1. Mensagem do nosso Camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil At Inf, Comandante do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 7 de Maio de 2010:
Queridos amigos,
Desiludam-se se pensam que estou no defeso. Para a semana há mais.
Correndo o risco de parecer obsessivo, apelo a que me indiquem obras de todo o tipo de escrita sobre a Guiné entre os anos 80 e 90.
Como é público e notório, o inventário deste princípio de século está praticamente feito. Arrisco a propor aos autores de várias listas de publicações que cotejem os seus inventários, acho que já chegou a hora do blogue constituir a sua relação bibliográfica, ao dispor de todos.
Um abraço do
Mário
Um caderno de recordações para lá de Mansoa e Bissorã, entre 1965 e 1967
Beja Santos
Chama-se Piçarra Mourão, é coronel, foi mobilizado, ainda como alferes, para a Guiné, em Julho de 1965. Comandou a CART n.º 1525, ainda como tenente. O seu punhado de recordações intitula-se “Guiné, Sempre! (Testemunho de uma Guerra)”, publicado pela Quarteto Editora, 2001. É um documento singelo da sua experiência, sem floreados nem atavios, deliberadamente na primeira pessoa, uma história de um jovem oficial com 23 anos. Interessa-nos pela sinceridade: “Jovem e desprevenido em quase tudo, a missão que me impunham era superior às minhas capacidades e disponibilidades. A minha preocupação maior ia mais no sentido de me ser facultado adequado aconselhamento, acompanhamento, treino operacional efectivo. Promovido a tenente, marchei para Oeiras, para uma unidade de artilharia de costa, acolhimento da minha futura companhia. A unidade, na ocasião, não estava organizada nem dispunha de meios humanos e materiais que pudessem sustentar as tarefas de que havia sido incumbida. O comando e os quadros, susceptíveis de nos ajudarem, manifestavam um grande distanciamento em relação às nossas preocupações e necessidades de toda a ordem”.
O pessoal vai-se apresentando, assim surge a CART n.º 1525, informa-se que o destino é a Guiné, segue-se a viagem do Uige. Piçarra Mourão sublinha a manifesta impreparação da tropa que lhe destinaram. O corrupio de histórias avulsas começa com uma operação no Queré em que inesperadamente apareceu o adjunto do adido militar norte-americano em Lisboa. O autor explica-nos o que era o Queré: uma zona de transição para o inimigo, fazendo a ligação entre sectores importantes do seu dispositivo Norte/Oeste: Morés, Biambe, Encheia, Bissum, Tiligi, etc. Graças a esta posição, o PAIGC controlava os movimentos das tropas portuguesas, tinha em primeira mão um manancial de informações sobre os movimentos das tropas, recortadas em tabancas estrategicamente posicionadas. Lá houve um fortíssimo contacto com forças do PAIGC no Queré, o oficial norte-americano, impávido e sereno, filmou e fotografou o que lhe apeteceu. Só quando viu alguns feridos é que confessou estar convencido da autenticidade do fogo, julgara tratar-se de um exercício simulado, para americano ver... A companhia de Piçarra Mourão ficou adida ao batalhão de Mansoa, começam aqui as visitas ao Morés, com mais insucessos que sucessos. Descreve-as minuciosamente, incluindo as forças especializada nelas envolvidas. Retêm-se com algum sabor peripécias como aquela noite de saída em que uma equipa de foto-cine exibia o filme “O Comboio Apitou Três Vezes”, em que na altura crucial do filme rebentou intenso foguetório, cada um tomou posição enquanto a máquina de projectar continuou a passar o filme, só mais tarde é que se desligou o gerador.
Lêem-se com agrado as suas recordações da colaboração das milícias e carregadores, a quem o autor presta uma comovida homenagem. Nesse ano de 1966, Mansoa provara várias flagelações, a situação militar tornou-se inquietante, a CART n.º 1525 foi lançada em várias batidas nas regiões de Jugudul e Bindoro. As baixas foram elevadas de ambos os lados. O inimigo acusou o desgaste e finalmente recuou depois de ter sido desbaratado em Ponta Bará. Igualmente comoventes são os episódios de dor, vários foram os mortos em combate, tanto da companhia como milícias e carregadores.
A companhia muda-se para Bula, segue para Tiligi, a Noroeste de Bissorã, seguem-se operações com intenso contacto e apreensão de material. Piçarra Mourão regista aspectos pícaros que ultrapassavam a compreensão militar: os balantas a roubar vacas nos acampamentos do Morés; o transporte de um caixote pesado, hermeticamente fechado, foi trazido como um provável troféu de guerra, afinal eram barras de sabão; os prisioneiros que aparentemente vinham de boa vontade e que subitamente desapareciam; aquele dia 13 de Maio de 1967 em que o Papa Paulo VI veio a Fátima e o PAIGC comemorou com fogachos por toda a região, entre outras.
Mais tocante ainda é o elogio que faz às milícias de Bissorã, dois pelotões que pertenciam a uma companhia sediada em Mansoa, homens impregnados de sentimentos verdadeiramente impares de coragem, vontade indomável de combater, gente inesquecível. Postura crítica é também manifestada relativamente ao comportamento da PIDE que fazia desaparecer todos aqueles sobre quem impendia a suspeita de jogo duplo. Como hoje está historicamente comprovado, a PIDE cometeu as maiores arbitrariedades na Guiné até à chegada de Spínola. O autor despede-se muito afectivamente de Bissorã, “uma terra onde se respirava saúde, confiança, progresso. No remanso do seu casario sentíamos uma reconfortante tranquilidade de espírito e de corpo. A sua hospitalidade era de tal modo afirmativa, que todos avaliávamos que muito do nosso sucesso operacional e institucional se devia à bonomia da terra e das gentes que em boa hora nos receberam, durante vintes indetermináveis meses”.
Piçarra Mourão regressou à Guiné trinta anos mais tarde e voltou a Bissorã. Pediu para falar com o administrador, viram o monumento que ali tinha ficado dedicado aos mortos. Descobriu que o seu interlocutor era nem mais nem menos que o chefe da então casa de mato de Biambe. O mesmo chefe que fora ferido numa operação dirigida por Piçarra Mourão: “caímos abruptamente nos braços um do outro, numa emoção e num envolvimento incontidos”.
É importante repertoriar todos estes testemunhos, tijolo a tijolo ergue-se uma parede e depois um edifício, a história da Guiné. Devemos procurar fazer convergir para o blogue todos estes documentos, seguramente dispersos. Os historiadores deverão contar connosco como uma indispensável fonte histórica.
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Nota de CV:
Vd. último poste da série de Guiné 63/74 - P6353: Notas de leitura (104): Vindimas no Capim, do nosso camarada e tertuliano José Brás (2) (Mário Beja Santos)
Blogue coletivo, criado por Luís Graça. Objetivo: ajudar os antigos combatentes a reconstituir o "puzzle" da memória da guerra colonial/guerra do ultramar (e da Guiné, em particular). Iniciado em 2004, é a maior rede social na Net, em português, centrada na experiência pessoal de uma guerra. Como camaradas que são, tratam-se por tu, e gostam de dizer: "O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande". Coeditores: C. Vinhal, E. Magalhães Ribeiro, V. Briote, J. Araújo.
segunda-feira, 10 de maio de 2010
Guiné 63/74 - P6360: Convívios (236): Encontro do pessoal da CCAV 2721, dia 28 de Maio de 2010 em Almeirim (Paulo Salgado)
1. A pedido do nosso camarada Paulo Salgado, (ex-Alf Mil Op Esp da CCAV 2721, Olossato e Nhacra, 1970/72), estamos a dar conhecimento do Encontro do Pessoal da CCAV 2721, a realizar no dia 28 de Maio em Almeirim.
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Nota de CV:
Vd. último poste da série de 9 de Maio de 2010 > Guiné 63/74 - P6355: Convívios (149): XVII Convívio da CCS do BCAÇ 2912, no dia 5 de Junho, em Pedrógão Grande (António Tavares)
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Nota de CV:
Vd. último poste da série de 9 de Maio de 2010 > Guiné 63/74 - P6355: Convívios (149): XVII Convívio da CCS do BCAÇ 2912, no dia 5 de Junho, em Pedrógão Grande (António Tavares)
Guiné 63/74 - P6359: Agenda cultural (73): Exposição de fotografia de Jaime Machado no Salão Nobre da Junta de Freguesia de Matosinhos
1. Mensagem do nosso camarada, Jaime Machado*, ex-Alf Mil Cav, Pel Rec Daimler 2046, Bambadinca, 1968/70, de 9 de Maio de 2010:
Caros Camaradas
Na próxima semana vai ser inaugurada uma Exposição de Fotos intitulada:
Guiné-Bissau - 40 fotos
40 Anos depois!
Local: Salão Nobre da Junta de Freguesia da Cidade da Senhora da Hora.
Horário:
Dias 13 e 14 de Maio das 18h às 20h
Dia 15 de Maio das 15h às 20h.
Algumas das fotos foram tiradas em 1970, as outras, na recente viagem que fiz à Guiné-Bissau.
Estão todos convidados e agradeço a divulgação nos nossos Blogues com toda a urgência.
A Exposição decorre a favor do Lions Clube da Senhora da Hora do qual sou sócio.
Aproveito para vos pedir autorização para no almoço do dia 26 em MonteReal repetir a referida Exposição, dessa feita a favor da Tabanca Pequena de Matosinhos.
Ficarei muito satisfeito se tal for possível.
Aguardo a v/ visita que desde já agradeço.
Um abraço
jaime
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Notas de CV:
(*) 23 de Abril de 2010 > Guiné 63/74 - P6227: O 6º aniversário do nosso blogue (21): Pequena homenagem ao nosso Blogue (Jaime Machado)
Vd. último poste da série de 21 de Abril de 2010 > Guiné 63/74 - P6204: Agenda cultural (72): Documentário, de Diana Andringa, Tarrafal: Memórias do Campo da Morte Lenta, no IndieLisboa '10, na Culturgest, a 23 (Grande Auditório, 21h30) e 25 (Pequeno Auditório, 18h30)
Guiné 63/74 - P6358: Parabéns a você (113): Henrique José de Matos Francisco, ex-Alf Mil, 1.º CMDT do Pel Caç Nat 52, 1966/68 (Os Editores)
1. Hoje, dia 10 de Maio de 2010, está de parabéns um dos nossos ilustres ilhéus, o camarada Henrique Matos*, o primeiro Comandante do Pel Caç Nat 52, nos já longínquos anos de 1966/68.
O Henrique é açoriano, mas está radicado em Olhão, onde vai concerteza festejar este dia de anos.
Caro Henrique, a Tertúlia aqui está para te desejar um dia alegre, junto da tua família e dos teus amigos, muitos anos de vida, com saúde, reservando, alguns de nós, um quebra costas para o dia do Encontro da Tertúlia.
2. Henrique Matos atabancou-se em Junho de 2007, tendo fornecido esta senha de acesso:
Caro camarada Luís Graça:
Não vou repetir o que outros camaradas disseram sobre a emoção de ter encontrado casualmente este Blogue. Já passei muitas horas a ler quase tudo, agora que tenho tempo com o estatuto de aposentado.
Como fui o 1º comandante do Pel Caç Nat 52 e pisámos o mesmo chão - pelotão e o chão que o Beja Santos bem conheceu - aqui vai o meu pedido para entrada na tertúlia, juntando as fotografias da praxe e ainda uma do pelotão.
Em 10 de Agosto de 1966 (recordo-me por ter sido 4 dias após a inauguração da Ponte sobre o Tejo, então Salazar) embarquei para a Guiné no Rita Maria, na chamada rendição individual.
Depois Bolama, que foi o meu curto IAO, onde já me esperava o Pel Caç Nat 52, composto por pessoal metropolitano (Furriéis Milicianos Vaz, Altino e Monteiro e 1ºs Cabos Cunha, Castanheira e Pires) e o restante pessoal do recrutamento local englobando três 2ºs Cabos (um era caboverdiano, penso que se chamava Félix).
Passados alguns dias, saímos numa LDM para o Enxalé, ficando em reforço à CCAÇ 1439, independente, de madeirenses, adstrita ao BCAÇ 1888, sediado em Bambadinca.
Na mesma ocasião também sairam de Bolama:
(i) o Pel Caç Nat 53, do Alf Mil Serra, que ficou no Xime em reforço à CCAÇ 1550;
(ii) o Pel Caç Nat 51, do Alf Mil Perneco, que foi para Guileje;
(ii) e o Pel Caç Nat 54, do Alf Mil Marchand, que foi inicialmente para Mansabá mas passado pouco tempo também foi parar ao Enxalé.
Este é o começo da minha história. Se me for permitido, continuarei...
Um grande abraço,
Henrique Matos
E continuou como podem comprovar no marcador Henrique Matos.
3. Do seu álbum fotográfico deixamos ao acaso estes instantâneos:
Este era o Pel Caç Nat 52 do tempo do Henrique Matos
Primeira lição no Geba, eu, periquito, com os velhinhos da CCAÇ 1439 no Sintex, que até tinha um pequeno motor fora de borda e base para metralhadora.
Sociedade de Geografia, 6 de Março de 2008 > Lançamento do Diário da Guiné - 1968-1969 - Na Terra dos Soncó, de Mário Beja Santos > O raro previlégio de reunir três ex-Comandantes do Pel Caç Nat 52. Da esquerda para a direita, do mais moderno para o mais antigo: os ex-Alf Mil Joaquim Mexia Alves, Mário Beja Santos e Henrique José de Matos Francisco
Museu da Farmácia, 11 de Novembro de 2008 > Lançamento do Diário da Guiné - 1969-1970 - O Tigre Vadio, de Mário Beja Santos > Queta Baldé, ex-combatente do Pel Caç Nat 52 e um precioso auxiliar de memória de Mário Beja Santos na feitura dos seus Diários da Guiné, ao lado do seu primeiro Comandante, o ex-Alf Mil Henrique Matos.
Ortigosa, 20 de Junho de 2009 > Dois açorianos ex-combatentes da Guiné: o Henrique Matos Francisco (Pel Caç Nat 52, 1966/68) e o Tomás Carneiro (CCAÇ 4745, 1973/74).
__________
Notas de CV:
(*) Vd. poste de 22 de Junho de 2007 > Guiné 63/74 - P1871: Tabanca Grande (15): Henrique Matos, ex-Comandante do Pel Caç Nat 52 (Enxalé, 1966/68)
Vd. último poste da série de 5 de Maio de 2010 > Guiné 63/74 - P6319: Parabéns a você (112): Joaquim Gomes Soares, ex-1.º Cabo da CCAÇ 2317/BCAÇ 2835
O Henrique é açoriano, mas está radicado em Olhão, onde vai concerteza festejar este dia de anos.
Caro Henrique, a Tertúlia aqui está para te desejar um dia alegre, junto da tua família e dos teus amigos, muitos anos de vida, com saúde, reservando, alguns de nós, um quebra costas para o dia do Encontro da Tertúlia.
2. Henrique Matos atabancou-se em Junho de 2007, tendo fornecido esta senha de acesso:
Caro camarada Luís Graça:
Não vou repetir o que outros camaradas disseram sobre a emoção de ter encontrado casualmente este Blogue. Já passei muitas horas a ler quase tudo, agora que tenho tempo com o estatuto de aposentado.
Como fui o 1º comandante do Pel Caç Nat 52 e pisámos o mesmo chão - pelotão e o chão que o Beja Santos bem conheceu - aqui vai o meu pedido para entrada na tertúlia, juntando as fotografias da praxe e ainda uma do pelotão.
Em 10 de Agosto de 1966 (recordo-me por ter sido 4 dias após a inauguração da Ponte sobre o Tejo, então Salazar) embarquei para a Guiné no Rita Maria, na chamada rendição individual.
Depois Bolama, que foi o meu curto IAO, onde já me esperava o Pel Caç Nat 52, composto por pessoal metropolitano (Furriéis Milicianos Vaz, Altino e Monteiro e 1ºs Cabos Cunha, Castanheira e Pires) e o restante pessoal do recrutamento local englobando três 2ºs Cabos (um era caboverdiano, penso que se chamava Félix).
Passados alguns dias, saímos numa LDM para o Enxalé, ficando em reforço à CCAÇ 1439, independente, de madeirenses, adstrita ao BCAÇ 1888, sediado em Bambadinca.
Na mesma ocasião também sairam de Bolama:
(i) o Pel Caç Nat 53, do Alf Mil Serra, que ficou no Xime em reforço à CCAÇ 1550;
(ii) o Pel Caç Nat 51, do Alf Mil Perneco, que foi para Guileje;
(ii) e o Pel Caç Nat 54, do Alf Mil Marchand, que foi inicialmente para Mansabá mas passado pouco tempo também foi parar ao Enxalé.
Este é o começo da minha história. Se me for permitido, continuarei...
Um grande abraço,
Henrique Matos
E continuou como podem comprovar no marcador Henrique Matos.
3. Do seu álbum fotográfico deixamos ao acaso estes instantâneos:
Este era o Pel Caç Nat 52 do tempo do Henrique Matos
Primeira lição no Geba, eu, periquito, com os velhinhos da CCAÇ 1439 no Sintex, que até tinha um pequeno motor fora de borda e base para metralhadora.
Sociedade de Geografia, 6 de Março de 2008 > Lançamento do Diário da Guiné - 1968-1969 - Na Terra dos Soncó, de Mário Beja Santos > O raro previlégio de reunir três ex-Comandantes do Pel Caç Nat 52. Da esquerda para a direita, do mais moderno para o mais antigo: os ex-Alf Mil Joaquim Mexia Alves, Mário Beja Santos e Henrique José de Matos Francisco
Museu da Farmácia, 11 de Novembro de 2008 > Lançamento do Diário da Guiné - 1969-1970 - O Tigre Vadio, de Mário Beja Santos > Queta Baldé, ex-combatente do Pel Caç Nat 52 e um precioso auxiliar de memória de Mário Beja Santos na feitura dos seus Diários da Guiné, ao lado do seu primeiro Comandante, o ex-Alf Mil Henrique Matos.
Ortigosa, 20 de Junho de 2009 > Dois açorianos ex-combatentes da Guiné: o Henrique Matos Francisco (Pel Caç Nat 52, 1966/68) e o Tomás Carneiro (CCAÇ 4745, 1973/74).
__________
Notas de CV:
(*) Vd. poste de 22 de Junho de 2007 > Guiné 63/74 - P1871: Tabanca Grande (15): Henrique Matos, ex-Comandante do Pel Caç Nat 52 (Enxalé, 1966/68)
Vd. último poste da série de 5 de Maio de 2010 > Guiné 63/74 - P6319: Parabéns a você (112): Joaquim Gomes Soares, ex-1.º Cabo da CCAÇ 2317/BCAÇ 2835
domingo, 9 de maio de 2010
Guiné 63/74 - P6357: O povo e o município de Moura homenagearam no passado dia 10 de Abril, os 29 mortos na guerra colonial (Parte III): Actuação do Grupo Coral e Etnográfico Ateneu Mourense (Luís Graça)
Moura > 10 de Abril de 2010 > Homenagem aos 29 mortos da guerra colonial, naturais do concelho (*) > Almoço-convívio > Actuação do Grupo Coral e Etnográfico Ateneu Mourense, com um belíssimo tema do Cancioneiro Popular Alentejano que remonta, segundo nos parece, ao tempo da I Grande Guerra (1917/18), e cuja letra tentámos recuperar e transcrever a seguir... O grupo, criado em 1997, tem dois CD gravados, de que a Câmara Municipal de Moura nos fez uma gentil oferta: Adeus minha linda Vila (2000 ), Se fores ao Alentejo... dá-lhe um beijo ( 2003).
Aqui fica mais uma vez o nosso agradecimento à Comissão Organizadora do evento (onde se inclui o nosso camarada Francisco Godinho, membro da nossa Tabanca Grande), pelos momentos de grande emoção que nos proporcionaram, a nós, membros do nosso blogue, que fomos convidados para a cerimónia e que interviemos no colóquio da manhã, eu próprio, o José Brás, o Pedro Lauret, o Miguel Pessoa e a Giselda.
Vídeo (4' 38''): © Luís Graça (2010). Alojado no You Tube> Nhabijoes
Me vou amanhã embora (?),
Adeus que embora me vou,
Quem não me conhece chora,
Que fará quem me criou.
E adeus montinho (?) da serra,
Adeus casa dos meus pais,
Estou de abalada p’rá guerra,
Não sei se voltarei mais.
Não sei se voltarei mais,
Vou deixar a minha terra,
Adeus casa dos meus pais,
P'ra sempre sozinho na guerra (?).
Em vales, montes andei
No trevo fazendo escolhas,
Só nos teus olhos achei,
O trevo das quatro folhas.
Adeus montinho (?) da serra,
Adeus casa dos meus pais,
Estou de abalada para a guerra,
Não sei se voltarei mais.
Não sei se voltarei mais,
Vou deixar a minha terra,
Adeus casa dos meus pais,
P'ra sempre sozinho na guerra (?).
[ Transcrição / fixação de texto: L.G.]
____________
Nota de L.G.:
(*) Vd. postes anteriores:
18 de Abril de 2010 > Guiné 63/74 - P6175: O povo e o município de Moura homenagearam, no passado dia 10, os seus 29 mortos na guerra colonial (Parte I) (Luís Graça / Francisco Godinho)
Guiné 63/74 – P6356: Historiografia da presença portuguesa em África (36): O PAIGC, os nossos arquivos e a Comissão para o Estudo das Campanhas de África, 1961/74 (Nuno Rubim)
0
1. O nosso Camarada Nuno Rubim, Cor Art Ref, enviou ao Luís Graça a seguinte mensagem, com data de 15 de Janeiro último
Acerca do poste P5639 (I)
Caro amigo Luís: Primeiro para te dizer que, finalmente ao fim de vários anos, vejo "uma luzinha ao fundo do túnel", no que concerne a possibilidade de alguns trabalhos meus virem efectivamente a ser publicados por uma editora.
Em resposta/aditamento à mensagem P5639, publicada em 13 de Janeiro, julgo ser melhor dividir o texto em duas partes, a serem publicadas separadamente, em função dos critérios editoriais, já que me parece que a maioria dos nossos Camaradas preferem, naturalmente, as "saborosas estórias" sobre o que foi o dia a dia dos que passaram parte das suas vidas naquela terra da Guiné e que nunca mais esquecerão até ao final dos seus dias.
Para além dos teus amáveis considerandos a meu respeito, talvez "inflacionados" pela amizade que nos une, julgo de interesse, para começar e porque isso se prende com a minha presente actividade, esclarecer as razões que me levaram a esse empenhamento que tão bem expuseste (mas são 114 GB, 973 pastas e 13211 ficheiros.
E estou ainda agora a começar a "trabalhar" o ano de 1972...
Em 1980 saiu a portaria que transcrevo em “attach”. Por ela se pode ver a preocupação que, desde cedo, se impôs a quem de direito. O resultado pode hoje ser avaliado pela publicação dos vários volumes da Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África, 1961-1974, cujos títulos (alguns ainda no prelo), também junto.
1- Não se propôs a CECA analisar de forma aprofundada e crítica as questões decorrentes da actividade operacional, embora o volume 6º pareça indiciar (ainda não tive oportunidade de consultar qualquer dos 3 tomos, nem tenho conhecimento se algum já foi editado) alguma orientação nesse sentido.
2- Nada há que preveja que seja analisada a actividade do PAIGC em qualquer vertente que se possa considerar, pelo menos a curto prazo, até porque:
O arquivo do PAIGC existente em Bissau, justamente referente aos aspectos operacionais desapareceu quase completamente, destruído em grande parte pelas tropas senegalesas aquando da guerra civil de 1998, bem como a maioria dos documentos do INEP (72,3 % dos arquivos históricos destruídos!).
Os poucos documentos sobreviventes, do espólio de Amílcar Cabral, foram entregues pela sua viúva aos arquivos da República de Cabo Verde e à Fundação Mário Soares, onde estão a ser objecto de digitalização integrados no Arquivo Amílcar Cabral, uma iniciativa de grande mérito.
Ora quando comecei a analisar em detalhe a produção da 2ª Rep, mais tarde RepInfo do Com Chefe Guiné dei-me conta do extraordinário manancial aí existente que, no meu entender, poderia vir a constituir uma base de trabalho ímpar para o estudo das actividades do PAIGC.
Porque podem ter a certeza camaradas, o nosso sistema de informações militar foi de uma grande eficiência. As notícias, que depois de "recortadas" originavam informações de enorme importância provinham de várias fontes: documentos capturados ou abandonados em bases, as declarações de prisioneiros, de apresentados e o que chamo as "populações flutuantes", os gilas (que muita vezes eram "agentes duplos"), as informações da PIDE/DGS e da sua vasta rede de informadores pagos, dentro e fora da Guiné e finalmente (e não menos importante) os resultados da pesquisa das unidades de quadrícula, cujo papel me parece não ter ainda sido devidamente reconhecido.
E falo com conhecimento directo do assunto...
Então o que é que se pode inferir? Possivelmente e isso terá certamente acontecido várias vezes, os serviços que tinham por obrigação de "expurgar" esses documentos e consequentemente fornecer orientações para a exploração dessas informações, nem sempre o terão feito da forma mais eficiente, e também os recipientes últimos, os que tinham a suprema autoridade para tomar as decisões não analisaram devidamente os dados que lhes eram fornecidos, várias vezes pesados custos...
Mas camaradas, estudo há muitos anos a história militar universal possuindo nesta altura qualquer coisa como 2.500 volumes, estudos, folhetos, etc., desde as primeiras guerras que deixaram referências escritas (César) até à Guerra do Vietname posso-vos assegurar que isso foi uma constante e muitas vezes com efeitos altamente desastrosos para alguns dos beligerantes...
(a continuar)
Um abraço,
Nuno Rubim
Portaria n.º 43/80, de 16 de Fevereiro
Considerando que as operações militares em África, durante o período de 1961-1974, constituem matéria que não foi ainda objecto de estudo profundo;
…………………………………………………………………………………………
Manda o Conselho da Revolução, pelo Chefe do Estado-Maior do Exército, o seguinte:
1 - É criada, no Estado-Maior do Exército, a Comissão para o Estudo das Campanhas de África (1961-1974).
A referida Comissão…. tem por finalidade a reunião, compilação e salvaguarda de elementos sobre toda a documentação e de todos os objectos com potencial interesse para o estudo da intervenção do Exército nas campanhas de África (1961-1974)...
Para tal compete-lhe, nomeadamente:
a) Localizar, inventariar e promover o levantamento de todos os documentos e objectos actualmente em poder de entidades oficias (militares ou civis) com potencial interesse para o estudo da intervenção do Exército nas campanhas de África (1961-1974) …
…………………………………………………………………………………………
d) Elaborar uma resenha histórico-militar da intervenção do Exército nas campanhas de África (1961-1974), tendo em vista, sobretudo, o possibilitar no futuro uma rigorosa análise histórica;
…………………………………………………………………………………………
3 - A Comissão é constituída por:
Presidente: um general do Exército, no activo ou na reserva;
Vogais: cinco a sete oficiais do Exército, no activo ou na reserva, nomeados sob proposta do presidente;
Gabinete de Apoio: destinado a apoiar o presidente e os vogais, será chefiado por um destes e incluirá, além do pessoal auxiliar indispensável, num mínimo, três adjuntos, oficiais do Exército do QP ou do QC;
Secretaria: com as funções normais num órgão desta natureza, será chefiada por um oficial do SGE;
Arquivo e biblioteca: tendo por missão a guarda temporária de toda a documentação e publicações em poder da Comissão enquanto necessárias ao estudo em curso, terá por chefe um oficial do Exército na reserva.
4 - Quando o volume do serviço ou a natureza dos trabalhos em curso no âmbito da Comissão o exijam, e mediante proposta devidamente justificada do presidente, poderá a mesma Comissão vir a ser reforçada, a título eventual, com outros elementos, nomeadamente oficiais do Exército ou de qualquer dos outros ramos das forças armadas ou mesmo civis de reconhecida competência...
____________
Nota de M.R.:
Mensagem anterior acerca desta matéria em:
13 de Janeiro de 2010 > Guiné 63/74 - P5639: Dossiê Guileje / Gadamael (22): Construção dos abrigos, minas AP tipo Claymore, viaturas blindadas BRDM 2, as NT, o PAIGC, o nosso blogue... (Nuno Rubim)
Mensagem anterior acerca desta matéria em:
13 de Janeiro de 2010 > Guiné 63/74 - P5639: Dossiê Guileje / Gadamael (22): Construção dos abrigos, minas AP tipo Claymore, viaturas blindadas BRDM 2, as NT, o PAIGC, o nosso blogue... (Nuno Rubim)
Vd. último poste desta série em:
17 de Dezembro de 2009 > Guiné 63/74 - P5485: Historiografia da presença portuguesa (33): Roteiro (Parte I) (Santos Oliveira / Luís Graça)
Guiné 63/74 - P6355: Convívios (235): XVII Convívio da CCS do BCAÇ 2912, no dia 5 de Junho, em Pedrógão Grande (António Tavares)
1. O nosso Camarada António Tavares* (ex-Fur Mil da CCS/BCAÇ 2912, Galomaro, 1970/72), enviou-nos uma mensagem, com data de 8 de Maio de 2010, solicitando-nos a divulgação da festa da sua Companhia:
XVII Convívio da CCS do BCAÇ 2912
Camaradas,
Junto envio o programa do XVII Convívio da CCS do BCaç 2912, a realizar em 05JUNHO2010 em Pedrógão Grande.
Junto envio o programa do XVII Convívio da CCS do BCaç 2912, a realizar em 05JUNHO2010 em Pedrógão Grande.
Agradeço a sua publicação até por que já encontrei, por vosso intermédio, o Vasco Joaquim, ao fim de 37 Anos.
Há Camaradas que nunca mais vimos desde 23MARÇO1972, e que muito gostávamos de reencontrar:
Os Alferes Milicianos Jesus e António Delgado (Oficiais dos Reabastecimentos do Batalhão);
Os Furriéis Milicianos Carlos José Filipe Lopes (vivia em Cascais), Júlio Gomes Martins (vivia em Oeiras) e Girão (vivia em Viseu).
O 1ºCabo Escriturário Cassessa (vivia em Lisboa).
Um abraço
António Tavares
Fur Mil da CCS/BCAÇ 2912
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Nota de M.R.:
Vd. último poste desta série em:
8 de Maio de 2010 > Guiné 63/74 - P6344: Convívios (148): Pessoal da CCS, CCAÇ 2366 e CCAÇ 2367 do BCAÇ 2845, ocorrido no dia 1 de Maio em Buarcos (Albino Silva)
Guiné 63/74 - P6354: Estórias de Mansambo II (Torcato Mendonça, CART 2339) (17): Uma ida ao Poindom
17.ª Estória de Mansambo, série do nosso camarada Torcato Mendonça*, ex-Alf Mil da CART 2339 (Mansambo, 1968/69).
Tínhamos cerca de quatro horas de progressão. Saíramos do Xime noite cerrada, a chuva a cair fraca abafando os ruídos, arrefecendo ainda mais o pessoal da Companhia. Demos uma volta em direcção quase oposta ao nosso destino. Precaução certamente desnecessária pois, a essa hora, o IN já teria sido avisado.
Caminhávamos lentamente na noite escura como breu, agarrando a arma do camarada que nos precedia. Finalmente, uma breve paragem para confirmar a nossa localização, verificar o equipamento, acondicionar melhor o material e descansar um pouco.
Tudo verificado, confirmadas as informações dos guias, breve olhar para a bússola e a ordem foi passada rapidamente: - está a andar. O cheiro a capim e a terra molhada, o som da mata, a chuva a cair leve, felizmente, por pouco tempo mais. Menos desconforto, mas mais atenção aos sons da mata.
Alto, vamos parar! Descansa, faz-se nova verificação e vamos parar mais tempo. O local, onde devíamos ficar antes do objectivo, estava perto. Consultada a bússola, a carta e vistas as horas, tudo parecia estar certo. Confirma-se com o guia e com o Seco, picador do Xime. Era melhor esperar.
Volta a chuva, talvez um pouco mais forte. Os sentidos estão mais despertos aos ruídos. Mesmo assim o pensamento, ou um pouco dele, consegue vaguear para longe. Um leve som, a atenção e a tensão aumenta na busca de entender o que se passa. De pronto fica esclarecido: quase ao lado um soldado, de joelhos, para minimizar o barulho, “vertia águas” em alívio da bexiga e dos nervos. Descontrair é preciso pois a espera continuaria até clarear um pouco. Sentíamos o despertar de toda aquela fauna. Era o despertar da mata. Milhentos seres indiferentes a nós os predadores que, naquele dia, eram intrusos à vida, à paz e à harmonia de todo aquele sistema.
Nada de os perturbar pois o ruído, principalmente as aves, eram preciosos indicadores de “tropa à vista” ou “turra à vista”… e certamente protestavam com a intrusão… eram o rádio ou telégrafo dos contentores.
Esperamos pouco, de pronto veio a ordem: - sigam e aproximem-se mais. Andamos pouco e paramos.
Passa-se a mão pelo material. Certamente os outros fazem o mesmo. Conferência com os furriéis e ultimam-se os preparativos. Éramos nós, o nosso Grupo, que íamos saltar ou assaltar o objectivo. Esperamos. Todos sabiam o que iriam fazer, se tudo desse certo, funcionavam só os gestos combinados e treinados. São momentos de tensão e é preciso descontrair. Olha-se o relógio, no espaço de quinze minutos, pela terceira ou quarta vez. O aviso: - cuidado, a artilharia vai começar daqui a pouco.
De repente, a saída, o silvo e o rebentamento da granada quase em simultâneo. Uma, duas e deixa-se de contar… avançamos lentamente, a alvorada a clarear, os músculos a apertarem, as armas prontas. Devagar, devagar, a tensão aumenta e diminui. Olhamo-nos. Sabemos o que fazer. A artilharia já tinha parado, aceleramos o passo, rápido, rápido e surge o objectivo… abre-se em leque… e nem se pensa, funciona o treino…saltam… entram… nada se mexe… continuam… atravessam e param à espera dos outros.
Os tipos foram-se. De repente barulho ali ao lado, correrias, gritos e dois ou três tiros. Apanha, apanha… perseguem o inimigo e param à entrada da bolanha. Duas morteiradas para provocar reacção e não obtêm resposta. Nada! Contentam-se com o chapéu cubano com fotos, em recordação, talvez, da mulher e filhos. Voltam. Boné sem cabeça foi o espólio. A artilharia tinha destruído, não o objectivo mas, próximo deste, uma pequena plantação de bananas. Tanto trabalho para um boné e bananas…
Os outros já tinham revistado o local. Além de papeis nada mais, de interesse tinham encontrado. Por isso, só lhes restava puxar fogo às casas de mato.
Saíram rapidamente e iniciaram o regresso por um percurso diferente.
Param passada uma ou duas horas, descansam, aliviam tensões, sorriem uns para os outros, ajeitam o vestuário e material. Abrem os bornais e cantis para um pequeno-almoço leve.
A atenção mantém-se. O inimigo sabe donde vieram e para onde regressam.
Pouco depois continuam, volteiam e, passado algum tempo tomam, em definitivo, a direcção do Xime. Passam a zona dos cajueiros, redobram a atenção e continuam.
Já no Xime ouvem o inimigo a bater a zona. É com eles e compreende-se a sua raiva. Mas não têm razão para isso: - o maior prejuízo foi o bananal…
Descontraem. Recebem a sempre óptima hospitalidade dos Camaradas do Xime (Cart 1746) e preparam a saída. Depois de passar a Ponta Coli e Amedalai, é sempre a andar rápido até Bambadinca. Depois uns para Fá outros para Mansambo.
Era a segunda ida ao Poindom. Talvez ainda regressassem lá outras tantas ou mais vezes. A última foi a cerca de dois ou três meses do fim da comissão. O guia era o Malan Mané. Nem lá se chegou… Operação Pato Rufia a 24 de Agosto. O nome está bem escolhido… patos nós… rufia o Comandante que nos acompanhou, mas de língua!
Caímos nalgumas emboscadas montadas, por vezes bem e com o auxilio dos “internacionalistas” Cubanos.
Recordo uma porque nela cometi um erro e, por isso ia pagando caro. É uma data que recordo bem. Anda sempre comigo uma bala retirada da árvore que pagou por mim. Mandei banhá-la em prata e fazer um suporte com argola. Tenho mais amuletos, chamemos-lhe assim, desse tempo. Sei que pensas ser loucura. Aceito. Mas se me foram ofertados para protecção porque não os usar em singela homenagem àqueles meus amigos?
A emboscada então.
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Nota de CV:
Vd. último poste da série de 8 de Maio de 2010 > Guiné 63/74 - P6346: Estórias de Mansambo II (Torcato Mendonça, CART 2339) (16): Milícias
ESTÓRIAS DE MANSAMBO II - 17
POINDOM (ou Poidão)
POINDOM (ou Poidão)
Tínhamos cerca de quatro horas de progressão. Saíramos do Xime noite cerrada, a chuva a cair fraca abafando os ruídos, arrefecendo ainda mais o pessoal da Companhia. Demos uma volta em direcção quase oposta ao nosso destino. Precaução certamente desnecessária pois, a essa hora, o IN já teria sido avisado.
Caminhávamos lentamente na noite escura como breu, agarrando a arma do camarada que nos precedia. Finalmente, uma breve paragem para confirmar a nossa localização, verificar o equipamento, acondicionar melhor o material e descansar um pouco.
Tudo verificado, confirmadas as informações dos guias, breve olhar para a bússola e a ordem foi passada rapidamente: - está a andar. O cheiro a capim e a terra molhada, o som da mata, a chuva a cair leve, felizmente, por pouco tempo mais. Menos desconforto, mas mais atenção aos sons da mata.
Alto, vamos parar! Descansa, faz-se nova verificação e vamos parar mais tempo. O local, onde devíamos ficar antes do objectivo, estava perto. Consultada a bússola, a carta e vistas as horas, tudo parecia estar certo. Confirma-se com o guia e com o Seco, picador do Xime. Era melhor esperar.
Volta a chuva, talvez um pouco mais forte. Os sentidos estão mais despertos aos ruídos. Mesmo assim o pensamento, ou um pouco dele, consegue vaguear para longe. Um leve som, a atenção e a tensão aumenta na busca de entender o que se passa. De pronto fica esclarecido: quase ao lado um soldado, de joelhos, para minimizar o barulho, “vertia águas” em alívio da bexiga e dos nervos. Descontrair é preciso pois a espera continuaria até clarear um pouco. Sentíamos o despertar de toda aquela fauna. Era o despertar da mata. Milhentos seres indiferentes a nós os predadores que, naquele dia, eram intrusos à vida, à paz e à harmonia de todo aquele sistema.
Nada de os perturbar pois o ruído, principalmente as aves, eram preciosos indicadores de “tropa à vista” ou “turra à vista”… e certamente protestavam com a intrusão… eram o rádio ou telégrafo dos contentores.
Esperamos pouco, de pronto veio a ordem: - sigam e aproximem-se mais. Andamos pouco e paramos.
Passa-se a mão pelo material. Certamente os outros fazem o mesmo. Conferência com os furriéis e ultimam-se os preparativos. Éramos nós, o nosso Grupo, que íamos saltar ou assaltar o objectivo. Esperamos. Todos sabiam o que iriam fazer, se tudo desse certo, funcionavam só os gestos combinados e treinados. São momentos de tensão e é preciso descontrair. Olha-se o relógio, no espaço de quinze minutos, pela terceira ou quarta vez. O aviso: - cuidado, a artilharia vai começar daqui a pouco.
De repente, a saída, o silvo e o rebentamento da granada quase em simultâneo. Uma, duas e deixa-se de contar… avançamos lentamente, a alvorada a clarear, os músculos a apertarem, as armas prontas. Devagar, devagar, a tensão aumenta e diminui. Olhamo-nos. Sabemos o que fazer. A artilharia já tinha parado, aceleramos o passo, rápido, rápido e surge o objectivo… abre-se em leque… e nem se pensa, funciona o treino…saltam… entram… nada se mexe… continuam… atravessam e param à espera dos outros.
Os tipos foram-se. De repente barulho ali ao lado, correrias, gritos e dois ou três tiros. Apanha, apanha… perseguem o inimigo e param à entrada da bolanha. Duas morteiradas para provocar reacção e não obtêm resposta. Nada! Contentam-se com o chapéu cubano com fotos, em recordação, talvez, da mulher e filhos. Voltam. Boné sem cabeça foi o espólio. A artilharia tinha destruído, não o objectivo mas, próximo deste, uma pequena plantação de bananas. Tanto trabalho para um boné e bananas…
Os outros já tinham revistado o local. Além de papeis nada mais, de interesse tinham encontrado. Por isso, só lhes restava puxar fogo às casas de mato.
Saíram rapidamente e iniciaram o regresso por um percurso diferente.
Param passada uma ou duas horas, descansam, aliviam tensões, sorriem uns para os outros, ajeitam o vestuário e material. Abrem os bornais e cantis para um pequeno-almoço leve.
A atenção mantém-se. O inimigo sabe donde vieram e para onde regressam.
Pouco depois continuam, volteiam e, passado algum tempo tomam, em definitivo, a direcção do Xime. Passam a zona dos cajueiros, redobram a atenção e continuam.
Já no Xime ouvem o inimigo a bater a zona. É com eles e compreende-se a sua raiva. Mas não têm razão para isso: - o maior prejuízo foi o bananal…
Descontraem. Recebem a sempre óptima hospitalidade dos Camaradas do Xime (Cart 1746) e preparam a saída. Depois de passar a Ponta Coli e Amedalai, é sempre a andar rápido até Bambadinca. Depois uns para Fá outros para Mansambo.
Era a segunda ida ao Poindom. Talvez ainda regressassem lá outras tantas ou mais vezes. A última foi a cerca de dois ou três meses do fim da comissão. O guia era o Malan Mané. Nem lá se chegou… Operação Pato Rufia a 24 de Agosto. O nome está bem escolhido… patos nós… rufia o Comandante que nos acompanhou, mas de língua!
Caímos nalgumas emboscadas montadas, por vezes bem e com o auxilio dos “internacionalistas” Cubanos.
Recordo uma porque nela cometi um erro e, por isso ia pagando caro. É uma data que recordo bem. Anda sempre comigo uma bala retirada da árvore que pagou por mim. Mandei banhá-la em prata e fazer um suporte com argola. Tenho mais amuletos, chamemos-lhe assim, desse tempo. Sei que pensas ser loucura. Aceito. Mas se me foram ofertados para protecção porque não os usar em singela homenagem àqueles meus amigos?
A emboscada então.
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Nota de CV:
Vd. último poste da série de 8 de Maio de 2010 > Guiné 63/74 - P6346: Estórias de Mansambo II (Torcato Mendonça, CART 2339) (16): Milícias
Guiné 63/74 - P6353: Notas de leitura (104): Vindimas no Capim, do nosso camarada e tertuliano José Brás (2) (Mário Beja Santos)
1. Mensagem do nosso Camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil At Inf, Comandante do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 5 de Maio de 2010:
Queridos amigos,
Suplicar não custa, o que custa é ser atendido.
Pelas minhas contas, estou a chegar ao fim dos anos 80, o que havia a inventariar já está inventariado. Mas será mesmo verdade? Será que vocês não têm uns livrinhos nas estantes que eu ainda não conheço? Estamos a trabalhar aqui no blogue para um futuro historiador que irá encontrar a papinha quase toda feita.
Continuo a pedir um livro do Álvaro Guerra “O Capitão Nemo e Eu”.
Continuo a pedir sugestões sobre os anos 90, estou praticamente às escuras, sejam bonzinhos comigo.
Um abraço do
Mário
Filipe Bento, um combatente que manteve as suas origens de campónio
Beja Santos
Será que Filipe Bento é José Brás? Será que na literatura memorialista da guerra colonial é justo procurar conhecer o disfarce do autor nas suas personagens? Útil ou desnecessário encontrar resposta, o narrador Filipe Bento de “Vindimas no Capim”, de José Brás (Prémio de Revelação de Ficção 1989 da APE e IPLL, Publicações Europa - América, 1987) encarrega-se de nos dizer abertamente que a sua memória saltita, com aparente desembaraço, entre o Sul da Guiné e o seu terrunho de origem, algures numa Estremadura de onde se avistam lezírias. Filipe Bento tem azedumes e não os esconde nas suas várias vertentes: políticas, militares e até morais. É sentenciador com vários tipos de intermediários, negociantes e vigaristas, não esqueceu a brutalidade da instrução militar, recorda a todo o momento com saudade os vinhedos mas também o Tejo, por entreposta pessoa, o camarada Santarém. Oiçamo-lo a falar do rio, são parágrafos muito belos:
O rio sereno como um espelho, o negro do céu adivinhado na profundeza das águas, os canaviais das margens...
E aquele silêncio... quebrado apenas pela corrente na quilha da bateira ou pelo salto de algum barbo brincalhão.
Aquela serenidade dava-lhe uma tristeza funda, uma saudade de não sei de quê, como uma lembrança de outra vida, de um espaço aberto e infinito onde vivera já. Era uma sensação profunda e vaga. Dolorosa e agradável ao mesmo tempo.
E à tarde, quando na casa do avô, sentado naquele barraco/lar sobre palafitas, sobre lodo e água construído, comendo fataça frita ou uma caldeirada de enguias mal amanhadas, lhe vinha à lembrança aquele sonhar, agora menos concreto ainda, ainda mais difícil de agarrar, faziam-se-lhe os olhos ansiosos sobre o prato, para além do prato e do barraco e do Tejo... e do mundo... e eram estrelas e azul fundo que lhe enchiam a alma”.
Foi furriel responsável pela messe, boas chatices lhe trouxe, isto ao tempo em que estava ali ao pé do corredor de Guileje, com o pessoal da 4022. O que é exemplar nesta escrita de José Brás, o seu selo original, é a mistura frenética de espaços e lugares, em que o acontecimento fortuito ganha, abruptamente, uma dimensão trágica. É a história daquele padeiro que já se habituara aos tiros, às morteiradas e às bazucadas e que um dia lhe deu na bolha, saiu com o pelotão em patrulhamento e achou um engenho artesanal, já ferrugento. Era uma lata velha, tentou desmanchá-la, explodiu:
“O padeiro ficou todo arranhado no peito nu e na barriga. E mão lá se foi!
No lugar dela havia uma pasta de sangue cheirando a trotil que tresandava.
A mão válida agarrou-se ao pulso mutilado e o padeiro iniciou uma corrida doida, aos berros, em direcção ao posto de socorros”. O relato em si assemelha-se a muitos outros que já aqui se transcreveram. Mas veja-se o remate: “– E teve muita sorte!” dizia o cabo do bar. “Teve muita sorte em ser canhoto!” Há sempre uma tirada pícara, uma saída truculenta, inesperada. Veja-se um novo exemplo:
“Dois gajos, o alferes P.G. e um soldado, amparavam o primeiro marino. O sangue corria-lhe da testa, encharcando-lhe a cara toda e o camuflado. Era um Cristo aos baldões da força dos socorristas. A mim pareceu-me que lhe tinham varado um olho.
O Bruno sentou-se no estribo da segunda GMC e limpou-lhe o sangue, usando logo de uma vez o algodão de um pacote.
Afinal, não era nada. Uma bala apenas, se calhar saída de alguma G3 dos periquitos, passara-lhe na sobrancelha esquerda de raspão. O sargento Marino iria fazer a comissão toda de boa saúde e a foder a malta na alimentação”. José Brás recorre frequentemente ao quente/frio, ao trágico e ao cómico, à atmosfera dramática com soluções hilariantes. Como o Alves, cabo da arrecadação, depois dos imbróglios de uma emboscada que se voltou para o furriel: “Ai Nossa Senhora do Sameiro, agora é que a gente vai todos prò caralho!”.
É uma memória que salta como uma mola do Sul da Guiné e vem até à Estremadura, por exemplo a tasca do Gato, entra-se numa rixa mortal, fala-se do Padre Francês que desertou, do Alexandre Lemos que pisou uma mina no caminho de Guileje e ali morreu, Filipe Bento vivia na Gatoeira, tinha oito anos quando a família se mudou para São Jerónimo, um camponês nunca se esquece das suas origens, os sulfates, os dias de festa, e depois a memória volta à Guiné, por exemplo uma peripécia que se passou com o Lemos:
“Um ataque de abelhas deixa a malta louca. Não há regras nem comando. Cada um defende-se como pode, e a única coisa que pode ou sabe é fugir à doida. O Lemos, apanhado na frente da bicha de pirilau, quando o pessoal largou a fugir para trás, nem viu do que era. Hesitou um segundo, meteu-se no carreiro errado depois, e perdeu-se.
As abelhas acharam-no à mesma e, às voltas naquela selva virgem, a fugir do inimigo feroz, afastou-se em sentido contrário ao do resto do pelotão.
Só ao fim de duas horas, e quase por acaso, o encontrámos, deitado junto a um charco, despido, vomitado, cagado, inchado e meio inconsciente.
Contou mais tarde que eram tantas as abelhas poisadas nele que, fugindo, foi tirando a roupa, peça a peça, e mergulhara na água da bolanha.
– O charco foi a tua sorte, pá!
Dizia um camarada na messe no dia seguinte, com o gajo ainda combalido e de olhar absorto.
– É! Fui sempre um tipo de sorte!
É uma narrativa que fala de bruxa de vários tipos, das eleições no tempo de Salazar, do obscurantismo de vários matizes, de um mundo que gradualmente foi desaparecendo com o termo daquela guerra. Compreendemos, no fim da narrativa, porquê vindimas no capim: é a voz do chamamento da terra, dentre as tabancas, ao pé do corredor da morte, com os palavrões da guerra. E também se compreende a dedicatória “Àqueles que se estoiravam, eles próprios, por dentro e por fora, para que a terra continuasse a parir e o sol a fecundá-la”. Seguramente, estas “Vindimas no Capim” têm lugar merecido entre o que melhor se escreveu nos já longínquos anos 80.
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Nota de CV:
Vd. último poste da série de 8 de Maio de 2010 > Guiné 63/74 - P6347: Notas de leitura (103): Vindimas no Capim, do nosso camarada e tertuliano José Brás (1) (Mário Beja Santos)
Queridos amigos,
Suplicar não custa, o que custa é ser atendido.
Pelas minhas contas, estou a chegar ao fim dos anos 80, o que havia a inventariar já está inventariado. Mas será mesmo verdade? Será que vocês não têm uns livrinhos nas estantes que eu ainda não conheço? Estamos a trabalhar aqui no blogue para um futuro historiador que irá encontrar a papinha quase toda feita.
Continuo a pedir um livro do Álvaro Guerra “O Capitão Nemo e Eu”.
Continuo a pedir sugestões sobre os anos 90, estou praticamente às escuras, sejam bonzinhos comigo.
Um abraço do
Mário
Filipe Bento, um combatente que manteve as suas origens de campónio
Beja Santos
Será que Filipe Bento é José Brás? Será que na literatura memorialista da guerra colonial é justo procurar conhecer o disfarce do autor nas suas personagens? Útil ou desnecessário encontrar resposta, o narrador Filipe Bento de “Vindimas no Capim”, de José Brás (Prémio de Revelação de Ficção 1989 da APE e IPLL, Publicações Europa - América, 1987) encarrega-se de nos dizer abertamente que a sua memória saltita, com aparente desembaraço, entre o Sul da Guiné e o seu terrunho de origem, algures numa Estremadura de onde se avistam lezírias. Filipe Bento tem azedumes e não os esconde nas suas várias vertentes: políticas, militares e até morais. É sentenciador com vários tipos de intermediários, negociantes e vigaristas, não esqueceu a brutalidade da instrução militar, recorda a todo o momento com saudade os vinhedos mas também o Tejo, por entreposta pessoa, o camarada Santarém. Oiçamo-lo a falar do rio, são parágrafos muito belos:
O rio sereno como um espelho, o negro do céu adivinhado na profundeza das águas, os canaviais das margens...
E aquele silêncio... quebrado apenas pela corrente na quilha da bateira ou pelo salto de algum barbo brincalhão.
Aquela serenidade dava-lhe uma tristeza funda, uma saudade de não sei de quê, como uma lembrança de outra vida, de um espaço aberto e infinito onde vivera já. Era uma sensação profunda e vaga. Dolorosa e agradável ao mesmo tempo.
E à tarde, quando na casa do avô, sentado naquele barraco/lar sobre palafitas, sobre lodo e água construído, comendo fataça frita ou uma caldeirada de enguias mal amanhadas, lhe vinha à lembrança aquele sonhar, agora menos concreto ainda, ainda mais difícil de agarrar, faziam-se-lhe os olhos ansiosos sobre o prato, para além do prato e do barraco e do Tejo... e do mundo... e eram estrelas e azul fundo que lhe enchiam a alma”.
Foi furriel responsável pela messe, boas chatices lhe trouxe, isto ao tempo em que estava ali ao pé do corredor de Guileje, com o pessoal da 4022. O que é exemplar nesta escrita de José Brás, o seu selo original, é a mistura frenética de espaços e lugares, em que o acontecimento fortuito ganha, abruptamente, uma dimensão trágica. É a história daquele padeiro que já se habituara aos tiros, às morteiradas e às bazucadas e que um dia lhe deu na bolha, saiu com o pelotão em patrulhamento e achou um engenho artesanal, já ferrugento. Era uma lata velha, tentou desmanchá-la, explodiu:
“O padeiro ficou todo arranhado no peito nu e na barriga. E mão lá se foi!
No lugar dela havia uma pasta de sangue cheirando a trotil que tresandava.
A mão válida agarrou-se ao pulso mutilado e o padeiro iniciou uma corrida doida, aos berros, em direcção ao posto de socorros”. O relato em si assemelha-se a muitos outros que já aqui se transcreveram. Mas veja-se o remate: “– E teve muita sorte!” dizia o cabo do bar. “Teve muita sorte em ser canhoto!” Há sempre uma tirada pícara, uma saída truculenta, inesperada. Veja-se um novo exemplo:
“Dois gajos, o alferes P.G. e um soldado, amparavam o primeiro marino. O sangue corria-lhe da testa, encharcando-lhe a cara toda e o camuflado. Era um Cristo aos baldões da força dos socorristas. A mim pareceu-me que lhe tinham varado um olho.
O Bruno sentou-se no estribo da segunda GMC e limpou-lhe o sangue, usando logo de uma vez o algodão de um pacote.
Afinal, não era nada. Uma bala apenas, se calhar saída de alguma G3 dos periquitos, passara-lhe na sobrancelha esquerda de raspão. O sargento Marino iria fazer a comissão toda de boa saúde e a foder a malta na alimentação”. José Brás recorre frequentemente ao quente/frio, ao trágico e ao cómico, à atmosfera dramática com soluções hilariantes. Como o Alves, cabo da arrecadação, depois dos imbróglios de uma emboscada que se voltou para o furriel: “Ai Nossa Senhora do Sameiro, agora é que a gente vai todos prò caralho!”.
É uma memória que salta como uma mola do Sul da Guiné e vem até à Estremadura, por exemplo a tasca do Gato, entra-se numa rixa mortal, fala-se do Padre Francês que desertou, do Alexandre Lemos que pisou uma mina no caminho de Guileje e ali morreu, Filipe Bento vivia na Gatoeira, tinha oito anos quando a família se mudou para São Jerónimo, um camponês nunca se esquece das suas origens, os sulfates, os dias de festa, e depois a memória volta à Guiné, por exemplo uma peripécia que se passou com o Lemos:
“Um ataque de abelhas deixa a malta louca. Não há regras nem comando. Cada um defende-se como pode, e a única coisa que pode ou sabe é fugir à doida. O Lemos, apanhado na frente da bicha de pirilau, quando o pessoal largou a fugir para trás, nem viu do que era. Hesitou um segundo, meteu-se no carreiro errado depois, e perdeu-se.
As abelhas acharam-no à mesma e, às voltas naquela selva virgem, a fugir do inimigo feroz, afastou-se em sentido contrário ao do resto do pelotão.
Só ao fim de duas horas, e quase por acaso, o encontrámos, deitado junto a um charco, despido, vomitado, cagado, inchado e meio inconsciente.
Contou mais tarde que eram tantas as abelhas poisadas nele que, fugindo, foi tirando a roupa, peça a peça, e mergulhara na água da bolanha.
– O charco foi a tua sorte, pá!
Dizia um camarada na messe no dia seguinte, com o gajo ainda combalido e de olhar absorto.
– É! Fui sempre um tipo de sorte!
É uma narrativa que fala de bruxa de vários tipos, das eleições no tempo de Salazar, do obscurantismo de vários matizes, de um mundo que gradualmente foi desaparecendo com o termo daquela guerra. Compreendemos, no fim da narrativa, porquê vindimas no capim: é a voz do chamamento da terra, dentre as tabancas, ao pé do corredor da morte, com os palavrões da guerra. E também se compreende a dedicatória “Àqueles que se estoiravam, eles próprios, por dentro e por fora, para que a terra continuasse a parir e o sol a fecundá-la”. Seguramente, estas “Vindimas no Capim” têm lugar merecido entre o que melhor se escreveu nos já longínquos anos 80.
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Nota de CV:
Vd. último poste da série de 8 de Maio de 2010 > Guiné 63/74 - P6347: Notas de leitura (103): Vindimas no Capim, do nosso camarada e tertuliano José Brás (1) (Mário Beja Santos)
Guiné 63/74 - P6352: As minhas memórias da guerra (Arménio Estorninho) (11): De Empada a Bissau no Batelão Corubal, acompanhando os restos mortais do camarada Mário Caixeiro
1. Mensagem de Arménio Estorninho* (ex-1.º Cabo Mec Auto Rodas, CCAÇ 2381, Ingoré, Aldeia Formosa, Buba e Empada, 1968/70), com data de 15 de Abril de 2010:
Caro camarada e amigo Luís Graça,
Envio renovadas saudações que são extensivas a todos os tertulianos da Tabanca Grande.
Como já nos habituamos, o prometido é devido, por isso cá estou escrevendo, e desta feita são “estórias mas com algumas peripécias,” sobre a viagem de Empada a Bissau com inicio a 15 de Janeiro de 1970, do tempo de espera para o regresso à Metrópole, contudo, são ilustradas com extractos do meu álbum fotográfico.
De Empada a Bissau -1
Acompanhando os restos mortais do camarada Mário Caixeiro
Estamos nos primeiros dias de Janeiro de 1970, está a aproximar-se o final da comissão e já vou fazendo alguns preparativos para ir de abalada, desta terra de gente amiga que é lembrada. Ocasionalmente “bruxo, máquegête moço” o responsável pela Secção Auto da CCaç 2381, Fur Mil Auto Rodas, Bertino Cardoso (Fotos 1 e 2), interpelara-me para saber se eu estava interessado em antecipadamente marchar para Bissau a concretizar-se nos próximos dias. A minha missão seria zelar pela urna com os restos mortais do Soldado Mário Caixeiro, que morrera em combate na noite de 14/Nov./69, e de diversos equipamentos que estavam adstritos à Companhia, que iriam fazer carga num Batelão a chegar brevemente. Seriam feitos os depósitos na Morgue do Hospital Militar e no Quartel dos Adidos, em Bissau.
Foto 1 > Guiné-Bissau > Região de Quinara > Empada > Oficina Auto > 1969 > Obtida do cimo do depósito de água, com imagem da Oficina da Secção Auto, em zona posterior situa-se a avenida e a seguir a casa do motor gerador, estando esta com o telhado danificado devido a um ataque IN.
Foto 2 > Guiné-Bissau > Região de Quinara > Empada > 1969 > O fotógrafo paparazzi estava lá. O ex-Fur Mil Auto Rodas, Bertino Cardoso, aquando do aproximar do final da comissão, também já estava apanhado pelo clima. Gamara um carneiro que tinha sido comprado pelo Vagomestre e este denunciara-o ao Oficial de Dia. Foi efectuada a apreensão do ónus da prova, a fim de ser organizada a participação para processo de infracção disciplinar por furto.
Tendo eu aceitado a proposta de seguir para Bissau, mas com a condição de não ficar aquartelado nos Adidos, em Brá, situação um pouco embaraçosa e que fora tratada a contento com o nosso 2.º Sargento, Fernando Monteirinho, (que posteriormente passara para a vida civil, tornando a vê-lo no Porto, em 1990). O combinado foi o de eu seguir com a guia de marcha e de forma a apresentá-la no Quartel dos Adidos, contudo eu seria o único responsável ao não apresentar-me. Mas caso não houvesse complicações, e logo que a Companhia chegasse a Bissau, ter-lhe-ia de devolver a dita.
Tratei imediatamente de aprontar a minha saída, emalando logo os objectos de recordação (que muitos ainda guardo), uma mala com garrafas de whisky e outros (que já se foram em eventos), o pagamento da mensalidade à lavadeira e a recolha final dos pesos pelos trabalhos das fotografias. Também não esquecendo cumprimentar e despedir-me da população amiga.
Na noite 14/15 Jan./70, o IN atacou o Quartel de Empada que para mim seria o último, ficando-me em lembrança e fazendo a despedida (Foto 3).
Dirigiu-me ao Cabo Quarteleiro efectuando a entrega do equipamento de roupa da cama, da arma e munições, que me estavam distribuídos.
Livrei-me, em 31/ Jan./70, de sofrer um grande ataque ao Quartel, o qual durou cerca de 45 minutos, não havendo qualquer baixa. A notícia chegara célere a Bissau, onde vim a saber, ficando surpreso pelo tempo que durara a acção.
Foto 3 > Guiné-Bissau > Região de Quinara > Empada > 1970 > Grupo de camaradas e amigos que ainda ficaram em Empada, a partor da esquerda: ex-1.º Cabo Mec Auto José Luís Moreira, de Marco de Canaveses, ex-1.º Cabo Enf. Jorge Catarino, de Vale Vacas - Cardigos, o Soldado Pintassilgo, do Cacém – Lisboa, o Soldado Mec. Auto José António Coelho, de Maiorca – Figueira da Foz e por último um camarada de que não recordo o nome.
Entretanto o Batelão “Corubal,” em serviço de cabotagem, atracara no cais de Empada, na manhã do dia 15/ Jan./70 (foto 4). Foram-me dadas instruções para preparar a saída de imediato, porque o batelão iria zarpar quando logo que a maré o permitisse.
Foto 4 > Guiné-Bissau > Região de Quinara > Empada > Cais de Empada > 1970 > O Batelão Corubal (dizia-se que era dos turras e não dava problemas), a aguardar a enchente da maré. Este barco demandava regularmente e fazia cabotagem no Rio Grande de Buba.
Dando-se o embarque de passageiros, alguns eram portadores de cabritos, porcos, galinhas, peixe seco e outros, também era necessária a entrada da urna com o cadáver do Mário Caixeiro. Não estando devidamente soldada, dela exalava um cheiro cadavérico e por isso os estivadores africanos recusavam-se a transporta-la - “homem grande papeia,” tsi..! djubi, amim ka mist ku péssoal nega,” - dando estalito com a ponta da língua, e com o bater do braço no tronco do corpo.
(i.e., do crioulo: “O chefe falou,” tsi..! olha, eu não quer e o pessoal recusa).
Como ia safar-me desta, porque o batelão tinha que sair? Inspirei o ar e fui ao pé da urna, depois expirei em um só período, eles viram, e tendo explicado no meu precário crioulo, como se faria, ficaram duvidando mas ensaiaram. Transportamos a urna em três levas e tudo se resolvera. “Sibi mesmo nós Cabo, nhabó tem cabeça mesmo. “Ku amim papeia,” ku nhabó ka sibi, nhabó tem cabeça suma nha burri di Bafatá, ió.
(i.e., do crioulo: Sabe mesmo nosso Cabo, tu tens cabeça que pensa. “E eu falei” e tu não sabes, tu tens cabeça igual a burro de Bafatá, sim).
Tendo o Batelão zarpado e tomando o rumo do Cais de Fulacunda, quando lá chegamos já se encontravam militares e civis esperando, feito o respectivo tráfego, descemos o rio com rota para o Cais de Bolama onde chegamos ao pôr-do-sol.
Na viagem, disse-lhes qual era a origem da frase “da cabeça suma a burro de Bafatá.”
Assim, ao tempo encontrava-se em Bafatá a Autoridade Máxima do Islão, na Guiné, Cherno Rachid, (Foto 5) que teria que viajar e instalar-se em Aldeia Formosa (Quebo), para onde era impensável ir a pé. Como mandavam as regras, deveria deslocar-se montado num camelo ou num cavalo, bichos que para aquelas bandas da Guiné há muito não eram vistos. Por conseguinte as entidades religiosas tinham que dar uma solução. Encontraram um burro e a decisão foi tomada, tendo o senhor seguido montado no dito cujo.
Foto 5 > Bissau > Teixeira Pinto > 1970 > Cerimónia religiosa do Ramadão. Autoridades máximas do Islão, na Guiné-Bissau na presença das Autoridades Militares e Civis. Na imagem, no lado direito, o Cherno Rachid, de etnia Futa Fula, (falecido em Novembro de 1973), à sua esquerda, vestido com calça e camisa branca, se bem me lembro, era um dos seus filhos.
Chegado a Aldeia Formosa, foram feitas as formalidades da praxe e havendo festa de arromba com pompa e circunstância, mas foi como uma pedra no sapato, do Chefe Cherno Rachid, de não se ter feito deslocar num meio de transporte adequado e ao nível da sua posição social.
Cherno Rachid, aparentava ser um religioso afectuoso e com um forte ascendente sobre a população do Credo Islâmico A sua presença dizia-se, fazia malograr qualquer intenção de perigo vindo do inimigo pois granjeava o respeito de todos.
Segundo se falava, tinha um sobrinho que integrava o PAIGC com influência na zona, em que os ataques de uma forma geral eram do lado da pista o que befeciava a povoação.
Quando passeava, dando uma volta pela Tabanca Grande de Aldeia Formosa, tendo-o reconhecido, tive oportunidade de lhe dirigir a saudação.
Batelão atracado no cais de Bolama, fora de todo conveniente falar com um camarada que era presença militar efectiva no batelão e a quem eu ficara a confiar, para lhe dizer que não ficávamos no barco e que íamos pernoitar no Quartel.
Na manhã seguinte e após o tráfego inerente à cabotagem, à hora marcada lá estávamos para embarcar e agora rumando a Bissau.
Chegados ao Cais de Pidjiguiti - Porto de Bissau, havia uma viatura do Exército a aguardar-me e transferimos o que estava a meu cargo. Foram feitas as devidas entregas na Morgue do Hospital (foto 6 e 7) e no Quartel dos Adidos.
Pernoitei no Quartel dos Adidos, era fim-de-semana e os serviços estavam fechados, e por isso um camarada emprestou-me um mosquiteiro e dois lençóis para os usar na cama. Quando era dia, porque o camarada estava de serviço, não pude agradecer-lhe por me ter proporcionado aquele conforto. Isto passou-se precisamente há quarenta anos.
Foto 6 > Bissau > Brá > Hospital Militar 241 > 1970 > Local temido e indesejável para as nossas tropas. Era preciso chegar com vida, que o resto os Médicos e Enfermeiros, tratavam e/ou enviavam para o Hospital da Estrela.
Foto 7 > Bissau > Morgue e Capela do Hospital Militar > 1970 > Depois do pesadelo, poderia vir a ser passagem para o destino final
__________
Nota de CV:
(*) Vd. poste de 7 de Maio de 2010 > Guiné 63/74 - P6336: As minhas memórias da guerra (Arménio Estorninho) (10): Em Empada, o caso do borrego furtado
Caro camarada e amigo Luís Graça,
Envio renovadas saudações que são extensivas a todos os tertulianos da Tabanca Grande.
Como já nos habituamos, o prometido é devido, por isso cá estou escrevendo, e desta feita são “estórias mas com algumas peripécias,” sobre a viagem de Empada a Bissau com inicio a 15 de Janeiro de 1970, do tempo de espera para o regresso à Metrópole, contudo, são ilustradas com extractos do meu álbum fotográfico.
De Empada a Bissau -1
Acompanhando os restos mortais do camarada Mário Caixeiro
Estamos nos primeiros dias de Janeiro de 1970, está a aproximar-se o final da comissão e já vou fazendo alguns preparativos para ir de abalada, desta terra de gente amiga que é lembrada. Ocasionalmente “bruxo, máquegête moço” o responsável pela Secção Auto da CCaç 2381, Fur Mil Auto Rodas, Bertino Cardoso (Fotos 1 e 2), interpelara-me para saber se eu estava interessado em antecipadamente marchar para Bissau a concretizar-se nos próximos dias. A minha missão seria zelar pela urna com os restos mortais do Soldado Mário Caixeiro, que morrera em combate na noite de 14/Nov./69, e de diversos equipamentos que estavam adstritos à Companhia, que iriam fazer carga num Batelão a chegar brevemente. Seriam feitos os depósitos na Morgue do Hospital Militar e no Quartel dos Adidos, em Bissau.
Foto 1 > Guiné-Bissau > Região de Quinara > Empada > Oficina Auto > 1969 > Obtida do cimo do depósito de água, com imagem da Oficina da Secção Auto, em zona posterior situa-se a avenida e a seguir a casa do motor gerador, estando esta com o telhado danificado devido a um ataque IN.
Foto 2 > Guiné-Bissau > Região de Quinara > Empada > 1969 > O fotógrafo paparazzi estava lá. O ex-Fur Mil Auto Rodas, Bertino Cardoso, aquando do aproximar do final da comissão, também já estava apanhado pelo clima. Gamara um carneiro que tinha sido comprado pelo Vagomestre e este denunciara-o ao Oficial de Dia. Foi efectuada a apreensão do ónus da prova, a fim de ser organizada a participação para processo de infracção disciplinar por furto.
Tendo eu aceitado a proposta de seguir para Bissau, mas com a condição de não ficar aquartelado nos Adidos, em Brá, situação um pouco embaraçosa e que fora tratada a contento com o nosso 2.º Sargento, Fernando Monteirinho, (que posteriormente passara para a vida civil, tornando a vê-lo no Porto, em 1990). O combinado foi o de eu seguir com a guia de marcha e de forma a apresentá-la no Quartel dos Adidos, contudo eu seria o único responsável ao não apresentar-me. Mas caso não houvesse complicações, e logo que a Companhia chegasse a Bissau, ter-lhe-ia de devolver a dita.
Tratei imediatamente de aprontar a minha saída, emalando logo os objectos de recordação (que muitos ainda guardo), uma mala com garrafas de whisky e outros (que já se foram em eventos), o pagamento da mensalidade à lavadeira e a recolha final dos pesos pelos trabalhos das fotografias. Também não esquecendo cumprimentar e despedir-me da população amiga.
Na noite 14/15 Jan./70, o IN atacou o Quartel de Empada que para mim seria o último, ficando-me em lembrança e fazendo a despedida (Foto 3).
Dirigiu-me ao Cabo Quarteleiro efectuando a entrega do equipamento de roupa da cama, da arma e munições, que me estavam distribuídos.
Livrei-me, em 31/ Jan./70, de sofrer um grande ataque ao Quartel, o qual durou cerca de 45 minutos, não havendo qualquer baixa. A notícia chegara célere a Bissau, onde vim a saber, ficando surpreso pelo tempo que durara a acção.
Foto 3 > Guiné-Bissau > Região de Quinara > Empada > 1970 > Grupo de camaradas e amigos que ainda ficaram em Empada, a partor da esquerda: ex-1.º Cabo Mec Auto José Luís Moreira, de Marco de Canaveses, ex-1.º Cabo Enf. Jorge Catarino, de Vale Vacas - Cardigos, o Soldado Pintassilgo, do Cacém – Lisboa, o Soldado Mec. Auto José António Coelho, de Maiorca – Figueira da Foz e por último um camarada de que não recordo o nome.
Entretanto o Batelão “Corubal,” em serviço de cabotagem, atracara no cais de Empada, na manhã do dia 15/ Jan./70 (foto 4). Foram-me dadas instruções para preparar a saída de imediato, porque o batelão iria zarpar quando logo que a maré o permitisse.
Foto 4 > Guiné-Bissau > Região de Quinara > Empada > Cais de Empada > 1970 > O Batelão Corubal (dizia-se que era dos turras e não dava problemas), a aguardar a enchente da maré. Este barco demandava regularmente e fazia cabotagem no Rio Grande de Buba.
Dando-se o embarque de passageiros, alguns eram portadores de cabritos, porcos, galinhas, peixe seco e outros, também era necessária a entrada da urna com o cadáver do Mário Caixeiro. Não estando devidamente soldada, dela exalava um cheiro cadavérico e por isso os estivadores africanos recusavam-se a transporta-la - “homem grande papeia,” tsi..! djubi, amim ka mist ku péssoal nega,” - dando estalito com a ponta da língua, e com o bater do braço no tronco do corpo.
(i.e., do crioulo: “O chefe falou,” tsi..! olha, eu não quer e o pessoal recusa).
Como ia safar-me desta, porque o batelão tinha que sair? Inspirei o ar e fui ao pé da urna, depois expirei em um só período, eles viram, e tendo explicado no meu precário crioulo, como se faria, ficaram duvidando mas ensaiaram. Transportamos a urna em três levas e tudo se resolvera. “Sibi mesmo nós Cabo, nhabó tem cabeça mesmo. “Ku amim papeia,” ku nhabó ka sibi, nhabó tem cabeça suma nha burri di Bafatá, ió.
(i.e., do crioulo: Sabe mesmo nosso Cabo, tu tens cabeça que pensa. “E eu falei” e tu não sabes, tu tens cabeça igual a burro de Bafatá, sim).
Tendo o Batelão zarpado e tomando o rumo do Cais de Fulacunda, quando lá chegamos já se encontravam militares e civis esperando, feito o respectivo tráfego, descemos o rio com rota para o Cais de Bolama onde chegamos ao pôr-do-sol.
Na viagem, disse-lhes qual era a origem da frase “da cabeça suma a burro de Bafatá.”
Assim, ao tempo encontrava-se em Bafatá a Autoridade Máxima do Islão, na Guiné, Cherno Rachid, (Foto 5) que teria que viajar e instalar-se em Aldeia Formosa (Quebo), para onde era impensável ir a pé. Como mandavam as regras, deveria deslocar-se montado num camelo ou num cavalo, bichos que para aquelas bandas da Guiné há muito não eram vistos. Por conseguinte as entidades religiosas tinham que dar uma solução. Encontraram um burro e a decisão foi tomada, tendo o senhor seguido montado no dito cujo.
Foto 5 > Bissau > Teixeira Pinto > 1970 > Cerimónia religiosa do Ramadão. Autoridades máximas do Islão, na Guiné-Bissau na presença das Autoridades Militares e Civis. Na imagem, no lado direito, o Cherno Rachid, de etnia Futa Fula, (falecido em Novembro de 1973), à sua esquerda, vestido com calça e camisa branca, se bem me lembro, era um dos seus filhos.
Chegado a Aldeia Formosa, foram feitas as formalidades da praxe e havendo festa de arromba com pompa e circunstância, mas foi como uma pedra no sapato, do Chefe Cherno Rachid, de não se ter feito deslocar num meio de transporte adequado e ao nível da sua posição social.
Cherno Rachid, aparentava ser um religioso afectuoso e com um forte ascendente sobre a população do Credo Islâmico A sua presença dizia-se, fazia malograr qualquer intenção de perigo vindo do inimigo pois granjeava o respeito de todos.
Segundo se falava, tinha um sobrinho que integrava o PAIGC com influência na zona, em que os ataques de uma forma geral eram do lado da pista o que befeciava a povoação.
Quando passeava, dando uma volta pela Tabanca Grande de Aldeia Formosa, tendo-o reconhecido, tive oportunidade de lhe dirigir a saudação.
Batelão atracado no cais de Bolama, fora de todo conveniente falar com um camarada que era presença militar efectiva no batelão e a quem eu ficara a confiar, para lhe dizer que não ficávamos no barco e que íamos pernoitar no Quartel.
Na manhã seguinte e após o tráfego inerente à cabotagem, à hora marcada lá estávamos para embarcar e agora rumando a Bissau.
Chegados ao Cais de Pidjiguiti - Porto de Bissau, havia uma viatura do Exército a aguardar-me e transferimos o que estava a meu cargo. Foram feitas as devidas entregas na Morgue do Hospital (foto 6 e 7) e no Quartel dos Adidos.
Pernoitei no Quartel dos Adidos, era fim-de-semana e os serviços estavam fechados, e por isso um camarada emprestou-me um mosquiteiro e dois lençóis para os usar na cama. Quando era dia, porque o camarada estava de serviço, não pude agradecer-lhe por me ter proporcionado aquele conforto. Isto passou-se precisamente há quarenta anos.
Foto 6 > Bissau > Brá > Hospital Militar 241 > 1970 > Local temido e indesejável para as nossas tropas. Era preciso chegar com vida, que o resto os Médicos e Enfermeiros, tratavam e/ou enviavam para o Hospital da Estrela.
Foto 7 > Bissau > Morgue e Capela do Hospital Militar > 1970 > Depois do pesadelo, poderia vir a ser passagem para o destino final
__________
Nota de CV:
(*) Vd. poste de 7 de Maio de 2010 > Guiné 63/74 - P6336: As minhas memórias da guerra (Arménio Estorninho) (10): Em Empada, o caso do borrego furtado
Guiné 63/74 - P6351: Os Marados de Gadamael (Daniel Matos) (16): Composição da CCAÇ 3518
Os Marados de Gadamael
e os dias da Batalha de Guidaje
Parte XVI
e os dias da Batalha de Guidaje
Parte XVI
por Daniel de Matos (ex-Fur Mil da CCaç 3518, Gadamael, 1972/74)
Composição da CCaç 3518
Manuel Nunes de Sousa, capitão miliciano, comandante de companhia
António Francisco Lopes Monteiro, alferes miliciano de operações especiais
José Eduardo Freitas da Silva Cavaco, alferes miliciano atirador
Dino Álvaro Mendes Duarte, alferes miliciano atirador, “colocado” na CCaç 6, em Bedanda a 5 de Novembro de 1972
Quirino do Sameiro Correia Igreja, alferes miliciano
Vitorino Ferreira da Cruz, alferes miliciano atirador, chegou à companhia a 12 de Outubro de 1972, (para substituir o alferes Dino Duarte). A 27 de Julho de 1973 seria transferido para o BEng 447.
Manuel Fagundes Neves, primeiro-sargento atirador
José Alberto Ferreira Durão, furriel miliciano mecânico auto
Domingos Gomes Gonçalves Pinto, furriel miliciano de transmissões
José Carlos Moreira Machado, furriel miliciano atirador
Hélder Esteves Novíssimo, furriel miliciano atirador
Nuno Álvares Brasil Pessoa, furriel miliciano atirador, transferido para a 1ª companhia do BCaç 4610, em 27 de Outubro de 1973
António Francisco Revez Guerreiro, furriel miliciano atirador
Manuel Fernando Urbano Neves, furriel miliciano atirador, também “colocado” na CCaç 6, em Bedanda, em Novembro de 1972
Avelino J. A. Gomes, furriel miliciano atirador
José Lopes Silva, furriel miliciano atirador
Daniel Rosa de Matos, furriel miliciano de minas e armadilhas, professor escolar no PEM 23
Ângelo César Carneiro da Silva, furriel miliciano de minas e armadilhas
Bernardo Gomes Monteiro, furriel miliciano de armas pesadas
Hélder Pereira Calvão, furriel miliciano de operações especiais, apresentou-se a 6 de Março de 1972
António Francisco Quaresma, furriel miliciano de alimentação (vagomestre), apresentou-se a 6 de Março de 1972, esteve também na CCaç 3520, de Cacine
Augusto Acácio de Morais, furriel miliciano enfermeiro, apresentou-se a 6 de Março de 1972
Florentino José Lopes de Almeida, furriel miliciano de operações especiais, guineense, apresentou-se a 6 de Março de 1972, vindo da CCaç 17 em substituição do segundo-sargento Luís Lavado, que não embarcou com companhia para a Guiné. Passou à disponibilidade em 1 de Dezembro de 1972.
Adriano Augusto da Silva, furriel miliciano atirador, substitui José Carlos Machado em 13 de Agosto de 1973
Manuel Baptista Fidalgo, furriel miliciano atirador, da, esteve em diligência na companhia; foi para a CCaç 6 (Bedanda) a 7 de Janeiro de 1973
Alexandre Vasco de Castro, 1º cabo escriturário, esteve no DA/CTIG em serviço da companhia
José Rafael Henriques Quintas, 1º cabo operador cripto
Jaime de Neiva Pereira dos Santos, 1º cabo operador cripto
Fernando Cardoso Simões, 1º cabo auxiliar de enfermeiro, esteve no DA/CTIG em serviço da companhia
José Amândio G. Cunha, 1º cabo auxiliar de enfermeiro
Emídio dos Santos Júnior, 1º cabo auxiliar de enfermeiro
Mário da Cruz Oliveira, 1º cabo auxiliar de enfermeiro
Gabriel Gomes Machado, 1º cabo mecânico de armas ligeiras
Luciano Fernandes Rebolo, 1º cabo apontador de armas ligeiras, esteve no DA/CTIG em serviço da companhia
João Luís de Gouveia, 1º cabo apontador de armas ligeiras
Carlos Manuel Nunes Curto, 1º cabo corneteiro
Luís Barros de Macedo, 1º cabo cozinheiro
José Manuel S. Garcês, 1º cabo C. A. R., sintex
Carlos Alberto Esteves Ferreira, 1º cabo C. A. R.
Manuel da Conceição Fino, 1º cabo mecânico A. R.
Manuel Coelho Rodrigues, 1º cabo padeiro
Manuel de Sousa Nogueira, 1º cabo apontador M. M., esteve em diligência em Cufar, na CCaç 4740
António de Oliveira Simões, 1º cabo apontador M. M.
Rafael de Freitas Pereira, 1º cabo atirador
João Manuel Pinto Rodrigues, 1º cabo atirador
Gabriel Ferreira Telo, 1º cabo atirador
Américo Z. G. Paulo, 1º cabo atirador
João Heliodoro Gomes da Silva, 1º cabo atirador
Humberto A. Camacho Gomes Pereira, 1º cabo atirador
Agostinho Gomes Serrão, 1º cabo atirador
Manuel Nuno de Sousa, 1º cabo atirador, monitor escolar
Manuel G. G. Quintal, 1º cabo atirador
José Agostinho de Freitas, 1º cabo atirador
Manuel de Freitas, 1º cabo atirador
José Manuel Mendonça de Viveiros, 1º cabo atirador, esteve no DA/CTIG em serviço da companhia
José Maria Fernandes, 1º cabo atirador
Manuel de Câmara Lambaz, 1º cabo atirador
José Rodrigues Fernandes, 1º cabo atirador
José Teixeira Cardoso, 1º cabo atirador, esteve em diligência no Pelundo
José de Sousa Costa, 1º cabo atirador
João Manuel Mendonça N. Jarimba, 1º cabo atirador
Mário Luís Martins, 1º cabo rádio-telegrafista, apresentou-se a 6 de Março de 1972
Armindo Gonçalves Barbosa, soldado corneteiro, esteve em diligência em Catió, na CCart 6251
Joaquim da Cunha Ramos, soldado corneteiro
José Maria dos Santos Lopes, soldado corneteiro
Francisco Estrela Gonçalves, soldado corneteiro
António Alfredo Cruz, soldado cozinheiro
José Manuel Gomes Aguiar, soldado auxiliar de cozinheiro
Serafim Ferreira Reis, soldado condutor A. R.
António Adílio Moreira Carneiro, sold. condutor A. R.
Albino Jorge C. Caldas, soldado condutor A. R.
Francisco Rocha Moutinho da Costa, soldado condutor A. R.
José Américo Araújo, soldado condutor A. R.
Francisco M. P. da Silva, soldado condutor A. R.
Fernando F. de Oliveira, soldado condutor A. R.
Artur Cunha da Fonseca, soldado condutor A. R.
Francisco Baiona Calado, soldado condutor A. R.
José da Costa Novais, soldado condutor A. R.
Fernando Fajardo, soldado condutor A. R.
Rogério Manuel Cesário Aguiar, soldado condutor A. R., sintex, esteve como delegado da companhia na 4ª REP/QG/CTIG
Fernando Manuel F. Ruivo, soldado transmissões
José Eduardo Marques Diogo, soldado de transmissões, esteve em diligência em Catió, na CCart 6251
José Elias Gomes de Oliveira, soldado de transmissões
Artur Fernandes Moita, soldado de transmissões
Francisco António Riço Louro, soldado mecânico A. R.
Manuel Rodrigues Gonçalves, soldado mecânico A. R.
Emílio de Carvalho Passos, soldado apontador M. M.
Aureliano Martins de Sousa, soldado apontador M. M.
José Manuel de Abreu, soldado apontador armas ligeiras
Francisco Bernardo Freitas Dornelas, soldado atirador
Avelino T. F. Henriques, soldado atirador
José Gabriel Freitas Pestana, soldado atirador
Manuel Januário de Abreu, soldado atirador
Manuel Pereira, soldado atirador
Manuel A. Silva, soldado atirador
Jorge de Andrade Gonçalves, soldado atirador
António de Leça Abreu, soldado atirador
Raul Gaspar Rodrigues, soldado atirador
Jordão Egídio dos Santos, soldado atirador
Juvenal Frutuoso Fernandes Dantas, soldado atirador
José Luís Figueira da Silva, soldado atirador
Manuel de Freitas Moniz, soldado atirador
João Gouveia de Olim, soldado atirador
Mário de Nóbrega Neto, soldado atirador, esteve também na CCaç 3548
José António dos Santos, soldado atirador
João Gonçalves de Jesus, soldado atirador
José Manuel da Silva, soldado atirador
José António da Silva Pires, soldado atirador
Manuel Agostinho T. Silva, soldado atirador
Manuel A. A. Catanho, soldado atirador
Alexandre António Pestana, soldado atirador
Luciano Aleixo Gomes, soldado atirador
Francisco Correia Fernandes, soldado atirador
Joaquim Faria de Abreu, soldado atirador
António de Andrade Pereira, soldado atirador
Adelino Gomes, soldado atirador
José Manuel F. Gouveia, soldado atirador
António Amaro de Oliveira, soldado atirador
Ambrósio F. Rodrigues, soldado atirador
Agostinho Teixeira de Ornelas Flor, soldado atirador, esteve em diligência em Catió, na CCart 6251
Moisés Ferreira Ganança, soldado atirador
Domingos Gonçalves, soldado atirador
José Boaventura de Castro Gouveia, soldado atirador
Agostinho Ferreira Perestrelo, soldado atirador
Arnaldo Martins, soldado atirador
José Pita de Andrade, soldado atirador
Manuel N. V. Cardoso, soldado atirador
Carlos Teixeira de Freitas, soldado atirador, esteve evacuado no HMB e no HMP
Manuel Delgado de Sousa, soldado atirador
Jesuíno Meneses dos Reis, soldado atirador
Manuel Câmara Costa, soldado atirador, esteve em diligência em Cufar, na CCaç 4740; e esteve evacuado no HMP
Vicente de Sousa, soldado atirador
José Marques da Silva, soldado atirador
Pio Marinho dos Santos, soldado atirador, esteve em diligência no BCart 6252
João de Freitas Bettencourt, soldado atirador
António de Sousa, soldado atirador
Sidónio G. Nóbrega, soldado atirador
Adelino Pereira Jardim, soldado atirador
António Rodrigues de Freitas, soldado atirador
Manuel Avelino M. de Olim, soldado atirador
José Urbano Gomes Camacho, soldado atirador
Manuel de Sousa, soldado atirador
José Manuel da Silva, soldado atirador
António do Rosário de Freitas, soldado atirador, esteve no DA/CTIG em serviço da companhia
Carlos Nóbrega de Freitas, soldado atirador
Manuel Baptista Teixeira, soldado atirador
António Alberto Gonçalves, soldado atirador
Heliodoro de Freitas Rodrigues, soldado atirador
José Manuel Barros Soares, soldado atirador
Tolentino Oliveira dos Santos, soldado atirador
Manuel Pestana, soldado atirador
João de Sousa Pinto, soldado atirador
Eleutério Teodósio S. Spínola, soldado atirador
Joaquim Marques de Mendonça, soldado atirador
João Nunes Ferreira, soldado atirador, ferido numa mina a 7 de Agosto de 1972, esteve evacuado no HMP; a 6 de Fevereiro de 1973 vem do DAG e regressa à companhia, indo depois morrer a Guidaje
José Alexandre Rodrigues, soldado atirador
Manuel Germano F. Rodrigues, soldado atirador, sintex
Daniel Martins Alves, soldado atirador
Alfredo Rodrigues França, soldado atirador
José Cipriano Ferreira, soldado atirador
José Nunes Araújo, soldado atirador
José Manuel F. Rodrigues, soldado atirador
Humberto Amaro Francisco, soldado atirador
José Virgílio Vieira, soldado atirador, apresentou-se a 6 de Março de 1972, esteve evacuado no HMB e no HMP
Emanuel Gonçalves, soldado cozinheiro, apresentou-se a 6 de Março de 1972
José de Jesus Rodrigues Carreira, soldado rádio-telegrafista, apresentou-se a 6 de Março de 1972
João Luís Gouveia Rodrigues, soldado rádio-telegrafista, apresentou-se a 9 de Abril de 1972
Ricardo Lima da Costa, soldado monitor escolar no PEM 23, guineense, (temporariamente)
Inácio Soares da Gama, soldado básico vindo do GA7, apresentou-se a 22 de Abril de 1972 e foi transferido para a CCaç 4147, em 24 de Novembro de 1973
Ângelo Manuel dos Santos Raposeiro, soldado atirador, apresentou-se em Maio de 1972, transferido do BCaç 3864
Malan Seidi, soldado atirador, apresentou-se em Maio de 1972, transferido da CCaç 3 , esteve deslocado na CCaç 3548, passou à disponibilidade em 1 de Dezembro de 1973
Joaquim Pereira Campos Simões, soldado atirador, apresentou-se em 15 de Junho de 1972, vindo do Comando de Defesa de Bissau e transferido da CCart 2762
António Henrique Paiva Valente, soldado atirador, monitor escolar, apresentou-se a 27 de Julho de 1972
José Avelino Pestana, soldado atirador, apresentou-se na companhia a 19 de Dezembro de 1972
Orlindo E. Vicente, soldado atirador, apresentou-se na companhia em Fevereiro de 1973
José N. S, Pereira, soldado atirador, apresentou-se na companhia em 26 de Novembro de 1973
Fernando J. F. Fleming de Oliveira, alferes miliciano da 2ª companhia do Depósito de Adidos da Guiné, a frequentar estágio para comandante de companhia
Alfredo Joaquim Ribeiro dos Santos Lima, furriel miliciano sapador do BEng 447, para onde regressou em Maio de 1972
Mário Alves Rolo, furriel miliciano de acção psicológica, da CCS/QG; a 15 de Junho de 1972 regressou à CCS para passar à disponibilidade.
Florémio Fernandes Romão, soldado atirador da CCS/BCaç 2930
Fernando da Silva Lopes, soldado atirador da CCaç 3325
Manuel da Costa e Silva, soldado Pont. A. Fix, do BEng 447, para onde regressou em Maio de 1972
Álvaro José da Silva Albuquerque, soldado atirador da CCaç 3477
José de Brito Simões Gomes, 1º cabo da CCav 8350, esteve em diligência na companhia depois de 2 de Dezembro de 1972
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Nota de CV:
Vd. último poste da série de 7 de Maio de 2010 > Guiné 63/74 - P6334: Os Marados de Gadamael (Daniel Matos) (15): Hino de Os Marados, Dedicatória e Balada dos Amigos Separados
Guiné 63/74 - P6350: Controvérsias (74): Como eu vi o fim da guerra (Fernando C. G. Araújo, ex-Fur Mil OpEsp / RANGER da 2ª CCAÇ / BCAÇ 4512)
1. O nosso Camarada Fernando Costa Gomes de Araújo* (ex-Fur Mil OpEsp / RANGER da 2ª CCAÇ do BCAÇ 4512, Jumbembem, 1973/74), enviou-nos a sua 5ª mensagem, com data de 4 de Maio de 2010:
Como eu vi o fim da guerra
Camaradas,
Tenho acompanhado no blogue a polémica gerada em volta dos contactos efusivos e das trocas de abraços com o inimigo de “ontem” - o PAIGC, que se seguiram à declaração do fim das hostilidades, ao longo do segundo semestre de 1974, até à saída total do dispositivo militar português, na Guiné.
Tenho acompanhado no blogue a polémica gerada em volta dos contactos efusivos e das trocas de abraços com o inimigo de “ontem” - o PAIGC, que se seguiram à declaração do fim das hostilidades, ao longo do segundo semestre de 1974, até à saída total do dispositivo militar português, na Guiné.
A meu ver, algum exagero houve, em alguns desses contactos, pois mais parecia que o ex-IN, passou a ser considerado, por alguns dos nossos Camaradas, o novo amigo de “hoje”!
Excluindo um ou outro caso pontual, em que os comandantes não souberam impor o respeito e disciplina indispensáveis, e obrigar a manter as devidas “distâncias” entre as partes beligerantes, que eu saiba a grande maioria não passaram de contactos meramente formais, específicos e decisivos, para a correcta entrega dos aquartelamentos e a posterior retirada, ordenada e disciplinada, para Bissau, onde se procediam aos acelerados embarques de cerca de 27 mil homens em armas, no regresso à Metrópole, via aérea e marítima.
Pelas minhas contas a evacuação das tropas foi efectuada em meia dúzia de meses.
Com podem constatar em 2 das fotos que anexo, e pelo que me foi dado ver e apreciar, naquele período, que registei como era meu apanágio na minha agenda/diário, em relação ao pessoal da minha companhia, foi evidente a satisfação de todos pelo fim da guerra e o consequente fim do derramamento de sangue de jovens com 21/22 /23 anos de idade, ou seja putos na flor da sua juventude.
Mas, se por um lado nos congratulamos com o fim da angústia de um dia a dia incerto, cheio de perigos e de stress permanente, quer pelas saídas em patrulhas para o tarrafo, picadas e bolanhas, onde nos esperavam inúmeras armadilhas, minas e emboscadas, quer pelos bombardeamentos ao aquartelamento, etc., que poderiam representar a qualquer momento a nossa mutilação e, ou, morte, por outro lado, chorávamos aqueles que faleceram e ficaram para sempre estropiados, nomeada e mais sentidamente os da nossa Unidade.
Recordo a finalizar que o meu pelotão, a partir de certo momento, devido a doenças (outro inimigo arrasador e considerável) e ferimentos estava reduzido a cerca de metade, tendo chegado a sair várias vezes apenas com +/- 17 homens.
Excluindo um ou outro caso pontual, em que os comandantes não souberam impor o respeito e disciplina indispensáveis, e obrigar a manter as devidas “distâncias” entre as partes beligerantes, que eu saiba a grande maioria não passaram de contactos meramente formais, específicos e decisivos, para a correcta entrega dos aquartelamentos e a posterior retirada, ordenada e disciplinada, para Bissau, onde se procediam aos acelerados embarques de cerca de 27 mil homens em armas, no regresso à Metrópole, via aérea e marítima.
Pelas minhas contas a evacuação das tropas foi efectuada em meia dúzia de meses.
Com podem constatar em 2 das fotos que anexo, e pelo que me foi dado ver e apreciar, naquele período, que registei como era meu apanágio na minha agenda/diário, em relação ao pessoal da minha companhia, foi evidente a satisfação de todos pelo fim da guerra e o consequente fim do derramamento de sangue de jovens com 21/22 /23 anos de idade, ou seja putos na flor da sua juventude.
Mas, se por um lado nos congratulamos com o fim da angústia de um dia a dia incerto, cheio de perigos e de stress permanente, quer pelas saídas em patrulhas para o tarrafo, picadas e bolanhas, onde nos esperavam inúmeras armadilhas, minas e emboscadas, quer pelos bombardeamentos ao aquartelamento, etc., que poderiam representar a qualquer momento a nossa mutilação e, ou, morte, por outro lado, chorávamos aqueles que faleceram e ficaram para sempre estropiados, nomeada e mais sentidamente os da nossa Unidade.
Recordo a finalizar que o meu pelotão, a partir de certo momento, devido a doenças (outro inimigo arrasador e considerável) e ferimentos estava reduzido a cerca de metade, tendo chegado a sair várias vezes apenas com +/- 17 homens.
Segundo me contou o Magalhães Ribeiro, também em Mansoa, além dos indispensáveis contactos com o PAIGC, para a entrega do quartel que foi precedido das cerimónias do arriar da bandeira nacional e o hastear da bandeira da Guiné-Bissau, pela parte das NT não se viu qualquer sinal de congratulação, ou de qualquer gesto de simpatia.
Este facto foi ainda agravado pelo inesperado e estranho facto de que o bigrupo que se apresentou, para representar as forças guerrilheiras, só sabia falar francês, não compreendendo nada do dialecto crioulo e muito menos da língua portuguesa.
Juntos nos questionamos sobre a seguinte questão: Onde é que estavam os milhares de homens do PAIGC, para que nem um bigrupo se tivesse disposto a estar em representação do seu partido, num dia tão importante para eles, como aquele que representou, com carácter oficial, a efectiva e final transmissão de poderes soberanos, na sua Guiné?
Outra coisa estranha se verificou, que hoje nos continuamos a questionar é que estas cerimónias decorreram, como é sabido em 9 de Setembro de 1974, tinham já decorrido 4,5 meses sobre o 25 de Abril, é como que se procedeu à desmobilização dos tão propalados (por alguns sectores mais bem informados das NT) dos milhares de guerrilheiros do PAIGC?
Desapareceram, ou foram, pura e simplesmente, reintegrados de imediato nas respectivas populações locais, voltando às suas rotinas habituais no início do conflito?
Ou formaram algum super-exército que passou despercebido ao resto do mundo?
Ou chacinaram-se entre eles e exterminaram-se por completo?
Também nos lembramos das reacções das populações locais, pois se uma pequena parte, evidentemente afecta ao PAIGC, demonstrava regozijo no final das cerimónias, era notório que a maioria se mantinha expectante e apreensiva, face a um futuro incerto.
A finalizar ainda hoje nos ocorrem os últimos pedidos, de inúmeros nativos: “Acabem com a guerra mas não se vão embora!” e “Não nos abandonem!”
11JUN1974 > Jumbembem > Fim da Guerra para a 2ª CCAÇ do BCAÇ4512 > Dia inesquecível > O Comandante do PAIGC daquela zona - Anso Bojan -, visitou o quartel e foi convidado para tomar café.
11JUN1974 > Jumbembem > Fim da Guerra para a 2ª CCAÇ do BCAÇ4512 > Ao meu lado estão elementos do PAIGC que haviam tomado café connosco.
11JUN1974 > Jumbembem > Fim da Guerra para a 2ª CCAÇ do BCAÇ 4512 > Ao meu lado está o Comandante do PAIGC daquela zona - Anso Bojan.
11JUN1974 > Jumbembem > O Comandante Anso Bojan visitou o nosso quartel. No fim da visita, fomos levar os guerrilheiros do PAIGC a Fambantã. Esta foto da viatura foi obtida por mim em plena bolanha, do jipe onde seguia o nosso CMDT de Companhia - Capitão Aires da Silva Gouveia -, e mais alguém que já não me recordo.
Em 24ABR1974 > 17h30 > Tínhamos sido atacados com 5 foguetões.
Em 18MAI1974 > 23 dias depois do 25 de Abril, numa coluna a Farim fomos emboscados em Lamel e sofremos 4 feridos (não me recordo quais os pelotões envolvidos).
Um abraço,Fernando Araújo
Fur Mil OpEsp/RANGER da 2ª CCAÇ do BCAÇ 4512
Fotos: © Fernando Araújo (2009). Direitos reservados.
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Nota de M.R.:
Vd. último poste desta série em:
5 de Maio de 2010 > Guiné 63/74 - P6322: Controvérsias (73): Contra a corrente é difícil nadar (José Brás)
5 de Maio de 2010 > Guiné 63/74 - P6322: Controvérsias (73): Contra a corrente é difícil nadar (José Brás)
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