ccncreto de fruta | pão ou bolacha (140 gramas);
(iii) Jantar: canka de galinha c/ aletria | carne de porco assada | doce de fruta | marmeladfa | concreto de fruta | pão ou bolacha (140 gramas).
Conteúdo da Ração Individual de Combate (RC) nº 20 , Tipo E (Europeu) - Ementa 1
Como complementos, a RC continha ainda: (i) papel higiénico9: (ii) caixa de fósforos; (iii) drageias toni-hidratantes ("sempre que se beba qualquer líguido, deve tomar-se uma ou mais drageias de preferência antes das refeições").
A bolacha (140 gr. por refeição) era uma alternativa ao apão, quando este não podia ser distribuído.
A bolacha (140 gr. por refeição) era uma alternativa ao apão, quando este não podia ser distribuído.
Este impresso correspondia à RC nº 167 334.
3. Em 1974, com a "crise do petrólero", os preços dos produtos alimentares dispararam, o que se tornou um bico de obra para a Manutenção Militar (e para o Ministério das Finanças).
A RC era fornecida pela Manutenção Alimentar: o seu reecheio variou com o tempo, mas no essencial seguia sempre a mesma tipologia: conservas de carne (porco, vaca), conservas de peixe (atum, sardinha), leite condensado, concreto de fruta, doce de fruta, bolachas...
Fonte: Adapt. de Albino Silva (20925) (**)
3. Em 1974, com a "crise do petrólero", os preços dos produtos alimentares dispararam, o que se tornou um bico de obra para a Manutenção Militar (e para o Ministério das Finanças).
Por outro lado, numa das duas listagens de existèncias de géneros em Nova Lamego, citadas pelo José Saúde, sabemos que havia uma grande diferença de preço por unidade das rações:
Por norma e por razões de segurança, na Guiné tinha de haver uma reserva de:
- Ração de combate nº 20: 43$00 por unidade (havendo 680 unidades em stock no dia 18/7/74):
- Ração de substituição nº 30: 14$54 por unidade (em stock (250).
Por norma e por razões de segurança, na Guiné tinha de haver uma reserva de:
- 72 mil Rações de Bolacha;
- 50 mil da RC nº 20;
- 20 mil da RS nº 30.
________________
Notas do editor:
(*) Último poste da série > 5 de fevereiro de 2025 > Guiné 61/74 - P26463: A nossa guerra em números (27): 800 mil portugueses (muito mais, em termos relativos, do que os americanos no Vietname, ou os franceses na Argélia) "contribuiram com o seu esforço e empenho para que o poder político obtivesse uma solução política" para a guerra, (...) "mas este não correspondeu e o tempo da história foi implacável" (maj-gen João Vieira Borges, in "Crepúsculo do Império", 2024)
(**) Vd. postes de:~
2 de novembro de 2021 > Guiné 61/74 - P22682: Paz & Guerra: memórias de um Tigre do Cumbijã (Joaquim Costa, ex-furriel mil arm pes inf, CCAV 8351, 1972/74) - Parte XVIII: A ração de combate
(***) Vd. poste de 18 de março de 2025 > Guiné 61/74 - P26595: Vivências em Nova Sintra (Aníbal José da Silva, Fur Mil Vagomestre da CCAV 2483/BCAV 2867) (3): A Alimentação
(****) Vd. poste de 8 de junho de 2016 > Guiné 63/74 - P16177: Memórias de Gabú (José Saúde) (63): O “ventre” de um espólio raramente conhecido. Passagem de bens alimentícios em armazém.
7 comentários:
Se havia um consenso sobre aquela guerra, no TO da Guiné, é que se comia mal e porcamente, dentro e fora dos quartéis do mato...E quanto à Ração Individual de Combate nº 20, tipo E (Especial ?), confesso que, para mim, era intragável...E, como fazia muita sede, era uma "aliada", involuntária mas objetiva, dos gajos que nos combatiam...
Leio aqui que o E não é de Especial mas de Europeia (referimo-nos à ração de combate)
Página Alecrim > A Alimentação em Tempo de Guerra
(...) 1.Como era a alimentação em tempo de guerra colonial?
Os soldados que combatiam no Ultramar tinham, digamos, dois tipo de alimentação diferente. Podiam fazer as suas refeições na base militar ou então, caso estivessem no terreno, em atividade de reconhecimento e combate, dispunham da chamada Ração Individual de Combate. Esta Ração daria, na teoria, para 24 horas e era fornecida numa caixa de cartão. (...)
2. O que compunha uma ração de combate?
(...) .Existiam tipos de rações diferentes, sendo a ração E (Europeia) a mais frequente. Dentro da ração tipo E existia a ração nº 20 e a ração nº 30, que diferiam na quantidade de produtos fornecidos (e consequentemente no aporte energético e nutricional).
Ainda que possam ter existido alterações ao longo de 13 anos (como??) de Guerra colonial, com os vários registos que recolhemos, reconstituímos a possível composição de uma ração de combate:
Ração tipo E nº 20
1 tubo de leite condensado
1 lata de atum
1 lata de sardinhas
2 latas de carne/carne com feijão/tripas
1 lata pequena de compota
1 lata de fruta em calda/sumo de fruta
1 saqueta de café instantâneo
1 torrão nougat (amendoim)
1 pastilha de sal
+ Pão OU 2 bolachas (140g) (...)
Nesta página, que é de um nutricionista ("Alecrim#"), pergunta-se (e bem a propósito):
(...) 3. A alimentação com as rações de combate era deficitária?
É difícil conseguirmos calcular a ingestão nutricional daquela altura, especialmente por não termos disponível a composição nutricional dos produtos. Ainda assim, se tentarmos fazer uma estimativa tendo por base os produtos que existem atualmente e as recomendações nutricionais para um homem com características semelhantes aos jovens combatentes, obtemos valores elevados para o sal, açúcar (elevadíssimos), colesterol total e gordura saturada e valores deficitários para nutrientes como as vitaminas C, D e E.
Estes valores, resultam da necessidade de garantir energia aos combatentes, através de refeições baratas e não perecíveis, contudo o excesso de sal, açúcar e gordura e o défice de vitaminas e minerais (e consequentemente de antioxidantes) acartam a artilharia para uma guerra contra a saúde.
Podia questionar-se, no entanto, qual seria mesmo o impacto especifico destas rações na saúde dos combatentes. “Será que fizeram assim tanta diferença tendo em conta a alimentação normal dos portugueses?”
Sim, muito possivelmente. Embora o sal fosse (e seja) de facto um ingrediente muito presente na culinária dos portugueses, o açúcar não era consumido numa base diária e os hortofrutícolas frescos (frutos e vegetais) estavam sempre presentes, o que representa uma alteração substancial em termos de padrão alimentar.
Adicionalmente também não devemos esquecer a água, que se resumia, muitas vezes, a um cantil. Se este cantil já não era suficiente para as necessidades de uma pessoa com uma rotina normal, muito menos o era numa situação de combate em climas quentes e sem grande possibilidade de re-abastecimento. (...)
(Continua)
E já agora, mais duas perguntas pertinentes:
(...) 4. Existiria malnutrição com o consumo das rações de combate?
Muito provavelmente. A malnutrição é frequentemente confundida com “fome”, quando, na realidade, por malnutrição se entende uma falta de equilíbrio na quantidade e qualidade dos alimentos (seja por défice ou por excesso). Assim, se os combatentes tivessem, efetivamente, acesso a uma ração de combate diária, é muito pouco provável que existisse “fome”, contudo, dado o claro excesso de sal e de açúcar e défice de algumas vitaminas e minerais, a malnutrição poderia estar efetivamente presente.
5. A alimentação no tempo de guerra colonial pode ter efeitos na saúde atual dos ex-combatentes?
Sim, é possível que a alimentação em tempo de guerra tenha contribuído para o estado de saúde atual de alguns ex-combatentes. Apesar de não existirem muitos dados neste sentido, um estudo português (Maia, A. 2010) apurou que as doenças atualmente mais reportadas por ex-combatentes do Ultramar são a perturbação mental (associada, muitas vezes, ao stress pós-traumático), a doença gastro-intestinal e a doença cardiovascular.
Sabemos também que, quer a patologia gastrointestinal, quer a patologia cardiovascular têm uma forte associação com a alimentação, sendo inclusivamente referido no estudo que os hábitos alimentares constituem uma das explicações para a relação entre a exposição à adversidade e a fragilidade do estado de saúde mais tarde. (...)
Luís confirmo o teu comentário, mas estou à vontade para falar porque não sei se por azar eu e a minha C, caç, 557 na operação Tridente sofremos 55 dias interruptos a ração de combate deve ser recorde em toda a guerra da Guiné, enjoei quase tudo menos a canja de galinha com aletria e mais te digo nessa fase Janeiro e Fevereiro de 1964 o prato de carne só tinha duas variedades vaca à jardineira e feijão branco com chouriço e apareciam latas "inchadas" está visto que eram para enterrar mas houve quem tentasse comer e o resultado foi ser evacuado até aparecia paralisia nas mãos e a sorte ou safa foi fazer parte da companhia um médico muito competente o Dr. Rogério Leitão que além de cardiologista um ser humano de 5 estrelas.
Nas operações com a C Caç 15 trocava normalmente as latas de conserva pelo leite condensado com os Balantas. Eles preferiam e assim eu alimentava-me durante aqueles poucos dias a leite condensado. Era o que havia. Abraços. Joaquim Mexia Alves
Havia a ração individual de combate Tipo E a tipo E especial. Ambas cheias de açúcares e gorduras. Já não me lembro bem do conteúdo da tipo E especial mas era ligeiramente melhor e mais cara. Ambas intragaveis no tempo final da comissão . Tendo em conta que saía para o mato de seis em seis dias por períodos de mais de 48 horas, fora outros menores, tive com as rações uma relação de mais ódio que amor.
Grande abraço
Eduardo Estrela
Cá estão os célebres comprimidos «para tirar o tesão»! Ainda há ex-militares da minha companhia que continuam a achar que os comprimidos eram mesmo «para tirar o tesão», e ninguém consegue convencê-los do contrário. Na verdade, os referidos comprimidos, que vinham expressamente identificados como sendo "toni-hidratantes", eram inocentes comprimidos de sal; melhor dizendo, de sais, porque não deviam conter só cloreto de sódio. Destinavam-se a restabelecer o equilíbrio eletroquímico do organismo, rompido pela intensa transpiração. Como sabemos, o suor é salgado, o que significa que além de constituir uma perda de água, também constitui uma perda de sais. Os comprimidos ajudavam a repor os sais perdidos pela transpiração e a aumentar o bem-estar resultante da ingestão de água. Como davam uma sensação de revigoramento, eram chamados "toni-hidratantes". Agora tentem explicar isto a um soldado cioso da sua masculinidade...
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