quinta-feira, 23 de julho de 2015

Guiné 63/74 - P14921: 3 anos nas Forças Armadas (Tibério Borges, ex-Alf Mil Inf MA da CCAÇ 2726) (3): De Bissau para Cacine

1. Parte III de "3 anos nas Forças Armadas", série do nosso camarada Tibério Borges (ex-Alf Mil Inf MA da CCAÇ 2726, Cacine, Cameconde, Gadamael e Bedanda, 1970/72).


3 anos nas Forças Armadas (3)

Cacine

E passamos uma semana em Bissau. Aqui fizemos alguns patrulhamentos nocturnos para nos irmos ambientando ao terreno. Dos Açores ao Continente português a maneira de ser e viver era muito diferente mas muito mais era em África relativamente ao Continente. Mundos diferentes.
Em Bissau ouviam-se histórias tenebrosas de mortes, ataques, bombardeamentos, emboscadas, as mais diversas operações no hospital e sei lá que mais. Mas vivia-se intensamente a vida. A promiscuidade era enorme. A vida dos militares na retaguarda era um luxo. Pobres dos que estavam a chafurdar na frente de combate. Em breve iria saber isso o que era. O que me aconteceu até aqui foi encontrar um oásis no deserto. Daqui por diante iria deixar o oásis e entrar no deserto. Quase dois anos me esperavam na frente de combate. Não fazia a mínima ideia do que me esperava.


Em Bissau, 1970

Não me lembro de muitos pormenores mas recordo-me de estar numa LDG (lancha desembarque grande) rumo a Cacine e penso que de noite. Entramos no rio Cacine onde as águas se misturavam e depois de estudadas as marés para podermos desembarcar na margem esquerda onde estava sediado o quartel de Cacine. Ao longo dos cerca de dois anos que ali permanecemos os nossos abastecimentos vinham por mar nestas lanchas.


 LDGs


Cacine

Fomos render a Companhia de Caçadores 2445 em Maio de 1970.
Cacine era o último reduto do Sul da Guiné onde estavam tropas portuguesas tendo como segurança na retaguarda o lugar de Cameconde, havendo mais a norte dois quartéis, Gadamael e Guileje, onde existia o corredor da morte, corredor esse que dava entrada ao armamento do PAIGC da Guiné Konacry para o interior da Guiné Bissau.

Logo à saída do quartel havia as habitações dos residentes de Cacine para mais perto de Cameconde existir ainda outra povoação, a Tabanca Nova. Entre Cacine e Cameconde com paragem na Tabanca nova fazíamos o trajecto diário, picando o caminho a fim de detectar alguma mina. Era necessário abastecer Cameconde e manter seguro esta picada. Além de cada um estar armado acompanhava-nos as “Daimlers”, Unimogs e a GMCs com sacos de areia como lastro. Todos os meses havia a mudança de pelotões de Cacine para Cameconde e vice-versa.

O lugar de Cacine situado na margem esquerda do rio Cacine era um lugar aprazível e não muito longe do mar. As marés eram muito acentuadas e como tal para navegar neste rio havia que ter em conta as marés. Fora do quartel e na margem do rio havia praia da qual desfrutamos bons momentos. Pena é a guerra ter condicionado o dia-a-dia destas populações que bem podiam desfrutar do seu modo de vida peculiar.


O pôr-do-sol era lindo. Em contraste a vida dura que a população levava derivado aos condicionalismos no terreno imposto pela situação militar portuguesa.


Este Unimog tem uma história que se passou com ele ao ficar uma noite na praia devido a não se conseguir tirá-lo pois as rodas enterraram-se na areia. Seria necessário a GMC para o puxar. E porque isso não aconteceu nesse dia não sei. O que me lembro é que a maré, quando encheu, provocou um curto-circuito no sistema eléctrico do carro e com o movimento das águas a luz começou a acender e a apagar. Isto durante a noite. Uma das sentinelas ao aperceber-se desta alternância de luz começou a disparar. A malta foi logo para os abrigos e foi o descarregar de uma tensão que se vinha acumulando duma notícia que iríamos ter um ataque aos arames. As armas desenferrujaram-se, a tensão desapareceu e tudo voltou ao normal no dia seguinte.

Nestas margens do rio a população apanhava as tão saborosas ostras com as quais nos deliciávamos. Eram bem graúdas. Era uma maneira de enriquecer o PIB local. A pesca era outro meio de sobrevivência. A caça fazia parte do modo de viver e lembro-me bem da carne do animal “monte” que era bem saborosa. A mancarra (amendoim) era outro produto.
A praia era um lugar para mitigar a solidão nestas paragens.

A vertente religiosa era bem acentuada onde em grupo ou em individual a oração fazia parte da vida. Um factor mais forte pesava na religiosidade que era a situação da guerra. Nos tempos difíceis o ser humano agarra-se a algo para além do que é material pois a impotência do humano perante os acontecimentos leva-o a pensar no sentido da vida.

Capela de Nossa Senhora de Fátima

A Capela de Nossa Senhora de Fátima estava ali para nos receber em grupo ou em particular, até os mortos que vinham de dois quartéis mais acima, Gadamael e Guileje. E foram muitos. O Carapeta de tanta pancadaria que apanhou teve que ser rendido mais cedo. Lembro-me dum capitão, de nome Ascensão (penso), dum desses quartéis ter sido morto numa emboscada. Eram notícias que nos congelavam as veias.

 Mesquita

Por outro lado a população que vivia ao lado do nosso aquartelamento era muçulmana e como tal aprendia a sua religião e costumes. E tinham a sua mesquita. Com a sua conjuntura social própria o encarregado de educar as crianças na religião muçulmana reunia-as e sentadas no chão aprendiam o Corão.

Na medida em que o tempo ia passando as saudades das notícias dos nossos entes queridos aumentavam e os aerogramas (envelopes-carta distribuídos pelo MNF) funcionava como meio de comunicação. Mas nem sempre o correio vinha directamente para o nosso quartel mas sim para outro ao lado e mais acima rio, Gadamael. Por isso era necessário lá ir de sintex e saber das marés porque só quando estava cheia era possível atracar no porto. Uma vez a maré já estava em posição avançada de baixar mas mesmo assim aventuramo-nos a lá ir ficando para o outro dia o regresso.

Lembro-me que quando lá chegamos a maré já estava em fase adiantada de abaixamento e por isso tivemos que arrastar o sintex até lugar seguro, amarrá-lo e tiramos as botas, arregaçamos as calças, enterramos os pés no lodo e chegamos a terra firme. Cortei a sola dos pés penso que por causa das conchas das ostras.


Na altura não medíamos a dimensão do perigo que nos rodeava pois a conjuntura política estava longe da nossa noção real da Guiné. Dizia-se que do outro lado da margem do rio, que ficava bem afastada, era mato denso. Portanto o perigo de sermos atacados dali não se avizinhava na nossa realidade. Cacine era o último reduto do sul rodeado de mata e água, havendo apenas uns carreiros pelo lado de Cameconde onde tínhamos o nosso destacamento. Era a retaguarda de Cacine. O enquadramento geo-estratégico de Cacine era bom. Plantado à beira rio com a população mais a interior o nosso quartel estava bem posicionado tendo ligação por um caminho que passava pela Tabanca Nova a caminho de Cameconde. O interior do quartel abrangia a messe dos Oficiais com condições más, vistas em 2009 mas que na altura até não eram más. Hoje ao olharmos para trás é que nos arrepiamos ao vermos onde estávamos instalados. Fazia parte, ainda, a messe dos sargentos, as Transmissões, a secretaria, a oficina mecânica, o refeitório, o local da PIDE, a nora de onde tirava a água, a capela…
Como em todos os quartéis havia a disciplina militar com os seus usos e costumes. Logo de manhã o tocar da alvorada e à noite o arrear da bandeira à qual se prestava homenagem.

Na Guiné penso que todos os quartéis tinham a sua pista para as avionetas. Este meio de transporte servia tanto para civis como para militares. Uma vez fui para Bissau gozar um artigo do RDM que me dava 5 dias longe do mato e comigo iam também civis. Estes monomotores sobrevoavam toda a Guiné, penso e noutra vez o motor, que era posto a trabalhar pegando numa haste da hélice e rodando-a, parou simplesmente dizendo o piloto que no ar não parava.


No isolamento em que vivíamos tudo que era fora do comum era novidade e uma atracção que quebrava a monotonia da nossa existência.
Fora do quartel e para os lados da Praia existia uma viatura fora de serviço, velha e estanque. Ao se passar por ela explorávamos a viatura pois na altura tudo era novidade. Estávamos em 1970. Mas conduzir um jeep sem ter carta era entusiasmante assim como um Unimog. Foi aprendendo assim que numa das férias que fui a S. Miguel tirei carta no quartel em Belém.



Entre Cacine e Cameconde havia diariamente um patrulhamento para assegurar a vigilância na zona e para deslocar toda a gama de material quer alimentício quer de armamento ou outra coisa qualquer.
Para isso um pelotão de 25 homens, 3 furriéis (no meu caso apenas dois), pessoal de transmissões, um pelotão de milícias que seguia na frente a fazer a picagem, as viaturas com os respectivos condutores (Unimog, Daimlers, GMC com a arma “Browning” com lastro de sacos de areia). Munidos de G3, metralhadora HK21, bazuca, não me lembro de morteiro 60 fazíamos o percurso para o qual já tinham seguido a milícia a fazer a picagem.

O obus 14 fazia parte da nossa segurança em que a artilharia fazia uso dele sobretudo em Cameconde. Era uma arma que mandava um rebuçado de 45 kg e que metia respeito.


O sector da “ferrugem”, oficinas de viaturas, era sui generis. Com espírito próprio e adquirido por um grupo pequeno era ali que a folia parecia brotar. Uma viola fazia parte da farra que acompanhada com umas ostras cozidas em meio bidão faziam a delícia de quantos tomavam parte dela. Eram estes uns dos poucos momentos que faziam esquecer o isolamento, o afastamento da família ou da mulher e filhos.

"Ferrugem"

Texto e fotos: © Tibério Borges
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Nota do editor

Último poste da série de 15 de julho de 2015 > Guiné 63/74 - P14879: 3 anos nas Forças Armadas (Tibério Borges, ex-Alf Mil Inf MA da CCAÇ 2726) (2): Passagem pelo BII 18 de Ponta Delgada, IAO no RI 11 de Setúbal e embarque em Lisboa no Ana Mafalda

Guiné 63/74 - P14920: Notas de leitura (739): Parabéns ao nosso camarada Mário Cláudio / Rui Barbot Costa [, ex alf mil, secção de justiça, QG, Bissau, 1968/70], Grande Prémio de Romance e Novela APE/ DGLAB - 2014, atribuído ao seu último livro "Retrato de rapaz"

© Mário Cláudio.
Cortesia de Bookoffice
1. Parabéns ao Mário Cláudio, pseudónimo literário do nosso camarada e membro da nossa Tabanca Grande, Rui Barbot Costa  [, nascido no Porto, em 1941,  ex-alf mil, na secção de justiça, QG, Bissau, 1968/70, foto atual à direita], chegado até nós pelo braço de outros dois camaradas, o Carlos Nery e o saudoso João Barge (1944-2010)...  Recorde-se que os três participaram num espectáculo teatral, inédito em Bissau, estreado em 5/4/1970: a peça de Ionesco, "A Cantora Careca", encenada pelo Carlos Nery.

A Associação Portuguesa de Escritores (APE) acaba de atribuir o Grande Prémio de Romance e Novela APE/ DGLAB - 2014, ao livro Retrato de Rapaz, editado sob a chancela da Dom Quixote.

Capa do livro, editado pela Dom Quixote,   
Segundo notícia da própria APE,  o júri, constituído por José Correia Tavares, que presidiu, Ana Paula  Arnaut, Isabel Cristina Mateus, Maria João Cantinho, Miguel Miranda e  Miguel Real, ao reunir pela 3.ª vez, deliberou maioritariamente, pois  Isabel Cristina Mateus e Maria João Cantinho votaram em Impunidade,  de H. G. Cancela (Relógio D’Água).

Mário Cláudio já tinha sido premiado, há 30 anos, com o livro Amadeo. Junta-se assim a  Vergílio Ferreira, António Lobo Antunes, Agustina Bessa-Luís e Maria  Gabriela Llansol, únicos autores que entretanto bisaram.

Foram admitidos 86 livros a concurso, de 64 homens (1 com 2 romances) e 21 mulheres, com a chancela de 35 editoras.  Na 2.ª reunião,  o júri já destacara 5 finalistas.

Desde que foi instuído em 1982, o prémio já foi atribuído a 28 autores (15 homens e 13 mulheres), de 18 editoras. O seu valor é de 15 mil euros.

O Grande Prémio de Romance e Novela APE/DGLAB, teve, nesta 33.ª edição, o patrocínio da Direcção-Geral do Livro, dos Arquivos e das Bibliotecas, Fundação Calouste Gulbenkian, Imprensa Nacional-Casa da Moeda, Instituto Camões e Sociedade Portuguesa de Autores. (***).

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Notas do editor

(*)  Mário Cláudio > Biografia >

(...) Mário Cláudio é o pseudónimo literário de Rui Manuel Pinto Barbot Costa, nascido a 6 de Novembro de 1941, no seio de uma família da média-alta burguesia industrial portuense de raízes irlandesas, castelhanas e francesas, e fortemente ligada à História da cidade nos últimos três séculos. Filho único, foi primeiro instruído por um professor particular, tendo prosseguido os estudos, até à conclusão do liceu, sob a rígida batuta dos padres do Colégio Almeida Garrett (actual Teatro do Bolhão, no Porto). 

Começou o curso de Direito em Lisboa e terminou-o em Coimbra (1966), onde viria a diplomar-se novamente, em 1973, com o Curso de Bibliotecário-Arquivista. Pelo meio, a Guerra Colonial e uma mobilização para a Guiné, na secção de Justiça do Quartel General de Bissau. Antes de partir, em 1968, entrega ao pai, pronto para publicação, o seu primeiro livro de poemas, Ciclo de Cypris, publicado no ano seguinte.

Pouco depois de assumir a direcção da Biblioteca Pública Municipal de Vila Nova de Gaia, foi bolseiro da Fundação Gulbenkian, tendo obtido o título de Master of Arts em Biblioteconomia e Ciências Documentais (1976), pela Universidade de Londres, defendendo uma tese que seria parcialmente publicada com o título Para o Estudo do Analfabetismo e da Relutância à Leitura em Portugal, o único livro que assinou com o seu nome civil. 

Ainda durante a década de 70 publica dois livros de poesia, um romance, uma novela, um livro de viagens em colaboração e uma antologia de textos sobre Gaia. Pertenceu sucessivamente à Delegação Norte da Secretaria de Estado da Cultura, ao inacabado Museu da Literatura e à direcção da Associação de Jornalistas e Homens de Letras do Porto. Em 1985, iniciou-se como professor na Escola Superior de Jornalismo do Porto e, actualmente, é professor convidado da Universidade Católica do Porto e da Fundação de Serralves.

Em 1984, por convite de Vasco Graça Moura, escreve Amadeo, biografia do pintor futurista Amadeo de Souza-Cardoso – ou «psico-socio-biografia», nas palavras do autor – e início da premiada Trilogia da Mão, na qual o escritor abordou a vida e obra de outras duas figuras artísticas nortenhas, a violoncelista Guilhermina Suggia (Guilhermina) e a barrista Rosa Ramalha (Rosa). Através dos três artistas, tipificou distintos estratos sociais (aristocracia, burguesia, povo) e o «imaginário nacional», entre o virar do século XIX e meados do século XX. Nesta primeira trilogia, o autor romanceia o próprio processo de biografar, através de uma escrita fragmentada, mais sensorial que objectiva. 

Seguiu-se a publicação de um segundo tríptico (A Quinta das Virtudes, Tocata para Dois Clarins e O Pórtico da Glória), onde a História volta a cruzar a ficção, mas desta feita incorrendo na autobiografia familiar. Entre 2000 e 2004 publicou uma outra trilogia, composta por Ursamaior, Oríon e Gémeos, e que é descrita pelo autor como relacionada com «situações de alguma marginalidade» e «discurso problemático com o poder», transversais a três gerações de personagens, uma por volume.

A História, a Cultura, a Pátria, a Identidade Nacional e Pessoal são o coração das aturadas pesquisas do escritor Mário Cláudio, resultando em obras que dificilmente podem ser rotuladas de «romances históricos», correspondendo antes à preocupação de revisitar, ou mesmo rever, episódios marcantes da cultura portuguesa, e onde os factos reais são inspiração e ponto de partida para imaginativas demonstrações. Melhor dizendo, para usar palavras do autor: «toda a biografia é um romance».

O autor está traduzido em inglês, francês, castelhano, italiano, húngaro, checo e serbo-croata. Foi condecorado com a Ordem de Santiago de Espada e, em 2004, recebeu o Prémio Pessoa.
Centro de Documentação de Autores Portugueses
02/2005

(Excerto, reproduzido com a devida vénia do sítio DGLAB - Direção Geral do Livro, dos Arquivos e das Bibliotecas)

Para saber mais sobre Mário Cláudio e a sua já vastíssima obra, clicar aqui em Bookoffice. Vd. também, uma entrevista recente dada ao Público. 27/3/2015.

(**) Sinopse da obra (144 pp.)

Retrato de Rapaz - CLÁUDIO, MÁRIO
Um discípulo no estúdio de Leonardo da Vinci

Um discípulo no estúdio de Leonardo da Vinci.

Farto do descaminho de Giacomo, o pai vem deixá-lo ao estúdio de banho tomado, mas ainda com andrajos e piolhos, para que o artista que exuma cadáveres e constrói máquinas voadoras o endireite e faça dele seu criado. A beleza do rapaz impressiona, porém, Leonardo, que logo pensa nele para um anjo, concluindo porém que lhe assentam melhor corninhos de diabrete, e assim o rebaptizando como Salai. Serão, de resto, os pecadilhos do rapaz que o farão cair nas boas graças do amo e o elevarão à categoria de aprendiz sem engenho mas com descaramento para emitir opiniões, borrar a pintura, traficar pigmentos e até surripiar desenhos. E, num jogo de pequenas traições mútuas, vai-se criando entre Salai e o pintor uma cumplicidade que os aproximará como se fossem pai e filho. Mas eis que irrompem na vida de ambos Três Graças viciosas que semeiam a discórdia e o ciúme, ameaçando fazer esmorecer a estrela que os reuniu…

Retrato de Rapaz é uma novela fulgurante sobre a relação entre mestre e discípulo, nem sempre isenta de drama e decepção, e sobre a criatividade de um artista genial em tudo, mesmo na gestão dos seus afectos. Com a presente obra, Mário Cláudio compôs, com a arte e a mestria a que nos habituou, um retrato belíssimo que pode ser apreciado como uma pintura.

Fonte: Cortesia de Leyaonline

quarta-feira, 22 de julho de 2015

Guiné 63/74 - P14919: Inquérito online: Resultados preliminares (n=115) a dois dias de encerrar a votação: menos de metade da malta (47,8%) utilizou os CTT para telefonar para a casa (leia-se: metrópole). Mesmo assim, parece que era mais fácil em Bissau, capital do território, do que no mato...

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Guiné > Região de Tombali > Catió > CCS / BART 1913 (1967/69) > Álbum fotográfico do Victor Condeço > Quartel > Foto 32 >

"Cerimónia militar em fevereiro de 1968, por ocasião da imposição à CART 1689 da Flâmula de Honra (ouro) do CTIG, atribuída em julho de 1967. Edifício do comando. Presença de militares, civis da administração, correios e comerciantes locais."


Da esquerda para a direita, e segundo indicação do fotógrafo:

 (1) de costas, o cap médico Morais que está a falar com um outro um militar, de camuflado, não  identificao;

(2) o comandante do BART 1913, ten cor Abílio Santiago Cardoso; 

 (3) quatro funcionários dos Correios e Administração; 

(4) o comerciantes sr. José Saad [, libanês,] e filha (pequena); (4) o comerciante, sr. Mota: 

(5) o comerciante Sr. Dantas  de fato escuro, e a filha; 

(6) o comerciante sr. Barros; 

(7) o electricista civil Jerónimo: 

(J) e, por fim, o alf graduado capelão Horácio [Neto Fernandes].



Guiné > Região de Tombali > Catió > CCS / BART 1913 (1967/69) > Álbum fotográfico do Victor Condeço > Quartel > Foto 32 A > Pormenor; quatro funcionários dos correios (à esquerda), seguidos de quatro comerciantes; o libanês José Saad (e filha), o  Mota, o  Dantas (e filha) e  o Barros.


Guiné > Região de Tombali > Catió > CCS / BART 1913 (1967/69) > Álbum fotográfico do Victor Condeço > Vila > Foto 16 > "Uma vista tirada da Rotunda, onde se vê uma DO-27 sobrevoando a zona do quartel, à direita a zona da antiga messe de oficiais e a antena dos Correios à esquerda."



Guiné > Região de Tombali > Catió > CCS / BART 1913 (1967/69) > Álbum fotográfico do Victor Condeço > Vila > Foto 17 > "Foto tirada da torre da Igreja no sentido do Quartel, vendo-se o depósito de água deste, a torre dos Correios, em baixo a rua das Palmeiras."

Fotos (e legendas) de Catió: Victor Condeço (1943/2010) / © Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2007). Todos os direitos reservados




I. Resultados preliminares da sondagem desta semana (que termina 6ª feira, dia 24,  às 14h45). Até às 19h00 de hoje tinham votado 115. 

(i) menos de metade da malta (47,8%) utilizou os CTT para telefonar para a casa (leia-se: metrópole);

(ii) mesmo assim, parece que era mais fácil conseguir uma ligação telefónica em Bissau, capital do território, do que no mato, nalgumas (poucas) povoações mais importantes, sedes de concelho  e postos administrativos,  onde havia estações dos CTT:

(iii) as ligações para a metrópole, a partir das estações dos CTT,  tinham dia e hora marcada (,mesmo em Bissau);

(iv) já ninguém se lembra do tarifário: quanto custava uma chamada (, julgo que via Marconi,) para a metrópole, por minuto ? 

(v) e, já agora que falamos de CTT... qual era a via normal para o envio e receção das encomendas postais ("slides", livros, jornais e revistas, fumeiro, bacalhau. etc.) ? Era o SPM (servço postal militar) ou os CTT ?...

(vi) e as grandes antenas de telecomunicações que viamos nalgumas destas povoações (por ex., Bambadinca, Catió)... eram civis ou militares ? quem as montou ? e quando ? quem as explorava ? quem fazia a sua mautenção ?

Se alguém souber e quiser falar sobre os serviços prestados pelos CTT na Guiné, tem o blogue à sua disposição... 

SONDAGEM: "NA GUINÉ, DURANTE A COMISSÃO, UTILIZEI OS CTT PARA TELEFONAR PARA CASA"

1. Sim, em Bissau > 30 (26,1%)

2. Sim, fora de Bissau > 15 (13,0%)

3. Sim, em Bissau e fora de Bissau > 10 (8,7%)

4. Não, nunca utilizei >  59 (51,3%)

5. Já não me lembro > 1 (0,9%)

Mude o seu voto
Votos apurados: 115 
Dias que restam para votar: 2 

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Nota do editor:

Vd. poste de 29 de julho de 2015 > Guiné 63/73 - P14901: Sondagem: Mais de 54% do pessoal nunca telefonou para a metrópole, durante a comissão, usando os CTT... Resultados preliminares (n=81), quando faltam 4 dias para "encerrar as urnas"...

Guiné 63/74 - P14918: Álbum fotográfico de Carlos Alberto Cruz , ex-fur mil, CCAÇ 617 / BCAÇ 619 (Catió e Cachil, 1964/66)



Foto nº 1 > Lisboa, 8/1/1964, a ponte sobre o Rio Tejo, em construção: imagem do pilar norte, tirada do T/T Quanza. Uma foto notável com esta obra, emblemátca do Estado Novo, cuja construção demorou 3 anos e meio (novembro de 1962 a agosto de 1966). No regresso, o BCAÇ 619 já passou sob o tabuleiro da ponte...



Foto nº 2 > Lisboa, 9/1/1964 > O N/M Quanza, no cais da Rocha Conde de Óbidos


 Foto nº 3 >  Lisboa, 8/1/1974 > O Carlos Criz no dia da partida, no cais da Rocha Conde de Óbidos (... e não de Alcântara)... Era daqui que partiam os navios da nossa marinha mercante para as "ilhas adjacentes" e as "províncias ultramarinas"... O cais de Alcântara estava reservado às carreiras internacionais...


Fotop nº 4 > Guiné > Região de Tombali > Catió > c. 1964/66 > Aspeto geral da vila, que foi sede do BCAÇ 619 (1964/66)


Fotop nº 4 A > Guiné > Região de Tombali > Catió > c. 1964/66 > Em prijmeiro plano, instalações ocupadaas pelo  BCAÇ 619 (1964/66) (1): em segundo plano, a igreja de Catió



Fotop nº 4 B > Guiné > Região de Tombali > Catió > c. 1964/66 > Em prijmeiro plano, instalações ocupadas pelo BCAÇ 619 (1964/66) (2)



Fotos do álbum do nosso camarada Carlos Alberto [Rodrigues]   Cruz, ex-fur mil, CCAÇ 617/BCAÇ 619, Catió e Cachil, 1964/66), membro da nossa Tabnca Grande desde 20/1/2014 e frquentador da Magnífica Tabnaca da Linha.

Sobre Catió (vila, quartel, porto interior e porto exterior, e ainda Ganjola), vd. o valiosíssimo e vasto  álbum fotográfico do Victor Condeço (1943-2010) que foi fur mil mec armamento da CCS/BART 1913 (Catió, 1967/69). Pesquisar em Google Imagens = Catió + "Victor Condeço".


Fotos (e legendas): © Carlos Alberto Cruz (2014). Todos os direitos reservados.[Edição e legendagem complementar: LG]


1. A CCAÇ 617 comemorou o ano passado o 50º aniversário da sua partida para  Guiné: foi a 8/1/1964, a bordo do T/T Quanza. Estas fotos que publicamos,  com a devida autorização do autor, foram "postadas" no blogue CCAÇ  617 - Guiné, com data de 3 de janeiro de 2014, e também já pubicadas, algumas, no nosso blogue, as da partida de Lisboa. 

Além da CCAÇ 617, embarcaram também no T/T Quanza  as restantes subunidades que pertencaim ao BCAÇ 619; as CCAÇ 616, 618 e 619

Recorde-se, resumidamente, o historial do BCAÇ 619 (Catió, 1964/66)

Carlos Alberto Cruz: Lisboa, Cais da Rocha
Conde de Óbidos, 8/1/1964

(i) Mobilizado pelo Regimento de Infantaria nº 1, Amadora;

(ii) sob o comando do Tenente-coronel de Infantaria Narsélio Fernandes Matias; 2º Comandante o Major de Infantaria Manuel de Jesus Correia; e como Oficial de Informações e Operações/adjunto o Capitão de Infantaria Rogério Jorge Vale de Andrade; comandante da Companhia de Comando e Serviços (CCS)  era o Capitã SGE José Francisco Galaricha;

(iii) dvisa: “Sentinela do Sul”;

(iv) embarca em Lisboa no dia 8 e desembarca em Bissau a 15 de Janeiro de 1964;

(v) em 17 de janeiro de 1964 assume a responsabilidade do Sector F, substituindo o Batalhão de Caçadores nº 356;

(vi) tem a sede em Catió e os subsetores de Catió, Empada, Bedanda e Cabedú;

(vii) integrou a  Operação Tridente (Ilha do Como, de 5 de Janeiro a 24 de Março de 1964);

(viii) passou a integrar na sua zona de acção o subsetor de Cachil;

(ix) entre as operações que coordenou destacam-se as operações “Broca”, “Campo”, “Razia” e “Satan”, tendo apreendido 1 metralhadora pesada, 4 ligeiras, cerca de meia centena de espingardas e   pistolas metralhadoras, 30 minas e 59 granadas de armas pesadas;

(x) no  dia 11 janeiro 1965 o setor passa a ser designado por Setor S 3 e em 17 de janeiro de 1965 passa a incluir o subsetor de Cufar, então criado na sua zona;

(xi) com as populações dispersas, a 17 de março de 1965 iniciou a experiência de reagrupamento de populações, sendo criada a tabanca de Ualala, para o efeito;

(xii) é rendido em 21 de janeiro de 1966, pelo BCAÇ 1858, seguindo para Bissau w ficando a aguardar embarque.


Guiné 63/74 - P14917: Nas férias do verão de 2015, mandem-nos um bate-estradas (11): Tatuagem de António Baraçal, alfacinha, que passou pelo CTIG entre janeiro e outubro de 1974, integrado numa companhia de comandos... É frequentador da Praia da Areia Branca.


Foto nº 1


Foto nº 2

Lourinhã > Praia da Areia Branca > 6 de julho de 2015 > Braço tatuado de um veraneante que foi nosso camarada no TO da Guiné > Costuma passar férias na Praia da Areia Branca, já o encontrei pelo menos três vezes. Chama-se António Baraçal, "Tony", é lisboeta de gema, e trabalha ou trabalhou na EPAL.

Diz que pertenceu a uma companhia de comandos, comandada por um tal capitão Branco (se bem percebi, já que a nossa conversa foi à beira-mar, com ruído ambiente)... Ora não existe nenhum capitão comando com este apelido, de acordo com a página da associação de comandos que consultei; a última a chegar ao TO da Guiné foi a CCmds 4041/73, chegou a 16/5/1974 e regressou menos de dois meses depois, a 4/7/1974; esteve em Teixeira Pinto, era comandada  pelo alf mil cmd Albano Manuel Monteiro de Albuquerque e foi render a 38ª CCmds (1972/74).

 Não lhe ocorreu o nº da companhia, Esteve no TO da Guiné entre janeiro e outubro de 1974.  "Fui lá fechar a guerra". Para lá foi nos TAM; para cá veio no T/T Uíge. De janeiro a março de 1974 não houve embarque de tropas para a Guiné. É possível então que o António Baraçal fosse de rendição individual e tivesse ido parar à CCS de algum batalhão,. e que essa companhia de comando e serviços fosse comandada pelo tal capitão Branco... Enfim, problemas da comunicação humana... Se voltar a encontrá-lo na Praia da Areia Branca, tento esclarecer este ponto.

De qualquer modo, registe-se aqui os batalhões, 3 de 1973 e 2 de 1974,  com as últimas tropas que saíram da Guiné, em 14/10/1974:

BART 6521/74 (Ingoré, Bissau)
BCAÇ 4612/74 (Mansoa, Brá)
BCAÇ 4510/73 (Catió)
BCAV 8320/73 (Bissorã, Bissau)
BCAÇ 4610/73 (Bissau, Piche, Bula, Bissau)

O Tony disse-me que estas tatuagens eram feitas a 4 agulhas... Não tive tempo para perceber a técnica (que não era muito apurada, a avaliar pelo traço grosso) e fazer-lhe mais perguntas... Embora simples, o padrão icónico é diferente de alguns que tenho visto: uma morança e um coqueiro erguidos numa ilhota (vd. foto nº 1)... Por baixo tem os dizeres: "Guiné-74  Tony".  Estamos a falar do braço direito. No braço esquerdo, há apenas uma  vulgaríssima tatuagem com os dizeres "Amor de pais" (foto nº 2)... Sobre tatuagens, temos apenas duas ou referências no blogue.

Mostrou-se agradavelmente surpreendido e colaborante quando lhe pedi autorização para tirar uma "chapa" e pôr no blogue... (LG)

Foto (e legenda): © Luís  Graça (2015). Todos os direitos reservados
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Nota do editor:

Último poste da série > 20 de julho de 2015 > Guiné 63/74 - P14905: Nas férias do verão de 2015, mandem-nos um bate-estradas (10): Não, nunca percebi para que serviam os CTT no CTIG... Notícias de Alhandra, da minha família, por ocasião da tragédia, as grandes inundações, de 25 para 26 de novembro de 1967, que atingiram a Grande Lisboa, recebi-as através de telegrama militar... (Mário Gaspar, ex-fur mil at art, MA, CART 1659, Gadamael e Ganturé, 1967/68)


Guiné 63/74 - P14916: Memória dos lugares (309): O meu rio próximo, e de estimação, era o Rio Grande de Buba (2) (António Murta)

1. Lembremos a mensagem do nosso camarada António Murta, ex-Alf Mil Inf.ª Minas e Armadilhas da 2.ª CCAÇ/BCAÇ 4513 (Aldeia Formosa, Nhala e Buba, 1973/74), com data de 1 de Julho de 2015:

Camaradas Luís Graça e Carlos Vinhal
Sobre a temática dos rios, de tantos encantamentos e infortúnios, comuns a quase todos nós, não sou muito versado, pois só um conheci pela proximidade e, ainda assim, sem grandes intimidades, tendo espreitado outro apenas duas vezes. Contudo, pelas experiências que me proporcionaram, não queria deixar de os referir.

António Murta


RIO GRANDE DE BUBA E RIO CORUBAL (2)

RIO GRANDE DE BUBA* (2)


 Rio de Buba em Buba, 1974 – O meu Grupo depois do banho.

 Rio Buba em Buba, 1974 – Maré baixa. 

 Rio Buba em Buba, 1974 – Maré a encher.

Rio Buba em Buba,1974 – Eu, no leito do rio junto à ponte-cais.

Rio Buba em Buba, 1974 – Eu, no leito do rio noutra ocasião.

Rio Buba em Buba, 1974 – O meu amigo Manuel de Nhala saltar para a água num dia de recreio.



Rio Buba em Buba, 1974 – Saltos para a água. 

Rio Buba em Buba, 1974 – Ponte-cais e três rapazes de quem já não recordo os nomes porque não eram da minha Companhia: o do meio, com quico, era furriel; o da direita era alferes e tenho um palpite para o seu nome mas não arrisco. Aceito sugestões.

(Continua)

Fotos: © António Murta
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Notas do editor

(*) Vd. poste de 20 de julho de 2015 > Guiné 63/74 - P14903: Memória dos lugares (305): O meu rio próximo, e de estimação, era o Rio Grande de Buba (1) (António Murta)

Último poste da série de 21 de julho de 2015 > Guiné 63/74 - P14909: Memória dos lugares (306): Rios ? Subi o Geba até Bambadinca, naveguei no Bichaque e no Cumbijã, fui atacado no Cacheu, andei no Cacine e no Sapo... (António Dâmaso, srgt PQ, BCP 12, BA 12, Bissalanca, 1972/74)... O rio da minha tabanca, o Olossato (Paulo Salgado,ex-alf mil cav, CCAV 2721, Olossato e Nhacra, 1970/72)

Guiné 63/74 - P14915: Os nossos seres, saberes e lazeres (107): Tomar à la minuta (9) (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70) com data de 23 de Junho de 2015:

Queridos amigos,
Já deu para perceber que as belezas de Tomar excedem a iconografia e o esplendor do Convento de Cristo, a Janela do Capítulo e a Charola.
A cidade templária guardou outras formosuras que se disseminam pelas margens do Nabão, andamos no seu encalço. Hoje visitamos a Mata dos Sete Montes, um oásis em que uma cerca conventual se converteu numa mata de recreio.
Houve que parar, em dia de canícula, no majestoso café Paraíso, um expoente da Arte Deco e depois visitar o lugar onde nasceu Fernando Lopes Graça, nome cimeiro da música clássica em diferentes variantes.

Um abraço do
Mário


Tomar à la minuta (9)

Beja Santos

Da Mata dos Sete Montes à Casa de Lopes Graça


Em nome da verdade, fique entendido que esta imagem não é minha, extraí-a de uma brochura editada pelo Município de Tomar e pelo Instituto da Conservação da Natureza e Biodiversidade, pois tornava-se necessário pôr em ecrã gigante onde fica a mata, adossada à muralha do castelo, temos aqui o mais rico pulmão da urbe nabantina. Reza a brochura que foi no reinado de D. João III que surgiu a Cerca Conventual, influenciada pelo espírito da Contra-Reforma, que teve consequências no conjunto monástico, criaram-se novos claustros e este vasto domínio rural. Do Aqueduto dos Pegões já falamos, vamos agora ao espaço verde.


Tudo começou por uma exploração agrícola, água não faltava, por ali corre o ribeiro do Vale da Riba Fria, construíram-se tanques, muito provavelmente por aqui se passeavam os frades em comunhão com a natureza. Desta apoteose da engenharia hidráulica, gostaria de vos mostrar duas peças por ora mal tratadas, o tanque pequeno e a Charolinha.


É uma obra típica do Renascimento. Era abastecido pelo tanque grande através de uma caleira a céu aberto, tinha a função de armazenar água para regar as hortas do vale. O que é hoje jardim eram hortas, depois deu-se o flanqueamento pelo olival e pela esplendorosa mata.



A Charolinha é este pequeno templo circular rodeado por um tanque, dói ver este mau estado, o viandante subiu até aqui em dia de alta temperatura, agora refresca-se. Sente-se como no Buçaco ou em Monserrate, é tudo frondoso, há um vozear miúdo que se estende do parque das merendas até à entrada, onde se anicham vários autocarros que aguardam que os seniores que vieram de longe recolham farnéis.


O espaço ajardinado engalanou-se, chegou a Festa dos Tabuleiros, é preciso que a Pomba do Espírito Santo tremule ao vento, o calor abrasa, sigo para a mata que pertenceu ao senhor Marquês de Tomar, António Costa Cabral, comprador de parte dos bens da Ordem de Cristo, com a extinção das ordens religiosas, em 1834. O Marquês esmerou-se, teve enlevo pelo terreno, mandou fazer infraestruturas, aprimorou a vocação agrícola da quinta. Em 1936, a Cerca foi comprada pelo Estado por 560 mil escudos. Em 1938, a Mata dos Sete Montes foi transformada em parque florestal e jardim municipal.


Encontrei canteiros de buxo recentemente cortado, que odor! ajuntar-se aos pinheiros destilando resina, passa-se por fileiras de ulmeiros, freixos, cedros e ciprestes, bem organizados em patamares superiores. Aqui vemos a mata a densar-se, quem zela pela mata deve ter orgulho nesta paleta aberta de arvoredo tão diverso, plantaram-se ciprestes, pinheiros mansos e bravos, loureiros, pistácias, pilriteiros e carrascos.


Subia para a Charolinha quando dei com este banco, fiquei enternecido pela integração dos elementos, a mata é exuberante, alguém pensou a sério no que deve estar numa mata de recreio e nas diferentes encostas e qual a lógica da exposição solar.


Com o tempo, hei de rodar-me a passear na mata e a apreender imagens do Convento ao fundo, hoje não foi mais longe de que este assomo, lá ao fundo, o calor é brutal, parece que aqui do alto tenho a mata por minha conta, caminho lentamente para evitar um tombo, as raízes parecem querer tomar conta dos percursos pedestres. Andei pelo Caminho da Charolinha, passei lesto pelo Caminho da Cadeira D’El Rei. Como a viagem nunca acaba, é suficiente que o viajante venha animado para captar boas imagens da cerca do castelo.


Aqui estão as razões para me precatar de dar um espalhanço de arranjar umas fraturas. Mas também não há senão que não tenha a sua beldade, a obrigação de saber onde se põem os pés dá tempo a olhar dentro deste vale húmido, fértil e exuberante, entalado entre colinas, a mata é hoje património nacional.


O Infante vigia à entrada da mata, olha para lá das brumas da memória. Aconteceu que este sénior aguarda a partida do autocarro, encostou-se ao Infante, parece imitá-lo, como se dissesse: despachem-se lá, temos que partir para o nosso Bojador…


Tenho a língua encortiçada, meti-me pelas sombras do centro histórico e vim, afogueado, até à mansidão deste café que tem um nome ajustado, Paraíso. Um café cheio de história, podia ter estado aqui sentado Winston Churchill, a receber-nos de havano na boca e a fazer o V da vitória. Dessedentado, miro esta graciosidade Arte Deco, naquele nicho ter-se-ão vendido cigarros, cigarrilhas e charutos, publicações de toda a espécie, ainda bem que ninguém se atreveu a remover este ícone do passado, aqui se entrava para ler o jornal, cavaquear e formar tertúlia.


Candeeiros da época, relógio da época, a fotografia que se segue é um pormenor do café, não é muito feliz, há muito brilho nos espelhos, o fundo fica um glauco um tanto enlanguescido, prometo voltar e encontrar soluções que ultrapassem este amadorismo e estas soluções de sapateiro remendão.


É só para verem o design, aqui respira-se contemporaneidade, é lindo chão marmoreado, lindas são as colunas e a combinação das cores com o predomínio do castanho são uma quintessência da harmonia. Venham aqui tomar café, chocolate ou matar a sede e digam-me se não tenho razão.






Estamos agora na rua Dr. Joaquim Jacinto, aqui nasceu Lopes Graça, chama-se Casa Memória. Deambula-se e é quase impossível acreditar que houve uma casa de primeiro andar com cerca de 50 metros, em que uns tabiques separavam dois quartos interiores de uma pequena sala, havia uma improvisada cozinha que dava para as traseiras e o rés-do-chão era uma loja com um pequeno poço. Mostra-se o piano e a mesa de trabalho do compositor, fotografou-se uma caricatura e a fachada. Não sei qual foi o maior compositor do século XX, mas estou plenamente convicto que Lopes Graça, para além de prolífico, terá sido o mais versátil, pela riqueza que nos legou da música regional portuguesa, tocou em muitas teclas: música coral sinfónica, música teatral, música orquestral, música cora, música vocal, música de câmara e de piano. Estive com ele em dois momentos: um, na Mandíbula d’Aço, a última tertúlia do Chiado, que reunia no escritório do compositor Felipe de Sousa, Lopes Graça digeriu um cozido à portuguesa com uma garrafa de uísque à frente; a outra, quando fomos prestar homenagem a um amigo comum, José Gomes Ferreira, estivemos ali largo tempo de olhos postos no chão, curvados respeitosamente perante um grande poeta português.

(Continua)
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Nota do editor

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