1. Os nossos camaradas Giselda e Miguel Pessoa, em mensagem do dia 19 de Setembro de 2011, deram-nos conta da exibição do Filme de Marta Pessoa, "Quem vai à Guerra", no Centro Cultural da Malaposta, Rua de Angola, Olival Basto, no próximo dia 30 de Setembro pelas 21h30.
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Notas de CV:
Vd. último poste dedicado ao filme de 22 de Junho de 2011 > Guiné 63/74 - P8460: As mulheres que, afinal, foram à guerra (17): Público, Cinecartaz: Críticas dos leitores
Vd. último poste da série de 21 de Setembro de 2011 > Guiné 63/74 - P8803: Agenda Cultural (155): Lançamento do livro Sopros de Vida, de José Lemos Vale, dia 24 de Setembro de 2011 na Livraria LeYa em Coimbra
Blogue coletivo, criado por Luís Graça. Objetivo: ajudar os antigos combatentes a reconstituir o "puzzle" da memória da guerra colonial/guerra do ultramar (e da Guiné, em particular). Iniciado em 2004, é a maior rede social na Net, em português, centrada na experiência pessoal de uma guerra. Como camaradas que são, tratam-se por tu, e gostam de dizer: "O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande". Coeditores: C. Vinhal, E. Magalhães Ribeiro, V. Briote, J. Araújo.
quinta-feira, 22 de setembro de 2011
quarta-feira, 21 de setembro de 2011
Guiné 63/74 - P8804: Convívios (375): XVIII Encontro da CCAÇ 727, dia 8 de Outubro de 2011, no RI 3 de Beja
1. Mensagem do nosso camarada Miguel Velez de Oliveira, com data de 16 de Setembro de 2011, dando conta do Convívio da CCAÇ 727 (Guiné, 1964/66):
Boa noite Caro Camarada e Amigo Vinhal
Mais um Ano mais um Convívio.
Este Ano no RI-3 em Beja, onde grande parte dos "Caçadores" tiveram o primeiro contacto com a Instrução.
Meu Caro Vinhal, peço-lhe que divulgue no V/Grande Blog o Encontro/Convívio da CCAÇ 727, uma das Companhias que, talvez terão tido, mais baixas.
Em nome dos Elementos da Organização, um Grande Obrigado.
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Nota de CV:
Vd. último poste da série de 15 de Setembro de 2011 > Guiné 63/74 - P8782: Convívios (368): Encontro do pessoal da CCAÇ 3461 do BCAÇ 3863 vai acontecer no próximo dia 17 de Setembro de 2011, em Coimbra (José Romão)
Boa noite Caro Camarada e Amigo Vinhal
Mais um Ano mais um Convívio.
Este Ano no RI-3 em Beja, onde grande parte dos "Caçadores" tiveram o primeiro contacto com a Instrução.
Meu Caro Vinhal, peço-lhe que divulgue no V/Grande Blog o Encontro/Convívio da CCAÇ 727, uma das Companhias que, talvez terão tido, mais baixas.
Em nome dos Elementos da Organização, um Grande Obrigado.
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Nota de CV:
Vd. último poste da série de 15 de Setembro de 2011 > Guiné 63/74 - P8782: Convívios (368): Encontro do pessoal da CCAÇ 3461 do BCAÇ 3863 vai acontecer no próximo dia 17 de Setembro de 2011, em Coimbra (José Romão)
Guiné 63/74 - P8803: Agenda Cultural (155): Lançamento do livro Sopros de Vida, de José Lemos Vale, dia 24 de Setembro de 2011 na Livraria LeYa em Coimbra
Caros Amigos,
Realizando-se no próximo sábado dia 24, pelas 16H30, na Livraria LeYa_Coimbra Editora, Rua Ferreira Borges 79 em Coimbra o lançamento do meu livro Sopros de Vida, muito me honrariam com a v/presença neste evento de apresentação pública do citado livro, que é a 1ª homenagem de carácter público aos abnegados e humanitários Enfermeiros Militares que apoiaram os grupos de Combate na Guerra do Ultramar.
Numa segunda parte, enalteço e homanageio as Valorosas Mulheres que constituiram o Corpo de Enfermeiras Paraquedistas da Força Aérea Portuguesa,onde foram inexcedíveis em abnegação,coragem, espírito de Corpo e Sentido de Missão, atributos só reconhecidos pelos combatentes feridos e por elas assistidos nas frentes de combate com desvelo e carinho, dons que só os seres humanos bons conseguem partilhar com quem sofre as avdversidades da vida.especialmente em ambiente de guerra.. O Estado Português teima em não as homenagear publicamente. Espero que este livro possa colmatar esse inaceitável apagão aos excelentes serviços e à memória destas duas classes Enfermeiros da Guerra doUltramar.
Grato pela v/ presença, creiam-me com amizade
José Lemos Vale
Notas de CV:
Vd. notícia ainda em http://ultramar.terraweb.biz/06livros_JoseLemosVale_GuerraColonial_SoprosdeVida.htm
Vd. último poste da série de 19 de Setembro de 2011 > Guiné 63/74 - P8794: Agenda Cultural (154): Exposição de fotos e lançamento do Livro Na Kontra Ka Kontra de autoria do nosso camarada Fernando Gouveia, ocorridos no dia 13 de Setembro de 2011, na Casa da Cultura Mestre José Rodrigues, em Alfândega da Fé
Realizando-se no próximo sábado dia 24, pelas 16H30, na Livraria LeYa_Coimbra Editora, Rua Ferreira Borges 79 em Coimbra o lançamento do meu livro Sopros de Vida, muito me honrariam com a v/presença neste evento de apresentação pública do citado livro, que é a 1ª homenagem de carácter público aos abnegados e humanitários Enfermeiros Militares que apoiaram os grupos de Combate na Guerra do Ultramar.
Numa segunda parte, enalteço e homanageio as Valorosas Mulheres que constituiram o Corpo de Enfermeiras Paraquedistas da Força Aérea Portuguesa,onde foram inexcedíveis em abnegação,coragem, espírito de Corpo e Sentido de Missão, atributos só reconhecidos pelos combatentes feridos e por elas assistidos nas frentes de combate com desvelo e carinho, dons que só os seres humanos bons conseguem partilhar com quem sofre as avdversidades da vida.especialmente em ambiente de guerra.. O Estado Português teima em não as homenagear publicamente. Espero que este livro possa colmatar esse inaceitável apagão aos excelentes serviços e à memória destas duas classes Enfermeiros da Guerra doUltramar.
Grato pela v/ presença, creiam-me com amizade
José Lemos Vale
C O N V I T E
Com a devida vénia a CELIVRARIAS
____________Notas de CV:
Vd. notícia ainda em http://ultramar.terraweb.biz/06livros_JoseLemosVale_GuerraColonial_SoprosdeVida.htm
Vd. último poste da série de 19 de Setembro de 2011 > Guiné 63/74 - P8794: Agenda Cultural (154): Exposição de fotos e lançamento do Livro Na Kontra Ka Kontra de autoria do nosso camarada Fernando Gouveia, ocorridos no dia 13 de Setembro de 2011, na Casa da Cultura Mestre José Rodrigues, em Alfândega da Fé
Guiné 63/74 - P8802: Caderno de notas de um Mais Velho (Antº Rosinha) (15): O Exército colonial português - do cofió, do bivaque e do caqui ao visual da boina e camuflado: Guerra e Paz(maceira)
Caldas da Rainha > "15/7/41. A despedida das tropas expedicionárias de Cabo Verde. R.I. 5, Caldas da Rainha. Luís Henriques [1º Cabo Inf)
Cabo Verde >S. Vicente > Mindelo > "23/7/1941. Chegada ao 1º Batalhão Expedicionário do R.I. nº 5 a São Vicente, Cabo Verde. Na fotografia estou eu com alguns camaradas da minha companhia. No porto do Mindelo fomos entusiasticamente recebidos. Luís Henriques". [Partida a 15 (?) ou talvez 16 de Julho de 1941, do Cais da Rocha Conde de Óbidos, Lisboa].
Fotos (e legendas): © Luís Henriques / Luís Graça (2010). Todos os direitos reservados
1. Mensagem, de 19 do corrente, do nosso amigo e camarada António Rosinha [, Fur Mil, em Angola, aqui em 1961, em Luanda, o primeiro da direita]:
Amigos editores, penso que tem cabimento, fica ao vosso critério um poste ou não (*).
Na RTP África, em entrevista recente dizia o presidente de Caboverde Pedro Pires que a história das guerras é sempre contada pelo lado dos vencedores.
Mas creio que no nosso caso aqui, essa afirmação não é verdadeira, porque neste blogue contamos a história de uma guerra que não ganhámos.
Ou ganhámos? E se perdemos, perdemos o quê? E a perda foi total? Ou apenas parcial?
Será que Portugal alguma vez chegou a investir numas forças militares para ganhar pelas armas fosse o que fosse? Claro que o tipo de guerra que viria a surgir em 1961, e aqui rememoramos, não era com armas que se ganhava. Será que era por isso que não se investia em armamento? Será porque era assim que Salazar pensava, e já tinha reduzido ao mínimo as armas e os homens na Índia, quando o Neru invadiu o Estado Portugês da India?
A pasmaceira dos quartéis coloniais, interrompida em 1961, em Angola, onde se iniciaram os conflitos armados pró-independência, datava provavelmente desde 1918 quando terminou a I guerra mundial. Foram 43 anos de paz(maceira).
Os oficiais e sargentos e praças do quadro, que povoavam os quartéis coloniais, funcionavam tal qual como o armamento ultrapassadíssimo daquele tempo, serviam apenas para dar instrução, desfilar nos juramentos de bandeira, e prestar serviço de rotina de um quartel em paz. Mas não pensavam nem eram mentalizados para qualquer guerra, apenas estavam estruturados para terminar a comissão no ultramar sem complicações, o que lhe proporcionaria alguma promoção ou um algum necessário louvor, no regresso à metrópole.
Quanto aos milicianos e praças anualmente incorporados obrigatoriamente, cumpriam com os programas por obrigação.
A Infantaria, e artilharia eram as armas que se podiam encontrar distribuidas pelas capitais de distrito em Angola nos anos 50 e apenas em 1959 foi criado um esquadrão de cavalaria ( penso que era esquadrão).
A Força Aérea e Marinha eram reduzidas certamente, pois que pouco se notava a suas presenças no ambiente luandense e muito menos no interior, o que é mais dificil de ajuizar sobre o que pouco se via.
Quem demonstrava muito entusiasmo pelo serviço militar, eram os soldados indígenas, Soldados I, que assimilavam com enorme rapidez a instrução militar e o ensino nas aulas regimentais. Era uma enorme desilusão para eles quando terminavam o tempo militar e tinham que regressar às famílias de mãos a abanar, e já inadaptados à vida da tribo.
Os quartéis de infantaria coloniais viviam numa rotina sonolenta, embora se falasse que em Moçambique havia uma "cultura" mais refinada, com hábitos de guiar à esquerda a imitar os vizinhos, mas parece que o mimetismo seria apenas no volante em contramão. Nas Ilhas crioulas e Guiné seria tudo militarmente bem reduzido.
Às vezes havia um certo ambiente marcial nesses quartéis, (em Angola), quando alguém fazia ouvir na parada discos com as marchas militares clássicas americanas. De resto era um arrastar de pés pelas paradas tão cansativo que provocava uma sede tropical enorme que só um abastecimento regular de barris de cerveja nas messes de oficiais e sargentos e cantinas, resolvia a situação.
Mesmo em tempos de paz, a tropa em África já tinha o hábito de não morrer à sede.
Parece pessimismo olhar assim para os militares, mas ninguém pode desmentir que os comandantes exigiam muito pouco, nem ao governo exigiam modernização nem aos oficiais e sargentos se exigia um rigor verdadeiro, como por exemplo ensinar a fazer fogo com as armas de cada especialidade.
Por exemplo, num curso de sargentos milicianos de armas pesadas de infantaria, com especialidade de metralhadora pesada, morteiro 81 e canhão anticarro, podia acontecer um aluno nunca ter dado um único tiro com qualquer uma dessas armas, e terminar com boa nota no fim do curso, (sem cunhas).
Na primeira manifestação nacionalista anti-colonial morreu um 1º cabo fardado de caqui, e provavelmente, digo eu, e talvez não seja exagero, sem bala na câmara, se é que tinha alguma arma na mão. Foi a 4 de Fevereiro de 1961 no ataque do MPLA (?) à casa de Reclusão em Luanda.
Nesse tempo o serviço de guarda`aos palácios do governo, ou às prisões eram feitas por uma secção: Um velho sargento barrigudo ou um novato cabo miliciano, branco ou mestiço ou mesmo preto, e um 1º cabo da mesmas cores, e 9 soldados invariavelmente (I) indígenas. Todos de caqui. Calças com polainitos, capacete de cortiça para o sargento ao palácio e cofió para os soldados I (Na casa de Reclusão era com capacete de aço, para todos).
Os soldados de sentinela usavam Mauser a tiracolo ou encostada à parede, e um pente com 5 balas dentro de um saquinho de plástico fechado e inviolável, sujeito a punição se o saco fosse violado sem justificação. Nas guaritas havia sempre dois tijolos que tanto serviam de banco para sentar como de travesseiro para dormir.
O Comandante de secção usava uma FBP a tiracolo ou no armário, que só dava tiro real já no final dos cursos de sargentos, pelo que era mais o tempo que passava com o cano cheio de massa consistente.
Mais tarde, na segunda manifestação anticolonial e tribalista, morre o primeiro alferes do exército colonial, quando nos massacres do 15 de Março (FNLA), o Alferes Flores fazia uma patrulha repetidíssima numa rotina semanal de transporte de correio entre Noqui e São Salvador. Nem a PIDE se informava nem informava, nem os comandantes das companhias se preocupavam muito, pois o destino se encarregaria de os informar.
A farda do exército colonial continuava de côr caqui, quando há 50 anos (1961) foi substituida por um vistoso camuflado.
Talvez por causa da manufatura morosa dessas fardas, é que teria demorado a chegar a Luanda o primeiro navio com um grande contingente de caçadores especiais fardados com camuflados. Seria a falta de fardas ou de estratégias a causa da demora?
Já havia muitas malas feitas para dar às de vila diogo, em Luanda e não só, quando Salazar reagiu aos massacres terroristas de 15 de Março (FNLA) enviando o 1º de muitos contingentes militares.
Será que foi o ditador o inspirador do alfaiate militar? (É que hoje já há tanta escrita sobre o homem que já se escreve que mandava em tudo, talvez ele entendesse mesmo de moda e fosse dele a ideia do camuflado. É que teve impacto psicológico positivo, naqueles que já pensavam dar corda aos sapatos.)
Não se sabe se os turras ficaram impressionados com o visual, mas ficaram e bem, impressionadas as garotas de Luanda. Já tinha sido em Fevereiro o ataque à casa de Reclusão e o navio chegou apenas a 1 de Maio.
Mais um pouco de demora na chegada do 1º contingente, e a impaciência tomava conta da multidão e já não seria preciso "fazer qualquer guerra" nem de caqui nem de camuflado, pelo menos em Angola. Pois não haveria "brancos" a quem guardar as costas, o que era para alguns capitães do quadro, o motivo daquela mobilização "guardar os brancos" contra a revolta dos pretos, que os brancos maltratavam, e por isso eles se revoltaram.
Claro que alguns brancos, tão ignorantes como alguns desses capitães, diziam a esses capitães que matassem os pretos todos para resolver o problema.
E já na Guiné e Moçambique havia bordoada da grossa, quando se dá a 3ª manifestação anticolonial em Angola (UNITA), em que torna a haver uma morte de europeu, só que desta vez não era militar. Será que foi o camuflado que ajudou?
E não morreu nenhum militar, porquê? Simplesmente era noite de festa de Natal de 1966, e estava tudo acordado e bem desperto dentro do quartel, e os "turras" de Savimbi, desorganizados, é que foram surpreendidos por esse facto.
E apenas houve um único europeu surpreendido, foi um civil noctívago, que regressava a casa vindo de uma visita feminina. Esse civil era simplesmente o inspector da PIDE em serviço naquela vila de fronteira de Teixeira de Souza, que pelos vistos andava mal infornado.
É que não era só falta de rigor e disciplina no desempenho da tropa, tudo o que era autoridade e Estado, estava completamente enferrujado e desligado da realidade, tropicalmente acomodado.
Para a classe da função pública, que em maioria era afro-luso caboverdeana-angolana-guineense-sãotomense-macaense e goesa, que em princípio sonhavam com uma autonomia e não escondiam essa pretensão, essa pasmaceira, que podemos dizer que era promovida ou apreciada por Salazar, nem era nada desagradável usufrui-la, antes pelo contrário, era uma vida a côres comparado com o preto e branco de Portugal e Ilhas.
Acho que essa modorra tropicalíssima, reinante nas colónias, tambem se poderia considerar um sistema político, como tudo.
Não quero agora falar na qualidade de vida que aqueles ambientes coloniais e tropicais proporcionavam, se compararmos com o nosso retângulo metropolitano e ilhas adjacentes. Imaginemos apenas que não havia fome nem pedintes, e já havia certos conhecimentos de tratamento de doenças tropicais.
Sem falar na vantagem de não haver tantas gravatas, o que tornava tudo mais desafogado, e não só no colarinho.
Falamos nos tempos em que já tudo tinha esquecido a guerra mundial, porque antes tambem terá sido complicado. Neste caso, podemos dizer que era política de Salazar, pois era ele que tudo mandava.
Visto hoje, 50 anos depois do início das independências dos países africanos com demaracação de fronteiras definidas em Berlim, portanto da inteira responsabilidade da europa, não podemos dissociar a história das ex-colónias portuguesas, hoje 5 paises, da história de toda a África colonizada, que vai de Marrocos à Cidade do Cabo.
Mas a maior diferença entre a independência destes nossos 5 irmãos lusófonos, e outros paises africanos, não foi só Portugal ter fardado um exército para impedir que os vários movimentos tomassem nas mãos a independência daquelas fronteiras, mas sim o facto de terem sido os movimentos cujos elementos eram os mais ligados a Portugal, " africanos mais aportuguesados", e os auto-intitulados brancos de 2ª que, ou venceram os outros movimentos ou até nem permitiram que outros movimentos se formassem, que içaram a respectiva bandeira nacional.
O que noutros paises africanos, embora muitos tenha sido o colonizador a "ajudar" a promover os futuros governantes, poucos destes dirigentes estariam desligados do ambiente tribal como o caso daqueles que tomaram o poder nos 5 paises lusófonos.
Que foi o caso mais genuíno desta afirmação a Guiné, com o PAIGC com Amilcar, e o irmão Luis Cabral e muitos outros elementos. Mas também como a formação do MPLA e FRELIMO em que a maioria já não nasceu em palhota de tabanca, mas sim na "praça".
O que parecia algo impossível aos ouvidos. Era difícil acreditar que coordenassem aquele emaranhado de tribos, pelo que muita gente se opôs a "entregar" e "entregar-se" a esses movimentos vencedores de uma luta que não foi apenas dos 13 anos da guerra que a política de Salazar nos obrigou a enfrentar, mas que está muito para lá desses 13 anos.
Muita ilusão tinham esses movimentos, sobre o futuro que os esperava, pois aquilo que parecia naquele período colonial de uma certa prosperidade e abundância e até uma paz social e tribal, ia transformar-se num pesadelo igual ao que outros paises já tinham sofrido e que ainda se vai manifestando aqui e alí.
Mas provavelmente se hoje aqueles 5 países, mantêm as suas bandeiras nacionais e as suas fronteiras intactas conforme as "herdaram" desde 1880 e tal, certamente foi graças a esses movimentos "destribalizados", o que seria muito difícil aos outros movimentos e facções que havia, terem sucesso por falta de gente idónea.
Mas se Portugal (Salazar) tivesse entregue às Nações Unidas (EUA e URSS) em 1961 o destino daqueles territórios como muitos "inteligentes" anti-salazaristas ainda hoje defendem, aquelas fronteiras iam ser todas pulverizadas ou iam ser re-colonizadas fora da lusofonia, e nem seriam provavelmente as figuras como Agostinho Neto, Amilcar e Luis Cabral, ou Machel e outros conhecidos protagonistas que sobreviviam à selvajaria que se adivinhava em Março de 1961.
Já vimos Angola, Guiné e Timor serem invadidos por vizinhos, após a saída de Portugal, imaginemos o que aconteceria em 1961. É que devido a muitos factores faceis de explicar, nem sempre fomos respeitados internacionalmente, e acontecia isso mesmo naquele momento crítico só que nem sempre queremos encarar isso de frente.
Nós portugueses temos tantos conceitos e preconceitos sobre o que nós somos que até temos medo/vergonha de encarar com as nossas fraquezas/forças e preferimos viver num misto de verdade/mentira quanto ao que fazemos ou fizemos ou que outros nos fizeram.
Se não vejamos um caso que não tem muito a ver com a guerra colonial, mas é ilucidativo como devemos ser nós a olhar para nós sem complexos, e não olhar para o lado e varrer os problemas para debaixo do tapete.
Por exemplo esta mentira de sermos o país com as fronteiras mais antigas da europa, com 800 ou mais anos, conforme políticos, escritores e historiadores se fartam de escrever e reescrever.
Mentira, porque a Madeira e os Açores não foram ocupados há tantos anos. Mentira, porque no Alentejo houve um recuo da fronteira de vários quilómetros a leste de Juromenha, o que faz que as nossas últimas fronteiras naquele lugar andam apenas pelos 200 anos, pelo menos provisoriamente, segundo esperam os "amigos de Olivença" o que faria com que hoje ainda nem temos as fronteiras definitivas.
Não devemos continuar a mentir a nós próprios, escondendo ou transfigurando factos históricos, em que nós mesmo participámos, ou estamos vendo mas fugimos com o olhar, como acontece com esta guerra nas nossas antigas colónias em que participámos em conjunto ou contra africanos, cubanos, russos, sulafricanos, etc. etc., e que como portugueses estivemos divididos mas não tanto como uns tantos querem fazer crer.
Até mesmo aqueles que não vestiram um camuflado ou porque foram para a pesca do bacalhau ou sairam das aldeias de assalto trabalhar para a França, até desses Salazar aproveitou o esforço para bem da Nação, uns pescando o fiel e indispensável amigo, outros atravez de agências do BES, estrategicamente colocadas que religiosamente lhe arrecadavam as suas remessas de emigrantes que ao que consta o ditador apreciava imenso.
Outros que foram mais para leste, tambem marcaram aquele período, e a sua maneira de ir contra aquela guerra deve tambem ser escrita e ficar para a história e nunca ser varrida para debaixo do tapete.
Claro que este Blogue é dedicado àqueles que viveram a guerra na Guiné, e espero que os assuntos que abordei, não desrespeitem as memórias de quem lá andou.
Cumprimentos para os editores e todos os que acompanham este blogue.
Antº Rosinha
_____________
Nota do editor:
Último poste da série > 11 de Maio de 2011 > Guiné 63/74 - P8258: Caderno de notas de um Mais Velho (Antº Rosinha) (14): Futebol, política e acção psico-social na guerra do ultramar...
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Guiné 63/74 - P8801: Parabéns a você (317): Coronel Ref Coutinho e Lima (Guiné, 1963/65; 1968/70 e 1972/73), e Raul Albino, ex-Alf Mil da CCAÇ 2402/BCAÇ 2851 (Guiné, 1968/70)
Com um abraço da tertúlia e editores
____________Notas de CV:
- Coutinho e Lima, na sua primeira comissão de serviço na Guiné, foi Comandante da CART 494, que esteve aquartelada em Gadamael (Dez 63/Mai 65); na segunda, entre 1968 e 1970, foi Adjunto da Repartição de Operações do Comando-Chefe das FA da Guiné e a terceira, iniciou-a em Setembro de 1972, tendo sido nomeado por Spínola como comandante do COP 5, com sede em Guileje, em Janeiro de 1973.
- Raul Albino foi Alf Mil da CCAÇ 2402/BCAÇ 2851, que esteve Có, Mansabá e Olossato, nos idos anos de 1968 a 1970.
Vd. último poste da série de 15 de Setembro de 2011 > Guiné 63/74 - P8775: Parabéns a você (316): Manuel José Ribeiro Agostinho, Soldado Escriturário (QG/CTI Guiné, 1968/70)
Guiné 63/74 - P8800: VII Encontro da Tabanca Grande - 2012 (1): Inquérito para escolha da data e recolha de opiniões (A Organização)
VII ENCONTRO DA TABANCA GRANDE - 2012
Inquérito para escolha da data e recolha de opiniões
Inquérito para escolha da data e recolha de opiniões
Camaradas e amigos tertulianos
Se os brasileiros na quarta-feira de Cinzas começam a pensar do Carnaval do ano seguinte, nós também temos que fazer pela vida porque, não tarda, está à porta o VII Encontro da nossa Tabanca.
Como sabem, este ano a data escolhida foi menos boa porque houve algumas coincidências com Encontros de Unidades de alguns do nossos camaradas tertulianos normalmente participantes.
Vamos tentar contornar este problema pondo à vossa apreciação este pequeno inquérito elaborado pelo camarada Miguel Pessoa. Podem responder enviando mensagem com as vossas opções para carlos.vinhal@gmail.com até ao dia 15 de Outubro*, para que se possa, a tempo e horas, fazer as respectivas reservas no Palace Hotel de Monte Real, onde, se não houver nenhum imprevisto, se realizará o próximo Convívio da Tabanca Grande.
I - As opções de datas são as seguintes:
- 31 de Março
- 14 de Abril
- 21 de Abril
- Outra / Qualquer uma
II -No caso de não costumar participar nos Encontros, assinale o motivo:
- Desinteresse
- Coincidência com outros convívios
- Distância de residência
- Outros motivos
III - O que poderia motivá-lo a participar?
IV - Outras observações que ache de interesse:
Este inquérito destina-se apenas a auscultar os participantes habituais, ou possíveis interessados, pelo que as respostas não serão de modo nenhum consideradas como pré-inscrição no Encontro. Mais à frente, depois de consideradas todas as opções/opiniões, começaremos a trabalhar efectivamente na realização do VII Encontro.
Podem e devem responder os tertulianos do Blogue, ex-combatentes da Guiné, que não pertencendo à tertúlia, costumam ou pensam vir a participar no Encontro e quem, de algum modo, se sente ligado à actual Guiné-Bissau.
Muito obrigado desde já pela vossa participação, esperamos vir a reencontrar os camaradas e amigo(a)s que este ano não marcaram presença, e receber aqueles que nunca tiveram oportunidade de comparecer, mas que vão fazer a sua estreia em 2012.
Informamos que a Comissão Organizadora é composta pelo Presidente Honorário Luís Graça e pelos vogais: Belarmino Sardinha, Carlos Vinhal, Joaquim Mexia Alves, José Eduardo Oliveira, José Martins, Magalhães Ribeiro e Miguel Pessoa.
Em nome d(est)a Organização
Carlos Vinhal
____________
Nota de CV:
(*) Em tempo:
Uma vez que o Palace Hotel de Monte Real está a receber muitos pedidos para eventos para os fins de semana de Março, Abril e Maio, antecipámos o prazo para recepção de opiniões para o dia 15 de Outubro de 2011.
terça-feira, 20 de setembro de 2011
Guiné 63/74 - P8799: (In)citações (33): Filhos do vento, ontem, brancu mpelélé, hoje (Cherno Baldé)
Guiné-Bissau > Região de Tombali > Iemberém > Visita dos participantes do Simpósio Internacional de Guileje > 2 de Março de 2008 >
Filhas do vento, filhas de amores de guerra (*)...
Estas duas mulheres, de olhar triste, irmãs, vieram de longe procurar-nos, uma delas com um filho às costas... Estariam na casa dos 30 e muitos anos...
Queriam saber notícias de um tal Furriel Mil Mecânico Auto, de apelido Barros, que terá estado em Cacine em 1971/72... e que seria de origem madeirense ou açoriana. Por essa altura, entre 20 de Maio de 1970 até 15 de Fevereiro de 1972, sabe-se que passou por Cacine a CCaç 2726... Não fixei os seus nomes, nem sei ao certo onde vivem, mas prometi divulgar as suas fotos...
Foto e legenda: © Luís Graça (2008). Todos os direitos reservados.
Foto e legenda: © Luís Graça (2008). Todos os direitos reservados.
1. Comentário. ao poste P8798 (**), assinado pelo nosso querido e bom amigo Cherno Baldé [, aqui na foto, à direita, com os seus filhos, num cerimónia religiosa muçulmana ]:
Caro José Saúde,
Pessoalmente, conheci muitos casos de "Filhos do vento", nascidos de "pais cabeças de vento" que nunca quiseram saber ou se responsabilizar dos seus irrefletidos atos, salvo rarissimas exceções, marcando assim, de forma indelével, o início das suas vidas que, na verdade, não tinham o valor a eles devido ou que é devido a cada ser humano.
No caso do chão Fula, que conheço melhor, a maior parte desses filhos abandonados foi integrada e educada no seio das famílias, mas não teve nem o afeto nem o respeito que merecia, pois tratava-se de filhos nascidos de um erro, uma falha impossível de camuflar e uma vergonha ou da sua falta, ainda mais difícil de explicar.
Mais tarde e já adultos, muitos imigraram para as cidades, onde são conhecidos pelo nome de "Brancu Mpelélé" ou seja, branco pobre como o resto da população, uma anormalidade social.
Muitos conseguiram passar a muralha da Europa e estão por ai, mais perto do que poderão supor, provavelmente à procura das suas raízes violadas ou, quem sabe, dos seus direitos negados.
Um grande abraço a todos,
Cherno Baldé (***)
[ Revisão / fixação de texto , em conformidade com a Novo Acordo Ortográfico: L.G.]
_______________
Notas do editor:
(*) Vd. poste de 20 de Julho de 2009 > Guiné 63/74 - P4710: Blogoterapia (119): As Fantas, as Marias, as Natachas, ou o amor em tempo de guerra e de diáspora (Cherno Baldé)
(*) Vd. poste de 20 de Julho de 2009 > Guiné 63/74 - P4710: Blogoterapia (119): As Fantas, as Marias, as Natachas, ou o amor em tempo de guerra e de diáspora (Cherno Baldé)
(**) Vd. poste de 19 de Setembro de 2011 > Guiné 63/74 – P8798: Memórias de Gabú (José Saúde) (3): reflexos de uma guerra que deixou marcas no tempo: “Filhos do vento”
(***) Último poste da série > 3 de Agosto de 2011 > Guiné 63/74 - P8632: (In)citações (35): Como nasce, vive e morre o homem africano (Artur Augusto Silva, Bissau, 1963)
segunda-feira, 19 de setembro de 2011
Guiné 63/74 - P8798: Memórias de Gabú (José Saúde) (3): “Filhos do vento”: reflexos de uma guerra que deixou marcas no tempo
1. O nosso Camarada José Saúde, ex-Fur Mil Op Esp/RANGER da CCS do BART 6523 (Nova Lamego, Gabú) - 1973/74, enviou-nos a 3ª mensagem desta sua série.
Era linda! Por ironia do destino não consigo lembrar-me do seu nome. Sei, e afirmava o povo com certezas absolutas, que era filha de um camarada, furriel miliciano, que anteriormente esteve em Nova Lamego. Era uma criança dócil. Meiga. Recordo que a sua mãe era uma negra, muito negra, com um rosto lindo e um corpo divinal. Conheci-a e verguei-me perante a sua sensibilidade feminina. Da menina, agora feita senhora, nunca mais soube.
Os seus cabelos eram loiros. Maravilhosos. De cor morena, e de olhos negros, a criança, ainda de tenra idade, era de facto graciosa. Simpática, e de sorriso aberto, a menina espalhava simpatia nos braços de um qualquer soldado… desconhecido. Perdi algum tempo a deliciar-me com a sua meiguice. Dei-lhe o carinho dos meus braços e o seu sorriso tenro transmitiu-me um infinito afecto. Hoje, lamento a ausência do seu nome. Ficou retida na minha memória a sua pequena fisionomia. A sua imagem dócil deixou-me saudades. A menina foi, afinal, mais um dos “filhos do vento” que marcaram os conflitos em África.
Não importa ir ao encontro dos factos reais. Importa, isso sim, sublinhar as virtuais razões de uma guerra que sublimava momentos de encontros e desencontros. Encontros de amores factuais e de desencontros de amores ressacados. Discrepâncias nos campos de batalha. Frutos do acaso. Salvaguardar, também, a razão de actos porventura nunca pensados. Desculpados. A senhora sua mãe, uma jovem encantadora, jamais ousaria imaginar que a sua fertilidade feminina exibiria um fruto tão bonito. Curioso era a sua dicotomia face à originalidade da progenitora. A menina, linda, possuía um ar tremendamente europeu. Quem não conhecia o seu cruzamento de sangues, talvez que não imaginasse a sua originalidade.
Do pai nada se soube. Partiu. A mãe, uma cidadã comum de uma tabanca, conviveu de perto com uma menina nada parecida com outros meninos com os quais partilhava brincadeiras de crianças. E assim terá crescido. Com a minha saída de Nova Lamego perdi-lhe o rasto. Não sei qual terá sido o seu futuro. Será, hoje, uma mulher ilustre na Guiné? Terá procurado futuro num país distante? Ter-se-á encontrado com o seu pai? Será que ele a reconheceu como filha? Será que sua mãe, outrora esbelta e linda, fez dela uma mulher digna no seio do seu clã? Será que estamos agora na presença de uma cidadã guineense com nome internacional? Enfim, um rol de interrogações que me conduz à decência de procurar no infinito do horizonte alvíssaras da sua presença. Fica o pedido!
Ex-Furriel Miliciano José Saúde, tmn 961 482 269 - Nova Lamego (Gabú) 1973/74 (resido em Beja)
Um abraço,
José Saúde
Fur Mil Op Esp/RANGER da CCS do BART 6523
Fotos: © José Saúde (2011). Direitos reservados.
Mini-guião de colecção particular: © Carlos Coutinho (2011). Direitos reservados.
__________
Nota de M.R.:
Vd. primeiros postes desta série em:
13 de Setembro de 2011 > Guiné 63/74 – P8772: Memórias de Gabú (José Saúde) (1): No declinar da nossa presença em terras guineenses… A despedida!
18 de Setembro de 2011 > Guiné 63/74 – P8788: Memórias de Gabú (José Saúde) (2): Os conflitos tribais e a acção da tropa portuguesa. A “Psicó”!
Os seus cabelos eram loiros. Maravilhosos. De cor morena, e de olhos negros, a criança, ainda de tenra idade, era de facto graciosa. Simpática, e de sorriso aberto, a menina espalhava simpatia nos braços de um qualquer soldado… desconhecido. Perdi algum tempo a deliciar-me com a sua meiguice. Dei-lhe o carinho dos meus braços e o seu sorriso tenro transmitiu-me um infinito afecto. Hoje, lamento a ausência do seu nome. Ficou retida na minha memória a sua pequena fisionomia. A sua imagem dócil deixou-me saudades. A menina foi, afinal, mais um dos “filhos do vento” que marcaram os conflitos em África.
Não importa ir ao encontro dos factos reais. Importa, isso sim, sublinhar as virtuais razões de uma guerra que sublimava momentos de encontros e desencontros. Encontros de amores factuais e de desencontros de amores ressacados. Discrepâncias nos campos de batalha. Frutos do acaso. Salvaguardar, também, a razão de actos porventura nunca pensados. Desculpados. A senhora sua mãe, uma jovem encantadora, jamais ousaria imaginar que a sua fertilidade feminina exibiria um fruto tão bonito. Curioso era a sua dicotomia face à originalidade da progenitora. A menina, linda, possuía um ar tremendamente europeu. Quem não conhecia o seu cruzamento de sangues, talvez que não imaginasse a sua originalidade.
Do pai nada se soube. Partiu. A mãe, uma cidadã comum de uma tabanca, conviveu de perto com uma menina nada parecida com outros meninos com os quais partilhava brincadeiras de crianças. E assim terá crescido. Com a minha saída de Nova Lamego perdi-lhe o rasto. Não sei qual terá sido o seu futuro. Será, hoje, uma mulher ilustre na Guiné? Terá procurado futuro num país distante? Ter-se-á encontrado com o seu pai? Será que ele a reconheceu como filha? Será que sua mãe, outrora esbelta e linda, fez dela uma mulher digna no seio do seu clã? Será que estamos agora na presença de uma cidadã guineense com nome internacional? Enfim, um rol de interrogações que me conduz à decência de procurar no infinito do horizonte alvíssaras da sua presença. Fica o pedido!
Ex-Furriel Miliciano José Saúde, tmn 961 482 269 - Nova Lamego (Gabú) 1973/74 (resido em Beja)
Um abraço,
José Saúde
Fur Mil Op Esp/RANGER da CCS do BART 6523
Fotos: © José Saúde (2011). Direitos reservados.
Mini-guião de colecção particular: © Carlos Coutinho (2011). Direitos reservados.
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Nota de M.R.:
Vd. primeiros postes desta série em:
13 de Setembro de 2011 > Guiné 63/74 – P8772: Memórias de Gabú (José Saúde) (1): No declinar da nossa presença em terras guineenses… A despedida!
18 de Setembro de 2011 > Guiné 63/74 – P8788: Memórias de Gabú (José Saúde) (2): Os conflitos tribais e a acção da tropa portuguesa. A “Psicó”!
Guiné 63/74 - P8797: Páginas Negras com Salpicos Cor-de-Rosa (Rui Silva) (14): Quando do PCA veio a ordem para atacar a base de Morés...
1. Mensagem de Rui Silva (ex-Fur Mil da CCAÇ 816, Bissorã, Olossato, Mansoa, 1965/67), com data de 15 de Setembro de 2011:
Caros Luís e Vinhal:
Recebam um grande abraço de estima e consideração, extensivo ao meu querido amigo Magalhães Ribeiro.
Aqui vai mais um extracto das minhas memórias (escritas).
Passem bem.
Rui Silva
Como sempre as minhas primeiras palavras são de saudação para todos os camaradas ex-Combatentes da Guiné, mais ainda para aqueles que de algum modo ainda sofrem de sequelas daquela maldita guerra.
Das minhas memórias “Páginas Negras com Salpicos cor-de-rosa”
Quando do PCA (Posto Comando Aéreo) veio a ordem para avançarem os dois Grupos de Combate da 816 para atacar a base de Morés.
- … viajei num Dornier com o inimigo, na véspera, o “manjaco”.
- … na emaranhada mata de Morés, vegetação “inexpugnável”, andar de gatas, lianas no pescoço, quico que se perde, catanas à esquerda e à direita a abrir caminho.
- … já dentro da mata, o inimigo surpreende-nos com morteiradas esporádicas, mas sem saber onde estávamos ao certo. Ouvia-se a percussão das granadas.
- Assisti ao diálogo, via rádio, entre o Comandante da força de assalto e o PCA que chegou a querer que avançássemos (2 pelotões!), … que estávamos perto.
Chegados a Bissau, de férias na metrópole, eu, o Baião, o Piedade e o Coutinho logo soubemos o que já também prevíamos, que a Companhia já estava instalada no Olossato e portanto era para lá que nos devíamos dirigir. A Companhia tinha deixado Bissorã depois de 5 meses ali aquartelados e a bater a zona, claro.
Uma vez em Mansoa (trampolim para o Olossato) foram primeiro o Baião, o Piedade e o Coutinho, em Dornier. Um dos quatro, por não ter lugar, teria de ficar para o próximo transporte e então foi eu o escolhido.
Em Mansoa aguardei que houvesse coluna ou lugar numa avioneta que fosse para lá, isto é para Olossato.
Passados três dias eis então que me surge a ordem para tomar lugar num “Dornier” que ia para o Olossato. Ao entrar no pequeno aparelho logo me apercebi de que grande operação estava na forja. A suspeita passou à certeza quando o Capitão de Operações dos “Águias Negras” - Batalhão a que estávamos adstritos - dirigindo-se a mim, diz:
- Você vai mesmo numa boa altura....- Disse-o com um sorriso significativo.
O Dornier ia superlotado. À frente, ao lado do piloto, o dito Capitão de Operações da BArt 645 e, atrás, metido entre cunhetes de munições, granadas e mais granadas e outro material de guerra, ia eu e, virado para mim, cara-a-cara, a agradável companhia de um “turra” que ia de mãos atadas com uma corda.
Deste modo viajei num Dornier com o inimigo, na véspera, o “manjaco”.
Raciocinei então que aquele tipo fora apanhado (logo no Olossato soube que tinha sido feito prisioneiro algures na mata de Morés) e agora nos iria servir de guia em alguma operação e que não ia ser pequena pela certa, a avaliar pelo abastecimento de grande quantidade de munições.
O Capitão chegou a oferecer-me a sua pistola temendo alguma reacção do “turra” cá atrás na avioneta. Não sei até que ponto ele admitia isto. Mais tarde, em reflexão, não me custou a admitir qualquer reboliço por parte do “turra”, ainda que isso lhe pudesse custar a vida, (e a dos outros) para provocar o despenhamento da avioneta, pois lembrei-me muito bem da resistência dos presos para interrogatórios em Bissorã, onde eles preferiam arriscar até a vida a contar algo que comprometesse os seus companheiros de luta.
Era esse o meu estado mental. Ali na avioneta poderia muito bem estar ali um desses heróis. Que se passou ao lado de uma possibilidade dessas, parece-me bem que sim.
Nunca uma avioneta demorou tanto a aterrar; era esse o meu estado de espírito.
Ao fim da tarde, já no Olossato, tomei conhecimento com os meus colegas de patente, da operação em causa. Tratava-se nem mais nem menos que ir a Morés, melhor dizendo, à base de Morés, ou melhor ainda, à base central de Morés e já naquela noite.
O nome Morés infundia terror. Morés era só… a principal base de toda a região do Oio, a mais forte do norte, e seguramente das mais fortes da Guiné.
Muito bem armada - as melhores armas estavam lá -, com trincheiras e outros abrigos subterrâneos, até em cimento (dizia-se), com arrecadações que abasteciam as várias bases do Oio, hospital, e com grande efectivo. Bom “pincel”, dizíamos nós.
Por outro lado estávamos orgulhosos de sermos os escolhidos para actuarmos no principal papel numa operação: o grupo de assalto! Fazer o assalto à tão importante base terrorista da Guiné.
Morés, tão pouco ou tão muito, onde jamais a tropa tivera qualquer êxito na verdadeira acepção da palavra. Mas, ir a Morés e… porque não?
Foi o que me estava reservado logo que regressei ao seio da Companhia, após férias. Era curioso: férias com desbunda natural, a própria da idade, e logo ao “outro dia” no mato da Guiné à “procura” da morte.
Operação: Águia Negra
Objectivo: Golpe de mão à casa-de-mato (base central) de Morés
Efectivo militar:
- 2 Grupos de Combate da 816 reforçados com milícias e carregadores indígenas e outros voluntários (a troco de alguns pesos) do Olossato, à frente da coluna e como grupo de assalto (cerca de 90 homens)
- A Companhia de Caçadores n.º 1418, sediada em Bissorã, logo de seguida na coluna e em apoio à retaguarda do grupo da 816.
- Do lado de Mansabá, isto é do lado oposto, avançava uma outra Companhia servindo de “isco” e eventualmente como reforço, se necessário, ao grupo de assalto.
Data: 3 de Novembro de 1965
MEIA-NOITE! A Companhia 1418, com os dois Grupos de Combate da 816 à frente, deixa então Olossato rumo à base de Morés. À frente ia então o “turra”, meu companheiro de viagem aérea de Mansoa para Olossato. Ia devidamente aprisionado e escoltado, não fosse dar o salto. A seguir ao “turra”, nosso guia na circunstância, o 3.º Grupo de Combate, ou seja o meu, depois o 2.º e por fim a fechar a coluna os “periquitos” de Bissorã.
Mergulhados no mato e na mais completa escuridão, (des) confiados na colaboração do guia, e entregues à sorte de Deus - e do diabo também, sempre por ali perto - cerca de 200 homens, armados até aos dentes, seguiam ao encontro do inimigo, algures acoitado e bem seguro, melhor defendido e muito bem armado, dentro daquela vasta zona da complexa mata de Morés de seu nome.
Mas tudo se desmorona como um castelo de cartas. O guia ludibria-nos intencionalmente, fazendo-nos andar às voltas e mais voltas até que nos vimos em plena mata virgem - se não o era assim o parecia. Vimo-nos assim na emaranhada mata de Morés, vegetação “inexpugnável”, andar de gatas, lianas no pescoço, quico que se perde, catanas à esquerda e à direita a abrir caminho.
Aqui, com as consequentes dificuldades de progressão e orientação. Tínhamos entretanto, e como era inevitável, sido detectados, ou para isso não contribuísse o “turra” com as suas deambulações pelo mato, o que não raras vezes acontecia. Mas os “turras” da base, embora já conscientes da nossa presença nas imediações, não sabiam qual o local exacto em que nos encontrávamos, como adiante se verá.
O alvorecer, altura ideal e a combinada para o assalto, já ia bem longe. Eram agora quase 11 horas da manhã e então paramos. Aí, sentados ou de cócoras – a vegetação não dava para mais -, o Alferes Costa, da 816, que chefiava a coluna, e portanto a Operação, dada a ausência do Capitão Riquito, então de férias na metrópole, estabelece contacto com o PCA e pôs este ao corrente da situação. A resposta veio então de forma bem peremptória: “Continuem que estão perto”.
Aqui o Capitão da 1418 insurge-se com tal determinação do PCA e ameaça não avançar mais com os seus homens em face das circunstâncias, a que não era alheio uma muito reduzida possibilidade de êxito contra a hipótese mais que viável de pagarmos tudo muito bem caro. O inimigo estava perfeitamente conhecedor das nossas intenções e… à nossa espera.
Uma vez e já dentro da mata, o inimigo surpreende-nos com morteiradas esporádicas, mas sem saber onde estávamos ao certo. Ouvia-se a percussão das granadas.
Julgo que eles batiam os trilhos, só que, nesta Operação, a ideia foi de os evitar e ir muito a corta-mato. Aqui o “manjaco” foi um bom trunfo e colaborou, até…
Entretanto as percussões de granadas de morteiro da base terrorista ouviam-se com nitidez o que queria dizer que estávamos bem perto deles. Estas eram lançadas ao redor da base, aqui e acolá, com o intuito de nos detectarem ao certo, mas isso só eles conseguiam se nós respondêssemos com qualquer tipo de fogo, o que não acontecia obviamente. Assim entre uma percussão e o rebentamento duma granada, passavam-se escassos segundos de extrema expectativa e angústia para nós. Receávamos que acabasse por cair alguma em cima de nós.
Ao fim de aturada discussão entre o Alferes Costa e o PCA, através do rádio, o PCA, em face das circunstâncias, manda então que a 1418 se instale ali fazendo a segurança à retaguarda e que PROSSEGUÍSSEMOS NÓS para o objectivo!!
Assisti ao diálogo, via rádio, entre o Comandante da força de assalto e o PCA que chegou a querer que avançássemos (2 pelotões!),… que estávamos perto.
- O quê? Só os dois Grupos de combate para a frente? Eles estão doidos!
Foi uma exclamação quase geral e em cadeia.
- Não pode ser meu Alferes! Somos muito poucos para eles.
- Eles estão mesmo à nossa espera e ainda por cima entrincheirados, e nós a peito descoberto?
Dizia este e aquele e ao fim e ao cabo o que ia no pensamento de todos. O ambiente era de evidente pessimismo e não era para menos. O Alferes Costa, em tão ingrata situação, não disfarçava o seu nervosismo. Ele tinha de cumprir a ordem e esta era de avançar para o inimigo. Incrível!!!
- Vamos lá ficar todos.
- Não temos qualquer hipótese.
- É uma operação suicida.
- O PCA fala assim porque anda lá em cima.
- Diga isso lá para cima, meu Alferes.
Estas e outras frases ouviam-se em tão caótica situação.
O Alferes Costa insiste com o PCA em reconsiderar tal estado de coisas, e este, finalmente, mas claramente contrariado, permite que regressemos ao Olossato abandonando assim a ideia de entramos suicidamente em confronto com o inimigo, instalado e avisado e super-armado. Sim, cerca de 90 homens (alguns apenas carregadores, isto é, sem armas) assaltarem uma base bem armada e melhor defendida, onde não faltavam os potentes morteiros de calibre 82 e as entrincheiradas metralhadoras pesadas, base já mais que prevenida das nossas intenções, era uma loucura, que resultaria, por certo, numa operação repleta de aspectos muito trágicos.
Assim:
Respiramos fundo uma vez libertos daquele pesadelo e a marcha de regresso começou logo a processar-se.
De Morés ficamos a conhecer o que era a mata para aqueles lados e, por pressentimento, quão forte era aquele refúgio inimigo.
Por insolação e/ou esgotamento foram evacuados vários militares.
Mas havíamos de lá voltar…
Descreve, no seu Site Leões Negros - CCaç 13, o camarada Carlos Fortunato o que era Morés ao tempo (1970) e, que coincidindo com a minha percepção e leitura, na altura, sobre aquele tão importante refúgio de Morés em 1966, transcrevo com a devida autorização do Carlos Fortunato, assim como as fotografias que se inserem.
No entanto, ao meu tempo, ainda não se falava na presença de cubanos, nem de canhões, e tenho consciência também, que Morés foi melhorando, com o tempo, aquela fortaleza, cada vez com armas mais sofisticadas e abrigos mais consistentes, ou Morés não fosse o “santuário” do PAIGC no centro da Guiné:
Uma escola na Tabanca de Morés
A mata do Morés era um dos nomes míticos da guerra na Guiné, tratava-se de uma mata muito densa, no meio da Guiné, na qual se encontrava situado o quartel general da zona norte do PAIGC.
A mata do Morés era um dos “santuários” da guerrilha, apenas superado pelas zonas junto à fronteira sul, pois aí com forte apoio do exterior, e com boas linhas de abastecimento vindas do território da Guiné-Conakry, o seu poder de fogo era inesgotável, transformando num inferno os aquartelamentos junto à fronteira. Na fronteira norte o problema na altura ainda não era tão grave, pois o apoio do Senegal, ainda não era um apoio declarado.
Nesta mata, segundo as informações existentes na altura, a guerrilha possuía uma força estimada em 900 homens bem equipados, onde se incluíam forças especializadas, cubanos, armas pesadas, anti-aéreas, abrigos subterrâneos contra bombardeamentos, hospital subterrâneo, etc.
Apesar de ser uma certeza de que possuía forças consideráveis na zona, era sempre difícil avaliar a dimensão das forças que iríamos enfrentar, pois a guerrilha facilmente as dispersava pelos vários acampamentos existentes, ou as concentrava se existisse um alvo que quisesse destruir.
No centro desta mata existia a tabanca do Morés, mas sem grande importância, e sem grande possibilidade de defesa, pois encontra-se em terreno aberto.
As bases do PAIGC estavam espalhadas pela mata, bem camufladas e era frequente a sua mudança, para evitar a sua localização.
O sucesso de uma operação nesta mata, dependia muito das informações conseguidas por dissidentes do PAIGC, nomeadamente quando se conhecia a localização de depósitos de material, não era este o caso da nossa “visita”, pois creio que se queria apenas afirmar ao PAIGC, que não existia nenhum local onde não pudéssemos ir.
Pelo que nos foi dado observar na nossa rápida “visita”, a mata possuía caminhos muito estreitos e alguns deles minados, ladeados por um mato tão cerrado que era impossível passar, ou lançar uma granada, nos lados desses caminhos trincheiras, para ninhos de metralhadoras, nas copas de algumas árvores uma placa de madeira e uma caixa, indicavam locais de vigia e talvez a existência de um sistema de comunicações, os abrigos anti-aéreos eram muito rudimentares, e consistiam num enorme buraco cavado no chão, sem qualquer estrutura que o suportasse.
Uma cozinha em Morés
Combater no meio da mata do Morés colocava grandes dificuldades, a primeira era que ficávamos privados de apoio aéreo (a vegetação é de tal modo cerrada que não se consegue sinalizar a nossa posição, para a aviação nos dar apoio, são escassas as clareiras e normalmente estão sob a mira dos morteiros), as progressões são difíceis ( tem que se caminhar agachado ou a rastejar, para conseguir passar entre as árvores), a alternativa de seguir pelos trilhos existentes tinha os problemas referidos anteriormente, pois existia um sistema defensivo implementado, que mesmo sendo rudimentar, dava-lhes vantagem, uma grande vantagem, num confronto com as nossas tropas.
Apesar de a actividade da guerrilha se caracterizar por acções de flagelação e fuga, a verdade é que nalguns casos excepcionais esta começava a defender terreno, como o caso do Morés.
Uma ocupação deste tipo de terreno, implicava muitas baixas, e a guerrilha acabaria sempre por fugir e regressar mais tarde.
O PAIGC considerava-se invencível nesta mata.”
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Nota de CV:
Vd. último poste da série de 18 de Agosto de 2011 > Guiné 63/74 – P8684: Páginas Negras com Salpicos Cor-de-Rosa (Rui Silva) (13): Como se apanha uma alcunha logo no primeiro dia de Guiné
Caros Luís e Vinhal:
Recebam um grande abraço de estima e consideração, extensivo ao meu querido amigo Magalhães Ribeiro.
Aqui vai mais um extracto das minhas memórias (escritas).
Passem bem.
Rui Silva
Como sempre as minhas primeiras palavras são de saudação para todos os camaradas ex-Combatentes da Guiné, mais ainda para aqueles que de algum modo ainda sofrem de sequelas daquela maldita guerra.
Das minhas memórias “Páginas Negras com Salpicos cor-de-rosa”
Quando do PCA (Posto Comando Aéreo) veio a ordem para avançarem os dois Grupos de Combate da 816 para atacar a base de Morés.
- … viajei num Dornier com o inimigo, na véspera, o “manjaco”.
- … na emaranhada mata de Morés, vegetação “inexpugnável”, andar de gatas, lianas no pescoço, quico que se perde, catanas à esquerda e à direita a abrir caminho.
- … já dentro da mata, o inimigo surpreende-nos com morteiradas esporádicas, mas sem saber onde estávamos ao certo. Ouvia-se a percussão das granadas.
- Assisti ao diálogo, via rádio, entre o Comandante da força de assalto e o PCA que chegou a querer que avançássemos (2 pelotões!), … que estávamos perto.
Localização do Morés
Chegados a Bissau, de férias na metrópole, eu, o Baião, o Piedade e o Coutinho logo soubemos o que já também prevíamos, que a Companhia já estava instalada no Olossato e portanto era para lá que nos devíamos dirigir. A Companhia tinha deixado Bissorã depois de 5 meses ali aquartelados e a bater a zona, claro.
Uma vez em Mansoa (trampolim para o Olossato) foram primeiro o Baião, o Piedade e o Coutinho, em Dornier. Um dos quatro, por não ter lugar, teria de ficar para o próximo transporte e então foi eu o escolhido.
Em Mansoa aguardei que houvesse coluna ou lugar numa avioneta que fosse para lá, isto é para Olossato.
Passados três dias eis então que me surge a ordem para tomar lugar num “Dornier” que ia para o Olossato. Ao entrar no pequeno aparelho logo me apercebi de que grande operação estava na forja. A suspeita passou à certeza quando o Capitão de Operações dos “Águias Negras” - Batalhão a que estávamos adstritos - dirigindo-se a mim, diz:
- Você vai mesmo numa boa altura....- Disse-o com um sorriso significativo.
O Dornier ia superlotado. À frente, ao lado do piloto, o dito Capitão de Operações da BArt 645 e, atrás, metido entre cunhetes de munições, granadas e mais granadas e outro material de guerra, ia eu e, virado para mim, cara-a-cara, a agradável companhia de um “turra” que ia de mãos atadas com uma corda.
Deste modo viajei num Dornier com o inimigo, na véspera, o “manjaco”.
Raciocinei então que aquele tipo fora apanhado (logo no Olossato soube que tinha sido feito prisioneiro algures na mata de Morés) e agora nos iria servir de guia em alguma operação e que não ia ser pequena pela certa, a avaliar pelo abastecimento de grande quantidade de munições.
O Capitão chegou a oferecer-me a sua pistola temendo alguma reacção do “turra” cá atrás na avioneta. Não sei até que ponto ele admitia isto. Mais tarde, em reflexão, não me custou a admitir qualquer reboliço por parte do “turra”, ainda que isso lhe pudesse custar a vida, (e a dos outros) para provocar o despenhamento da avioneta, pois lembrei-me muito bem da resistência dos presos para interrogatórios em Bissorã, onde eles preferiam arriscar até a vida a contar algo que comprometesse os seus companheiros de luta.
Era esse o meu estado mental. Ali na avioneta poderia muito bem estar ali um desses heróis. Que se passou ao lado de uma possibilidade dessas, parece-me bem que sim.
Nunca uma avioneta demorou tanto a aterrar; era esse o meu estado de espírito.
Ao fim da tarde, já no Olossato, tomei conhecimento com os meus colegas de patente, da operação em causa. Tratava-se nem mais nem menos que ir a Morés, melhor dizendo, à base de Morés, ou melhor ainda, à base central de Morés e já naquela noite.
O nome Morés infundia terror. Morés era só… a principal base de toda a região do Oio, a mais forte do norte, e seguramente das mais fortes da Guiné.
Muito bem armada - as melhores armas estavam lá -, com trincheiras e outros abrigos subterrâneos, até em cimento (dizia-se), com arrecadações que abasteciam as várias bases do Oio, hospital, e com grande efectivo. Bom “pincel”, dizíamos nós.
Por outro lado estávamos orgulhosos de sermos os escolhidos para actuarmos no principal papel numa operação: o grupo de assalto! Fazer o assalto à tão importante base terrorista da Guiné.
Morés, tão pouco ou tão muito, onde jamais a tropa tivera qualquer êxito na verdadeira acepção da palavra. Mas, ir a Morés e… porque não?
Foi o que me estava reservado logo que regressei ao seio da Companhia, após férias. Era curioso: férias com desbunda natural, a própria da idade, e logo ao “outro dia” no mato da Guiné à “procura” da morte.
Operação: Águia Negra
Objectivo: Golpe de mão à casa-de-mato (base central) de Morés
Efectivo militar:
- 2 Grupos de Combate da 816 reforçados com milícias e carregadores indígenas e outros voluntários (a troco de alguns pesos) do Olossato, à frente da coluna e como grupo de assalto (cerca de 90 homens)
- A Companhia de Caçadores n.º 1418, sediada em Bissorã, logo de seguida na coluna e em apoio à retaguarda do grupo da 816.
- Do lado de Mansabá, isto é do lado oposto, avançava uma outra Companhia servindo de “isco” e eventualmente como reforço, se necessário, ao grupo de assalto.
Data: 3 de Novembro de 1965
MEIA-NOITE! A Companhia 1418, com os dois Grupos de Combate da 816 à frente, deixa então Olossato rumo à base de Morés. À frente ia então o “turra”, meu companheiro de viagem aérea de Mansoa para Olossato. Ia devidamente aprisionado e escoltado, não fosse dar o salto. A seguir ao “turra”, nosso guia na circunstância, o 3.º Grupo de Combate, ou seja o meu, depois o 2.º e por fim a fechar a coluna os “periquitos” de Bissorã.
Mergulhados no mato e na mais completa escuridão, (des) confiados na colaboração do guia, e entregues à sorte de Deus - e do diabo também, sempre por ali perto - cerca de 200 homens, armados até aos dentes, seguiam ao encontro do inimigo, algures acoitado e bem seguro, melhor defendido e muito bem armado, dentro daquela vasta zona da complexa mata de Morés de seu nome.
Mas tudo se desmorona como um castelo de cartas. O guia ludibria-nos intencionalmente, fazendo-nos andar às voltas e mais voltas até que nos vimos em plena mata virgem - se não o era assim o parecia. Vimo-nos assim na emaranhada mata de Morés, vegetação “inexpugnável”, andar de gatas, lianas no pescoço, quico que se perde, catanas à esquerda e à direita a abrir caminho.
Aqui, com as consequentes dificuldades de progressão e orientação. Tínhamos entretanto, e como era inevitável, sido detectados, ou para isso não contribuísse o “turra” com as suas deambulações pelo mato, o que não raras vezes acontecia. Mas os “turras” da base, embora já conscientes da nossa presença nas imediações, não sabiam qual o local exacto em que nos encontrávamos, como adiante se verá.
O alvorecer, altura ideal e a combinada para o assalto, já ia bem longe. Eram agora quase 11 horas da manhã e então paramos. Aí, sentados ou de cócoras – a vegetação não dava para mais -, o Alferes Costa, da 816, que chefiava a coluna, e portanto a Operação, dada a ausência do Capitão Riquito, então de férias na metrópole, estabelece contacto com o PCA e pôs este ao corrente da situação. A resposta veio então de forma bem peremptória: “Continuem que estão perto”.
Aqui o Capitão da 1418 insurge-se com tal determinação do PCA e ameaça não avançar mais com os seus homens em face das circunstâncias, a que não era alheio uma muito reduzida possibilidade de êxito contra a hipótese mais que viável de pagarmos tudo muito bem caro. O inimigo estava perfeitamente conhecedor das nossas intenções e… à nossa espera.
Uma vez e já dentro da mata, o inimigo surpreende-nos com morteiradas esporádicas, mas sem saber onde estávamos ao certo. Ouvia-se a percussão das granadas.
Julgo que eles batiam os trilhos, só que, nesta Operação, a ideia foi de os evitar e ir muito a corta-mato. Aqui o “manjaco” foi um bom trunfo e colaborou, até…
Entretanto as percussões de granadas de morteiro da base terrorista ouviam-se com nitidez o que queria dizer que estávamos bem perto deles. Estas eram lançadas ao redor da base, aqui e acolá, com o intuito de nos detectarem ao certo, mas isso só eles conseguiam se nós respondêssemos com qualquer tipo de fogo, o que não acontecia obviamente. Assim entre uma percussão e o rebentamento duma granada, passavam-se escassos segundos de extrema expectativa e angústia para nós. Receávamos que acabasse por cair alguma em cima de nós.
Ao fim de aturada discussão entre o Alferes Costa e o PCA, através do rádio, o PCA, em face das circunstâncias, manda então que a 1418 se instale ali fazendo a segurança à retaguarda e que PROSSEGUÍSSEMOS NÓS para o objectivo!!
Assisti ao diálogo, via rádio, entre o Comandante da força de assalto e o PCA que chegou a querer que avançássemos (2 pelotões!),… que estávamos perto.
- O quê? Só os dois Grupos de combate para a frente? Eles estão doidos!
Foi uma exclamação quase geral e em cadeia.
- Não pode ser meu Alferes! Somos muito poucos para eles.
- Eles estão mesmo à nossa espera e ainda por cima entrincheirados, e nós a peito descoberto?
Dizia este e aquele e ao fim e ao cabo o que ia no pensamento de todos. O ambiente era de evidente pessimismo e não era para menos. O Alferes Costa, em tão ingrata situação, não disfarçava o seu nervosismo. Ele tinha de cumprir a ordem e esta era de avançar para o inimigo. Incrível!!!
- Vamos lá ficar todos.
- Não temos qualquer hipótese.
- É uma operação suicida.
- O PCA fala assim porque anda lá em cima.
- Diga isso lá para cima, meu Alferes.
Estas e outras frases ouviam-se em tão caótica situação.
O Alferes Costa insiste com o PCA em reconsiderar tal estado de coisas, e este, finalmente, mas claramente contrariado, permite que regressemos ao Olossato abandonando assim a ideia de entramos suicidamente em confronto com o inimigo, instalado e avisado e super-armado. Sim, cerca de 90 homens (alguns apenas carregadores, isto é, sem armas) assaltarem uma base bem armada e melhor defendida, onde não faltavam os potentes morteiros de calibre 82 e as entrincheiradas metralhadoras pesadas, base já mais que prevenida das nossas intenções, era uma loucura, que resultaria, por certo, numa operação repleta de aspectos muito trágicos.
Assim:
Respiramos fundo uma vez libertos daquele pesadelo e a marcha de regresso começou logo a processar-se.
De Morés ficamos a conhecer o que era a mata para aqueles lados e, por pressentimento, quão forte era aquele refúgio inimigo.
Por insolação e/ou esgotamento foram evacuados vários militares.
Mas havíamos de lá voltar…
Descreve, no seu Site Leões Negros - CCaç 13, o camarada Carlos Fortunato o que era Morés ao tempo (1970) e, que coincidindo com a minha percepção e leitura, na altura, sobre aquele tão importante refúgio de Morés em 1966, transcrevo com a devida autorização do Carlos Fortunato, assim como as fotografias que se inserem.
No entanto, ao meu tempo, ainda não se falava na presença de cubanos, nem de canhões, e tenho consciência também, que Morés foi melhorando, com o tempo, aquela fortaleza, cada vez com armas mais sofisticadas e abrigos mais consistentes, ou Morés não fosse o “santuário” do PAIGC no centro da Guiné:
Uma escola na Tabanca de Morés
A mata do Morés era um dos nomes míticos da guerra na Guiné, tratava-se de uma mata muito densa, no meio da Guiné, na qual se encontrava situado o quartel general da zona norte do PAIGC.
A mata do Morés era um dos “santuários” da guerrilha, apenas superado pelas zonas junto à fronteira sul, pois aí com forte apoio do exterior, e com boas linhas de abastecimento vindas do território da Guiné-Conakry, o seu poder de fogo era inesgotável, transformando num inferno os aquartelamentos junto à fronteira. Na fronteira norte o problema na altura ainda não era tão grave, pois o apoio do Senegal, ainda não era um apoio declarado.
Nesta mata, segundo as informações existentes na altura, a guerrilha possuía uma força estimada em 900 homens bem equipados, onde se incluíam forças especializadas, cubanos, armas pesadas, anti-aéreas, abrigos subterrâneos contra bombardeamentos, hospital subterrâneo, etc.
Apesar de ser uma certeza de que possuía forças consideráveis na zona, era sempre difícil avaliar a dimensão das forças que iríamos enfrentar, pois a guerrilha facilmente as dispersava pelos vários acampamentos existentes, ou as concentrava se existisse um alvo que quisesse destruir.
No centro desta mata existia a tabanca do Morés, mas sem grande importância, e sem grande possibilidade de defesa, pois encontra-se em terreno aberto.
As bases do PAIGC estavam espalhadas pela mata, bem camufladas e era frequente a sua mudança, para evitar a sua localização.
O sucesso de uma operação nesta mata, dependia muito das informações conseguidas por dissidentes do PAIGC, nomeadamente quando se conhecia a localização de depósitos de material, não era este o caso da nossa “visita”, pois creio que se queria apenas afirmar ao PAIGC, que não existia nenhum local onde não pudéssemos ir.
Pelo que nos foi dado observar na nossa rápida “visita”, a mata possuía caminhos muito estreitos e alguns deles minados, ladeados por um mato tão cerrado que era impossível passar, ou lançar uma granada, nos lados desses caminhos trincheiras, para ninhos de metralhadoras, nas copas de algumas árvores uma placa de madeira e uma caixa, indicavam locais de vigia e talvez a existência de um sistema de comunicações, os abrigos anti-aéreos eram muito rudimentares, e consistiam num enorme buraco cavado no chão, sem qualquer estrutura que o suportasse.
Uma cozinha em Morés
Combater no meio da mata do Morés colocava grandes dificuldades, a primeira era que ficávamos privados de apoio aéreo (a vegetação é de tal modo cerrada que não se consegue sinalizar a nossa posição, para a aviação nos dar apoio, são escassas as clareiras e normalmente estão sob a mira dos morteiros), as progressões são difíceis ( tem que se caminhar agachado ou a rastejar, para conseguir passar entre as árvores), a alternativa de seguir pelos trilhos existentes tinha os problemas referidos anteriormente, pois existia um sistema defensivo implementado, que mesmo sendo rudimentar, dava-lhes vantagem, uma grande vantagem, num confronto com as nossas tropas.
Apesar de a actividade da guerrilha se caracterizar por acções de flagelação e fuga, a verdade é que nalguns casos excepcionais esta começava a defender terreno, como o caso do Morés.
Uma ocupação deste tipo de terreno, implicava muitas baixas, e a guerrilha acabaria sempre por fugir e regressar mais tarde.
O PAIGC considerava-se invencível nesta mata.”
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Nota de CV:
Vd. último poste da série de 18 de Agosto de 2011 > Guiné 63/74 – P8684: Páginas Negras com Salpicos Cor-de-Rosa (Rui Silva) (13): Como se apanha uma alcunha logo no primeiro dia de Guiné
Guiné 63/74 - P8796: História do BCAÇ 4612/72 (Mansoa, 1972/74): Encontros e reencontros com o PAIGC, de 1 de Maio a 31 de Julho de 1974 (Parte II) (Jorge Canhão)
Saber fazer a guerra, aprender a construir a paz... Ilustrações retiradas da História do BCAÇ 4612/72
(Mansoa, 1972/74).
[ Selecção / edição / introdução e legendagem / Ortografia de acordo com o Novo Acordo: L.G.]
1. Retomamos mais algumas páginas da História do BCAÇ 4612/72 (Mansoa, 1972/74), unidade que foi rendida pelo BCAÇ 4612/74 (Mansoa, 1974)... (Sobre esta aparente confusão de dois batalhões com o mesmo número, já chamámos a atenção para o poste, esclarecedor, do nosso camarada Agostinho Gaspar, P7414, de 10 de Dezembro de 2010).
Um exemplar (aliás, uma boa cópia, bem legível) da história desta unidade, o BCAÇ 4612/72, foi-nos oferecido em tempos pelo nosso camarigo Jorge Canhão (ex-Fur Mil 3ª C/BCAÇ 4612/72, Mansoa e Gadamael, 1972/74) (*). O Jorge já havia aqui publicado uma série de postes com a história do batalhão... (se bem que incompleta).
Convém aqui recordar que o BCAÇ 4612/72 foi mobilizado pelo RI 16, tendo partido para o TO da Guiné em 28/9/72 e regressado em finais de Agosto de 1974 (no período de 26 a 28). Esteve sediado em Mansoa. Foi seu comandante o Ten Cor Inf Eurico Simões Mateus. Unidades de quadrícula: 1ª C/BCAÇ 4612/72 (Porto Gole); 2ª C/BCAÇ 4612/72 (Jugudul); 3ª C/BCAÇ 4612/72 (Mansoa, Gadamael, Mansoa).
De acordo com o poste anterior (*), focamos agora a nossa atenção sobre os últimos três meses da comissão desta unidade no TO da Guiné, coincidindo com o pós-25 de Abril de 1974 (Maio, Junho e Julho). Interessa-nos ver como, no sector de Mansoa, se processaram as relações entre as NT e a o PAIGC, no terreno.
Recorde-se que o nosso camarada, coeditor, Eduardo Magalhães Ribeiro, já aqui havia publicado uma série de postes relativos à transferência de soberania entre o BCAÇ 4612/74 e o PAIGC, em Mansoa, em 9 de Setembro de 1974. (A cerimónia ocorrida em Mansoa teve bastante cobertura mediática na altura, e o Eduardo terá sido o último português a arriar a nossa bandeira no antigo TO da Guiné, hoje República da Guiné-Bissau).
O que se passou entretanto em Junho de 1974, no setor de Mansoa ? Grosso modo, pode dizer-se que houve uma cessação total da atividade operacional ofensiva tanto das NT como do PAIGC, na sequência das conversações de paz entre o Governo Português e a delegação do PAIGC, que estavam a decorrer em Londres e Argel.
Conforme se pode ler nos excertos da História da Undiade, que publicamos a seguir, o cessar-fogo, neste sector, foi formalizado com a reunião, de 12 de Junho, às 9h30, entre o comandante do BCAÇ 4612/72, Ten Cor Eurico Simão Mateus, e o comandante do PAIGC, da Frente Morés/Nhacra, Manuel N'Dinga (que o nosso camarada Eduardo Magalhães Ribeiro irá depois conhecer pessoalmente, em 9 de Setembro de 1974, e a quem chama "comissário político").
Conforme se pode ler nos excertos da História da Undiade, que publicamos a seguir, o cessar-fogo, neste sector, foi formalizado com a reunião, de 12 de Junho, às 9h30, entre o comandante do BCAÇ 4612/72, Ten Cor Eurico Simão Mateus, e o comandante do PAIGC, da Frente Morés/Nhacra, Manuel N'Dinga (que o nosso camarada Eduardo Magalhães Ribeiro irá depois conhecer pessoalmente, em 9 de Setembro de 1974, e a quem chama "comissário político").
Neste período, prosseguiu entretanto a construção da estrada Jugudul-Bambdinca, tendo a sua asfaltagem avançado mais cerca de 2,5 quilómetros em relação ao mês anterior... Também foram concluídas mais umas dezenas de casas dos reordenamentos em curso assim como um posto sanitário.
O comando do BCAÇ 4612/72 (que assume a ideia de que o processo é irreversível) diz o seguinte em relação ao estado de espírito da população civil neste período de 1 a 30 de Junho de 1974:
"A atitude geral das populações, até agora sob nosso controlo, é de grande expetativa e euforia, sobretudo nas massas mais jovens. Têm-se notado algumas desavenças ideológicas entre a população e a tropa africana do nosso lado, nomeadamente com alguns milícias.
"No princípio das tréguas, a população mais idosa mostrou uma certa relutância em aceitar o PAIGC, mostrando-se apreensiva quanto a uma futura independência da Guiné e consequente saída dos brancos. Tem-se no entanto notado ultimamente um desvio quase total dessa tendência inicial anti-PAIGC, sendo agora a aceitação daquele Partido bastante notória, verificando-se grande adesão, visível em especial na comparticipação eufórica da população nas reuniões de esclarecimento e propaganda feitas pelo PAIGC.
"Atualmente mantem-se a expetativa quanto ao desenrolar das negociações entre o PAIGC e o Governo português e a concretização final das mesmas" (História da Unidade, Cap II, Fasc XIX, pp. 107-108).
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Nota do editor:
(*) Poste anterior da série > 17 de Setembro de 2011 > Guiné 63/74 - P8787: História do BCAÇ 4612/72 (Mansoa, 1972/74): Encontros e reencontros com o PAIGC, de 1 de Maio a 31 de Julho de 1974 (Parte I) (Jorge Canhão)
Guiné 63/74 - P8795: Notas de leitura (275): A Força Aérea na Guerra em África - Angola, Guiné e Moçambique, 1961 - 1974, por Luís Alves de Fraga (Mário Beja Santos)
1. Mensagem de Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, Comandante do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 26 de Agosto de 2011:
Queridos amigos,
Tanto como me é dado saber, este trabalho do coronel Luís Alves de Fraga é o primeiro que abraça toda a actividade aeronáutica nos três teatros de operações. Permite uma leitura sugestiva e ter a percepção em sequência do historial da Força Aérea. Valerá talvez a pena procurar articular melhor este estudo com os pára-quedistas.
Tenho agora pela frente as quase 900 páginas de “Bordo de Ataque”, de José Krus Abecasis, porventura o melhor conjunto de memórias que permite exactamente iluminar algumas dimensões do trabalho do coronel Luís Alves de Fraga.
O abraço do
Mário
A Força Aérea na Guiné
Beja Santos
“A Força Aérea na Guerra em África – Angola, Guiné e Moçambique, 1961 – 1974”, por Luís Alves de Fraga, Prefácio, 2004, apresenta-se como o primeiro trabalho que abrange a actividade aeronáutica nos três teatros de operações africanos e tem a pretensão de proceder à descrição do esforço militar da Força Aérea no decurso da guerra. O coronel Luís Alves de Fraga dá-nos um quadro sumário dos antecedentes da aviação militar em África, como o nosso ingresso na Nato introduziu um fluxo renovador na Força Aérea como terceiro ramo das Forças Armadas. Foi graças a um novo conceito estratégico da NATO que Portugal foi dotado com elevado número de aviões de caça (175 em 14 esquadrilhas). Para os cérebros da NATO a aviação de caça era a prioridade e não a aviação naval. Depois, o autor traça uma resenha dos sinais de subversão em África e comenta a evolução das hostilidades militares na Guiné, nomeadamente chama a atenção para o enquadramento da Força Aérea segundo as directivas do Governador e Comandante-Chefe António de Spínola. Mais adiante, esmiúça o papel da Força Aérea nos três teatros de operações.
Centrado no teatro guineense, conta a história da Zona Aérea de Cabo Verde e Guiné, integrada na 1ª Região Aérea. O Aeródromo-Base nº 2 foi inaugurado em 25 de Maio de 1961 (converter-se-á, anos depois, depois de obras de beneficiação, na Base Aérea nº 12). Comenta que os guerrilheiros do PAIGC desde cedo mostraram forte desejo de fazer frente à mobilidade e liberdade de deslocação da Força Aérea, atacando com um certo à-vontade as aeronaves, e refere concretamente as primeiras baixas: perda de um F-86F do Capitão Barros Valla, a perda de um T-6 do Sargento Lobato que colidiu com o Furriel Casal; sinistro em que morreu o Capitão Rebelo Valente que pilotava um T-6. A deslocação dos aviões F-86F para Bissau suscitou grande contestação do governo dos EUA visto tratarem-se de aeronaves atribuídas à NATO. E escreve: “O governo do Estado-novo foi habilidosamente argumentando, ao nível diplomático, de forma a fazer crer que qualquer empenhamento militar em África correspondia a um processo de contenção da expansão do comunismo internacional. Washington mostrou-se inamovível. Mesmo assim, os F-86F conseguiram-se manter na Guiné até 1964, data em que regressaram definitivamente a Portugal”.
De que aeronaves dispunha a Guiné no início da guerra? Para além do F-86F, havia T-6, DO-27, Austers, Alouette II e dois C-47. Observa o autor: “Com estes meios começou-se a dar apoio de fogo ao Exército, a efectuar transporte ligeiro e a fazer frente à guerrilha. Também actuaram sobre o território aviões P2V-5, partindo da ilha do Sal, para efeitos de bombardeamento nocturno. Os Alouette III só chegaram à Guiné no final de 1965. E explica porque é que a missão dos T-6 era essencialmente de apoio às tropas do Exército e às lanchas da Marinha, referindo a amplitude das marés que fazia com que as rias substituíssem as picadas e assegurassem o abastecimento dos aquartelamentos em muitos casos com mais facilidade por via fluvial de que por terra. Os T-6, principalmente nas rias do sul faziam escolta às lanchas como em certas zonas do Geba e do Cacheu. Escreve: “O apoio de fogo com T-6 fazia-se, pelo menos entre 1963 e 1965, usando as metralhadoras Browning com o calibre de 7,7mm, retiradas dos Spitfire e dos Hurricane; evitava-se a utilização de foguetes, por estar condicionado o seu consumo. Inicialmente, os guerrilheiros temiam o fogo de metralhadora mas com o passar do tempo teve de fazer-se a opção pelo uso de foguetes de fragmentação Sneb de 37mm”. O DO-27 era o meio aéreo mais comum para o transporte ligeiro e o PCA; os Auster acabaram por deixar de operar, após sucessivos acidentes; os C-47 estavam destinados ao transporte médio e pesado para longas distâncias.
Referindo-se a actividade antiaérea, o autor lembra que os guerrilheiros possuíam metralhadoras antiaéreas 14,4mm que chegavam a pôr em risco os próprios T-6, obrigando os pilotos a voar a 8 mil pés de altitude; logo em 1963 houve notícia da existência de metralhadoras 12,7mm montadas em tripés, responsáveis pelo abate de vários aparelhos. Em finais de 1965, desencadeou-se a operação “Resgate” que tinha por objectivo calar as armas antiaéreas existentes na península do Cantanhez. Foram lançadas 30 toneladas de bombas e a ofensiva antiaérea desapareceu do Cantanhez durante vários meses. Quando, na segunda metade de 1966, aumentou a resistência do PAIGC na península de Quitafine, atacando os aquartelamentos de Cacine e Cameconde, impedindo as guarnições de saírem, foi lançada a operação “Estoque” que empenhou consideráveis meios aéreos. Lançaram-se cerca de 800Kg de bombas e granadas sobre as armas antiaéreas logo nas primeiras horas e no balanço final concluiu-se que se haviam lançado 6800Kg de bombas e 50 granadas incendiárias. O Exército teve o caminho desimpedido, baixou significativamente a actividade antiaérea na Guiné. O ataque às baterias antiaéreas constituía uma missão perigosa, visto que o piloto tinha de aguentar a sua aeronave dirigida às bocas-de-fogo no solo. Krus Abecasis, em livros que mais tarde serão alvo de recensão, deixou um relato onde escreveu: “O inimigo batia-se e morria no seu posto. Fazendo-nos frente com bravura invejável e desconhecida da generalidade dos militares portugueses”. Todo este panorama mudou radicalmente em 20 de Março de 1973 com o aparecimento do míssil Strela, já estava a ser utilizado no Vietnam. Este míssil obrigava à existência de uma equipa de dois homens – um para carregar o tubo de lançamento e um apontador – e implicava sempre uma guarnição de segurança de outros 15 homens, havia ordens de nunca deixar as tropas portuguesas apanhar um míssil Strela.
O autor deixa-nos um relato condensado das operações aéreas na Guiné de 1966 até ao final da guerra. Um só exemplo, a operação “Valquíria”, em finais de Dezembro de 1966 destinada a desalojar os guerrilheiros que no rio Cumbijã procuravam destruir as lanchas que abasteciam Cufar. 6 toneladas de bombas levaram os guerrilheiros a abandonar as posições que punham em risco a navegação no Cumbijã. Luis Alves de Fraga detalha o cativeiro do Sargento Lobato, já largamente documentado no nosso blogue.
Por último, e de forma condensada, o autor descreve as tropas pára-quedistas e as suas operações em África. Na Guiné, durante toda a campanha, morreram 3 oficiais, 6 sargentos e 47 praças.
A guerra de África foi para os oficiais e sargentos do quadro permanente da Força Aérea o elemento agregador que fez nascer e individualizar este ramo das Forças Armadas. E segundo o autor gerou um espírito de corpo que tornou possível, no fim do conflito, não se ter verificado uma debandada geral dos efectivos permanentes em busca de outras fontes de rendimento.
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Nota de CV:
Vd. último poste da série de 16 de Setembro de 2011 > Guiné 63/74 - P8785: Notas de leitura (274): Hna Bijagó, de António Estácio (Mário Beja Santos)
Queridos amigos,
Tanto como me é dado saber, este trabalho do coronel Luís Alves de Fraga é o primeiro que abraça toda a actividade aeronáutica nos três teatros de operações. Permite uma leitura sugestiva e ter a percepção em sequência do historial da Força Aérea. Valerá talvez a pena procurar articular melhor este estudo com os pára-quedistas.
Tenho agora pela frente as quase 900 páginas de “Bordo de Ataque”, de José Krus Abecasis, porventura o melhor conjunto de memórias que permite exactamente iluminar algumas dimensões do trabalho do coronel Luís Alves de Fraga.
O abraço do
Mário
A Força Aérea na Guiné
Beja Santos
“A Força Aérea na Guerra em África – Angola, Guiné e Moçambique, 1961 – 1974”, por Luís Alves de Fraga, Prefácio, 2004, apresenta-se como o primeiro trabalho que abrange a actividade aeronáutica nos três teatros de operações africanos e tem a pretensão de proceder à descrição do esforço militar da Força Aérea no decurso da guerra. O coronel Luís Alves de Fraga dá-nos um quadro sumário dos antecedentes da aviação militar em África, como o nosso ingresso na Nato introduziu um fluxo renovador na Força Aérea como terceiro ramo das Forças Armadas. Foi graças a um novo conceito estratégico da NATO que Portugal foi dotado com elevado número de aviões de caça (175 em 14 esquadrilhas). Para os cérebros da NATO a aviação de caça era a prioridade e não a aviação naval. Depois, o autor traça uma resenha dos sinais de subversão em África e comenta a evolução das hostilidades militares na Guiné, nomeadamente chama a atenção para o enquadramento da Força Aérea segundo as directivas do Governador e Comandante-Chefe António de Spínola. Mais adiante, esmiúça o papel da Força Aérea nos três teatros de operações.
Centrado no teatro guineense, conta a história da Zona Aérea de Cabo Verde e Guiné, integrada na 1ª Região Aérea. O Aeródromo-Base nº 2 foi inaugurado em 25 de Maio de 1961 (converter-se-á, anos depois, depois de obras de beneficiação, na Base Aérea nº 12). Comenta que os guerrilheiros do PAIGC desde cedo mostraram forte desejo de fazer frente à mobilidade e liberdade de deslocação da Força Aérea, atacando com um certo à-vontade as aeronaves, e refere concretamente as primeiras baixas: perda de um F-86F do Capitão Barros Valla, a perda de um T-6 do Sargento Lobato que colidiu com o Furriel Casal; sinistro em que morreu o Capitão Rebelo Valente que pilotava um T-6. A deslocação dos aviões F-86F para Bissau suscitou grande contestação do governo dos EUA visto tratarem-se de aeronaves atribuídas à NATO. E escreve: “O governo do Estado-novo foi habilidosamente argumentando, ao nível diplomático, de forma a fazer crer que qualquer empenhamento militar em África correspondia a um processo de contenção da expansão do comunismo internacional. Washington mostrou-se inamovível. Mesmo assim, os F-86F conseguiram-se manter na Guiné até 1964, data em que regressaram definitivamente a Portugal”.
De que aeronaves dispunha a Guiné no início da guerra? Para além do F-86F, havia T-6, DO-27, Austers, Alouette II e dois C-47. Observa o autor: “Com estes meios começou-se a dar apoio de fogo ao Exército, a efectuar transporte ligeiro e a fazer frente à guerrilha. Também actuaram sobre o território aviões P2V-5, partindo da ilha do Sal, para efeitos de bombardeamento nocturno. Os Alouette III só chegaram à Guiné no final de 1965. E explica porque é que a missão dos T-6 era essencialmente de apoio às tropas do Exército e às lanchas da Marinha, referindo a amplitude das marés que fazia com que as rias substituíssem as picadas e assegurassem o abastecimento dos aquartelamentos em muitos casos com mais facilidade por via fluvial de que por terra. Os T-6, principalmente nas rias do sul faziam escolta às lanchas como em certas zonas do Geba e do Cacheu. Escreve: “O apoio de fogo com T-6 fazia-se, pelo menos entre 1963 e 1965, usando as metralhadoras Browning com o calibre de 7,7mm, retiradas dos Spitfire e dos Hurricane; evitava-se a utilização de foguetes, por estar condicionado o seu consumo. Inicialmente, os guerrilheiros temiam o fogo de metralhadora mas com o passar do tempo teve de fazer-se a opção pelo uso de foguetes de fragmentação Sneb de 37mm”. O DO-27 era o meio aéreo mais comum para o transporte ligeiro e o PCA; os Auster acabaram por deixar de operar, após sucessivos acidentes; os C-47 estavam destinados ao transporte médio e pesado para longas distâncias.
Referindo-se a actividade antiaérea, o autor lembra que os guerrilheiros possuíam metralhadoras antiaéreas 14,4mm que chegavam a pôr em risco os próprios T-6, obrigando os pilotos a voar a 8 mil pés de altitude; logo em 1963 houve notícia da existência de metralhadoras 12,7mm montadas em tripés, responsáveis pelo abate de vários aparelhos. Em finais de 1965, desencadeou-se a operação “Resgate” que tinha por objectivo calar as armas antiaéreas existentes na península do Cantanhez. Foram lançadas 30 toneladas de bombas e a ofensiva antiaérea desapareceu do Cantanhez durante vários meses. Quando, na segunda metade de 1966, aumentou a resistência do PAIGC na península de Quitafine, atacando os aquartelamentos de Cacine e Cameconde, impedindo as guarnições de saírem, foi lançada a operação “Estoque” que empenhou consideráveis meios aéreos. Lançaram-se cerca de 800Kg de bombas e granadas sobre as armas antiaéreas logo nas primeiras horas e no balanço final concluiu-se que se haviam lançado 6800Kg de bombas e 50 granadas incendiárias. O Exército teve o caminho desimpedido, baixou significativamente a actividade antiaérea na Guiné. O ataque às baterias antiaéreas constituía uma missão perigosa, visto que o piloto tinha de aguentar a sua aeronave dirigida às bocas-de-fogo no solo. Krus Abecasis, em livros que mais tarde serão alvo de recensão, deixou um relato onde escreveu: “O inimigo batia-se e morria no seu posto. Fazendo-nos frente com bravura invejável e desconhecida da generalidade dos militares portugueses”. Todo este panorama mudou radicalmente em 20 de Março de 1973 com o aparecimento do míssil Strela, já estava a ser utilizado no Vietnam. Este míssil obrigava à existência de uma equipa de dois homens – um para carregar o tubo de lançamento e um apontador – e implicava sempre uma guarnição de segurança de outros 15 homens, havia ordens de nunca deixar as tropas portuguesas apanhar um míssil Strela.
O autor deixa-nos um relato condensado das operações aéreas na Guiné de 1966 até ao final da guerra. Um só exemplo, a operação “Valquíria”, em finais de Dezembro de 1966 destinada a desalojar os guerrilheiros que no rio Cumbijã procuravam destruir as lanchas que abasteciam Cufar. 6 toneladas de bombas levaram os guerrilheiros a abandonar as posições que punham em risco a navegação no Cumbijã. Luis Alves de Fraga detalha o cativeiro do Sargento Lobato, já largamente documentado no nosso blogue.
Por último, e de forma condensada, o autor descreve as tropas pára-quedistas e as suas operações em África. Na Guiné, durante toda a campanha, morreram 3 oficiais, 6 sargentos e 47 praças.
A guerra de África foi para os oficiais e sargentos do quadro permanente da Força Aérea o elemento agregador que fez nascer e individualizar este ramo das Forças Armadas. E segundo o autor gerou um espírito de corpo que tornou possível, no fim do conflito, não se ter verificado uma debandada geral dos efectivos permanentes em busca de outras fontes de rendimento.
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Nota de CV:
Vd. último poste da série de 16 de Setembro de 2011 > Guiné 63/74 - P8785: Notas de leitura (274): Hna Bijagó, de António Estácio (Mário Beja Santos)
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