Foto: © Torcato Mendonça
1. Em mensagem do dia 1 de Junho de 2020, o nosso camarada António Eduardo Ferreira (ex-1.º Cabo Condutor Auto da CART 3493/BART 3873, Mansambo, Fá Mandinga e Bissau, 1972/74) lembra o seu tempo em Fá Mandinga.
MEMÓRIA DOS LUGARES
FÁ MANDINGA
De quando em vez, ao ler alguns dos postes que aparecem no blogue, acontece comigo, o que certamente acontece com muitos, sou levado a sítios por onde passei que não estando esquecidos se vão mantendo em hibernação... foi o que me aconteceu ao ler o poste enviado pelo Ex-furriel Fernando Cepa, em que falava de Fá, onde ele esteve algum tempo.
Também a minha companhia num dos tempos mais difíceis para o nosso pessoal (lá esteve uma semana) não motivado por situações de guerra que naquele tempo, por ali, não se fazia sentir… Mas sim pela mudança com que estávamos a ser confrontados, a saída de Mansambo para Cobumba. Local que a maioria de nós nunca tinha ouvido falar. As informações que nos chegavam depois de sabermos da mudança, não eram nada animadoras… embora não fossem ainda tão negativas como as que viemos a ter de enfrentar enquanto por lá estivemos…
Em Fá Mandinga, local onde passamos "uma espécie de férias”, existiam instalações de grandes dimensões em que as telhas que as cobriam, pelo menos algumas, tinham sido fabricadas na então metrópole, na região de Porto de Mós, onde existiam muitas fábricas, o que me tocava ainda mais dada a proximidade da minha terra. Existia também no local, um espaço em mau estado com vários motores inoperacionais que noutro tempo ali teriam funcionado para produzir energia. Um pouco mais abaixo, junto à bolanha, havia mais instalações, onde os padeiros da nossa companhia iam fazer o pão. Creio que não estou errado… foi há muito tempo...
Dizia-se que aquelas instalações pertenciam a Amílcar Cabral quando a guerra começou. Mas diziam-se tantas coisas…
Durante o tempo que lá estivemos, para além do pessoal da cozinha e os padeiros, não me lembro que mais alguém tivesse feito qualquer serviço, eu sei que não fiz assim como os outros condutores. Mas o lado psicológico não deixava ninguém tranquilo. A mais pequena coisa... levava a comportamentos nada comuns. Comigo, aconteceu eu estar deitado durante o dia e um colega entendeu chatear, avisei-o para me deixar estar sossegado ele não fez caso, o que me levou a pegar nas cartucheiras que tinha ali à mão atirando-lhe com elas com alguma violência, coisa que não era meu hábito. Durante algum tempo o nosso relacionamento passou a ser mais distanciado... o José não fez nada de muito mau, era o seu jeito de estar, mas a minha perturbação era enorme.
A esta distância no tempo peço-lhe desculpa e desejo que ele se encontre de boa saúde.
Outro dia, cerca da meia-noite, quando estávamos a dormir houve um “corneteiro” que se lembrou de pôr a tocar o seu instrumento acordando toda a gente. Instrumento que nunca tinha sido usado na nossa companhia, nem em Mansambo e menos depois em Cobumba. Atitude estranha, mas aconteceu… Um dia estava eu junto de outros camaradas do lado de fora das instalações próximo de um poço que existia junto ao caminho que seguia para a bolanha, em que alguém ali por perto tinha um rádio onde uma das canções que ouvi, foi, "Guitarra toca baixinho", cantada por Francisco José.
Estranhamente, ou não, ainda hoje, quando ouço essa canção a minha mente desloca-se logo até Fá Mandinga.
Marcas que ficaram para a vida…
António Eduardo Ferreira
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Nota do editor
Último poste da série de 29 de maio de 2020 > Guiné 61/74 - P21020: Memória dos lugares (409): Fazenda Experimental de Fá (Fernando Cepa, ex-Fur Mil Art)
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