Angola > s/l > s/d > Fotografia, do domínio público, mostrando uma dança guerreira cuanhama, em
que os participantes empunham arcos, flechas, lanças, etc. O 17º (e último) rei dos cuanhamas foi o chamado soba Mandume (1894-1917).
Imagem e legenda: Cortesia do Fernando Ribeiro. Edição: Blogue Luís Graça

O dicionário Priberam diz que "quimbo" (ku imbo) vem do umbundo... Quem sou eu para discordar ? E parece fazer sentido: o umbundo é a língua falada pelos ovimbundos, povo originário do Planalto Central de Angola; é a língua banta mais falada em Angola. O vocábulo "sanzala" usa-se no norte, e "quimbo" no sul, como tu reconheces.
(*) Vd. poste de 24 de agosto de 2025 > Guiné 61/74 - P27148: Felizmente ainda há verão em 2025 (22): Em Angola, nem todos os sobas eram régulos e nem todos os régulos eram sobas

BCAÇ 3880 (Zemba e Ponte do Zádi, Angola, 1972/74);
(ii) membro da Tabanca Grande desde 11 de novembro de 2018, com o nº 780, tem 35 referências no nosso blogue.
(iii) engenheiro, natural do Porto, é o administror do blogue "A Matéria do Tempo", que mantém ativo desde janeiro de 2006 até hoje.
1. Comentário do nosso camarada Fernando de Sousa Ribeiro, ao poste P27148 (*)
A palavra "régulo" não era usada em Angola. Ela podia figurar na legislação do território (não sei se figurava ou não), mas ninguém em Angola chamava régulo a um chefe tradicional. Isso era na Guiné e em Moçambique. A designação genericamente usada em Angola para designar um tal chefe era "soba".
A definição de soba está muito bem exposta na página FAAT-Fórum Angolano das Autoridades Tradicionais do Facebook, referida pelo Luís.
A definição de soba que é dada na página referida é genérica. No concreto, existem algumas variantes, dependendo das etnias.
No próprio texto, vem a seguinte frase: «Existem dois tipos de Sobas, o Soba grande (regedor) e o Soba.»
(ii) são enquadradas num sistema administrativo em que a soberania pertence exclusivamente ao Estado português.
(ii) colaboração no recrutamento de trabalho forçado ou contratado (obras públicas, culturas obrigatórias, como o algodão, o café, a mancarra);
(iii) manutenção da ordem pública local, em articulação com a administração e forças militares;
(iv) apoio em campanhas de “civilização” (escola, missões catequese, saúde).
(i) o poder colonial detém a prerrogativa de nomear, confirmar ou destituir os chefes gentílicos;
(ii) o que vem esvaziar a legitimidade “tradicional” dessas autoridades, subordinando-as a critérios coloniais de “fidelidade”, "submissão" e “utilidade”.
(i) as autoridades gentílicas estavam enquadradas no Estatuto do Indigenato (abolido só em 1961), com direitos políticos e civis limitados:
(ii) não eram equiparadas a funcionários da administração colonial, mas sim auxiliares, com remuneração e prestígio dependentes da boa conduta perante os administradores coloniais.
Análise Crítica do di0ploma:
(ii) Portugal utilizava os chefes locais para reduzir custos de administração e controle, em territórios a milhares de quilómetros de distância (em relação ao Terreiro do Paço), mantendo o "verniz" da continuidade e do respeito das estruturas tradicionais.
(ii) muitas vezes, os chefes hostis eram destituídos e substituídos por figuras mais maleáveis, corroendo a legitimidade das hierarquias locais.
(i) a função principal atribuída às autoridades gentílicas era extrativa e coerciva: impostos, trabalho, disciplina, obediência, "compliance";
(ii) isso colocava-as em contradição (e conflito) com as próprias comunidades, passando a ser vistos como agentes do colonialismo.
(iii) na Guiné, por exemplo, a memória da colaboração dos chefes gentílicos (régulos, chefes de tabanca, cipaios, guias e picadores, milícias...) com o poder colonial marcou o discurso político do PAIGC, que os acusava de serem “agentes do colonialismo”, "cães do colonialismo".
Em resumo:
O Decreto-lei 23228, de 15 de novembro de 1933, institucionalizou um sistema de colonialismo indireto tutelado, em que as autoridades gentílicas foram reduzidas a instrumentos auxiliares do Estado Novo, destituídas da sua autonomia tradicional e transformadas em mediadores coloniais subordinados.
A palavra "régulo" não era usada em Angola. Ela podia figurar na legislação do território (não sei se figurava ou não), mas ninguém em Angola chamava régulo a um chefe tradicional. Isso era na Guiné e em Moçambique. A designação genericamente usada em Angola para designar um tal chefe era "soba".
A definição de soba está muito bem exposta na página FAAT-Fórum Angolano das Autoridades Tradicionais do Facebook, referida pelo Luís.
A definição de soba que é dada na página referida é genérica. No concreto, existem algumas variantes, dependendo das etnias.
No próprio texto, vem a seguinte frase: «Existem dois tipos de Sobas, o Soba grande (regedor) e o Soba.»
Eu nunca ouvi chamar "soba grande" a um regedor, mas, pelo menos entre os bacongos, o regedor era mais do que um soba; um regedor tinha vários sobas na sua dependência e (caso não fosse apenas um fantoche nomeado pela administração colonial) podia ser muito poderoso e influente.
Conheci um regedor que era tão respeitado pelos seus súbditos que nem a PIDE se atrevia a meter-se com ele, por receio de provocar um levantamento popular... Os pides limitavam-se a vigiá-lo de longe, sem darem nas vistas.
O soberano dos cuanhamas também usava o título de soba, ainda que de facto fosse rei. O último rei dos cuanhamas foi o chamado soba Mandume, que acabou por se suicidar com um tiro de Mauser para não ser capturado, no fim das campanhas ditas "de pacificação".
O soberano dos cuanhamas também usava o título de soba, ainda que de facto fosse rei. O último rei dos cuanhamas foi o chamado soba Mandume, que acabou por se suicidar com um tiro de Mauser para não ser capturado, no fim das campanhas ditas "de pacificação".
Eu mesmo sou testemunha da enorme admiração que os meus soldados africanos (de qualquer etnia) nutriam pelos cuanhamas, precisamente por causa da sua tenaz resistência à colonização portuguesa (em Angola) e alemã (na Namíbia). Diziam os meus soldados que não foram os portugueses nem os alemães que venceram os cuanhamas; foi a fome, provocada por uma seca entretanto surgida.
Do ponto de vista físico, os respeitados e admirados cuanhamas são um povo tendencialmente de elevada estatura e com feições que fazem lembrar as dos etíopes, sudaneses e até dos tuaregues, pelo menos em alguns casos. Praticam uma economia agro-pastoril e têm tradições guerreiras. Dito isto, será possível que haja algum laço de parentesco entre os cuanhamas e os fulas?
A imagem que se publica acima, é muito antiga e mostra uma dança guerreira cuanhama, em que os participantes empunham arcos, flechas, lanças, etc.
Em Coimbra existiu uma república de estudantes chamada Kimbo dos Sobas (no plural) (imagem `^a esquerda). Ela era assim chamada por ter sido fundada por estudantes angolanos.
Do ponto de vista físico, os respeitados e admirados cuanhamas são um povo tendencialmente de elevada estatura e com feições que fazem lembrar as dos etíopes, sudaneses e até dos tuaregues, pelo menos em alguns casos. Praticam uma economia agro-pastoril e têm tradições guerreiras. Dito isto, será possível que haja algum laço de parentesco entre os cuanhamas e os fulas?
A imagem que se publica acima, é muito antiga e mostra uma dança guerreira cuanhama, em que os participantes empunham arcos, flechas, lanças, etc.
Em Coimbra existiu uma república de estudantes chamada Kimbo dos Sobas (no plural) (imagem `^a esquerda). Ela era assim chamada por ter sido fundada por estudantes angolanos.
A República Kimbo dos Sobas teve uma participação ativa na crise académica de 1969, juntamente com todas as outras repúblicas da cidade, menos uma.
A palavra quimbo é sinónima da palavra sanzala e ambas equivalem a tabanca.
A palavra quimbo é sinónima da palavra sanzala e ambas equivalem a tabanca.
No norte de Angola usa-se a palavra sanzala, enquanto no centro e no sul se usa a palavra quimbo. Duvido seriamente que a palavra quimbo venha do umbundo, porque na língua umbundo não existe a sílaba ki, que é sempre substituída pela sílaba tchi. A palavra quimbo poderia ser, por exemplo, uma forma abreviada da palavra quilombo.
Angola não era a joia da coroa do império português, de maneira nenhuma. A joia do império era Goa. Angola era um território para onde eram desterrados os condenados ao degredo pela Justiça, como aconteceu ao Zé do Telhado e a muitos outros. Um território assim não pode ser joia de coisa alguma.
O selo moçambicano que se vê na última imagem é um selo da Companhia do Niassa, uma companhia majestática equivalente à sua vizinha Companhia de Moçambique. Note-se que em parte nenhuma do selo se pode ler a palavra "Moçambique", o que é muito significativo.
Angola não era a joia da coroa do império português, de maneira nenhuma. A joia do império era Goa. Angola era um território para onde eram desterrados os condenados ao degredo pela Justiça, como aconteceu ao Zé do Telhado e a muitos outros. Um território assim não pode ser joia de coisa alguma.
O selo moçambicano que se vê na última imagem é um selo da Companhia do Niassa, uma companhia majestática equivalente à sua vizinha Companhia de Moçambique. Note-se que em parte nenhuma do selo se pode ler a palavra "Moçambique", o que é muito significativo.
2. Comentário do editor LG:
Fernando, tens toda a razão no que respeita ao uso da palavra "régulo" em Angola. Se leres o Decreto-lei 23228, de 15 de Novembro de 1933 (Carta Orgânica do Império Colonial Português), o termo genérico consagrado para as autoridades gentílicas é regedor (soba em Angola, régulo na Guiné e em Moçambique, liurai em Timor...).
Fernando, tens toda a razão no que respeita ao uso da palavra "régulo" em Angola. Se leres o Decreto-lei 23228, de 15 de Novembro de 1933 (Carta Orgânica do Império Colonial Português), o termo genérico consagrado para as autoridades gentílicas é regedor (soba em Angola, régulo na Guiné e em Moçambique, liurai em Timor...).
Já que estamos no verão de 2025 e a nossa universidade sénior não encerrou para ir... a banhos, vamos discorrer um pouco sobre esta "bizantinice"...(Ou talvez não: acho que não estamos a discutir o "sexo dos anjos"... As questões terminológicas também são importantes... Corrigi o poste P27148, substituindo régulo por regedor. E dei conhecimento a alguns dos nossos "amigos angolanos").
Este diploma de 1933 é um marco do regime do Estado Novo na definição da política colonial, consolidando a ideologia do império orgânico, centralizado e hierarquizado. Um império ainda em grande parte de "papel"... Lisboa gostava de gerir o seu vasto e glorioso império, "de caneta e papel" em cima da secretária do gabinete... Até 1936 as campanhas de pacificação e ocupação ainda continuariam (na Guiné, nos Bijagós, em Canhabaque)
Sumário: Promulga a Carta Orgânica do Império Colonial Português, que dispõe sobre a administração colonial portuguesa nas seguintes províncias: Cabo Verde, Guiné, São Tomé e Príncipe, Angola, Moçambique, Estado da Índia, Macau e Timor. Estabelece os orgãos centrais de governo do imperio colonial, enunciando as suas atribuições, estrutura, competências e funcionamento. Dispõe sobre os funcionários coloniais e os serviços militares, bem como sobre a administração financeira e de justiça, a ordem social e económica e sobre os indígenas.
No que toca às autoridades gentílicas (designação para chefes locais africanos, como régulos, regedores, sobas, liurais, etc.), destacam-se os seguintes pontos:
Este diploma de 1933 é um marco do regime do Estado Novo na definição da política colonial, consolidando a ideologia do império orgânico, centralizado e hierarquizado. Um império ainda em grande parte de "papel"... Lisboa gostava de gerir o seu vasto e glorioso império, "de caneta e papel" em cima da secretária do gabinete... Até 1936 as campanhas de pacificação e ocupação ainda continuariam (na Guiné, nos Bijagós, em Canhabaque)
Sumário: Promulga a Carta Orgânica do Império Colonial Português, que dispõe sobre a administração colonial portuguesa nas seguintes províncias: Cabo Verde, Guiné, São Tomé e Príncipe, Angola, Moçambique, Estado da Índia, Macau e Timor. Estabelece os orgãos centrais de governo do imperio colonial, enunciando as suas atribuições, estrutura, competências e funcionamento. Dispõe sobre os funcionários coloniais e os serviços militares, bem como sobre a administração financeira e de justiça, a ordem social e económica e sobre os indígenas.
No que toca às autoridades gentílicas (designação para chefes locais africanos, como régulos, regedores, sobas, liurais, etc.), destacam-se os seguintes pontos:
- Reconhecimento subordinado:
(ii) são enquadradas num sistema administrativo em que a soberania pertence exclusivamente ao Estado português.
- Funções atribuídas:
(ii) colaboração no recrutamento de trabalho forçado ou contratado (obras públicas, culturas obrigatórias, como o algodão, o café, a mancarra);
(iii) manutenção da ordem pública local, em articulação com a administração e forças militares;
(iv) apoio em campanhas de “civilização” (escola, missões catequese, saúde).
- Nomeação e demissão:
(i) o poder colonial detém a prerrogativa de nomear, confirmar ou destituir os chefes gentílicos;
(ii) o que vem esvaziar a legitimidade “tradicional” dessas autoridades, subordinando-as a critérios coloniais de “fidelidade”, "submissão" e “utilidade”.
- Estatuto jurídico desigual:
(i) as autoridades gentílicas estavam enquadradas no Estatuto do Indigenato (abolido só em 1961), com direitos políticos e civis limitados:
(ii) não eram equiparadas a funcionários da administração colonial, mas sim auxiliares, com remuneração e prestígio dependentes da boa conduta perante os administradores coloniais.
Análise Crítica do di0ploma:
- Instrumento de dominação indireta
(ii) Portugal utilizava os chefes locais para reduzir custos de administração e controle, em territórios a milhares de quilómetros de distância (em relação ao Terreiro do Paço), mantendo o "verniz" da continuidade e do respeito das estruturas tradicionais.
- Ambiguidade entre tradição e colonialismo:
(ii) muitas vezes, os chefes hostis eram destituídos e substituídos por figuras mais maleáveis, corroendo a legitimidade das hierarquias locais.
- Reforço da exploração colonial:
(i) a função principal atribuída às autoridades gentílicas era extrativa e coerciva: impostos, trabalho, disciplina, obediência, "compliance";
(ii) isso colocava-as em contradição (e conflito) com as próprias comunidades, passando a ser vistos como agentes do colonialismo.
- Fragmentação e dependência:
- Efeito a longo prazo:
(ii) por um lado, eram vistas como colaboracionistas; por outro, foram recuperadas em certas conjunturas como mediadoras comunitárias;
(iii) na Guiné, por exemplo, a memória da colaboração dos chefes gentílicos (régulos, chefes de tabanca, cipaios, guias e picadores, milícias...) com o poder colonial marcou o discurso político do PAIGC, que os acusava de serem “agentes do colonialismo”, "cães do colonialismo".
Em resumo:
O Decreto-lei 23228, de 15 de novembro de 1933, institucionalizou um sistema de colonialismo indireto tutelado, em que as autoridades gentílicas foram reduzidas a instrumentos auxiliares do Estado Novo, destituídas da sua autonomia tradicional e transformadas em mediadores coloniais subordinados.
Embora tenha permitido algum grau de governabilidade num império vasto e disperso, e com recursos administrativos limitados (humanos, técnicos, logísticos, financeiros...), comprometeu a legitimidade das lideranças africanas e criou dinâmicas de exploração, desconfiança e fragmentação social que perduraram para além da descolonização.
Vd. https://dre.tretas.org/dre/97412/decreto-lei-23228-de-15-de-novembro#anexos
(Fonte: Pesquisa: LG + IA/ChatGPT | Condensação, revisão / fixação de texto: LG)
Vd. https://dre.tretas.org/dre/97412/decreto-lei-23228-de-15-de-novembro#anexos
(Fonte: Pesquisa: LG + IA/ChatGPT | Condensação, revisão / fixação de texto: LG)
PS - Fernando, quanto ao significado e origem da palavra "quimbo"... "Quimbo" = bairro/aldeia indigena do centro de Angola; significa «no bairro» («ku imbo»); ficou em português: «quimbo». (Explicação dada no Ciberdúvidas da Língua Portuguesa, 4 de maio de 2000).
O dicionário Priberam diz que "quimbo" (ku imbo) vem do umbundo... Quem sou eu para discordar ? E parece fazer sentido: o umbundo é a língua falada pelos ovimbundos, povo originário do Planalto Central de Angola; é a língua banta mais falada em Angola. O vocábulo "sanzala" usa-se no norte, e "quimbo" no sul, como tu reconheces.
Quanto á "jóia da coroa", Angola ou Goa... Bom, refiro-me ao período do Estado Novo e ao tempo da guerra colonial... A Índia Portuguesa ficou definitivamente perdida em 1961...
De facto, originalmente, as colónias foram um um lugar de coerção e desterro (da Guiné a Timor, passando por Angola)...
Finalmente, o selo de 1901 é realmente exclusivo da Companhia (majestática) do Niassa (um estado dentro do estado, como se costuma dizer).
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Notas do editor LG:
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