sábado, 29 de junho de 2024

Guiné 61/74 - P25701: Os nossos seres, saberes e lazeres (634): Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (159): Na vila realenga de Belas, no termo de Sintra, já houve Paço Real, estamos perto da Venda Seca - 2 (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 13 de Março de 2024:

Queridos amigos,
Para falar francamente, não voltei a Belas só à cata dos fofos, a especialidade doceira da terra; depois da minha querida irmã ter sido vitimada por um AVC e viver num lar, procurava proporcionar-lhe passeios nas proximidades de Lisboa que lhe dessem satisfação, ela fora sempre uma andarilha, visitava amigas, adorava comboios e autocarros, o importante era sair de manhã e regressar a casa à noite. Já combalida, o cerimonial começava nos fofos de Belas com um galão, lá íamos de braço dado até à Quinta da Senhora da Assunção, havendo de bom tempo percorríamos lentamente o jardim. Em sua homenagem, da doce lembrança que dela guardo, por aqui andei em itinerância e do muito que gostei de ver achei que não era despiciendo partilhar convosco.

Um abraço do
Mário



Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (159):
Na vila realenga de Belas, no termo de Sintra, já houve paço real, estamos perto da Venda Seca – 2


Mário Beja Santos

Já aqui se referiu que a vila de Belas foi realenga, possuiu nos seus arredores importantes vestígios do passado romano e árabe, foi sede de concelho e este faz parte da União das Freguesias de Queluz e Belas, o seu interior possuiu um eixo diário com um tráfego intenso, andar pelos estreitos passeios requer extrema cautela. Quando se fala em vila realenga, os fundamentos são sólidos. Respigo de um artigo que encontrei na net o seguinte, tem a ver com uma notícia publicada em 23 de setembro de 1728 na Gazeta de Lisboa: "A Rainha Nossa Senhora, foi ontem a Belas com a Senhora Infanta D. Francisca ver o Senhor Infante D. Carlos". Tratava-se da Rainha D. Maria Ana de Áustria, mulher de D. João V. O infante D. Carlos, seu filho, encontrava-se doente e procurava alívio, no ambiente saudável de Belas. Faleceu em 1730, com 14 anos. O infante D. Manuel de Portugal, irmão de D. João V, nascido em 1696, viveu alguns anos em Belas onde faleceu em 1766, reinando D. José I, que o visitava com regularidade. Foi cabeça de Marquesado e Condado, adstritos aos Senhores de Pombeiro e Castelo Branco. D. Manuel I, aquando Duque de Beja, doou os rendimentos da igreja de Belas às freiras do convento daquela povoação.
É neste espaço cheio de história que se vai dar uma passeata.

Igreja Matriz de Belas, mais um templo religioso que conheceu transformações umas atrás das outras, do período manuelino resta a sua porta principal
Interior da Igreja Matriz de Belas, de uma só nave
Moradia a carecer de obras, mas guarda uma certa imponência que convinha que não se perdesse na requalificação. Eram assim as casas de férias ou de habitação permanente em tempos que já lá vão, quando a cidade ainda parecia longe, a região era considerada de ar puro e Sintra não está longe.
Em contraste, numa das artérias de maior trânsito em Belas, vemos como se reconstrói mantendo o traçado genuíno de muitas décadas atrás, virando à direita, como parece ser a direção daquele carro, pode-se caminhar para a Venda Seca ou para a Rinchoa. Fico especado a pensar que a Rinchoa tem uma bela casa-museu, a de Leal da Câmara, onde me apetece voltar.
Esta é uma das entradas da Quinta do Senhora da Serra, construção heterogénea, mas cheia de pergaminhos, é uma propriedade que remonta à fundação da nacionalidade, há ali marcas do gótico e arcarias ogivais, aí pelo século XIV, a Quinta, que também foi designada por Paço Real, era usada pela família real. As obras e transformações sucederam-se, desde o reinado de D. Manuel até ao século XVIII, os jardins aprimoraram-se. A Quinta é hoje propriedade particular, uma prestigiada agência imobiliária mostra um pequeno filme para quem quiser comprar estes muito hectares e a construção histórica.
Pormenores do interior da Quinta do Senhor da Serra, imagens retiradas do site promocional da Porta da Frente, a propriedade está à venda por 14 milhões
Um pormenor do muro que fala dos tempos muito idos
Outro pormenor da Quinta do Senhora da Serra, o casarão ao fundo é também de tempos muito idos
Um pormenor do muro da Quinta, possui um património florestal valioso, custa ver como todo este magnífico espaço sofre da poluição sonora do corrupio do trânsito, a CREL está lá ao fundo, todas estas vias que acedem ao interior do termo de Sintra são fustigadas por viaturas de toda a espécies, andar nas ruas estreitas de Belas não é convite para ninguém. Mas já estamos habituados a tudo, veja-se o que se passa com um troço importante do Palácio de Queluz, com o IC 19 à porta.

(continua)

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Notas do editor:

Post anterior de 15 DE JUNHO DE 2024 > Guiné 61/74 - P25642: Os nossos seres, saberes e lazeres (632): Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (158): Na vila realenga de Belas, no termo de Sintra, já houve Paço Real, estamos perto da Venda Seca - 1 (Mário Beja Santos)

Último post da série de 20 DE JUNHO DE 2024 > Guiné 61/74 - P25663: Os nossos seres, saberes e lazeres (633): viagem à China, de 1 a 12 de setembro próximo, com um cicerone de luxo, o nosso camarada António Graça de Abreu

3 comentários:

Fernando Ribeiro disse...

Quem deve conhecer Belas como a palma da sua mão deve ser o camarada Valdemar. A estrada que sai para a direita, na quarta fotografia, liga Belas aos seus "domínios". Do lado esquerdo, em frente à estrada, fica a Casa dos Fofos de Belas, que são realmente fofos e deliciosos, passe a publicidade. Por razões profissionais, eu ia frequentemente a Queluz, Sabugo e Almargem do Bispo. Percorri muitas vezes toda a região e, sempre que passava em Belas, parava para comer um fofo. Era irresistível.

A Quinta da Senhora da Serra, também chamada Quinta dos Marqueses de Belas, foi palácio real, porque o rei D. Pedro I, "O Justiceiro", a confiscou ao seu proprietário para seu próprio usufruto. É de facto muito antiga, mas eu não gostaria de viver agora nela, porque está quase por baixo da CREL, com todo o trânsito que nela passa.

Antigamente, a Serra de Monsanto, em Lisboa, era bastante escalvada, com trigais a ondular ao vento e moinhos nos seus cabeços. O ministro Duarte Pacheco decidiu arborizar esta serra com espécies autóctones da região, para fazer dela um parque florestal. Aonde foi ele buscar a vegetação que agora cobre Monsanto? A Belas. Ainda hoje se pode ver que a estrada que de Belas sai para Pero Pinheiro e Mafra é ladeada, no seu troço inicial, por frondosos arvoredos. Pois foi dessa mesma região que sairam as espécies vegetais que agora cobrem o Parque Florestal de Monsanto.

Valdemar Silva disse...

Beja Santos, conheço bem esses lugares, fica a dez minutos de minha casa e ia para lá frequentemente.
Na fotografia do "um pormenor do muro que fala dos tempos muito idos", ainda conheci o belo baixo relevo, não muito danificado, no muro com um tanque com peixes, à entrada do Paço.
Já não é do meu tempo, mas na parte da zona que servia de permanência das pessoas na Romaria ao Senhor da Serra ainda por lá andei a fotografar a "pedra alta da Idanha", antiga cúpula de uma anta, que, agora, as urbanizações fizeram desaparecer.
Assim era descrito as idas à Romaria do Senhor da Serra, em Belas.
"Nos finais do século XIX e começos do século XX, a romaria ao Senhor da Serra, foi uma das mais afamadas e concorridas que então ocorriam nos arredores de Lisboa. Esta realizava-se na localidade de Belas, no concelho de Sintra.
As festas tinham lugar na magnífica herdade do antigo Paço Real de Belas, a poucos quilómetros de Queluz. Este Paço integra uma capela do Senhor da Serra e a Via-sacra, constituindo estes os principais motivos de atracção dos romeiros.
A região é abundante em monumentos megalíticos, existindo no local um dólmen sobre cuja tampa se encontrava derrubada. Tinham por costume os romeiros escorregar sobre ela, tradição que sugeria a sobrevivência de ritos ancestrais ligados à fertilidade.
Terminada a romaria, os festeiros regressavam como podiam: de carroça e a pé ou de comboio, que tinham de o apanhar na gare de Queluz."

Agora, não posso sair de casa por causa do meu problema de saúde, e resta-me estas "Itinerâncias avulsas.." feitas por Beja Santos.

Saúde da boa
Valdemar Queiroz

Valdemar Silva disse...

Depois de publicar o comentário anterior é que reparei no que o nosso caro Fernando Ribeiro escreveu.
Julgo que a quinta é a Quinta do Senhor da Serra e sobre o D. Pedro I "O Justiceiro" confiscar
ao proprietário, assim reza a história:

"1334 - a quinta passa para a posse de Lopo Fernandes Pacheco, que a lega a seu filho Diogo Lopes Pacheco; 1364 / 1365 / 1366 - o rei D. Pedro I (proprietário da quinta por expropriação dos Pachecos) passa temporadas em Belas, procedendo mesmo à edificação de uma torre e outras construções na propriedade; 1367 - restituição por D. Fernando I a Diogo Lopes Pacheco dos seus bens, entre os quais se contava a quinta de Belas; 1398 - sob a acusação de traição Diogo Lopes Pacheco é expulso do reino e os seus confiscados pela coroa...."

Este Diogo Lopes Pacheco é um dos apontados no assassinato de Inês de Castro.
Também é curioso, o traçado a linha dos comboios para Sintra dar a volta por Agualva-Cacém, por não ser autorizado devido ao Paço e a outros palacetes que teriam de ser destruídos.
Mas Belas, que dizem assim chamar-se por ter "bellas árvores".
Talvez seja por isso, mas a quadra existentente também não ajuda a saber

Um dia fui a Belas
E em Belas eu as não vi
Porque a mais bela de Belas
Meu amor és ti.

Valdemar Queiroz