sábado, 13 de janeiro de 2018

Guiné 61/74 - P18209: Fotos à procura de... uma legenda (98): Adivinhem quem vem almoçar à Tabanca da Linha, 5ª feira, dia 18?... Será um grupo coral alentejano? Alguns "meninos da Linha" já se começaram a queixar, ao régulo e seu adjunto, que a Tabanca está-se a tornar numa grande "bandalheira"...


Foto sem legenda: Alguns virão ao 35.º almoço-convívio da Magnífica Tabanca da Linha (*), dizem-nos... Mas a foto é intrigante e há várias hipóteses de resposta:

a) um grupo coral alentejano junto à Casa do Cante;
b) um grupo excursionista e jantarista da raia espanhola;
c) uma turma da universidade sénior de Freixo Espada à Cinta;
d) um bando de turistas nórdicos fotografados junto ao Padrão dos Descobrimentos, em Belém;
e) fãs do escritor Zé Ferreira de Catió;
f)  os últimos sobreviventes portugueses da batalha de La Lys
g) representantes sindicais dos lenhadores do pinhal de Leiria;
h) delegação dos que viviam "para lá do Marão" antes da abertura do túnel, e que vieram a Lisboa protestar porque "já não mandam os que lá estão";
i) foliões do Carnaval de Torres Vedras, candidatos ao Panteão Nacional;
j) grupo de ex-combatentes da guerra colonial na véspera de embarque para a Guiné, em viagem de turismo de saudade;
k) os mais jovens frequentadores do café mais velho da cidade;
l) simplesmente um bando de bandalhos... (des)alinhados.

Alguns "meninos da Linha" já se queixaram ao régulo (e seu adjunto) que a Tabanca se  está a tornar numa grande "bandalheira" (**)... A resposta do Jorge Rosales, coadjuvado pelo Manuel Resende, só podia ter sido  a mais politicamente correta possível: "Meninos da Linha, não sejam sulistas e elitistas. A Tabanca quando nasceu, foi para todos!"...

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Guiné 61/74 - P18208: Convívios (836): Já são 62 os ' magníficos' inscritos para o 35º almoço-convívio da Tabanca da Linha, 5ª feira, dia 18, em Algés, no restaurante "Caravela de Ouro". Cinco vêm do Porto, cinco gloriosos "bandalhos"!... O prazo de inscrição termina 2ª feira, 13 (Manuel Resende)


Magnífica Tabanca da Linha > Foto de grupo do 30º  almoço-convívio em 

35.º almoço-convívio > Algés, 5ª feira, dia 18/1/2018 > Lista provisória dos inscritos


Destaque para os cinco "bandalhos", do glorioso Bando do Café Progresso, Porto (régulo: Jorge Teixeira)
1. Mensagem de ontem ao fim da tarde, do nosso régulo Manuel Resende, publicada na página do Facebook da Magnífica Tabanca da Linha (que tem 88 membros registados):

Amigos Magníficos, depois de publicar o convite para o 35.º Convívio da Magnífica Tabanca da Linha, publico a seguir a lista dos já inscritos até este momento. 

Já somos 62. Esperamos chegar a 70. Veremos, pois ainda faltam muitos que não costumam falhar. Qualquer alteração, digam.

Manuel Resende


2. Informações:

Preço por boca - 20 "morteiradas"  (crianças dos 5 aos 10 anos pagam metade)
Restaurante "Caravela de Ouro"

Localização:
Alameda Hermano Patrone, 1495 Algés (Jardim de Algés, junto à marginal)

Inscrições até às 24 horas do dia 15, 2ª feira,  para os régulos:

Jorge Rosales 914 421 882 - jorge.v.rosales@gmail.com

Manuel Resende 919 458 210 - manuel.resende8@gmail.com

ou dizendo "vou" ao convite do Facebook no nosso grupo.
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Nota do editor:

Último poste da série >  > 9 de janeiro de 2018 > Guiné 61/74 - P18194: Convívios (835): Vai realizar-se no próximo dia 18 de Janeiro mais um convívio da Magnífica Tabanca da Linha, no Restaurante "Caravela de Ouro", em Algés (Manuel Resende)

Guiné 61/74 - P18207: Os nossos seres, saberes e lazeres (248): À sombra de um vulcão adormecido (3) (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70) com data de 1 de Novembro de 2017:

Queridos amigos,
Estadia mais frutuosa não podia haver. Amigo há várias décadas de Mário Reis, o combativo secretário-geral da ACRA - Associações dos Consumidores da Região Açores, recebi com ambas as mãos o convite que me endereçou para passar um tempo numa casa de família, no Vale das Furnas. Dali só saí para ir a Ponta Delgada visitar uma comadre e fazer uma brevíssima romagem de saudade por alguns dos locais frequentados 50 anos atrás.
Apanhei bom e mau tempo, sol e neblina, os calores de várias estações do ano, o importante era uma varanda vidrada com vista para os prados e para as cumeeiras, acrescentando-se o mugir das vacas ao quadro bucólico. E fica-se naquela varanda a contemplar um quadro de uma região que é, toda ela, um geoparque, uma preciosidade nascida de um acidente vulcânico habitado por povoadores que adubaram o misticismo e a curiosidade de conhecer mundo, basta pensar em Antero de Quental e Bento de Góis, o importante missionário que chegou à China.
Nunca dá para cansar o deslumbramento açoriano.

Um abraço do
Mário


À sombra de um vulcão adormecido (3)

Beja Santos

O viandante chegou em Outubro de 1967 a esta terra abençoada pela bagacina e pedra vulcânica. Muito se surpreendeu pelas estradas flanqueadas por plátanos, perguntou a alguém que planta era aquela que se espalhava pelos declives, aprendeu o que era a conteira, uma infestante. Numa fase mais adiantada de iniciação açoriana aprendeu a distinguir a criptoméria. E se aqui se fixa camélias amarelas, em pleno Outubro, depois habitou-se a vê-las pelo Outono a desabrochar em tons vermelhos e brancos, é porque se manteve incrédulo, visto à distância até lhe parecia hibisco, valha-nos a ignorância, mas é assim que se aprende. Camélias a receber-me no Vale das Furnas!



Era 19 de Outubro, data de nascimento da filha mais nova do viandante, falecida em 2009. Entrou na igreja de Nossa Senhora da Alegria para fazer as suas encomendas, apontando-as às estrelas. É nisto que dá de face com este vitral, a exaltação do nascimento, calou-lhe fundo a associação imaginada, nesta e noutras coisas o viandante é pouco virado para os milagres, visões a aparições, embora acredite que é possível receber sinais. Haja alegria!



Estamos agora na Poça de D. Beija, apresentada como espaço de correio e de relaxamento, tendo mesmo uma mística especial. O que para o caso interessa é o deslumbramento da água férrea, fluído contínuo, sabe bem estar em decúbito dentro de águas a uma temperatura média de 39 graus, encostar a coluna à torrente, um arremedo de talassoterapia, assim se passam as horas e o corpo agradece. Repare-se na segunda imagem duas hidrângeas em flor, como se contempla assim a água em cascata.


Já se tirou esta fotografia, largos meses atrás, na primeira viagem comemorativa do cinquentenário do achamento de S. Miguel. Desta feita até se conversou com a proprietária do estabelecimento, ela tem muito orgulho neste espavento de cestos coloridos, tudo à disposição de furnenses e turistas, é uma bela atração vegetal, ali a escassos centímetros daquele belo pavimento de pedra acinzentada, não acham?



Um tanto a despropósito, quer recordar-se a quem nos lê que se cumpriu a tradição, comeu-se cozido, aqui nas Furnas tem chancela de monumento nacional. As coisas passam-se assim: as panelas que resguardam as carnes e os vegetais do cozido são ensacadas e enterradas em solo geotérmico, segue-se uma cozedura de cerca de 5 horas, e o resultado é um cozido totalmente distinto do que se come no continente. Mas não se vai agora falar em cracas, nem nos bifes, nem nos filetes de abrótea, nem nas alcatras de peixe, nem nas queijadas, quanto muito deixa-se uma referência ao bolo lêvedo, daqui originário, um bolinho preparado na sertã, uma delícia com compota ou manteiga. Voltemos à natureza. O que aqui se vê é o que é possível ver do jardim da D. Beatriz do Canto que no século XIX era conhecido por Parque das Murtas, localiza-se junto do leito da Ribeira das Murtas. O parque é visitável em Agosto, ao todo 3,7 hectares. Isto que se mostra é o que se pode ver fora de Agosto. É muito pouco mas é muito belo.



As caldeiras merecem uma visita obrigatória, não há ninguém que não se impressione com estas fumarolas de água fervente, aqui se fez termalismo usando lamas medicinais e águas. É ponto obrigatório, tal como as caldeiras da Lagoa das Furnas, nesta é que se prepara o cozido. Os turistas que aqui arribam veem um pouco da lagoa, inexplicavelmente não chegam a visitar a Ermida de Nossa Senhora das Vitórias nem a Mata-jardim José do Canto, ao tempo um caso exemplar de empreendedor agrícola, sempre na vanguarda; há passeios pelo Parque Terra Nostra, com abundante flora, com uma espantosa coleção de fetos, conhecido no mundo inteiro pela sua coleção de camélias, rododendros e a flora endémica nativa dos Açores; e finalmente as caldeiras, acreditem que é um passeio incomparável. Por aqui o viandante andou à solta e daqui partiu com a noite escura.


Quem vem ao Vale das Furnas não deve perder a oportunidade de visitar o Observatório Microbiano dos Açores, que se apresenta como um centro de divulgação científica e tecnológica, está instalado no antigo chalé, seguramente que aqui se fazia termalismo, olhe-se para a cor desta banheira e tenham-se ideias positivas que nela emergiram doentes e que imergiram com muito mais conforto. Ninguém deu uma explicação satisfatória ao viandante por que estas termas perderam uso quando no passado tiveram tanto prestígio.

(Continua)
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Nota do editor

Último poste da série de 6 de Janeiro de 2018 > Guiné 61/74 - P18181: Os nossos seres, saberes e lazeres (247): À sombra de um vulcão adormecido (2) (Mário Beja Santos)

Guiné 61/74 - P18206: Historiografia da presença portuguesa em África (106): O atlas da Guiné, de 1914 (Armando Tavares da Silva)





Guiné > Atlas de 1914 (esboço) > Escala 1/1 milhão


Cortesia do prof Armando Tavares da Silva, nosso grã-tabanqueiro,  autor de “A Presença Portuguesa na Guiné, História Política e Militar (1878-1926)” (Porto: Caminhos Romanos, 2016, 972 pp.)


1. Mensagem de Armando Tavares da Silva, com data de 4 do corrente:

Caro Luís Graça,

O Post P18170 do Grã-Tabanqueiro Cherno Baldé, fez-me apressar o envio da carta da “Província da Guiné”, inserta no Atlas Colonial Português da Comissão de Cartografia do Ministério das Colónias, de 1914. Esta carta, que tem 100 anos, ajuda a conhecer as mudanças que sofreu a toponímica da Guiné.

Para além da imagem de toda a carta (ocupa 2 páginas e tem a dimensão de 43 x 32 cm), envio ainda a mesma carta mas dividida em quatro partes para melhor identificação das povoações.

Uma das povoações que nela figura é Gam Sancó, povoação que não figura nas cartas mais recentes. Esta povoação figurava também nas cartas da Comissão de Cartografia de 1889 e 1906, e ainda no atlas de João Soares (*), que teve várias edições nos anos 1940, e era utilizado no ensino liceal. [...]

 Abraço do

Armando Tavares da Silva

Guiné 61/74 - P18205: Parabéns a você (1374): Maria Ivone Reis, ex-Capitão Enfermeira Paraquedista (1961/74)

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Nota do editor

Último poste da série de 10 de Janeiro de 2018 > Guiné 61/74 - P18196: Parabéns a você (1373): Bernardino Parreira, ex-Fur Mil Inf da CCAV 3365 e CCAÇ 16 (Guiné, 1971/73)

sexta-feira, 12 de janeiro de 2018

Guiné 61/74 - P18204: Historiografia da presença portuguesa em África (105): O atlas da Guiné, de João Soares, que teve várias edições nos anos 40 do séc. XX e era usado no ensino liceal (Armando Tavares da Silva)







Guiné > Atlas de João Soares (c. 1940) > Escala: 1/2 milhões. Teve várias edições nos anos 40 e era usado no ensino liceal. 

Cortesia do prof Armando Tavares da Silva, nosso grã-tabanqueiro, especialista da história da Guiné no período que vai de 1878 a 1926, abarcando o essencial das "campanhas de pacificação". 




Capa do livro de Armando Tavares da Silva. “A Presença Portuguesa na Guiné, História Política e Militar (1878-1926)” (Porto: Caminhos Romanos, 2016, 972 pp.)

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Nota do editor:

Guiné 61/74 - P18203: Notas de leitura (1031): Os Cronistas Desconhecidos do Canal do Geba: O BNU da Guiné (17) (Mário Beja Santos)


Escola Missionária de Bolama


1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 4 de Outubro de 2017:

Queridos amigos,

Este documento é intencionalmente extenso, não conheço melhor comprovante, relatório tão meticuloso e protesto quase virulento, como este.
Trata-se de responder ao governador do BNU sobre uma alegada revolta de Felupes que ocorreu em Novembro de 1933, fruto da queda de um avião francês, que se presumia ter acontecido na região de Susana. O que aqui se expõe,  demonstra de forma eloquente que era precária a posição portuguesa em toda aquela região, cambiava a violência, não se pagava o imposto de palhota, cortavam-se cabeças por tudo e por nada. É um episódio tão impressionante que o historiador René Pélissier lhe dedicará inusitada atenção, como veremos mais adiante.

Um abraço do
Mário


Os Cronistas Desconhecidos do Canal do Geba: O BNU da Guiné (17)

Beja Santos

O ano de 1933 vai ser dominado pela chamada revolta dos Felupes. Em 10 de Novembro desse ano o BNU sede envia o seguinte telegrama:

“Este telegrama é absolutamente confidencial e só poderá ser decifrado pelo gerente devendo na sua ausência ser devolvido indecifrado ao expedidor – telegrafe se o gentio se revoltou – telegrafe se ordem restabelecida quem e como foi sufocada alteração. Telegrafe as notícias que puder pormenorizando. Este telegrama é absolutamente confidencial para toda e qualquer pessoa seja como for a sua categoria.

A 13, por carta talhada, o gerente de Bissau escreve ao governador relativamente à revolta dos Felupes:  

“Há cerca de três meses levantou voo de Dakar, com destino a Ziguinchor, um avião francês tripulado pelo aviador Gatti, acompanhado de um observador.

Por qualquer razão desconhecida – diz-se que fugindo a um tornado, o avião desviou-se da sua rota e presume-se que por falta de gasolina tenha caído em território desta colónia, a uns 40 ou 50 quilómetros da fronteira Norte, na região dos Felupes, área do posto civil de Susana, circunscrição de Canchungo.

O governo francês, supondo que o avião tenha de facto caído nesta região, solicitou do nosso que mandasse proceder às necessárias pesquisas. Diz-se que essas pesquisas foram efetuadas sem resultado. Há 20 dias, pouco mais ou menos, apareceram na área do posto de Susana a mulher do aviador desaparecido e uma outra senhora francesa acompanhadas de um sargento aviador francês e ainda de um outro indivíduo que se dizia comerciante de Dakar, para fazerem, por sua vez, novas pesquisas.

O administrador da circunscrição não consentiu nessas diligências sem autorização superior, e essa equipa francesa foi a Bolama conferenciar com o governador, regressando ao posto de Susana acompanhada pelo ajudante de campo deste.

Em breve começaram a circular boatos sobre o aparecimento de vestígios do avião e dois ou três dias depois seguia também para Susana o Diretor dos Serviços e Negócios Indígenas, Capitão Velez Caroço. Afirma-se que este oficial, depois de iniciadas novas pesquisas, notando certo retraimento do gentio, receando qualquer agressão dos Felupes (gentio da região) que desde sempre se tem mantido mais ou menos rebelde, pagando o imposto positivamente quando e como quer, sem que lhes tenha sido aplicado o corretivo necessário por falta de recursos, cobardia ou desleixo, resolveu de acordo com o governador, não continuar as suas diligências sem se fazer acompanhar de uma pequena força militar.



No dia seguinte ao da ida daqueles oficiais a Bolama, regressaram a Bissau com um pequeno contingente, e daqui partiram de novo para Susana, armados e municiados. Os Felupes receberam-nos hostilmente, travando-se um combate em que morreram dois soldados, ficando vários feridos. O facto foi comunicado ao governador, seguindo imediatamente para o local, com reforços, o Capitão Sinel de Cordes, comandante da polícia. Chegado este a Susana, e posto ao corrente do que se tinha passado, entendeu, e muitíssimo bem, que era preciso castigar energicamente os revoltosos, tanto mais que já o ano passado, na mesma região, tinham cortado a cabeça a cinco soldados, presumindo-se que outro tanto tivessem feito aos tripulantes do avião desaparecido.

O Capitão Sinel de Cortes veio a Bissau conferenciar com o governador, no dia 4 do corrente, e no dia seguinte regressava a Susana com mais reforços, sendo expedidas ordens para de Bolama virem todos os oficiais e soldados disponíveis que aqui chegaram cerca de meia-noite desse dia, seguindo ato contínuo por via marítima para a região revoltada.

Entretanto, era mandado chamar o nosso [, do BNU,] chefe dos contínuos, Bora Sanhá, alferes de 2ª linha, com bons serviços prestados em anteriores campanhas, para se lhe ordenar que organizasse o mais rapidamente possível um grupo de irregulares Fulas, com o fim de coadjuvarem com as tropas regulares na ação decisiva que o momento impunha contra os Felupes. Poucas horas depois, Bora Sanhá escolhia 100 homens da sua confiança, alguns deles seus antigos companheiros de armas, dos 300 que se lhe ofereceram, depois de armados e municiados, embarcaram para Jufunco (povoação revoltada). Ao mesmo tempo, foram expedidas ordens para em Bambadinca serem mobilizados mais 200 irregulares Fulas, também comandados pelo Tenente de 2.ª Linha Bonco Sanhá, primo de Bora, um dos quais foi a Lisboa o ano passado, à Exposição Industrial.

Corriam os mais desencontrados boatos sobre o que se estava a passar com os Felupes. Dizia-se que aos aviadores desaparecidos tinham sido cortadas as cabeças, operação de especial simpatia dos Felupes, para, depois de descarnadas por elas beberem vinho de palma com sangue de galinha, como manda o ritual.

Tinham sido mortos dois soldados nossos e feridos outros, em combate; foram mandados para a região revoltada, todos os soldados disponíveis, 100 ou 120; mobilizaram-se irregulares, etc; mas as autoridades, guardando uma reserva que nada justifica, a nosso ver, informavam que nada se passava de anormal, que se tratava de um simples caso de polícia! O Capitão Sinel de Cortes assumiu o comando de regulares e irregulares, ao tudo cerca de 400 armas e cinco metralhadoras, começando a bater os revoltosos com a energia que o momento impunha. Os revoltosos, porém, batidos mas não derrotados, refugiavam-se entre pântanos de onde era difícil desalojá-los por falta de artilharia, visto estarem fora do alcance das metralhadoras e espingardas, fazendo pequenos ataques de guerrilhas, dizimando dezenas de auxiliares. A região é muito pantanosa e portanto moroso o avanço das nossas forças.

O governador seguiu para o campo de operações, e durante quatro dias estivemos, em Bissau, sem quaisquer notícias. Sua Excelência regressou a esta cidade em 11, à noite, e no dia seguinte, aproveitando o convite que nos fez para irmos falar, tivemos ocasião de trocar impressões sobre o que se passava com os Felupes.

Disse-nos que, apesar das grandes dificuldades de avanço das nossas tropas, o gentio, desalojado, se tinha posto em fuga, sofrendo importantes baixas; resolvera dar por findas as operações, deixando apenas na região uma pequena força para policiamento, visto que os acontecimentos não tinham a gravidade que se lhes atribuía; que se tratava apenas de um caso de polícia, já solucionado, e que se iniciaria uma política de atração do indígena, que se deve ter refugiado no território francês, criando-se para início dessa política, a circunscrição civil de S. Domingos, que abrangerá toda a região dos Felupes.

Ao senhor Ministro das Colónias devem ter sido prestadas outras informações mais claras e precisas, pois nós julgamos saber que a situação de Susana, conquanto não seja grave, é, todavia, um tanto melindrosa. As nossas tropas, à custa de sacrifícios grandes, têm efetivamente avançado e arrasado todas as povoações por onde têm passado, incendiando as palhotas e destruindo as culturas, dizimando os revoltosos sem contudo os derrotar.

A revolta, que teve início na tabanca (povoação indígena) de Jufunco, estendeu-se a outras povoações, como Egino, Bolor e Lala, engrossando, consequentemente, o número dos rebeldes, que a princípio se calculavam entre 1500 a 2000, número que hoje deve ser muito mais elevado, oferecendo mesmo poucas garantias toda a região dos Felupes. 

A ação das nossas tropas está longe, muito longe mesmo, segundo as informações que temos, de se poder considerar decisiva. Ainda nos últimos dias foi assaltada pelos rebeldes uma camioneta que conduzia auxiliares, escapando, por milagre, o condutor do carro; aos outros foi a todos cortada a cabeça e membros, e os troncos decapitados deixados na estrada, alinhados, numa demonstração de ameaça e requintada selvajaria. As cabeças foram levadas para, consoante o uso, servirem de taças.


Bolama- Interior de uma escola

É curioso notar, e convém não esquecer para melhor se poder aquilatar do caso de polícia em questão, que, até hoje, as nossas tropas não conseguiram ver nem uma mulher nem uma criança. Quer isto dizer que o gentio está perfeitamente decidido a tudo e disposto a combater até ao fim. O gado também desapareceu, na sua quase totalidade, o que não é menos significativo. Só por manifesto desconhecimento dos usos e costumes gentílicos se poderá atribuir significado diferente a estes detalhes. O senhor governador, porém, resolveu, e possivelmente com muito acerto, mandar recolher as tropas em operações, deixando na região revoltada, porventura batida mas não derrotada – não é demais frisá-lo – um destacamento de polícia.

Não desejamos comentar esta medida governamental, porque isso não está na nossa índole, nem temos fundamento bastante para considerar desastrosa a ordem de retirada. Não percebemos nada de assuntos militares, nem dos altos problemas de administração ou de política indígena e muito menos de política internacional.

Mas, talvez justamente por isso, permitimo-nos discordar absolutamente – perante V. Exa., nesta carta confidencial –, da atitude assumida pelo senhor governador. A saída das nossas tropas da região revoltada sem ter infligido um exemplar castigo aos revoltosos é desprestigiante e será, necessariamente, mal interpretada pelos vizinhos franceses, que estabeleceram postos militares ao longo da nossa fronteira, guarnecidos por tropas senegalesas rapidamente transportadas para lá em camiões e bicicletas, como fomos informados.

Sabe-se que em Ziguinchor um francês que acompanhou as duas senhoras a que atrás fizemos menção ao referir-se à nossa ação nas pesquisas do avião desaparecido nos alcunhou de cobardes. Talvez tenha sido por isso que o Capitão Sinel de Cordes, calmo e sereno, mas decidido, tivesse tido a intenção de acabar de vez, com a lenda dos Felupes, lenda que tem custado a vida a soldados e auxiliares indígenas”.

Nunca até agora me fora dado ler documento tão contundente e exposição tão pormenorizada de gerente para governador do BNU. Fala-se em vergonha, na arrogância Felupe que no ano anterior tinham feito sofrer um revés na mesma região às nossas tropas, cortando cabeças, era completamente incompreensível deixar os Felupes sem uma punição severa. E o gerente da filial de Bissau recorda ao governador em Lisboa os Bijagós da ilha de Canhabaque e a falta permanente de respeito dos Papéis na ilha de Bissau, os Papéis recusavam-se à reparação das estradas da ilha e à limpeza da cidade mandando fazer este trabalho os Balantas e os Mancanhas, considerados os intrusos do “seu chão”. E mais criticava o governador por não ter acedido à proposta do ministro das Colónias de dispor de dois aviões para acompanhar as operações. E assim se despede o gerente de Bissau:

“O efeito moral seria ótimo, sendo esta a melhor forma de mostrar aos franceses que também dispomos dessa arma de guerra”.

Mas não fica por aqui esta saga da revolta dos Felupes, como veremos a seguir.

(Continua)
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Nota do editor

Poste anterior de 5 de janeiro de 2018 > Guiné 61/74 - P18175: Notas de leitura (1029): Os Cronistas Desconhecidos do Canal do Geba: O BNU da Guiné (16) (Mário Beja Santos)

Último poste da série de 8 de janeiro de 2018 > Guiné 61/74 - P18188: Notas de leitura (1030): A Guiné-Bissau, os acontecimentos de 14 de Novembro de 1980 e um relatório do CIDAC de Dezembro do mesmo ano (Mário Beja Santos)

quinta-feira, 11 de janeiro de 2018

Guiné 61/74 - P18202: Efemérides (266): Dia Internacional do Obrigado... uma seleção de 12 manifestações, no nosso blogue, de agradecimento e de gratidão, que são dois dos sentimentos mais genuinamente humanos... Um Oscar Bravo (OBrigado) à nossa Tabanca Grande, aos membros do nosso blogue, aos nossos leitores, a todos os que nos visitam, lêem e escrevem, aos nossos editores, aos nossos colaboradores permanentes, a todos os que nos apoiam, direta ou indiretamente (Luís Graça)



Infografia: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2018)



No Dia Internacional do Obrigado, 11 de janeiro de 2018,  aqui ficam uma dúzia de manifestações de agradecimento e gratidão,  nossos e vossos, editores, autores, colaboradores permanentes, comentadores, leitores, visitantes do nosso blogue, avós, pais, filhos, netos... e todos os de mais  que, direta ou indiretamente, nos apoiam, pelo bem  que mutuamente fazemos uns aos outros através da existência, organização e manutenção desta Tabanca Grande, organizada  em torno do conhecimento e da experiência  comum de uma guerra e de um território, a Guiné entre 1961 e 1974... Aliás, temos uma expressão que traduz perfeitamente esse sentimento: "O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande!"...

São excertos de postes, recolhidos ao acaso, onde surge o descritor "obrigado", "obrigada", "oscar bravo"...


1
Para todos os/as amigos/as e camaradas da Guiné vai o meu/nosso Oscar Bravo (OBrigado). Continuamos a contar com todos/as para, juntos, mantermos vivo este nosso projeto, que já não é nosso, é da NOSSA geração, a tal que se recusa a ser sepultada na vala comum da ignonímia e do esquecimento (Luís Graça, editor)

https://blogueforanadaevaotres.blogspot.pt/2015/01/guine-6374-p14111-o-nosso-blogue-em.html

2
Obrigado, pai... Tenho muito orgulho em si (Tiago ). Obrigada, pai, por seres o melhor pai do mundo (Marta): depoimentos dos filhos do Jorge Rosales, no dia do seu 74º aniversário.


3
Obrigado, amigo e camarada Luís,  pelas notícias! De facto, não quis forçar a entrada de um "angolano" na Tabanca Grande, por ter pensado (erradamente) que o Régulo só deixaria entrar na aldeia veteranos "guinéus"! (Mário Leitão).


4
Obrigado aos nossos críticos, anónimos ou não. Obrigado, sem ironia. Obrigado, mesmo. Vejo os seus comentários como um repto, um desafio, não apenas aos editores e colaboradores mais próximos, mas a todos aqueles camaradas da Guiné que acreditaram (e ainda acreditam...) neste projeto de restituição da voz de um geração sofrida e silenciada ou, no mínimo, esquecida... (Editor Luís Graça)


5
Obrigado pelo vosso apoio e ajuda, bjs, Filomena Maria de Sousa Parreira [filha de Francisco Parreira (1948-2012), ex-1º cabo mec elect auto, Grupo de Artilharia nº 7, Bissau, 1970/72]


6
Obrigada, pelo trabalho no blog “A Nossa Quinta de Candoz” que diriges, mas que também é nosso, por todos os versos, frases e cantilenas que, graciosamente,  redigiste ao longo destes anos, em diferentes situações, para toda a nossa família, (mas eu neste aspeto sinto-me a mais sortuda… a mais privilegiada é verdade… porque só para mim fizeste muitos, muitos versinhos!)  (Ana Carneiro, nos 70 anos do nosso editor, Luís Graça).


7
Obrigada a todos, em meu nome e da Cidália, por nos terem permitido entrar nas vossas vidas [Cátia Félix, amiga da Cidália, esposa do nosso camarada António Ferreira, 1º Cabo Trms, CCAÇ 3490 (Saltinho, 1972/74), morto em 17 de Abril de 1972 na emboscada do Quirafo, e mãe da filha que que ele nunca chegou a conhecer]


8
Obrigada, ex-combatentes. Esta gente continua a ter no seu ADN a garra e o espírito lutador que ganharam na sua juventude (Fátima Ascensão, Diário de Notícias da Madeira, 23 de abril de 2017).


9
Sr. Carlos Vinhal, muito obrigada pelo carinho. Muitos Parabéns por terem criado um blogue de tremenda importância social! Tal deve ser constantemente reconhecido, deve ser premiado e quiçá ser objecto de estudo académico. Tudo farei por divulgar o vosso projecto! (Mafalda Ramos, filha do nosso camarada Armando Ramos, ex-1.º Cabo TRMS da CCS/BCAÇ 1911 (Teixeira Pinto e Bissau, 1969/71)


10
Obrigada, Carlos Vinhal, meu amigo desconhecido, mas não tanto, que não dê para trocar umas palavras amigas. Obrigada, meu Amigo, por este ano que passou fugindo.  Nem calcula quantas horas passo aqui frente ao computador, é um vício! mas acredita que ligo o computador e vou direitinha ao nosso Blogue? Podem orgulhar-se do vosso trabalho! (Felismina Costa, nossa amiga, grã-tabanqueira, poetisa).


11
O meu OBRIGADA a todos os Camaradas que enviaram mensagens de Solidariedade, Amizade, Carinho.... tudo contribuiu para que estes dois últimos meses de vida do Ranger Humberto Duarte tivessem um pouco mais de qualidade, e, para que ele e eu continuássemos a sorrir apesar da difícil picada que estávamos a atravessar. (Ana Duarte,  esposa  do nosso Camarada Humberto Carneiro Fernandes Duarte, ex- Fur Mil Op Esp / Ranger do BCAÇ 4514, Cantanhez -1973/74, falecido em 28 de fevereiro de 2010).

https://blogueforanadaevaotres.blogspot.pt/2010/03/guine-6374-p5945-in-memoriam-38.html

12
À nossa Tabanca Grande, aos membros do nosso blogue, aos nossos leitores, a todos os que nos visitam, leem e escrevem, aos nossos editores: um especial OSCAR BRAVO (obrigado). Aos autores mais comentados, os meus parabéns.(Luís Graça, editor).

https://blogueforanadaevaotres.blogspot.pt/2009/11/guine-6374-p5214-o-nosso-blogue-em.html

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Nota do editor:

Último poste da série > 25 de novembro de 2017 > Guiné 61/74 - P18012: Efemérides (265): 25/26 de novembro de 1967: a notícia da tragédia diluviana na Região de Lisboa que chegou a Gadamael pelas ondas hertzianas (Mário Gaspar, ex-fur mil at art, MA, CART 1659, Gadamael e Ganturé, 1967/68)

Guiné 61/74 - P18201: Álbum fotográfico de Virgílio Teixeira, ex-alf mil, SAM, CCS / BCAÇ 1933 (Nova Lamego e São Domingos, 1967/69) - Parte IX: regresso a casa, no N/M Uíge, em 4 de agosto de 1969


Foto nº 516 > No Uíge, o último adeus à Guiné


Foto nº 517 > Uíge: já no alto mar, no oceano Atlântico


Foto nº 518 > Avistado do Uíge, um navio ao largo [, parece ser um petroleiro]


Foto nº 514 > Bissau: um caça-bombardeiro T6 protege o nosso Uíge


Foto nº 515 > O heli do Spínola, dizendo adeus às tropas embarcadas no Uíge



Foto nº 510 > Militares no convés do Uíge

Guiné > Bissau > Estuário do rio Geba e Oceano Atlântico > N/M UIge > 4 de agosto de 1969 > O regresso a casa...

Fotos (e legendas): © Virgílio Teixeira (2018). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]




1. Continuação da publicação do álbum fotográfico do nosso camarada Virgílio Teixeira, ex-alf mil, SAM, CCS / BCAÇ 1933 (Nova Lamego e São Domingos, 1967/69):

Mensagem de 3 do corrente;

Caro Luís e camaradas:

Com os desejos de um Bom ano que agora já vai no seu 3º dia de 2018, com saúde e tudo de bom.
Coincidência, faz hoje 51 anos que assentei praça em Mafra, dia 3 de Janeiro de 67. Foi só para lembrar como era bom ser novo... Voltava de bom grado a reviver tudo do principio.

Vou acabar com as fotos relativas a este capitulo 511 - O Regresso, acho que faz-me bem. Quando puderem ser publicadas, não há pressa nenhuma. (...) 


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Nota do editor:



20 de dezembro de 2017 > Guiné 61/74 - P18109: Álbum fotográfico de Virgílio Teixeira, ex-alf mil, SAM, CCS / BCAÇ 1933 (Nova Lamego e São Domingos, 1967/69) - Parte III: Foto tirada do T/T Uíge, no nosso regresso, em 4/8/1969: vê-se o T/T Rita Maria atracado na ponte-cais de Bissau, e uma lancha da marinha que nos veio trazer o último militar a embarcar.

17 de dezembro de 2017 > Guiné 61/74 - P18096: Álbum fotográfico de Virgílio Teixeira, ex-alf mil, SAM, CCS / BCAÇ 1933 (Nova Lamego e São Domingos, 1967/69) - Parte II: Zona portuária de Bissau e o heli do Spínola a dizer adeus ao T/T Uíge, em 4/8/1969

Guiné 61/74 - P18200: (De)Caras (104): Patrício Ribeiro, nascido em Águeda, criado em Angola, "filho da escola" da Armada, ex-grumete fuzileiro, empresário em Bissau, ator e observador da história recente da "pátria de Cabral", o "homem certo no sítio certo"... Ou melhor: o "tuga" que sabe mais da Guiné, e para quem a Guiné "sabi di mais"...


Guiné-Bissau > Arquipélago dos Bijagós > Ilha de Orango > 7 de outubro de 2008 > O Patrício Ribeiro no--- Hotel de Orango, na ilha mais atlântica da Guiné-Bissau, a 100 km de Bissau, ou seja, a 7 horas de canoa "nhominca", de Bissau..

[O nosso amigo e camarada Patrício Ribeiro é um português, natural de Águeda, criado e casado em Angola, com família no Huambo, ex-fuzileiro em Angola durante a guerra colonial, a viver na Guiné-Bssau desde meados dos anos 80 do séc. passado, fundador, sócio-gerente e director técnico da firma Impar, Lda.]

Foto (e legenda): © Patrício Ribeiro (2008). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné].


Guiné-Bissau > Bissau > Impar Lda > 15 de abril de 2017 > Foto da página do Facebook da Impar Lda: 25 anos na Guiné-Bissau, a trabalhar na área da energia e comunicações: energia solar geradores, bombas de água solar, rádios VHF/HF, GPS, radares... Ver aqui a sua galeria de projetos realizados, do arquipélago dos Bijagós à fronteira com o Senegal e a Guiné Conacri... 100 guineenses (trabalhadores e suas famílias dependem da carteira de encomendas desta empresa, e da sua boa gestão)...

Foto: cortesia da Impar Lda... Ao fundo, o Patrício Ribeiro, de óculos escuros, orientando so trabalhos de montagem de painéis solares...


1. Resposta do Patrício Ribeiro ao comentário do nosso editor Luís Graça (*):

Luís, o comentário que enviei sobre as fotos da praia de Varela, foi a partir da minha lareira nas margens do Vouga [, em Águeda], onde há frio e foi com um copo de tinto na mesa …
Gosto de falar da minha praia de Varela de que adoro; dos banhos na água quente a 30º, das minhas pescarias diretamente para o grelhador, acompanhadas por umas bacias de ostras, etc…

O que escrevi no comentário, é um pequeno resumo dos diversos capítulos vividos naquela época, mas muitos deles ainda os considero 'classificados' …

Quando nos voluntariamos a ajudar os outros, quando pessoas a chorar nos pedem para não os deixar para trás …,   a “formação militar não o permite", vem ao de cima...

E, por força das condições, passamos a ser o elo de ligação entre o resto do mundo e o interior de um país em guerra, de onde não é possível informar os familiares: onde estamos, que estamos vivos … Repara, não havia telefones e as fronteiras estavam fechadas, quer internamente, quer com os países vizinhos e estas últimas estavam a ser bombardeadas. Bissau ficava longe e não  se sabia o que se passava no interior.

E quando do exterior… nos pedem a colaboração, através do nosso “bombolom”, para encontrar esta e aquela pessoa de quem não se tem notícias há muitas semanas … certamente qualquer um de nós ajudaria, se tivesse condições...

Os restantes capítulos vão saindo, quando alguém tocar na "ferida".

Luís, depois de ter saído na canoa nhominca, que, no regresso, na minha presença, carregou da fragata Vasco da Gama a primeira ajuda humanitária para a Guiné, destinada à Missão Católica de Suzana,  eu voltei para Portugal. Não, não fiquei lá...

Mas passados 2 meses regressei à Guiné, via Dakar e táxi aéreo para Bubaque, dali para Bissau em vedeta de guerra, que foi construída no Alfeite e que estava na mão dos militares senegaleses.

De Bissau por vezes saía para Varela, quando recebia um 'papelinho' avisando que era melhor ir dar uma volta… Pegava na minha mochila com uma lata de atum, atravessava a pé as bolanhas e lá ia eu para banhos.

O aeroporto de Bissau, esteve fechado quase um ano…

Quando da morte do 'Nino', tinha ido passar o fim de semana à ilha de  Orango…

Na morte do Ansumane Mané, estava fora de Bissau...Ao reentrar em Bissau encontrei quase uma centena de milhares de pessoas, a saírem a pé. Algumas já iam para lá de Nhacra. Fiz um apelo na rádio RTP África, para mandarem transporte, afim de apanharem as pessoas que estavam a dormir à beira da estrada, sem qualquer condição.

Ao mínimo problema, a estrada principal era fechada a viaturas, em Safim.

Assim. como da morte dos restantes [altos dirigentes do país...], estava fora, por Varela, Contuboel, etc.

Abraço

Patricio Ribeiro

MPAR Lda
Av. Domingos Ramos 43D - C.P. 489 - Bissau ,
Tel / Fax 00 245 3214385, 6623168, 7202645, Guiné Bissau | Tel / Fax 00 351 218966014 Lisboa
www.imparbissau.com
impar_bissau@hotmail.com


2. "Curriculum vitae" (abreviadíssimo...) que o Patrício Ribeiro nos mandou em 10/9/2009 (, devendo acrescentar-se que ele é membro sénior da Tabanca Grande, entrou em... janeiro de 2006):



(i) nasci [em 11 de outubro de 1947,] nas margens do Rio Vouga, centro do mundo, sou vizinho do D. Duarte Lemos, frequentei a Escola Industrial de Águeda;

(ii) fui Fuzileiro (Gr FZ) [, portanto "filho da escola"];

(iii) passei por Bissalanca em 1969, estava muito calor: como não tinha roupa apropriada (tinha deixado o camuflado em Vale do Zebro, na escola de Fuzileiros), mandaram-me seguir para Luanda [, 1969/72]…

(iv) ao fim de uns anos, deixaram-me ir para casa, em Luanda, em 1972...

(v) por lá fiquei até ao último avião, da ponte aérea para Lisboa (, enfim, outras guerras);

(v) a minha família viveu dezenas de anos no Huambo (, antiga Nova Lisbao): pai, mãe e irmãos, etc.

(vi) minha mulher é natural do Huambo;

(vi) por questões profissionais, em 1984 fui para Bissau; 

(vii) gostei, fiquei por lá desde então:

(viii) fundei a Impar Lda: o 'patrão' paga-me para fazer coisas que gosto, em locais de difícil acesso, e porque é uma aventura permanente… já não sei viver sem ela!

(ix) faltam-se 2 660 dias para a reforma… 

Lx, , 10/9/2009

quarta-feira, 10 de janeiro de 2018

Guiné 61/74 - P18199: O nosso blogue em números (49): em c. de 14 anos (164 meses) entraram 4,7 novos membros, por mês, para a Tabanca Grande: éramos 111, em junho de 2006, somos agora 765 (em dezembro de 2017)... Neste último ano tivemos 9 "baixas", por falecimento.




Infografias: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2018)


1. No final de 2017, a Tabanca Grande contava com 765 membros, designados por "grã-tabanqueiros"... No final de 2016, éramos 731... Entraram, portanto, durante o ano, 34 novos membros, mais 13 do que em 2016 (n=21). (*)

Em junho de 2006, éramos 111... De abril de 2004 a maio de 2006, entram em média, 5,3 novos membros por mês (!)... Tratávamo-nos, uns aos outros, "tertulianos".  O nosso coeditor Carlos Vinhal ainda usa o termo "tertuliano", membro da Tertúlia da Guiné" ou "Tertúlia dos Ex-Combatentes da Guiné". O termo foi progressivamente substituído por "Tabanca Grande", e passou a incluir os camaradas e os amigos da Guiné...

Mais do que triplicámos em  pouco mais do que três anos e meio (de junho de 2006 a dezembro de 2009), passando a ser  390 membros da Tabanca Grande: crescimento médio mensal = 6,5.
De 2009 (n=390) a 2012 (n=595), o crescimento médio mensal continuou alto (5,7). De então para cá, esse indicador tem vindo a  diminuir: é agora de 2,8  por mês. Em todo o caso, melhor em 2017 (2,8) do que em 2016 (1,7).

No conjunto dos c. de 14  anos da nossa história (164 meses),  tivemos em média 4,7  novos membros por  mês, o que é notável.

 2. No ano de  2017 tivemos 9 "baixas" (por falecimento), mais 3 do que em 2016. Lembremos aqui, por ordem alfabética, os nomes dos 8 camaradas e 1 amigo, inscritos formalmente na Tabanca Grande, que "da lei da morte se foram libertando":


Alfredo Roque Gameiro Martins Barata (1938-2017)
Aurélio Duarte (1947-2017)
Carlos Filipe Coelho (1950-2017)
Inácio J. Carola Figueira (1950-2017)
Ivo da Silva Correia (c 1974-2017)
Jorge Teixeira (Portojo) (1945-2017)
José Luís Pombo Rodrigues (1934-2017)
Mário Vasconcelos (1945-2017)
Nelson Batalha (1948-2017)

São agora já 61 os camaradas e amigos já falecidos nestes 13 anos e tal de existência do nosso blogue. Mas podem eventualmente ser mais. Há membros da nossa Tabanca Grande que não têm dados "sinais de vida", nos últimos anos, contactando-nos, escrevendo-nos, telefonando-nos, aparecendo nos convívios das diversas tabancas, etc.(**)

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Notas do editor:



Vd. postes anteriores:

8 de janeiro de 2018 > Guiné 61/74 - P18190: O nosso blogue em números (47): o nº de visualizações de páginas /visitas em 2017 foi de 800 mil (média diária: 2192)... Em 2018, vamos continuar a "blogar" até quando "todos" quisermos e pudermos...

8 de janeiro de 2018 > Guiné 61/74 - P18189: O nosso blogue em números (46): postes (1262) e comentários (4100) publicados em 2017

Guiné 61/74 - P18198: Bibliografia de uma guerra (82): “Contra o Vento, Portugal, o Império e a Maré Anticolonial (1945-1960)”, por Valentim Alexandre; Temas e Debates/Círculo de Leitores, 2017 (1) (Mário Beja Santos)



1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 23 de Novembro de 2017:

Queridos amigos,

Temos finalmente um tratado científico sobre o pano de fundo dos 15 anos que precedem o início da guerra colonial.

O historiador Valentim Alexandre dá-nos uma moldura impressiva da mística imperial já num quadro de ameaças que despontavam com as latentes independências asiáticas e a crescente preocupação da chegada dos países africanos ao Palácio de Vidro, em Nova Iorque, Salazar sabe que só pode contar os Estados Unidos por causa da Guerra Fria, assiste à desarticulação dos velhos impérios, substituiu fórmulas, ensaiou colonatos, a industrialização. Mas o trabalho de Valentim Alexandre ocupa-se meticulosamente da crise de Goa e de tudo quanto se passa à volta de Macau e Timor.

Proponho a todos vós a leitura imediata deste soberbo documento.

Um abraço do
Mário


Contra o vento: uma obra-prima da historiografia portuguesa (1)

Beja Santos

“Contra o Vento, Portugal, o Império e a Maré Anticolonial (1945-1960)”, por Valentim Alexandre, Temas e Debates/Círculo de Leitores, 2017, é indubitavelmente um dos principais acontecimentos da edição historiográfica de 2017.

O investigador Valentim Alexandre tem sobejas provas dadas na área da história colonial, este seu opulento (e a partir de agora incontornável) levantamento é o fecho de abóbada, a consagração da sua carreira. Passamos a dispor, a partir deste trabalho, de uma sequência bem articulada para a cronologia os principais eventos que contextualizam o Império Português no pós-guerra, ressaltando a primeira ameaça, a crise de Goa (1954-1955), segue-se a pormenorização dos dados da grande vaga da descolonização e a resposta dada pelo Estado Novo: o luso-tropicalismo – a política indígena, uma incipiente industrialização, as formas precárias de deslocação da população branca, nomeadamente para colunatos, a ONU como a principal arena a confrontar o império português, os atritos com o Vaticano, a reorganização dos dispositivos militares; e a manutenção das inquietações no Oriente, um tanto à semelhança de que ocorrera no decurso da II Guerra Mundial, mas agora fruto das descolonizações: Goa, Macau e Timor, devido ao aparecimento da União Indiana, da República Popular da China e da República da Indonésia.

Na introdução, Valentim Alexandre apresenta a configuração do império a partir da independência do Brasil, o projeto imperial centrado em África, a importância da legislação de Sá da Bandeira, a disputa por garantir a presença em territórios entre Angola e Moçambique, a ferida no orgulho nacional com o Ultimato, a conferência de Berlim e o imperativo da ocupação dos territórios, tarefa que irá prolongar-se por cerca de três dezenas de anos. O comentário do autor é pertinente:

“No seu conjunto, este processo consolidou o império, permitindo a extensão da soberania lusa e a ação do respetivo aparelho colonial a zonas até então não tocadas e reduzindo o perigo de intromissão a de outras potências. No entanto, tal como finalmente se constituiu, o sistema colonial português sofria de um pecado original – a sua dependência de uma metrópole débil, economicamente atrasada, de fracos recursos financeiros, sem dúvida o elo mais vulnerável de entre as potências imperiais europeias”

Chegados ao século XX, Portugal é alvo de acusações contra a “política indígena”, designadamente na questão do trabalho forçado: Angola, Moçambique e S. Tomé e Príncipe, sobretudo, eram o centro das atenções. Ciente das ameaças de partilha dos territórios africanos, cobiçados pela Alemanha, Portugal entra na primeira guerra. Na Conferência de Paz de 1919, assegura-se o império. Segue-se um período marcado pelo fracasso de planos de desenvolvimento rápidos do Ultramar. Com a queda da primeira república e com a ascensão do impulso nacionalista chega-se ao Ato Colonial, assim caraterizado pelo autor:

“Tratava-se de reafirmar de forma solene a soberania portuguesa no Ultramar, em documento com valor constitucional, dando-lhe um caráter permanente, numa altura em que se agudizavam as tensões com a Sociedade das Nações sobre a questão do trabalho indígena”.

E chama igualmente à atenção para a substância do artigo segundo:

“É da essência orgânica da nação portuguesa desempenhar a função histórica de possuir e colonizar domínios ultramarinos e de civilizar as populações indígenas que nelas se compreendem”

O regime de Salazar vai estar atento a novas investidas, a Alemanha de Hitler sonha retornar a África o autor comenta:

“Para finais de 1937, o governo britânico tinha por certo que a melhoria das relações com a Alemanha passava pela revisão da partilha colonial, abrangendo os territórios belgas e portugueses em África”.

Estas ameaças desapareceram com a derrota alemã, mas emergia outra, a descolonização da Ásia, primeiro, e de África, depois. É este o período analisado: 1945 a 1960. Porque tudo vai mudar a partir de 4 de Fevereiro de 1961.

É já durante o conflito da II Guerra Mundial que o regime de Salazar se inquieta com sinais eloquentes: a rutura nos sistemas coloniais da Holanda, Bélgica e França com a rápida ocupação dos exércitos alemães em 1940, em Vichy a França ocupada procura zelar pelos seus territórios ultramarinos, mas na Indochina houve bases japonesas e a África Equatorial Francesa tomaram partido do General de Gaulle; em 14 de Agosto de 1941 aumenta a inquietação com a “Carta do Atlântico” onde Roosevelt e Churchill deixaram claro que no futuro cabia aos povos escolherem a sua forma de governo, devendo ser restaurados os “direitos soberanos e o autogoverno daqueles que dele haviam sido privados pela força”. Não era claramente preocupante, sê-lo-á depois, no acesso da descolonização.

Apercebendo-se desta linha dominante da política externa norte-americana, Salazar volta-se para a Grã-Bretanha, só que o império britânico está a caminho da sua desarticulação. E assim chegamos à Carta das Nações Unidas, irão começar as dores de cabeça para a defesa do império português.

Salazar pôde contar com um elemento atenuante: a Guerra Fria. Washington e Moscovo assumiam, ao princípio uma posição anticolonialista, embora partindo de pressupostos diferentes. Os EUA, após a guerra, queriam conter o comunismo e simultaneamente ganhar a confiança junto dos países recentemente saídos de situações coloniais. Os EUA não podiam interferir no que se passava no Norte de África: Marrocos, Tunísia, Argélia, o Egipto. Muitas centenas de milhares de homens tinham sido enviados a combater na Europa, no Norte de África ou na Ásia, em nome da França ou da Grã-Bretanha. Várias cidades de África – Cairo, Dakar, Lagos, Freetown e a Cidade do Cabo, entre outras – serviram de pontos de apoio militar. Na Grã-Bretanha e na França estudavam e formavam-se africanos que irão rapidamente reivindicar a independências das colónias. Aos poucos, estas potências coloniais foram aceitando as independências.

Urgia, pois, reavivar a retórica imperial, melhorar as condições de vida dos timorenses e refazer os equipamentos destruídos pelos japoneses, manter uma relação aceitável com os comunistas chineses, que não reivindicavam nem Macau nem Hong Kong, ensaiou-se uma manobra de afetividade com a União Indiana, e no caso africano procurou-se melhorar a presença missionária e tornar a mística imperial como vetor ideológico incontestável.

Marcello Caetano é ministro das Colónias. Valentim Alexandre termina assim este capítulo:

“As atenções do governo de Lisboa, nos anos do após-guerra, centraram-se sobretudo no povoamento branco e no fomento da economia, que tinha finalmente condições para arrancar. No imediato, as ameaças à integridade do Império situavam-se no Oriente, dada a evolução política desta parte do mundo, com o ataque generalizado às posições europeias”.

(Continua)
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Nota do editor

Último poste da série de 24 de setembro de 2017 > Guiné 61/74 - P17794: Bibliografia de uma guerra (81): “A Guerra Civil em Angola - 1975-2002”, por Justin Pearce; Tinta da China, 2017 (Mário Beja Santos)