domingo, 21 de abril de 2024

Guiné 61/74 - P25419: No dia 25 de Abril de 1974 eu estava em... (31): Lisboa, de licença de férias, e depois de uma noitada o meu cunhado acordou-me às 9h00: "Eh, pá, já não voltas mais para a guerra" (Jorge Pinto, ex-alf mil, 3.ª CART/BART 6520/72, Fulacunda, 1972/74)





















Lisboa >Av Lierdade e Marquês de Pombal>  28 de abril de 1974, domingo > Um alferes de Fulacunda, de férias na metrópole, transformado em fotojornalista,captou estas imagens...

Fotos (e legendas): © Jorge Pinto (2016). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagemcomplemene: Blogue Luís GRaça & Camaradas da Guiné]



Jorge Pinto
1. O Jorge Pinto (ex-alf mil, 3.ª CART/BART 6520/72, Fulacunda, 1972/74) mandou-nos, há tempos, fotos do seu arquivo pessoal relativas ao 25 de Abril de 1974.(*)

Escreveu ele: "Como sabes, tive o privilégio, de estar de férias na 'metrópole' , nessa data. No próprio dia 25, vim de Alcobaça (Turquel) para Lisboa e por aqui permaneci, até regressar a Bissau no dia 3 de Maio."

Nessa altura, enviou-nos fotos f tiradas no primeiro domingo (28.04.74), a seguir ao 25 de Abril, que fora numa quinta feira. (**) 

E explicou-nos que foram  "tiradas junto ao Marquês de Pombal, apanhando manifestação (ões) espontânea(s) que subia(m) a Avenida da Liberdade".

Ontem almoçámos juntos, em casa de amigos comuns, no lugar da Estrada,  
Geraldes, Peniche. (Um belíssimo almoço, acrescenta-se  de "arraia com batata e cebola cozida",  em dois panelões, éramos 16 à mesa, à moda das aldeias ribeirinhas do concelho da Lourinhã.)

Em Fulacunda
Depois de folgar em saber que ele está melhor das suas mazelas músculo-esqueléticas (foi operado ao fémur), falámos desta história do 25 de Abril. E ele esclareceu algunas das minhas dúvidas... 

Se bem percebi, ele já estava em Lisboa no 25 de Abril, deitou.se muito tarde, depois de estar com amigos até às tantas, ficou na casa da irmã,ali perto do Marquês de Pombal e às nove horas, foi acordado abruptamente pelo cunhado, que eufórico lhe disse:
- Jorge, tu já não voltas para a Guiné!

Ele estava a acabar de licença de férias, com viagem marcada  para o dia 3 de maio. 

Como muitos de nós, face à escassez de notícias nerdsa manhã,  ficou na dúvida se se tratava de um golpe militar encabeçado pelo Kaulza de Arriaga, do Spínola ou de outros generais...Com o passar das horas, as coisas começaram a clarificar-se. Não conseguiu chegar ao Terreiro do Paço nem ao Carmo, mas já não saiu de Lisboa, até ao regresso a Fulacunda.

Tomou o avião no dia 3, voltou a Fulacunda que foi atacada em força com canhão s/r no dia 7...Terminou a comissão em junho, mas só regressou em setembro... Nessa altura, além do 3ª C / BART  6520/72,  Fulacunda dispunha  do Pel MIl 221 e do 31º Pel Art (obus 14 cm).  

PS - O Jorge Pinto trabalhava na União Gráfica, como revisor de texto,  e já tinha o 1º ano da licenciatura em História, quando foi chamado para  tropa.

2. Comentário do editor LG:

Jorge, recuperei e reeditei as tuas fotos, que ficam para a história do nosso blogue

São de uma manife (o vocábulo já foi grafado pelos nossos dicionaristas...) do dia 28, domingo...

Como escrevi na altura (28 de fevereiro de 2016, também domingo), há 8 anos, há um certo olhar "naïf" do fotógrafo de Alcobaça, ou se calhar, mais de Fulacunda do que Alcobaça ... Afinal, só agora fico a saber que já vivias e trabalhavas em Lisboa.

Nessa altura eu estava a viver e a trabalhar em Mafra, e o dia 25 de abril de 1974, quinta-feira, foi de alguma inquietação, ansiedade, incredulidade e depois de alegria... Também eu bão sabia de que lado é  que estavam as tropas sublevadas... Pela "Máfrica", a EPI, estava tudo aparentemenet calmo... Já não tenho a certeza se nesse fim de semana fui a Lisboa, mas fui, isso sim, ao 1º de maio... Irrepetível, esse 1º de maio histórico.

Tenho pena de nessa época não fazer fotografia!... Nem se quer tinha máquina...

De facto, foste fotojornalista de ocasião, e estas fotos, mesmo de amador, vão ter daqui a muitos anos grande valor documental... Aliás, já têm... Não é todos os dias que a História nos entra pela porta dentro... No teu caso, pela porta dentro do quarto adenetro de um alferes miliciano, em férias, e com bilhete marcado de regresso a Bissau (e depois Fulacunda, na região de Quínara, lá no cu de Judas)...

Por outro lado, até o analista do mercado automóvel e o sociólogo é capaz de achar piada às tuas fotos: está ali o Portugal no seu melhor em autorrodas: os Fiat 127, os minis, a carroça do burro, a Panhard AML 60... para além os marinheiros aventureiros, os briosos cavaleiros do RC 7, e até as "flausinas" da Reboleira e arredores!...

É um retrato socioantropológico do teu, do nosso Portugal dos anos 70... Espantoso, ternurento, humano, ingénuo, lírico, desconcertante, espontâneo, mágico, solidário, piroso, popular, desenrascado, enrascado, generoso, sonhador, interesseiro, sublime...

O Portugal no seu melhor, que o Zé Povinho éramos todos nós, fomos todos nós, que aguentamos há mil anos a insustentável leveza deste estranho e fascinante país à beira mar plantado, destruído,replantado, recontruído, inventado, reiventado... Representado, aqui, neste blogue pelos melhores dos seus filhos!
____________

Notas do editor:

(**) Último poste da série > 18 de abril de 2024 > Guiné 61/74 - P25404: No 25 de Abril de 1974 eu estava em... (30): Em Bolama, à espera do meu "periquito"... Embarquei nos TAM, em meados de maio, a expensas minhas (João Silva, ex-fur mil at inf, CCAV 3404, Cabuca; CCAÇ 12, Bambadinca e Xime; CIM, Bolama, 1972/74)

8 comentários:

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Como Lisboa mudou... O "amarelinho" ainda atravessava a Av da Liberdade...

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Quem seriam estes dois oficiais (capitães...) que estão em cima da Panhard ? A que unidade pertenceriam ?...Um deles parece ostentar, na boina, o crachá dos comandos... A imagem não é nítida... O Jorge Pinto não se deve lembrar, 50 anos depois...

Valdemar Silva disse...

Então, o oficial do lado esq. de óculos escuros parece ser Jaime Neves "o Jaimite" o outro não se sabe por ter a cara tapada.
Grande reportagem fotográfica de Jorge Pinto, que não se limitou a "tirar fotos", apanhando o contentamento geral do momento inesquecível que até a PSP está com farda de gala.
E de certeza com uma vontade de ficar por cá e não voltar ao mato na Guiné.

Valdemar Queiroz

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Valdemar, também me pareceu mas não quis ser eu o primeiro a responder à minha própria pergunta...

João Carlos Abreu dos Santos disse...

"Cravo ao peito, Asno feito".
... desde há muito recordo aquele dito da Senhora Minha Mãe...

Hélder Valério disse...

Caro Jorge Pinto

Sabemos que as ocasiões são mesmo assim: ou se aproveitam, ou não.
Neste teu caso tiveste a oportunidade de ver "ao vivo e a cores" um dos momentos mais marcantes da nossa História, a de Portugal e, naturalmente, também daqueles que a viveram.
As fotos que tiraste e que nos foi dado ver, revelam um grande envolvimento popular, muito entusiasmo, muita emotividade e, já agora, também serenidade e disciplina.
Claro que o acontecimento suscita considerações diversas, umas a "quente", outras ao correr dos anos.
Há os que gostaram muito, que desejaram muito. Há os que só gostaram. Há os que "assim-assim". Há os que não gostaram. Há os que detestam, abominam e que espumam ódio.
Tudo isto é natural, faz parte do "processo humano".
Também será natural que o teu cunhado, perante os acontecimentos e sabendo algumas coisas que certamente lhe contaste, lembrando-se de Fernando Pessoa, lhe tenha ocorrido o poema "O Menino de Sua Mãe" e temendo que te pudesse suceder o que esse poema enuncia no final
....
"Lá longe, em casa, há a prece:

«Que volte cedo, e bem!»

(Malhas que o Império tece!)

Jaz morto, e apodrece,

O menino da sua mãe."

ele tivesse o impulso de te dizer "é pá, já não voltas mais para a guerra"!

Mas, o que é insofismável é mesmo o que potenciou "aquela clara madrugada".
Digo "potenciou", porque reconheço que percorridos estes 50 anos muitas coisas não correram como se queria, como se esperava que corressem.
Não cabe aqui escalpelizar os "porquês" disso mas certamente muitas mães terão dito muitas coisas embora, garantidamente, muitos filhos, muitos "meninos de suas mães" só tenham ouvido o que as suas conveniências permitiam.

Que viva o 25 de Abril!

Hélder Sousa

Valdemar Silva disse...

Ó Helder é isso mesmo, e até houve muitas mães que disseram cheias de alegria 'sós os parvos não gostam de cravos.

E que viva o 25 de Abril !!!

Saúde da boa
Valdemar Queiroz

João Carlos Abreu dos Santos disse...

- «Balofas carnes
de balofas tetas
caem aos montões
em duas mamas pretas
chocalhos velhos
a bater na pança
e a puta dança.

Flácidas bimbas sem
expressão nem graça
restos mortais
de uma cusada escassa
a quem do cu só lhe
ficou cagança
e a puta dança.

A ver se caça com
disfarce um chato
coça na cona
e vai rompendo o fato
até que o chato
de morder se cansa
e a puta dança.»

--
"Poesia erótico-satírica"
(António Tomás Botto 17Ago1897-16Mar1959)