FERRÃO, João (Geógrafo, ICS/UL) – População. In: Dicionário de História de Portugal, suplemento, vol IX (Suplemento P/Z). (Coord. António Barreto e Filomena Mónica). Lisboa: Figueirinhas, 2000, pp. 127-133.
O Portugal onde nasceram, cresceram, amaram, casaram, viveram trabalharam e morreram os meus pais (Luís Henriques, 1920-2012, e Maria da Graça, 1922-2014) conheceu profundas mudanças, nomeadamente de natureza demográfica, epidemiológica, social, económica, política e cultural...
Foi a pensar neles, e na sua geração, que eu, nascido em 1947, publico agora estas notas de leitura do artigo de João Ferrão sobre Portugal, 1926-1974... O país que eu herdei... O país que herdámos...
1ª fase – 1926-40:
Portugal (1926-1974) – Dinâmicas sociais e populacionais
O Portugal onde nasceram, cresceram, amaram, casaram, viveram trabalharam e morreram os meus pais (Luís Henriques, 1920-2012, e Maria da Graça, 1922-2014) conheceu profundas mudanças, nomeadamente de natureza demográfica, epidemiológica, social, económica, política e cultural...
Foi a pensar neles, e na sua geração, que eu, nascido em 1947, publico agora estas notas de leitura do artigo de João Ferrão sobre Portugal, 1926-1974... O país que eu herdei... O país que herdámos...
Crescimento natural (fecundidade, natalidade, mortalidade…);
Movimentos migratórios (internos e externos);
Factores endógenos e exógenos;
Mudanças conjunturais e estruturais;
Três fases, um período longo: 1926/74: consolidação dos padrões demográficos modernos: processo de transição demográfica > de longo ciclo de taxas de natalidade e mortalidade elevadas (> 30 por mil e 20 por mil, respetivamente) para um outro (c. 10 por mil);
Passagem de uma sociedade rural, pré-moderna, de economia fechada, fracamente monetarizada, para uma sociedade industrializada, de economia aberta (adesão à EFTA, 1959) e desenvolvimento urbano;
A transição demográfica coincide também com o fim do ciclo da emigração transcontinental (“Novo Mundo”: Brasil, EUA) e substituição por um outro, o da emigração europeia (França, Alemanha)
1ª fase – 1926-40:
Início da quebra das taxas de natalidade e mortalidade, fim de ciclo emigratório (“Novo Mundo”), contexto adverso à emigração (crise internacional de 1929, guerra civil de Espanha, início da II Guerra Mundial, em 1939)
2ª fase – 1941-50:
Recuperação das taxas de natalidade, crescente papel polarizador de Lisboa em relação ao êxodo rural, suburbanização, economia nacional fechada e corporativa;
3ª fase – 1951-74:
Consolidação das tendências demográficas modernas, irreversível processo de transição demográfico, no contexto de novo ciclo emigratório (continental), abertura da economia ao exterior, industrialização (plano de eletrificação do país, barragem de Castelo de Bode, 1950; EFTA, 1951); guerra colonial; crise do petróleo de 1973; 25 de abril de 1974; duplo retorno (emigrantes europeus e população das colónias africanas).
1926-1940
Situação anterior (início do sec. XX): das mais elevadas taxas de natalidade, mortalidade e emigração na Europa; Rio de Janeiro, a "segunda cidade portuguesa"; centralidade do setor primário e da ruralidade;
Portugal, 1930: 6,8 milhões de habitantes; 1940: 7,7 milhões (a taxa acréscimo anual de 12,8 por mil, na década de 1930) > quebra acentuada da taxa de mortalidade, entraves à emigração (Brasil, EUA), êxodo rural para os centros urbanos – Lisboa e Porto);
a partir de 1927, inflexão das taxas brutas de natalidade ( < 30 por mil), embora regionalmente desigual; reflexos na fecundidade: o nº de filhos por mulher fértil passa de 3,8 em 1930/31, para 3,1 em 1940/41;
o declínio da taxa de mortalidade inicia-se em meados da década de 1920 (dos 20 por mil para os 12-13 por mil ao longo dos anos 40); aumento da esperança de vida (que em Portugal rondava os 50 anos); melhorias sanitárias e ambientais no combate à 1ª causa de morte (doenças infecciosas e parasitárias):
mantem-se a mortalidade infantil acima dos 100 por mil;
transição epidemiológica, historicamente associada à transição demográfica (vd. 3ª fase);
redução da emigração, devida à crise internacional e às restrições dos EUA (anos 20) e Brasil (anos 30); durante 20 anos (décadas de 1930 e 1940) emigram apenas 200 mil pessoas, 4 vezes menos do que no período anterior… 80% para o Brasil: reunificação familiar, origem norte e centro; fim do ciclo emigratório transcontinental;
acentua-se o processo de êxodo rural/atração interna; deslocamentos temporários ou sazonais (‘ranchos’, 100 mil trabalhadores sazonais em 1957), e deslocamentos definitivos (, mecanização da agriculturaarroteamento de charnecas no sul, “colonização interna”: foi criada, em 1936, a Junta de Colonização Interna: (...) "era um organismo com personalidade jurídica, de funcionamento e administração autónomos; (...) incumbia-lhe a execução dos planos de colonização interna; (...) pelo Decreto-Lei nº 27:207, de 16 de novembro de 1936, (...) tinha, nomeadamente, as seguintes competências: (i) tomar conta dos terrenos que lhe foram entregues pela Junta Autónoma das Obras de Hidráulica Agrícola, instalando nesses casais agrícolas; (ii) promover a constituição de associações e regantes e a instalação de Postos Agrários; (iii) efectuar o reconhecimento e estabelecer a reserva dos terrenos baldios do Estado; (iv) proceder à aquisição de terrenos para colonização; (v) estudar o regime jurídico a que devia obedecer a concessão de glebas.")
Lisboa polariza 60% dos movimentos internos (Porto, 17%): orientação para a cidade e para atividades não agrícolas (indústria, serviços); início do processo de suburbanização (sobretudo Grande Lisboa, margem norte do Rio Tejo):
Aprofundamento das tendências anteriores;
Vd. também Graça, L. (1999) - Evolução Histórica da Legislação Portuguesa sobre a Saúde e o Trabalho, no Contexto do Processo de Modernização do País: 3. O período de 1926-1974: A modernização bloqueada. [Em Linha]. Página pessoal, Saúde e Trabalho. [Consult em 17 de junho de 2015]. Disponível em http://www.ensp.unl.pt/luis.graca/historia1_legis1926_1974.html
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Nota do editor:
Último poste da série > 25 de novembro de 2015 > Guiné 63/74 - P15408: Manuscrito(s) (Luís Graça) (70): O Alzheimer da história
1941/1950
Luís Henriques, expedicionário em Cabo Verde (1941/43). Foto de LG |
Aprofundamento das tendências anteriores;
Aproximação tendencial aos padrões demográficos dos países europeus mais desenvolvidos;
Portugal, 1950: 8,7 milhões (desaceleração do crescimento demográfico);
Disparidades regionais, norte/sul, litoral (Lisboa/Porto) / interior;
Lisboa e Porto: taxas de natalidade ainda relativamente elevadas e taxas de fecundidade mais baixos do que no resto: comportamentos demográficos mais modernos, urbanização, abertura ao exterior, feminização da mão de obra… Lisboa: 1,79 filhos por mulher em idade fértil (valor que só ocorrerá em 1982 para o conjunto do país…);
Desaceleração da taxa bruta de mortalidade, a partir de 1943; 12-13 por mil ao longo da década;
Declínio da mortalidade infantil (< 100 por mil, na maioria dos distritos), por razões endógenas e exógenas; transição epidemiológica ainda tímida nesta década;
Esperança média de vida aproxima-se agora dos 60 anos;
Aumento da clivagem norte/sul (por ex., aumento da população no norte; diminuição no sul; taxas de fecundidade, mortalidade infantil e mortalidade elevadas no norte, baixas no sul…); recessão demográfica no Alentejo depois dos arroteamentos das charnecas e da campanha do trigo (anos 30); norte e centro litoral beneficiam de fatores conjunturais: (i) retorno do Brasil e dos EUA; (ii) “boom” do volfrâmio e do têxtil e calçado com a II Guerra Mundial;
Contenção da quebra da taxa de natalidade (c. 25 por mil) entre 1940 e 1960, nos distritos do norte e ilhas, deve-se à contenção da emigração;
Lisboa polariza 75% dos movimentos internos (12%, o Porto); movimentos internos particularmente significativos no sul;… mas Lisboa capta apenas c. 48% do êxodo rural;
Crescente litoralização do país;
1951-1974
Lourinhã, 1947 > Luís Henriques e Maria da Graça, com o seu primeiro filho, de quatro filhos. O primogénito tem, 2 filhos. Foto: LG |
Confirma-se definitivamente o declínio das taxas de natalidade e mortalidade;
Em 1950 e 1974 Portugal tem a mesma população: c. 8,5 milhões. 9 milhões em 1960; perde pela primeira vez população desde que existem contagens de âmbito nacional (ou seja, de há 3 séculos): crescimento médio anual de 12,8% na década de 1930, 9,3% na década de 1940, vai desacelerar: 4,4% na década de 1950, e – 3,3% entre 1960 e 1970…
Novo ciclo de emigração (para a Europa, mas também colónias de África…) leva à queda da natalidade (menos de 20 por mil no final desta fase) e da fecundidade… menos 250 mil residentes entre 1960 (8,9 milhões) e 1970 (8,6 milhões);
Tendências para o “envelhimento” (ainda não é a “revolução grisalha”, que começa a preocupar, nos anos 70, alguns países europeus): (i) envelhecimento na base (peso decrescente dos com 14 anos ou menos no conjunto da população); (ii) redução da população ativa (15-64); e (iii) mesmo envelhecimento no topo da pirâmide (aumento dos idosos com 65 ou mais, a partir do início da década de 1970);
Transição da família alargada tradicional para a família nuclear moderna;
Esperança média de vida: 65 anos;
Consolidação definitiva do processo de transição epidemiológico: as doenças cérebro-vasculares ocupam agora o 1º lugar nas causas de morte; a mortalidade infantil detém agora um peso menor no conjunto da mortalidade;
Transição facilitada pelo êxodo rural (migrações externas e internas), melhoria da alimentação, da assistência médica e hospitalar, das condições de vida e de trabalho;
Luís M. Graça Henriques (n. 1947). Psssou pelo TO da Guiné (1969/71). Casado, tem 2 filhos. Foto de LG |
População portuguesa em África, em 1940, muito baixa: 44 mil (Angola); 27500 (Moçambique); no final dos anos 40, fluxo anual médio, para o Ultramar, é já de 12 mil; atinge os 25 mil no período de 1965/63… Em 1960: c. 173 mil pessoas de origem europeia em Angola; 97 mil em Moçambique… Política de povoamento a partir de 1961 (início da guerra colonial em Angola)…
A França, a partir de 1957, é o principal destino da emigração… Em 15 anos (1960/74) parte 1 milhão, legal ou ilegalmente, para a França, Alemanha e outros países da Europa. Paris é "a segunda cidade portuguesa";
A clivagem norte/sul é agora substituída pela oposição litoral/interior; a Grande Lisboa polariza agora 85% dos movimentos internos… Mas só c. 16% do êxodo rural se encaminha para a área de Lisboa.. Um em cada cinco portugueses habita na Grande Lisboa, no início dos anos 70…
Litoralização (70%), urbanização (27%), metropolitanização (Lisboa: 22,8%; Porto: 11,5%)… Causa e consequência dos processos de transição demográfica, familiar e epidemiológica, a par dos movimentos migratórios (internos e externos)…
Evolução das taxas de população ativa empregue na agricultura: 50%/45% (entre 1930 e 1960); 41,2% (em 1960), 29,8% (em 1970)…
(LG)
________________________Vd. também Graça, L. (1999) - Evolução Histórica da Legislação Portuguesa sobre a Saúde e o Trabalho, no Contexto do Processo de Modernização do País: 3. O período de 1926-1974: A modernização bloqueada. [Em Linha]. Página pessoal, Saúde e Trabalho. [Consult em 17 de junho de 2015]. Disponível em http://www.ensp.unl.pt/luis.graca/historia1_legis1926_1974.html
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Nota do editor:
Último poste da série > 25 de novembro de 2015 > Guiné 63/74 - P15408: Manuscrito(s) (Luís Graça) (70): O Alzheimer da história