quinta-feira, 8 de março de 2007

Guiné 63/74 - P1574: Uma estória dos Gringos de Guileje (CCAÇ 3477): Estás f..., pá! (Amaro Samúdio)

Lourinhã > Aspecto parcial do Monumento aos Mortos do Ultramar. 2005. Arquitecto: Augusto Silva. Escultora: Andreia Couto (1). O meu primo, José António Canoa Nogueira, foi o primeiro soldado da Lourinhã a morrer, em terras da Guiné, em 1965, em Ganjolá, Catió (2)... Lembro-me do seu impressionane funeral e quanto a palavra Guiné me marcou... Tinha eu 18 anos, já feitos... Quando cheguei à Guiné, em finais de Maio de 1969, Guileje e Gandembel eram para nós, periquitos, nomes míticos, para além de Madina do Boé... Inspiravam respeito e temor, e pronunciavam-se baixinho... (LG)

Foto: © Luís Graça (2007). Direitos reservados.

Guiné > Região de Tombali > Guileje > CCAÇ 3477 (Novembro de 1971/ Dezembro de 1972) > Foto aérea de 1972 do aquartelamento e tabanca de Guileje, tirada no sentido oeste-leste. Ao fundo, a pista de aviação e o heliporto.

Foto: © Amaro Samúdio (2006). Direitos reservados.


Texto do Amaro Munhoz Samúdio, ex-1º Cabo Enfermeiro da CCAÇ 3477 (1971/73) - Os Gringos de Guileje:

Por engano, fui passar férias aos Açores, Arrifes, BII 18, no Paquete Funchal. A Companhia já tinha ido para a Guiné. Ainda bem. Regressei a Lisboa no mesmo Paquete e numa altura em que os banhos na sua piscina permitiram umas tardes de enorme gozo.

Não voltaram a enganar-se e, no Uíge, cheguei à Guiné em 29 de Novembro de 1971.

Apresentei-me, de noite lembro-me bem, naquelas mesas em Brá, onde entreguei a caderneta.
- Estás fodido, pá! - diz-me um Sargento, certamente por, a vermelho, estar escrito na caderneta CCAÇ 3477.

Como já andava na tropa desde Janeiro de 1968, perguntei-lhe com a natural irreverência de quem nada temia:
- Estou fodido, porquê?
- Vais para Guileje - responde-me ele.
- Guileje? - diz um cabo que estava próximo dele, saltando para baixo e vindo ter comigo.
- Vais para Guileje? - pergunta-me.
- Acho que sim, sei lá.
- Não te preocupes - acalma-me ele. - O problema é quando temos que ir para a mata. Dentro do quartel enfiamo-nos dentro dos abrigos e elas podem cair. Não há problema nenhum.
- Obrigado.

Fiquei naturalmente mais descansado, não resistindo, no entanto, a perguntar-lhe porque estava ali.
- Vim com um Madeirense. Na primeira saída para a mata sofremos uma emboscada. Um velhinho Madeirense foi ferido. Eu sou enfermeiro e vim com ele para o hospital de Bissau.
- Obrigado. Já estou mais descansado.

No dia seguinte lá embarcámos, na LDG até Gadamael Porto, seguindo posteriormente na coluna que nos levou ao quadrado de arame farpado, na altura suportado por paus , chamado Guileje.

Houve, entre nós, os naturais problemas daquela má fase da nossa vida, mas...
- É o meu Amigo Monteiro!...

Foi o primeiro Gringo que conheci.

A. Samúdio

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Notas de L.G.:

(1) Vd. post de 24 de Julho de 2005 > Guiné 63/74 - CXXV: Homenagem aos mortos da minha terra (Lourinhã, 2005) (Luís Graça)

(2) Vd. posts de:


22 de Janeiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1455: Crónica de um Palmeirim de Catió (Mendes Gomes, CCAÇ 728) (7): O Sr. Brandão, de Ganjolá, aliás, de Arouca, e a Sra. Sexta-Feira

8 de Setembro 2005 > Guiné 63/74 - CLXXXI: Antologia (18): Um domingo no mato, em Ganjolá (Luís Graça / José António Canoa Nogueira)

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