1. Mensagem do nosso camarada Mário Gaspar, ex-Fur Mil At Art, Minas e Armadilhas da CART 1659, "Os Zorbas" (Gadamael e Ganturé, 1967/68), com data de 12 de Dezembro de 2021, trazendo em anexo o Boletim "O Olhar do Mocho", de que reproduzimos as seis páginas dedicadas ao Natal:
Caros Camaradas
Luís, Carlos e todos os Homens Grandes da Tabanca Grande.
Envio, em Anexo o Boletim 073 de “Olhar do Mocho” – Órgão Informativo e Cultural da Associação Cultural e Social dos Seniores de Lisboa (Academia de Seniores de Lisboa).
Fui fundador deste Boletim em 2005 e seu primeiro Director.
Este número foi dedicado ao Natal.
Desejo para o Blogue “Luís Graça & Camaradas da Guiné”, e Todos os Seus Aderentes:
UM FELIZ NATAL E UM PRÓSPERO ANO DE 2020, COM SAÚDE E ALEGRIA.
Abraço
Mário Vitorino Gaspar
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Nota do editor
Último poste da série de 20 DE DEZEMBRO DE 2021 > Guiné 61/74 - P22825: O meu sapatinho de Natal (14): Votos de boas festas para todos os "residentes" da Tabanca Grande... E uma prendinha: a notícia da última viagem do N/M Niassa, em 8/5/1979, a caminho do sucateiro de Bilbao, Espanha... (Carlos Arnaut, ex-alf mil, 16º Pel Art, Binar, Cabuca, Dara, 1970/72)
Blogue coletivo, criado por Luís Graça. Objetivo: ajudar os antigos combatentes a reconstituir o "puzzle" da memória da guerra colonial/guerra do ultramar (e da Guiné, em particular). Iniciado em 2004, é a maior rede social na Net, em português, centrada na experiência pessoal de uma guerra. Como camaradas que são, tratam-se por tu, e gostam de dizer: "O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande". Coeditores: C. Vinhal, E. Magalhães Ribeiro, V. Briote, J. Araújo.
segunda-feira, 20 de dezembro de 2021
Guiné 61/74 - P22825: O meu sapatinho de Natal (14): Votos de boas festas para todos os "residentes" da Tabanca Grande... E uma prendinha: a notícia da última viagem do N/M Niassa, em 8/5/1979, a caminho do sucateiro de Bilbao, Espanha... (Carlos Arnaut, ex-alf mil, 16º Pel Art, Binar, Cabuca, Dara, 1970/72)
Recorte do "DN - Diário de Notícias", 10 de maio de 1979.
Cortesia de Carlos Arnaut (2021)
1. Noticiava o matutino lisboeta, em 10 de maio de 1979, que o nosso conhecido N/M Niassa partia para a sua última viagem, a caminho da sucata, em Bilbau, Espanha... O seu "cadáver" ainda valeu mais de 25 mil contos (c. 1.612.500 euros, a preços atuais).
Pertencia à Companhia Nacional de Navegação. A notícia "necrológica" (, os navios também se abatem como os cavalos e os seres humanos,) acrescentava:
"Com alojamento para 322 passageiros, o paquete efectou durante longos anos, as carreiras regulares entre Lisboa e as colónias de África, tendo servido como transporte de tropas e, durante alguns meses, foi o elo de ligação entre o Continente e a Madeira [em 1978 ]. Pela tarde [do dia 8 de maio de 1979] a sirene do "Niassa" anunciava a saída para a última viagem".
Foi mandado construir em Antuérpia, Bélgica, em 1952, no âmbito da modernização da nossa frota da marinha mercante. Custo: 135.000.000$00 (equivalente, a preços atuais, a cerca de 66,4 milhões de euros, de acordo com a aplicaçãodo INE, Atualização de Valores com base no IPC - Índice de Preços ao Consumidor).
Pertencia à Companhia Nacional de Navegação. A notícia "necrológica" (, os navios também se abatem como os cavalos e os seres humanos,) acrescentava:
"Com alojamento para 322 passageiros, o paquete efectou durante longos anos, as carreiras regulares entre Lisboa e as colónias de África, tendo servido como transporte de tropas e, durante alguns meses, foi o elo de ligação entre o Continente e a Madeira [em 1978 ]. Pela tarde [do dia 8 de maio de 1979] a sirene do "Niassa" anunciava a saída para a última viagem".
Foi mandado construir em Antuérpia, Bélgica, em 1952, no âmbito da modernização da nossa frota da marinha mercante. Custo: 135.000.000$00 (equivalente, a preços atuais, a cerca de 66,4 milhões de euros, de acordo com a aplicaçãodo INE, Atualização de Valores com base no IPC - Índice de Preços ao Consumidor).
Foi lançado ao mar em 1955 e logo a seguir fez a sua viagem inaugural à África Orienatl. Foi fretado, inúmeras vezes, ao Ministério do Exército para transporte de tropas e material de guerra, nomeadamente a partir 1959.
2. Mensagem de Carlos Arnaut (ex-alf mil, 16º Pel Art, Binar, Cabuca, Dara, 1970/72, tem cerca de uma dezena de referências no nosso blogue; entrou para a Tabanca Grande em 12/9/2020) (*):
Data - sexta, 17/12/2021, 00:53
Assunto - Niassa
Olá Luís,
Como tenho lido diversas citações ao paquete "Niassa" nos posts da rapaziada que nele viajou, junto envio notícia do seu falecimento em Maio de 79.
Se entenderes que vale a pena recordar a notícia, aqui segue a foto.
P.S. - Não mereci parabéns no dia 22 de Setembro, quase chorei ...
Obrigado, Carlos, estes pequenos recortes de jornal são preciosos para alimentar as nossas memórias vividas ou construídas... Sim, o N/M Niassa, que foi um dos principais transportes de tropa no nosso tempo, tem mais de uma meia centena de referências no nosso blogue...
Ultimamente temos estado a "exigir" a prova de vida... A tua está feita. Espero que o 2022 nos corra a todos melhor do que o 2021.
2. Mensagem de Carlos Arnaut (ex-alf mil, 16º Pel Art, Binar, Cabuca, Dara, 1970/72, tem cerca de uma dezena de referências no nosso blogue; entrou para a Tabanca Grande em 12/9/2020) (*):
Data - sexta, 17/12/2021, 00:53
Assunto - Niassa
Olá Luís,
Como tenho lido diversas citações ao paquete "Niassa" nos posts da rapaziada que nele viajou, junto envio notícia do seu falecimento em Maio de 79.
Se entenderes que vale a pena recordar a notícia, aqui segue a foto.
Aproveito a oportunidade para desejar a todos os residentes da nossa Tabanca Grande um Feliz Natal, fazendo votos para que 2022 seja diferente para melhor do que este 2021 cheio de "bichos". (**)
Grande abraço, Carlos Arnaut
P.S. - Não mereci parabéns no dia 22 de Setembro, quase chorei ...
3. Comentário do editor LG:
Afinal os navios também se abatem, como os cavalos e os homens...
Fizemos um poste para a série "O meu sapinho de Natal" (**), não apenas com esta tua "prendinha", mas também inserindo a tua mensagem de boas festas, sem omitir o teu reparo por não termos sinalizado o teu aniversário, a 22 de setembro último.
Carlos, fui verificar, e tu o ano passado tiveste, de facto, direito ao teu "cartanito" de parabéns... Enfim, foste tratado como devias e queirias, mas nem todos os camaradas nos dão a data de nascimento para este efeito. Este ano houve, de facto,um lapso. Já te pedi desculpa. Vou pedir ao Carlos Vinhal para corrigir a "anomalia"...
Ultimamente temos estado a "exigir" a prova de vida... A tua está feita. Espero que o 2022 nos corra a todos melhor do que o 2021.
Um abraço fraterno, Luis
Notas do editor:
(*) V.d poste de 12 de setembro de 2020 > Guiné 61/74 - P21351: Tabanca Grande (502): Carlos Arnaut, ex-alf mil art, 16º Pel Art (Binar, Cabuca, Dara, 1970/72): senta-se, no lugar nº 817, à sombra do nosso poilão
(**) Último poste da série >17 de dezembro de 2021 > Guiné 61/74 - P22817: O meu sapatinho de Natal (13): Votos de Boas Festas dos camaradas: Abel Santos, Ernestino Caniço, Sousa de Castro e José Firmino
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(*) V.d poste de 12 de setembro de 2020 > Guiné 61/74 - P21351: Tabanca Grande (502): Carlos Arnaut, ex-alf mil art, 16º Pel Art (Binar, Cabuca, Dara, 1970/72): senta-se, no lugar nº 817, à sombra do nosso poilão
Guiné 61/74 - P22824: Paz & Guerra: memórias de um Tigre do Cumbijã (Joaquim Costa, ex-Furriel mil arm pes inf, CCAV 8351, 1972/74) - Parte XXI: A "marcha louca" na véspera do Natal de 1973
Foto nº 1
Foto nº 1 > Guiné > Região de Tombali > Cumbijã > CCAV 8351 (1972/74 > c. Natal de 1973 Algures entre Cumbijã e Nhacobá > Base de lançamento das granadas de canhão sem recuo do IN contra o Cumbijã... São bem visíveis duas valas cavadas feitas à medida do apontador e do municidor do canhão s/r (Foto nº 1A) > Foto: Cortesia de Carlos Machado
Foto nº 2 > Guiné > Região de Tombali > Cumbijã > CCAV 8351 (1972/74 > c. Natal de 1973 > Pelotão da “Marcha Louco” > Marchar, marchar… até encontrar o covil do IN e seu amigos Cubanos... 2º pelotão sendo eu o primeiro de pé à esquerda (Foto nº 2A) e o líder “louco” da marcha, alferes Afonso, o primeiro de pé à direita (Foto nº 2B).
Foto nº 3 > Guiné > Região de Tombali > Cumbijã > CCAV 8351 (1972/74 > 1974 > Algures entre Cumbijã e Nhacobá: Os furriéis: Machado e Costa... Na base móvel do PAIGC utilizada com sucesso nos ataques ao Cumbijã com canhóes sem recuo. O Machado tentando encontrar o local das minas por ele colocadas depois deste ser alvo de uma queimada, fazendo desaparecer as referências da sua localização. Esta desminagem ocorreu já depois do 25 de Abril de 74, com o objetivo de sinalizar o local com tampas de “bidon” pintadas (Foto nº 3A). Na altura o Furriel Machado já usava calças da moda, rotas nos joelhos!
Fotos (e legendas): © Joaquim Costa (2021). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]
Paz & Guerra: memórias de um Tigre do Cumbijã (Joaquim Costa, ex-Furriel mil arm pes inf, CCAV 8351, 1972/74) - Parte XXI
Não tenho nenhuma memória do meu segundo Natal no TO da Guiné (1973), contudo julgo que esta “marcha louca” teve lugar nas vésperas desta quadra, tendo em conta o redobrar dos esforços no sentido de garantir alguma tranquilidade neste dia, do qual a tradição não fala de fogo de artifício...
As nossas rotinas continuavam: Patrulhamentos de reconhecimento e proteção na mata, fazer segurança aos trabalhos da estrada, levantar minas e proteger pontões, e, aceitar como fizesse parte destas rotinas as recorrentes flagelações com canhão sem recuo.
Sempre que as flagelações atingiam em pleno o perímetro do destacamento não descansávamos até encontrar o local do lançamento das mesmas, que mais tarde ou mais cedo lá conseguíamos.
Não estávamos preparados para aceitar mais mortes dentro do próprio destacamento com estas flagelações!
Não tínhamos dúvidas que os operadores destes canhões sem recuo eram elementos cubanos, muito bem preparados tecnicamente. Impressionante a forma como à segunda ou terceira tentativa as metiam quase todas dentro do destacamento. Contudo, é minha convicção que algo mais havia para além da competência técnico dos operadores… “No creo em las brujas, pero hay”.
Enquanto as granadas caiam fora do destacamento, lá íamos tolerando a ousadia do IN (e seus amigos cubanos). Contudo, quando começavam a cair dentro do perímetro do destacamento a coisa “piava mais fino” e todas as contas eram feitas no sentido de confirmar a direção das mesmas e aferir a distância do local, tendo em vista a sua “caça”.
Geralmente o ataque começava ainda com a luz do dia e acabava já noite posta. Sempre assim atuavam. A noite sempre foi a “praia” do IN, deslocando-se, montando minas e infiltrando-se para o interior do território sem nenhum obstáculo a não ser uma ou outra emboscada noturna e uma ou outra granada de obus.
Os ataques nesta “nesga” de tempo tinha como objetivo evitar a nossa perseguição bem como não denunciar a sua posição, tendo em conta o clarão provocado pela saída das granadas. Contudo, as últimas canhoadas, já com a noite a cair, acabavam por denunciar a sua direção. Quanto à distância? Alguém disse com toda a propriedade: “é só fazer as contas”, sabendo que a velocidade do som é de 340 m/s...
Já dois pelotões tinham saído com o objetivo de encontrar a base de lançamento das granadas de canhão sem recuo. Nada foi encontrado, pelo que chegou a nossa vez de tentar a sorte. Nesta altura já estava no meu pelotão o meu grande amigo “alfero” Afonso (amigo para a vida), que, não tendo passado todo o calvário da companhia até aí, estava, contudo, imbuído de uma determinação, quase doentia, em encontrar o local do ataque. Na saída vira-se para mim e diz-me com toda a convicção: "Costa, só regressamos ao destacamento depois de encontrarmos a base". Ao que eu repliquei: "Então era melhor reforçarmos as rações de combate !"
Inicia-se assim a “marcha louca”, atravessando trilhos, bolanhas e rasgando a mata com a faca de mato na direção do objetivo que o homem tinha gravado na sua cabeça, sem o auxílio de mapas ou bússolas, que segundo ele só complicavam.
Assumiu a dianteira, substituindo-se ao guia, tornando-se cada vez mais difícil acompanhar o seu andamento. A determinação era tanta que nem nos apercebemos que já estávamos a algum tempo a andar em círculo, com o primeiro da coluna a juntar-se ao último (perante o susto e a estupefação dos dois), caminhando em passo cada vez mais acelerado, mas não saindo do mesmo sítio.
Todas estas voltas se justificavam já que o seu “GPS” marcava que tínhamos chegado ao destino/objetivo. Este estava bem dissimulado na mata. “Manga de ronco”, o nosso homem conseguiu!
Encontramos o local junto a um Baga Baga com duas valas cavadas para se protegerem das nossas granadas de obus (Foto nº 1).
Regressamos ao Cumbijã, eufóricos e só não demos uma medalha ao nosso “herói” porque foram todas gastas no torneio de futebol inter- turmas (pelotões).
Se o Marcelo da altura fosse o Marcelo de hoje, havia medalha!
No dia seguinte um outro pelotão foi ao local minar a zona, tendo encontrado uma das valas minada.
Felizmente tivemos sossego durante algum tempo, ao fim do qual a rotina voltou…
Continua...
Último poste da série > 26 de novembro de 2021 > Guiné 61/74 - P22754: Paz & Guerra: memórias de um Tigre do Cumbijã (Joaquim Costa, ex-Furriel mil arm pes inf, CCAV 8351, 1972/74) - Parte XX: outras guerras, outros protagonistas: os mosquitos, as abelhas, as formigas, as matacanhas...
Foto nº 2
Foto nº 2A
Foto nº 2 B
Foto nº 3
Foto nº 3 A
Fotos (e legendas): © Joaquim Costa (2021). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]
O ex- furriel mil Joaquim Costa: natural de V. N. Famalicão,
vive hoje em Fânzeres, Gondomar, perto da Tabanca dos Melros.
É engenheiro técnico reformado.
Tem pronto o seu livro de memórias (, a sua história de vida),
de que estamos a editar alguns excertos, por cortesia sua.
Tem um pósfácio da autoria do nosso editor Luís Graça.
Paz & Guerra: memórias de um Tigre do Cumbijã (Joaquim Costa, ex-Furriel mil arm pes inf, CCAV 8351, 1972/74) - Parte XXI
“A MARCHA LOUCA”
(para garantir que não haveria “fogo de artifício” no dia de Natal)
Não tenho nenhuma memória do meu segundo Natal no TO da Guiné (1973), contudo julgo que esta “marcha louca” teve lugar nas vésperas desta quadra, tendo em conta o redobrar dos esforços no sentido de garantir alguma tranquilidade neste dia, do qual a tradição não fala de fogo de artifício...
As nossas rotinas continuavam: Patrulhamentos de reconhecimento e proteção na mata, fazer segurança aos trabalhos da estrada, levantar minas e proteger pontões, e, aceitar como fizesse parte destas rotinas as recorrentes flagelações com canhão sem recuo.
Sempre que as flagelações atingiam em pleno o perímetro do destacamento não descansávamos até encontrar o local do lançamento das mesmas, que mais tarde ou mais cedo lá conseguíamos.
Não estávamos preparados para aceitar mais mortes dentro do próprio destacamento com estas flagelações!
Não tínhamos dúvidas que os operadores destes canhões sem recuo eram elementos cubanos, muito bem preparados tecnicamente. Impressionante a forma como à segunda ou terceira tentativa as metiam quase todas dentro do destacamento. Contudo, é minha convicção que algo mais havia para além da competência técnico dos operadores… “No creo em las brujas, pero hay”.
Enquanto as granadas caiam fora do destacamento, lá íamos tolerando a ousadia do IN (e seus amigos cubanos). Contudo, quando começavam a cair dentro do perímetro do destacamento a coisa “piava mais fino” e todas as contas eram feitas no sentido de confirmar a direção das mesmas e aferir a distância do local, tendo em vista a sua “caça”.
Geralmente o ataque começava ainda com a luz do dia e acabava já noite posta. Sempre assim atuavam. A noite sempre foi a “praia” do IN, deslocando-se, montando minas e infiltrando-se para o interior do território sem nenhum obstáculo a não ser uma ou outra emboscada noturna e uma ou outra granada de obus.
Os ataques nesta “nesga” de tempo tinha como objetivo evitar a nossa perseguição bem como não denunciar a sua posição, tendo em conta o clarão provocado pela saída das granadas. Contudo, as últimas canhoadas, já com a noite a cair, acabavam por denunciar a sua direção. Quanto à distância? Alguém disse com toda a propriedade: “é só fazer as contas”, sabendo que a velocidade do som é de 340 m/s...
Já dois pelotões tinham saído com o objetivo de encontrar a base de lançamento das granadas de canhão sem recuo. Nada foi encontrado, pelo que chegou a nossa vez de tentar a sorte. Nesta altura já estava no meu pelotão o meu grande amigo “alfero” Afonso (amigo para a vida), que, não tendo passado todo o calvário da companhia até aí, estava, contudo, imbuído de uma determinação, quase doentia, em encontrar o local do ataque. Na saída vira-se para mim e diz-me com toda a convicção: "Costa, só regressamos ao destacamento depois de encontrarmos a base". Ao que eu repliquei: "Então era melhor reforçarmos as rações de combate !"
Inicia-se assim a “marcha louca”, atravessando trilhos, bolanhas e rasgando a mata com a faca de mato na direção do objetivo que o homem tinha gravado na sua cabeça, sem o auxílio de mapas ou bússolas, que segundo ele só complicavam.
Assumiu a dianteira, substituindo-se ao guia, tornando-se cada vez mais difícil acompanhar o seu andamento. A determinação era tanta que nem nos apercebemos que já estávamos a algum tempo a andar em círculo, com o primeiro da coluna a juntar-se ao último (perante o susto e a estupefação dos dois), caminhando em passo cada vez mais acelerado, mas não saindo do mesmo sítio.
Todas estas voltas se justificavam já que o seu “GPS” marcava que tínhamos chegado ao destino/objetivo. Este estava bem dissimulado na mata. “Manga de ronco”, o nosso homem conseguiu!
Encontramos o local junto a um Baga Baga com duas valas cavadas para se protegerem das nossas granadas de obus (Foto nº 1).
Regressamos ao Cumbijã, eufóricos e só não demos uma medalha ao nosso “herói” porque foram todas gastas no torneio de futebol inter- turmas (pelotões).
Se o Marcelo da altura fosse o Marcelo de hoje, havia medalha!
No dia seguinte um outro pelotão foi ao local minar a zona, tendo encontrado uma das valas minada.
Felizmente tivemos sossego durante algum tempo, ao fim do qual a rotina voltou…
Continua...
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Nota do editor:
Último poste da série > 26 de novembro de 2021 > Guiné 61/74 - P22754: Paz & Guerra: memórias de um Tigre do Cumbijã (Joaquim Costa, ex-Furriel mil arm pes inf, CCAV 8351, 1972/74) - Parte XX: outras guerras, outros protagonistas: os mosquitos, as abelhas, as formigas, as matacanhas...
Guiné 61/74 - P22823: Notas de leitura (1400): "Guiné, Minha Terra", pelo jornalista bolamense Armando de Aguiar; uma edição da Agência-Geral do Ultramar (Mário Beja Santos)
1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 22 de Novembro de 2018:
Queridos amigos,
Trata-se de uma obra de um jornalista nascido em Bolama que aqui regressa nas primícias da luta armada, traz a exaltação patriótica e rasgados elogios às políticas das últimos governadores. É recebido com pompa e circunstância em Bolama, botou conferência para a comunidade local, apareceu sorridente e de laço na camisa, vem tudo em "Bolamense", órgão de propaganda regional de cultura e de turismo, cujo primeiro número saiu em 1 de agosto de 1956, e que terá uns anos de vida. O aspeto mais curioso, falo por mim, são os dados que ele enuncia sobre a prospeção de petróleo, a haver fidelidade nos dados, petróleo era só miragem. Mas a esperança continua.
Um abraço do
Mário
Guiné, minha terra, por Armando de Aguiar
Beja Santos
Armando de Aguiar foi jornalista do Diário de Notícias, gostava imenso de viajar, era natural de Bolama, encontrei no jornal “Bolamense” uma sua conferência ao lado do inspetor Santos Lima, que o apresentou. Tratando-se de uma edição da Agência-Geral do Ultramar, com data de 1964 mas anteriormente escrito (ele di-lo, entrevistou o Governador de então, o Comandante Peixoto Correia, estaríamos seguramente no início da década de 1960), é todo redigido num tom laudatório, cheio de exclamativas, com muitos encómios dirigidos aos últimos governadores que fizeram estradas, portos, trouxeram equipamentos, a saúde, a educação e a cultura; refere sempre que por detrás estão cinco séculos de colonização, que aquela terra é irremissivelmente portuguesa, que houve a obra de um herói chamado Teixeira Pinto, entre outros gloriosos; viaja de Santiago para Bissau, entretanto passa pela Gâmbia e passeia-se por Zinguinchor, em Bissau repertoria tudo quanto se tem construído e mostra os sinais do desenvolvimento. Em suma, uma obra que se regista mas praticamente sem história. Porém, já estamos a caminhar para o final desta exaltação ultramarina quando ele nos traz um capítulo que espicaça a curiosidade, tem o título “Haverá Petróleo?”. Vamos ver o que ele escreve:
“Quando em Abril de 1958 a Esso Exploration Guiné, Inc., que acabava de ser fundada com sede naquela capital e subsidiária da Standard Oil Company, de Nova Jérsia, solicitou do governo permissão para estudar, em primeiro lugar, e realizar depois a pesquisa e eventual exploração de petróleo, gás e outros hidrocarbonetos que porventura existissem na área da concessão solicitada, grande onda de entusiasmo avassalou a província.
A área da concessão, que ocupa cerca de 40.000 quilómetros quadrados, pode ser definida da seguinte maneira: abrange uma zona continental limitada a norte pela fronteira com o Senegal e a leste pelo rio Geba, e uma zona marítima que inclui o arquipélago dos Bijagós.
A pesquisa do petróleo compreende duas fases que se completam. A prospeção indireta é feita por intermédio de sondagens de profundidade executadas em locais selecionados, com base nas informações obtidas pelas investigações geológicas e geofísicas.
A existência ou não existência de petróleo é uma incógnita a que só as sondagens de profundidade poderão dar uma resposta concreta. As pesquisas por métodos indiretos levadas a efeito pela Esso da Guiné na área da concessão consistiram no reconhecimento geológico e nos levantamentos gravimétrico e sísmico.
Haverá petróleo na Guiné?
Para responder conscienciosamente a esta pergunta, a Esso contratou três grupos de técnicos americanos, aos quais se juntaram alguns portugueses, que realizaram um após outro, importantes trabalhos de campo e de laboratório: levantamento sísmico, marítimo e terrestre de toda a Guiné e levantamento gravimétrico. Aguardava-se com o maior interesse o resultado das sondas perfuradoras quando elas atingissem os lençóis petrolíferos. O poço Safim n.º 1 é um poço exploratório destinado a fornecer informações que permitiriam verificar determinadas hipóteses formuladas pelos geólogos e geofísicos quanto às caraterísticas estruturais do subsolo. Naquele local, situado a menos de 30 quilómetros de Bissau, estabeleceu a Esso um dos seus acampamentos. A sonda funcionava 24 horas por dia. Infelizmente, o poço Safim n.º 1 foi abandonado à profundidade de 3244 pés sem que se tivessem encontrado quaisquer vestígios de petróleo ou outros hidrocarbonetos. O mesmo aconteceu no 2.º poço – Có n.º 1 –, que foi abandonado à profundidade de 6569 pés. A terceira sondagem – Cagongué n.º 1 –, a 10 quilómetros para oeste de Teixeira Pinto, atingiu cerca de 8000 pés de profundidade. Teoricamente também não assinalou a existência de petróleo, razão por que as pesquisas foram suspensas e os trabalhos dados por terminados. Ao fim ao cabo os americanos souberam aquilo que pretendiam. A verdade é que essa curiosidade custou-lhes rios de dinheiro. Tenho, porém, fortes razões para julgar que não foi trabalho totalmente perdido…”
Na verdade, com o crescendo da luta armada, estes poços foram selados e nunca mais se falou em petróleo. A haver, não passava de conjetura. Depois da independência, como é sabido, as prospeções estenderam-se à plataforma marítima, entre a Guiné e o Senegal, continuavam a não existir resultados conclusivos, mas só a hipótese de haver petróleo fez suscitar um grave litígio entre os dois Estados – ninguém quer perder o quinhão, cedendo um quilómetro de mar ao outro.
Haverá petróleo na Guiné?
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Nota do editor
Último poste da série de 18 DE DEZEMBRO DE 2021 > Guiné 61/74 - P22819: Notas de leitura (1399): "O Povo de Santa Maria, seu falar e suas vivências", 2ª edição revista e acrescentada (2021), por Arsénio Chaves Puim, um caso de grande sensibilidade sociocultural e de amor às suas raízes (Luís Graça ) - Parte I: "Muitos parabéns, muitos parabéns, muitos parabéns!"
Guiné 61/74 - P22822: Parabéns a você (2016): José Botelho Colaço, ex-Soldado TRMS da CCAÇ 557 (Cachil e Bafatá, 1963/65) e José Casimiro Carvalho, ex-Fur Mil Op Esp da CART 8350/72 e CCAÇ 11 (Gulieje, Gadamael e Paunca, 1972/74)
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Nota do editor
Último poste da série de 19 de Dezembro de 2021 > Guiné 61/74 - P22820: Parabéns a você (2015): Humberto Reis, ex-Alf Mil Op Esp da CCAÇ 2590/CCAÇ 12 (Bambadinca, 1969/71)
domingo, 19 de dezembro de 2021
Guiné 61/74 - P22821: Fotos à procura de... uma legenda (158): Tão meninos que nós éramos!... (Valdemar Queiroz, ex-fur mil, CART 2479 / CART 11, Contuboel, Nova Lamego, Canquelifá, Paunca, Guiro Iero Bocari, 1969/70)
Espinho > Silvade > Fevereiro de 1969 > Jantar de despedida antes da partida, a 18, para o TO da Guiné... Um grupo de sargentos e furriéis milicianos da CART 2479, futura CART 11
Foto (e legenda): © Valdemar Queiroz 2021). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]
1. Mensagem de Valdemar Queiroz [ex-fur mil, CART 2479 /CART 11, Contuboel, Nova Lamego, Canquelifá, Paunca, Guiro Iero Bocari, 1969/70); e não se esqueçam de lhe mandar um alfabravo, por msn, neste Natal: telem 965 290 110; ele precisa e vai gostar; até ao dia 22, porque depois já tinha a companhia do Menino Jesus e do Pai Natal, que vêm da Holanda, ou Países Baixos, como se diz agora ]
Data - 14 dez 2021 15:23
Assunto - Foto à procura de uma legenda
Luís,Esta fotografia foi tirada em Espinho num jantar de despedida (???) na semana anterior (05-02-1969) ao embarque, não para a colónia de férias, para a guerra na colónia da Guiné, também chamada de jure Guiné Portuguesa e por cá Província da Guiné. Chamem o que quiserem: fomos para a guerra na Guiné
.
Vemos na foto, excepção feita ao 1º. Sargento, uma rapaziada de Furriéis milicianos de 20/21 anos de idade.
Para completar a classe de Sargentos da CART 2479 (futura CART 11) falta o 2º. Sarg. Almeida (o velho Lacrau), o Fur mil Vera Cruz e o Fur mil Aurélio Duarte que já tinha partido à frente para tratar dos "hotéis e aluguer de carros de passeio".
Na legenda da fotografia vão todos identificados, e destes, infelizmente, já faleceram o 1º. Sarg Ferreira Jr, o meu amigo Renato Monteiro (*) e o outro meu amigo Aurélio Duarte (**) que não está na fotografia.(***)
Temos na fotografia à ess sentados Canatário (armas pesadas) e Cunha, em pé Silva (transm.), Abílio Duarte e Pinto, atrás Macias e Pechincha (op. especiais), ao alto Sousa, ao centro 1º. Sarg. Ferreira Jor., Renato Monteiro, Ferreira (vagomestre), Edmond (enfermeiro), Pais (mecânico) e sentado Valdemar Queiroz (armado em finório) (****).
Abraço e saúde
Valdemar Queiroz
(**) Vd. poste de 20 de agosto de 2017 > Guiné 61/74 - P17684: In Memoriam (302): Morreu o Aurélio Duarte, mais um dos nossos, da nossa seita, da nossa guerra... Nunca mais ouvirei o teu grito de guerra coimbrão, Eferreá!... Eferreá!... Mas para ti vai tudo, amigo e camarada!... Ficas à sombra do nosso poilão, no lugar nº 750!... (Valdemar Queiroz, ex-fur mil, CART 2479 /CART 11, Contuboel, Nova Lamego, Canquelifá, Paunca, Guiro Iero Bocari, 1969/70)
(***) Vd. poste de 1 de julho de 2019 > Guiné 61/74 - P19935: (De)Caras (131): Um ninho de "lacraus", em Espinho, Silvalde, fevereiro de 1969, na véspera de partida para o CTIG (Valdemar Queiroz / Abílio Duarte, CART 2479 / CART 11, 1969/70)Vemos na foto, excepção feita ao 1º. Sargento, uma rapaziada de Furriéis milicianos de 20/21 anos de idade.
Para completar a classe de Sargentos da CART 2479 (futura CART 11) falta o 2º. Sarg. Almeida (o velho Lacrau), o Fur mil Vera Cruz e o Fur mil Aurélio Duarte que já tinha partido à frente para tratar dos "hotéis e aluguer de carros de passeio".
Na legenda da fotografia vão todos identificados, e destes, infelizmente, já faleceram o 1º. Sarg Ferreira Jr, o meu amigo Renato Monteiro (*) e o outro meu amigo Aurélio Duarte (**) que não está na fotografia.(***)
Temos na fotografia à ess sentados Canatário (armas pesadas) e Cunha, em pé Silva (transm.), Abílio Duarte e Pinto, atrás Macias e Pechincha (op. especiais), ao alto Sousa, ao centro 1º. Sarg. Ferreira Jor., Renato Monteiro, Ferreira (vagomestre), Edmond (enfermeiro), Pais (mecânico) e sentado Valdemar Queiroz (armado em finório) (****).
Abraço e saúde
Valdemar Queiroz
___________
Notas do editor:
(*) Vd. poste de 11 de julho de 2021 > Guiné 61/74 - P22363: O nosso blogue por descritores (4): "Renato Monteiro" (com cerca de 6 dezenas de referências)... Morreu o amigo e camarada, mas fica para a eternidade a saudade do "homem da piroga"
(**) Vd. poste de 20 de agosto de 2017 > Guiné 61/74 - P17684: In Memoriam (302): Morreu o Aurélio Duarte, mais um dos nossos, da nossa seita, da nossa guerra... Nunca mais ouvirei o teu grito de guerra coimbrão, Eferreá!... Eferreá!... Mas para ti vai tudo, amigo e camarada!... Ficas à sombra do nosso poilão, no lugar nº 750!... (Valdemar Queiroz, ex-fur mil, CART 2479 /CART 11, Contuboel, Nova Lamego, Canquelifá, Paunca, Guiro Iero Bocari, 1969/70)
(****) Último poste da série > 15 de dezembro de 2021 > Guiné 61/74 - P22808: Fotos à procura de... uma legenda (157): Os quatro membros da comitiva guineense (a saber Sene Sané, Sampulo Embaló, Duarte Embaló e Alagé Baldé, amigos do meu pai, Manuel Joaquim dos Prazeres,) às Comemorações do V Centenário da morte do Infante D. Henrique, agosto de 1960 (Lucinda Aranha, escritora) - II ( e última) Parte
Guiné 61/74 - P22820: Parabéns a você (2015): Humberto Reis, ex-Alf Mil Op Esp da CCAÇ 2590/CCAÇ 12 (Bambadinca, 1969/71)
____________
Nota do editor
Último poste da série de 15 de Dezembro de 2021 > Guiné 61/74 - P22807: Parabéns a você (2014): Sousa de Castro, ex-1.º Cabo Radiotelegrafista da CART 3494/BART 3873 (Xime e Mansambo, 1971/74)
Nota do editor
Último poste da série de 15 de Dezembro de 2021 > Guiné 61/74 - P22807: Parabéns a você (2014): Sousa de Castro, ex-1.º Cabo Radiotelegrafista da CART 3494/BART 3873 (Xime e Mansambo, 1971/74)
sábado, 18 de dezembro de 2021
Guiné 61/74 - P22819: Notas de leitura (1399): "O Povo de Santa Maria, seu falar e suas vivências", 2ª edição revista e acrescentada (2021), por Arsénio Chaves Puim, um caso de grande sensibilidade sociocultural e de amor às suas raízes (Luís Graça ) - Parte I: "Muitos parabéns, muitos parabéns, muitos parabéns!"
Capa do livro do nosso camarada Arsénio Chaves Puim, "O Povo de Santa Maria, seu falar e suas vivências", 2ª edição revista e acrescentada, Santa Maria, Câmara Municipal de Vila do Porto, 2021, 286 pp. Capa: Ilha de Santa Maria, do cartógrafo Luís Teixeira, 1587, Biblioteca Nacional de Florença.
1. Estou em dívida para com o meu amigo e camarada da Guiné, o ex-alf mil capelão Arsénio Puim (CCS / BART 2917, Bambadinca, 1970/72) que me mandou, pelo correio, um exemplar autografado (e com dedicatória) do seu livro, há 5 meses atrás.
Prometi-lhe fazer uma ou mais notas de leitura, mesmo que o livro não tenha a ver diretamente com a Guiné, ou as memórias da guerra da Guiné. Mas a Guiné está sempre presente, entre nós (*), até na dedicatória, que reza assim: "Ao companheiro da Guiné e grande amigo de sempre, Luís Graça. Vila Franca do Campo, 5 de julho d2 2021, Arsénio Chaves Pum". Confesso que já li o livro, de fio a pavio, e, não sendo sequer açoriano, e só conhecendo 4 ilhas do arquipélago (Terceira, onde fiz férias em 1993, São Miguel, Horta e Pico) fiquei com ganas de dar um saltinho a Santa Maria, logo que as "novas" pernas mo permitam...
Esta primeira nota de leitura é apenas para dar conta da publicação da obra que teve uma 1ª edição em 2008. E fazer uma apresentação (sumária) deste trabalho de pesquisa, revelador de uma grande sensibilidade socioantropológica e, mais do que isso, de um grande amor à sua terra, à sua gente, às suas raízes. O livro é dedicado aos seus pais e ao povo da ilha, mostrando-se o autor "grato pela herança moral, cultural e linguística que me legaram". E começa por lembrar que o seu pai, António Carvalho Puim, nascido em 1903, "foi uma enciclopédia viva da linguagem mariense de sabor arcaico" (pág. 15).
Este interesse etnográfico pelo "falar" (, a língua mais oral que escrita,) que dá identidade a cada povo ou comunidade, já se revelava, na Guiné. Veja-se por exemplo, o poste P13314, da série "Memórias de um capelão" em que ele exalta as competências linguísticas do povo guineense, a que chama, com propriedade, um povo "poliglota" (**).
O autor, um "jovem" de 85 anos, natural da freguesia de Espírito Santo, Santa Maria, vive atualmente na Ilha de São Miguel, em Vila Franca do Campo, estando reformado (desde 1995) da sua profissão de enfermeiro, do Serviço Regional de Saúde, a que se dedicou em exclusividade, tendo deixado em 1979, o múnus espiritual enquanto sacerdote católico. Foi ainda professor de História e Português no Externato do Aeroporto, Santa Maria, na década de 60. Opositor político ao regime então vigente, foi mobilizado para a Guiné como capelão militar em 1970, sendo expulso do CTIG, um ano depois, em maio de 1971. Regressado aos Açores, continuou a paroquiar, manteve o seu empenho cívico e concluiu, entretanto, o curso de enfermagem em 1976. É casado, tem dois filhos e dois netos.
Nunca abandonou, porém, o prazer e o dever da escrita, nomeadamente como jornalista e escritor: foi cofundador da II série do jornal “O Baluarte”, juntamente com João de Braga e José Dinis Resendes. Foi diretor deste mensário entre 1977 e 1982.
É autor ainda dos livros «A Pesca à Baleia na Ilha de Santa Maria" (edição do Museu de Sta Maria e da junta de Freguesia de Sto Espírito, 2001), e «As Ribeiras de Santa Maria - Seus Percursos e História» (edição do jornal “O Baluarte”, 2009).
2. E de que é que trata esta 2ª edição de "O Povo de Santa Maria: seu falar e suas vivências" ? Embora fazendo apelo a técnicas da pesquisa etnográfica (como a observação participante, a entrevista, a biografia, a acão-investigação, a análise documental, etc.), o autor não tem a pretensão de fazer obra académica, o seu objetivo é apenas o de "identificar, coligir e contextualiar um vasto conjunto de elementos e características respeitantes ao falar, muito castiço, muito expressivo e muito bonito, da pequena comunidade de Santa Maria", com a introdução, nesta 2ª edição, de novos temas como a cozinha tradicional, a cultura da vinha nas fajãs e o casamento rural.
(*) Vd. poste de 8 de maio de 2021 > Guiné 61/74 - P22181: Os nossos capelães (16): Arsénio Puim, vítima da ira de César por mor de Deus e da sua consciência de cristão e português (Luís Graça, "O Baluarte de Santa Maria", maio de 2021)
(**) 20 de junho de 2014 > Guiné 63/74 - P13314: Memórias de um alferes capelão (Arsénio Puim, BART 2917, Dez 69 / Mai 71) (12): O crioulo (e as suas virtualidades)
2. E de que é que trata esta 2ª edição de "O Povo de Santa Maria: seu falar e suas vivências" ? Embora fazendo apelo a técnicas da pesquisa etnográfica (como a observação participante, a entrevista, a biografia, a acão-investigação, a análise documental, etc.), o autor não tem a pretensão de fazer obra académica, o seu objetivo é apenas o de "identificar, coligir e contextualiar um vasto conjunto de elementos e características respeitantes ao falar, muito castiço, muito expressivo e muito bonito, da pequena comunidade de Santa Maria", com a introdução, nesta 2ª edição, de novos temas como a cozinha tradicional, a cultura da vinha nas fajãs e o casamento rural.
Mas vejamos o índice do livro (de que se fizeram 500 exemplares). Esquematicamente:
I - Linguagem Popular Mariense (pp.. 19-114), incluindo: léxico popular, locuções e expressões populares, terminologia anatómica e sexual popular, americanismos, e alguns aspectos específicos do falar mariense.
II - Atividades Tradicionais Marienses e sua Expressão Linguística (pp. 115-218): o carrear e o carro de bois; a lavra da terra, o arado e a grade; a debulha do trigo na eira; o trabalho doméstico do linho; o artesanato; a cozinha tradicional; a arquitetura rural ( a casa tradicional e sua chaminé; moinhos de água e de vento); a cultura da vinha nas fajãs; a pesca à baleia e o seu léxico baleeiro).
III - Celebrações Festivas: sua Caracterização e Linguagem ( pp. 219- 268): a Senhora das Candeias na Freguesia do Espírito Santo; o Império Mariense: praxes, folias e linguagem: o São João de antigamente; os serões na aldeia: a 'matação' do porco; o casamento rural em tempos passados.
Breves Notas sobre a Literatura Popular Mariense (pp. 269-283).
Bibliografia.
Ficam os nossos leitores, espero, com "água no bico", aguardando a segunda nota de leitura, que há de sair, em passando o Natal... Ao nosso autor, só tenho que felicitá-lo pelo seu livro, usando uma expressão tipicamente mariense (das muitas que ele recolhe): ""Muitos parabéns, muitos parabéns, muitos parabéns!".. Remeto a explicação para o autor: "Era assim, em repetição tripla emitida num só fôlego, que as pessoas felicitavam os vizinhos e conhecidos por ocasião de uma acontecimento feiz, como um nascimento, um casamento, a chegada da vida militar, a recuperação deuma doença, etc." (pp. 75/76)... E eu acrescento: a publicação de um livro, como este, que é uma prova de muio amor, paciência e saber. (***)
Parto também mantenhas natalícias, com o nosso camarada Puim!... Muita saúde e longa vida, que tu mereces tudo!... LG
__________
Notas do editor:
(**) 20 de junho de 2014 > Guiné 63/74 - P13314: Memórias de um alferes capelão (Arsénio Puim, BART 2917, Dez 69 / Mai 71) (12): O crioulo (e as suas virtualidades)
(***) Último poste da série > 13 de dezembro de 2021 > Guiné 61/74 - P22804: Notas de leitura (1398): "Cartas de Amor e de Dor", por Marta Martins da Silva; Saída de Emergência, 2021, com prefácio do general Pezarat Correia (3) (Mário Beja Santos)
Guiné 61/74 - P22818: Os nossos seres, saberes e lazeres (482): Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (29): As surpresas que o Museu de Lisboa nos reserva (Mário Beja Santos)
1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 8 de Novembro de 2021:
Queridos amigos,
Aqui se conclui a viagem pelo piso térreo do Museu da Cidade, foram bem felizes as benfeitorias produzidas, logo entra a Pré-História e a Lisboa Quinhentista e o novo semblante que tem a cozinha e a Lisboa dos ofícios. Penso que há tudo a ganhar em uma visita-guiada, ainda não há um documento completo sobre o Museu de Lisboa, a despeito das duas boas brochuras entregues na receção sobre uma súmula histórica do que nos reserva o Museu, uma, e sobre a maquete de Lisboa anterior ao Terramoto de 1755, outra. A museografia é cativante, formula-se com mais discernimento a comunicação dos objetos com a história da cidade e quem como eu tenho a felicidade de o visitar desde a primeira hora posso dizer que se tem vindo a aprimorar a partir do sonho idealizado por uma eminente olisipógrafa e investigadora que felizmente não está esquecida, a dinâmica Irisalva Moita, a quem os museus da cidade ficaram com uma dívida impagável. Mas ainda há muito mais para ver, haverá circunstância para continuarmos este passeio por esta Lisboa de outras eras.
Um abraço do
Mário
Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (29):
As surpresas que o Museu de Lisboa nos reserva
Mário Beja Santos
Sobre o histórico do Palácio Pimenta, quem por aqui viveu e inclusivamente deixou memórias nas Artes Plásticas (caso do pintor Manuel Amado que nos legou obras soberbas das suas recordações de infância) já se fez menção no texto anterior, como igualmente se exaltou o papel determinante de Irisalva Moita, que logo com responsabilidades ligadas à conservação dos museus municipais elaborou um programa do então chamado Museu Municipal de Lisboa, concebeu uma exposição sobre a História de Lisboa, no fundo já estava a esboçar o programa museológico que veio dar lugar ao museu que abriu as suas portas ao público em 1979. O museu irá conheceu um programa de alargamento concluído em 1985, quando o museu ganhou três novos núcleos expositivos. O denominado Pavilhão Preto do Museu da Cidade foi inaugurado em 1994 com uma exposição intitulada Lisboa em Movimento, 1850-1920, organizada no contexto da programação de Lisboa Capital da Cultura 1994. Irisalva Moita envolveu-se igualmente na reformulação dos restantes museus municipais de então, o Museu Antoniano e o Museu Rafael Bordalo Pinheiro. Num livro de consagração que recentemente o Museu de Lisboa dedicou a Irisalva Moita, vê-se como esta arqueóloga, olisipógrafa e museóloga utilizava as exposições temporárias como meio para complementar a exposição de longa duração em qualquer dos museus municipais. No caso do Museu da Cidade, terão sido as exposições Lisboa e o Marquês de Pombal (1982) e Lisboa Quinhentista (1983), os dois pontos altos da sua atividade.
Como o leitor recordará, estamos a percorrer o piso térreo do Palácio Pimenta, já andámos bastante da Pré-História até à Cidade Medieval Cristã, percorreu-se um pouco a Cidade Quinhentista, muda-se de edifício depois de visitar os objetos que pertenceram ao Hospital de Todos-Os-Santos, aguarda-nos a maqueta de Lisboa anterior ao Terramoto de 1755.
Antes, porém, somos confrontados com um conjunto ímpar de azulejos onde podemos ver como era o Terreiro do Paço, os quadros impressionantes da Lisboa até Setecentos, incluindo o mercado que se situava o Campo das Cebolas, podemos ver a Casa dos Bicos como existiu até ao Terramoto de 1755, caiu o primeiro andar, tudo foi reedificado no tempo de uma exposição que deu brado, a XVII Exposição Europeia de Arte Ciência e Cultura, de 1983, de que aqui se reproduz a imagem do edifício reedificado.
Que importância podemos atribuir a esta maquete de Lisboa, idealizada pelo historiador Gustavo de Matos Sequeira? À distância de mais de meio século, a maqueta é ainda uma representação fidedigna de Lisboa nas vésperas do terramoto de 1 de novembro de 1755, apresentando a cidade como entidade urbana ribeirinha, entre Alcântara e Santa Apolónia, e desenvolvendo-se para norte até ao Rato e à Senhora do Monte.
Em 2009, associaram-se à exposição da maquete conteúdos multimédia interativos, com o intuito de facilitar a comunicação com o público. A par do modelo tridimensional da Lisboa representada da maquete, apresentam-se modelos 3D rigorosos de 22 edifícios civis e religiosos, ruas e praças da Lisboa barroca e três percursos que permitem conhecer o centro urbano nas vésperas do terramoto. Graças a estes dois quiosques multimédia, cada visitante tem a possibilidade de explorar a cidade antes do terramoto, consoante os seus próprios interesses. A brochura que é oferecida ao visitante recorda-nos cinco lugares icónicos desta Lisboa antes do terramoto: o Terreiro do Paço, centro político, cívico e social e símbolo do poder régio, uma praça de aparato; o Rossio como palco de vida intensa, ali estava o Hospital Real de Todos-os-Santos que se estendia para o que é hoje a Praça da Figueira, o hospital sobreviveu ao terramoto mas foi logo desativado; a Casa dos Bicos, edifício prestigiante e original na Lisboa Quinhentista, mandado construir por Brás de Albuquerque, 1º Presidente do Senado da Câmara de Lisboa; a Rua Nova dos Ferros, a mais importante rua da cidade, estendia-se desde a Praça do Pelourinho Velho até ao Largo da Patriarcal; o Colégio de Santo Antão, grandioso edifício jesuíta fundado em 1573 que depois de remodelado passou ao que é hoje o Hospital de São José; e a Praça da Patriarcal, destruída pelo terramoto e nunca reconstruída, dava acesso à Capela Real mandada construir por D. João IV e engrandecida por D. João V.
Um belo azulejo evocativo de Santo António, o Museu da Cidade alberga outras peças afins como o Registo da Nossa Senhora da Penha de França, datado de 1756
Um dos espaços que mais deslumbram o visitante é a cozinha, detentora de conjuntos azulejares de invulgar qualidade e beleza, parece que está pronta a servir, é um dos pontos fortes das visitas guiadas, ajuda a criançada a entender os motivos desta azulejaria, a conhecer os utensílios de cozinha, desde os tachos e panelas aos almofarizes e tabuleiros.
Saímos da cozinha e temos nova surpresa, a cidade dos ofícios, uma produção cerâmica que muitos ignoram, há um quadro que menciona os locais de fabrico e o visitante tem à sua mercê peças de valor excecional que saíram da Fábrica do Rato. Vale a pena determo-nos a compreender esta cidade de ofícios e uma cerâmica que teve tantos continuadores, como a Viúva Lamego, a Fábrica de Santana ou a Fábrica de Cerâmica Constância, podemos ver o painel de azulejos da autoria de João Abel Manta que está na Avenida Calouste Gulbenkian, como que envolvendo o bairro da Calçada dos Mestres.
As Belas-Artes testemunham como grandes artistas viram Lisboa, logo Carlos Botelho com este magnífico quadro onde cabe Lisboa antiga supostamente vista de uma janela com um supostamente emaranhado montanhoso a beijar um Tejo de um tom turquesa desmaiado. Outros mestres aqui têm destaque, pense-se em Eduardo Viana e muitos outros.
Deixamos para o fim um quadro singular de azulejos com motivos orientais e mais bela cerâmica, isto com a preocupação de alertar o visitante para a riqueza azulejar desta casa, está tudo muito beneficiado com as recentes obras de remodelação, um dia destes subimos ao andar superior, onde outras belezas espetaculares nos aguardam, dessa Lisboa de outras eras.
(continua)
____________
Nota do editor
Último poste da série de 11 DE DEZEMBRO DE 2021 > Guiné 61/74 - P22799: Os nossos seres, saberes e lazeres (481): Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (21): As surpresas que o Museu de Lisboa nos reserva (Mário Beja Santos)
Queridos amigos,
Aqui se conclui a viagem pelo piso térreo do Museu da Cidade, foram bem felizes as benfeitorias produzidas, logo entra a Pré-História e a Lisboa Quinhentista e o novo semblante que tem a cozinha e a Lisboa dos ofícios. Penso que há tudo a ganhar em uma visita-guiada, ainda não há um documento completo sobre o Museu de Lisboa, a despeito das duas boas brochuras entregues na receção sobre uma súmula histórica do que nos reserva o Museu, uma, e sobre a maquete de Lisboa anterior ao Terramoto de 1755, outra. A museografia é cativante, formula-se com mais discernimento a comunicação dos objetos com a história da cidade e quem como eu tenho a felicidade de o visitar desde a primeira hora posso dizer que se tem vindo a aprimorar a partir do sonho idealizado por uma eminente olisipógrafa e investigadora que felizmente não está esquecida, a dinâmica Irisalva Moita, a quem os museus da cidade ficaram com uma dívida impagável. Mas ainda há muito mais para ver, haverá circunstância para continuarmos este passeio por esta Lisboa de outras eras.
Um abraço do
Mário
Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (29):
As surpresas que o Museu de Lisboa nos reserva
Mário Beja Santos
Sobre o histórico do Palácio Pimenta, quem por aqui viveu e inclusivamente deixou memórias nas Artes Plásticas (caso do pintor Manuel Amado que nos legou obras soberbas das suas recordações de infância) já se fez menção no texto anterior, como igualmente se exaltou o papel determinante de Irisalva Moita, que logo com responsabilidades ligadas à conservação dos museus municipais elaborou um programa do então chamado Museu Municipal de Lisboa, concebeu uma exposição sobre a História de Lisboa, no fundo já estava a esboçar o programa museológico que veio dar lugar ao museu que abriu as suas portas ao público em 1979. O museu irá conheceu um programa de alargamento concluído em 1985, quando o museu ganhou três novos núcleos expositivos. O denominado Pavilhão Preto do Museu da Cidade foi inaugurado em 1994 com uma exposição intitulada Lisboa em Movimento, 1850-1920, organizada no contexto da programação de Lisboa Capital da Cultura 1994. Irisalva Moita envolveu-se igualmente na reformulação dos restantes museus municipais de então, o Museu Antoniano e o Museu Rafael Bordalo Pinheiro. Num livro de consagração que recentemente o Museu de Lisboa dedicou a Irisalva Moita, vê-se como esta arqueóloga, olisipógrafa e museóloga utilizava as exposições temporárias como meio para complementar a exposição de longa duração em qualquer dos museus municipais. No caso do Museu da Cidade, terão sido as exposições Lisboa e o Marquês de Pombal (1982) e Lisboa Quinhentista (1983), os dois pontos altos da sua atividade.
Como o leitor recordará, estamos a percorrer o piso térreo do Palácio Pimenta, já andámos bastante da Pré-História até à Cidade Medieval Cristã, percorreu-se um pouco a Cidade Quinhentista, muda-se de edifício depois de visitar os objetos que pertenceram ao Hospital de Todos-Os-Santos, aguarda-nos a maqueta de Lisboa anterior ao Terramoto de 1755.
Antes, porém, somos confrontados com um conjunto ímpar de azulejos onde podemos ver como era o Terreiro do Paço, os quadros impressionantes da Lisboa até Setecentos, incluindo o mercado que se situava o Campo das Cebolas, podemos ver a Casa dos Bicos como existiu até ao Terramoto de 1755, caiu o primeiro andar, tudo foi reedificado no tempo de uma exposição que deu brado, a XVII Exposição Europeia de Arte Ciência e Cultura, de 1983, de que aqui se reproduz a imagem do edifício reedificado.
Reedificação da Casa dos Bicos, 1983
Que importância podemos atribuir a esta maquete de Lisboa, idealizada pelo historiador Gustavo de Matos Sequeira? À distância de mais de meio século, a maqueta é ainda uma representação fidedigna de Lisboa nas vésperas do terramoto de 1 de novembro de 1755, apresentando a cidade como entidade urbana ribeirinha, entre Alcântara e Santa Apolónia, e desenvolvendo-se para norte até ao Rato e à Senhora do Monte.
Em 2009, associaram-se à exposição da maquete conteúdos multimédia interativos, com o intuito de facilitar a comunicação com o público. A par do modelo tridimensional da Lisboa representada da maquete, apresentam-se modelos 3D rigorosos de 22 edifícios civis e religiosos, ruas e praças da Lisboa barroca e três percursos que permitem conhecer o centro urbano nas vésperas do terramoto. Graças a estes dois quiosques multimédia, cada visitante tem a possibilidade de explorar a cidade antes do terramoto, consoante os seus próprios interesses. A brochura que é oferecida ao visitante recorda-nos cinco lugares icónicos desta Lisboa antes do terramoto: o Terreiro do Paço, centro político, cívico e social e símbolo do poder régio, uma praça de aparato; o Rossio como palco de vida intensa, ali estava o Hospital Real de Todos-os-Santos que se estendia para o que é hoje a Praça da Figueira, o hospital sobreviveu ao terramoto mas foi logo desativado; a Casa dos Bicos, edifício prestigiante e original na Lisboa Quinhentista, mandado construir por Brás de Albuquerque, 1º Presidente do Senado da Câmara de Lisboa; a Rua Nova dos Ferros, a mais importante rua da cidade, estendia-se desde a Praça do Pelourinho Velho até ao Largo da Patriarcal; o Colégio de Santo Antão, grandioso edifício jesuíta fundado em 1573 que depois de remodelado passou ao que é hoje o Hospital de São José; e a Praça da Patriarcal, destruída pelo terramoto e nunca reconstruída, dava acesso à Capela Real mandada construir por D. João IV e engrandecida por D. João V.
Um belo azulejo evocativo de Santo António, o Museu da Cidade alberga outras peças afins como o Registo da Nossa Senhora da Penha de França, datado de 1756
Um dos espaços que mais deslumbram o visitante é a cozinha, detentora de conjuntos azulejares de invulgar qualidade e beleza, parece que está pronta a servir, é um dos pontos fortes das visitas guiadas, ajuda a criançada a entender os motivos desta azulejaria, a conhecer os utensílios de cozinha, desde os tachos e panelas aos almofarizes e tabuleiros.
Saímos da cozinha e temos nova surpresa, a cidade dos ofícios, uma produção cerâmica que muitos ignoram, há um quadro que menciona os locais de fabrico e o visitante tem à sua mercê peças de valor excecional que saíram da Fábrica do Rato. Vale a pena determo-nos a compreender esta cidade de ofícios e uma cerâmica que teve tantos continuadores, como a Viúva Lamego, a Fábrica de Santana ou a Fábrica de Cerâmica Constância, podemos ver o painel de azulejos da autoria de João Abel Manta que está na Avenida Calouste Gulbenkian, como que envolvendo o bairro da Calçada dos Mestres.
As Belas-Artes testemunham como grandes artistas viram Lisboa, logo Carlos Botelho com este magnífico quadro onde cabe Lisboa antiga supostamente vista de uma janela com um supostamente emaranhado montanhoso a beijar um Tejo de um tom turquesa desmaiado. Outros mestres aqui têm destaque, pense-se em Eduardo Viana e muitos outros.
Deixamos para o fim um quadro singular de azulejos com motivos orientais e mais bela cerâmica, isto com a preocupação de alertar o visitante para a riqueza azulejar desta casa, está tudo muito beneficiado com as recentes obras de remodelação, um dia destes subimos ao andar superior, onde outras belezas espetaculares nos aguardam, dessa Lisboa de outras eras.
(continua)
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Nota do editor
Último poste da série de 11 DE DEZEMBRO DE 2021 > Guiné 61/74 - P22799: Os nossos seres, saberes e lazeres (481): Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (21): As surpresas que o Museu de Lisboa nos reserva (Mário Beja Santos)
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