quinta-feira, 27 de junho de 2024

Guiné 61/74 - P25689: Humor de caserna (68): Passa-palavra, furriel Canhão à frente! (Alberto Branquinho)



Leiria > Monte Real > Palace Hotel > 26 de Junho de 2010 > V Encontro Nacional da Tabanca Grande > Sousa de Castro, o antigo 1º cabo radiotelegrafista (CART 3494, Xime e Mansambo, 1971/74), tentando comunicar com o Eduardo Campos, ex-1º cabo trms (CCAÇ 4540, Cumeré, Bigene, Cadique, Cufar e Nhacra, 1972/74), simulando uma situação de comunicação militar,  vulgaríssima, em operações no mato, com recurso ao velhinho Emissor / Receptor AVP1, o famoso"rádio-banana" (*).

Fotos (e legendas): © Sousa de Castro (201o). Todos os direitos [Edição e legendagem complementar : Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné] 

 

1. A comunicação humana parece fácil... mas não é. É uma das principais fontes de conflito, a nível das nações, das sociedades, das organizações, dos grupos, das famílias... E, então, nas redes sociais, é que pode ser mesmo um "bico de obra"...Podemos falar todos português, a mesma "língua", o que não quer dizer a mesma "linguagem"... Em suma, muitas vezes  a gente não se entende...

Comunicar (do latim, "communicare", que quer dizer "pôr em comum", "partilhar"...) é mais do que uma técnica: quem diz o quê a quem, por que meio, e com que efeitos...

A comunicação é uma "arte",  uma "competência", que se tem de se aprender, praticar, desenvolver... Tem muitas subtilezas e armadilhas... Não é só o "texto", é o "contexto"...

 Na tropa e na guerra, no nosso tempo, não faltaram as situações (umas trágicas, outras dramáticas, outras ainda caricatas) de incomunicação, total ou parcial. Às vezes até podia dar jeito à "tropa macaca" quando queria "acampar": por exemplo, as "transmissões não funcionavam" entre terra e ar...


Alberto Branquinho (n. 1944, Vila Foz Coa),
advogado e escritor, a viver em Lisboa desde 1970,
ex-alf mil, CART 1689 / BART 1913,
Fá, Catió, Cabedu, Gandembel e Canquelifá, 1967/69),
tem mais de 140 referências no nosso blogue:
é autor das notáveis séries "Contraponto"
e "Não venho falar de mim... nem do meu umbigo". 
Tem vários livros publicados, incluindo 
o "Cambança Final"  (2013).


2. O nosso Alberto Branquinho, no seu livro de contos "Cambança Final" (2013) tem uma dessas cenas de (in)comunicação "bem apanhadas", e que merece ser contada ... 

Mais uma vez, temos o privilégio de beneficiar do seu apurado sentido de humor e do seu talento como contador de histórias (**). 


 Passa-palavra, furriel Canhão à frente!

por Alberto Branquinho


Durante as operações militares a comunicação, entre o capitão, comandante de uma companhia e os quatro alferes responsáveis pelos pelotões, era feita através dos chamados rádios-banana: rádios pequenos, com cerca de um palmo de comprimento e cerca de cinco centímetros de espessura, previamente sintonizados e com regulador de som. As extremidades do rádio eram ligadas por uma correia de lona, extensível, que permitia pendurá-lo do pescoço, caído sobre o peito.

No entanto, quando era necessário passar uma mensagem ou uma ordem para retaguarda da coluna, era usada a transmissão homem a homem, o chamado "passa-palavra".

Tinham sido detetadas, na frente da coluna, terras recentemente movimentadas e folhagem caída, ainda fresca. O capitão entendeu dever chamar o furriel de minas e armadilhas, com o apelido Canhão.

− Passa-palavra, o furriel Canhão à frente !

A mensagem foi passando para a retaguarda:

− Furriel Canhão à frente...

− Furriel Canhão à frente...

E assim sucessivamente, homem a homem.

Passaram minutos e minutos. O capitão estava já impaciente, porque o furriel não vinha. Então surgiu a resposta, de trás para a frente:

− Canhão não veio... 

− Canhão não veio... 

− Não veio o canhão... 

− Canhão ficou no quartel!... 

Fonte:  Alberto Branquinho  - Cambança final: Guiné, guerra colonial:  contos. Vírgula, Lisboa, 2013, pp. 45/46

(Título, excerto,  revisão / fixação de texto, parênteses curvos, para efeitos de publicação deste poste, na série "Humor de caserna": LG)  (Com a devida vénia ao autor e à editora...)

___________

Notas do editor:


4 comentários:

Tabanca Grande Luís Graça disse...

O humor é uma coisa que nos faz muita falta... Há quem não tenha a mais pequena pitada de sentido de humor...Devíamos levar carradas de humor para a cova, porque no céu, e tanto quanto sabemos, é proibido contar anedotas... LG

Valdemar Silva disse...

Quando se encontrou com humoristas, o Papa deu a novidade que Deus também se ri.
E se assim for, guardo uma anedota pra lhe contar quando lá chegar: a célebre história do cão que só tinha uma perna.

Até lá, há aquela do transmissões que em vez de 'diga se ouve, escuto' trocou por 'diga se me escuta, oubo'.

Valdemar Queiroz

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Fico mais tranquilo, sabendo que Deus também se ri. O Papa dixit. Ou melhor o Valdemar dixit que o Papa dixit... Mesmo não acreditando no dogma da infalibilidade do Papa...e muito menos do Valdemar, que a estas horas está sozinho em casa com o filho, a neta e a nora nos Países ditos Baixos...(Era mais simples quando se chamavam Holanda, mas era um insulto para os neerlandeses que são não-holandeses.)

Valdemar Silva disse...

Luís, anteontem na consulta rotineira de pneumologia, no Hospital FF Amadora-Sintra, a minha médica no fim disse-me: você está na mesma. E nem valeu a pena de perguntar 'mas como é que eu estou?'

"...era simples quando se chamavam Holanda".
Vendo bem, a Holanda sempre se chamou Nederland, mas por causa da Companhia das Índias com sede em Amesterdão, na província da Holanda, passaram a ser conhecidos por Holandeses, com os ingleses a propagar a Holland, e os próprios holandeses por razões comerciais não se importaram com isso desde o fim do séc.XVI até há poucos anos.
Agora, também por razões comerciais e com um forte marketing para desenvolver o turismo, acabaram com o ser Holanda e passaram a ser Países Baixos (Nederland), pese embora já os frísios a norte e os brabantinos (brabanders) do sul, e de outras províncias, não se considerarem holandeses.
Por cá temos o caso do Vinho do Porto, ou do Oporto para os ingleses, não havendo vinhas na região do Porto, mas sim no Alto Douro.
Não sei se alguma vez houve correspondência entre alguém do Reino Unido e alguma Quinta no Alto Douro, p.ex. no Pinhão, com a direcção de Pinhão (Oporto) - Portugal.

Mas, julgo que o nome Países Baixos não vai ficar por aqui. O Reino dos Países Baixos, deve passar para Reino da Nederlanda e por fim simplesmente Nederlanda, só com uma palavra como praticamente todos os países. Até a República Checa. mudou para Chéquia simplesmente por que só Checa não soava bem.

Valdemar Queiroz