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quinta-feira, 10 de julho de 2025

Guiné 61/74 - P27000: S(C)em Comentários (74): o telegrama fatal: (...) Sua Excia Ministro Exército tem pesar comunicar falecimento seu filho (...) ocorrido dia (...) Guiné por motivo combate defesa da Pátria Sua Excelência apresenta mais sentidas condolências" (...)


João Carlos Vieira Martinho, natural de Sobreiro Curvo, A-dos-CVunhados, Torres Vedras, ex-fur mil cav,  EREC 8740/3, Bula, morto em combate em 25/5/1973.


Fotos (e legendas): © Eduardo Jorge Ferreira  (2019). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné].


1. Exemplo, acima,  de um telegrama enviado à família de um militar,  morto em 25/5/1973, no CTIG, o fur mil cav João Carlos Vieira Martinho, natural de A-dos-Cunhados, Torres Vedras, com data de 26 de maio de 1973, às 12h32, assinado pelo Comandante do Depósito Geral de Adidos, Ajuda, Lisboa. 

"Nº 602787. Sua Excia Ministro Exército tem pesar comunicar falecimento seu filho furriel miliciano João Carlos Oliveira 
[lapso, Vieira ] Martinho ocorrido dia 25 corrente Guiné por motivo combate defesa da Pátria Sua Excelência apresenta mais sentidas condolências

"Comandante Depósito Geral de Adidos,
Lisboa".

Era o fatal telegrama (*)... Todos temíamos que um dia pudesse chegar também a nossa casa um de igual teor.... Como chegou à casa do José António Canoa Nogueira, do José Henriques Mateus, do João   Carlos Vieira Martinho e de tantos outros nossos camaradas mortos durante a guerra colonial.



Arsénio Marques Bonifácio da Silva (1951 - 1972), sold at inf, CCS/BCAÇ 12 (Angola, 1972).
Morreu ao fim de 3 meses, vítima de uma mina A/P, em 4/9/1972


2. O outro telegrama que a família do morto (neste caso o lourinhanense Arsénio Marques Bonifácio da Silva)  recebia, a seguir,  era do mesmo teor, frio, seco, impessoal, burocrático, desumano (**):

"Nº 604830.  Renovando condolências solicito V Exa informar-nos via telegrama máxima urgência se deseja transladação militar falecido por conta Estado caso afirmativo caberá V Exa adquirir local para depósito corpo indicando cemitério destino segue ofício elucidativo. Comando Depósito Gerak Adidos Lisboa"



Fotos (e legendas): © Jaime Bonifácio Marques da Silva  (2025). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné].


3. O Jaime Bonifácio Marques da Silva já aqui reconstituiu os trâmites burocráticos da morte, incluindo a comunicação da morte (ou do desaparecimento)  de um militar,  durante a sua Comissão no Ultramar (*):

O comandante da unidade ou subunidade a que pertencia o militar em questão, comnunicava  via rádio as circunstâncias da ocorrência ao superior hierárquico; por sua vez, encaminhava o "assunto" para o departamento responsável, o Depósito Geral de Adidos (DGA), na Ajuda, em Lisboa:

A partir desse momento todas as formalidades eram da competência do DGA, a quem incumbia:

(i) informar todos os departamentos governamentais e das Forças Armadas com responsabilidades na condução da guerra;

(ii) enviar um "telegrama à família", via CTT, a dar a notícia ("nunca as Forças Armadas de Portugal enfrentaram diretamente as famílias para lhes darem essa notícia, escudaram-se nos carteiros, mas isso é outra história!");

(iii) realizar o funeral na respetiva Província onde ocorreu o acidente (por vezes, sobretudo nos primeiros anos da guerra, os militares eram sepultados nos cemitérios locais);

(iv)  mandar transladar o caixão chumbado com o corpo do militar para Portugal e realizar o funeral no cemitério da sua freguesia (até 1968 as famílias dos militares tinham que pagar ao Estado as despesas da transladação);

(v) tratar de enviar à família a mala com o seu espólio (quase sempre, era o melhor amigo que realizava esta "operação"); e,

(vi) tratar da documentação a enviar à família para que esta pudesse receber a "pensão de de preço de sangue", quando tinha direito (nem todas as famílias, apesar da morte dos filhos no Ultramar, tiveram direito a essa "pensão").

Em relação ao telegrama enviado aos pais do Arsénio Marques Bonifácio Marques da Silva, seu primo duplo (os pais de um e outro eram irmãos), a irmã mais nova do Jaime, então com 18 anos em 1972, a Esmeralda, disse-nos que foi ela quem recebeu o telegrama diretamente da mão do carteiro, na via pública, à porta do estabelecimento dos tios, no lugar do Seixal, Lourinhã.  O carteiro nem sequer entrou no estabelecimento, evitando desse modo o "odioso" de ser o mensageiro da desgraçada, numa terra em que toda a gente se conhecia.
________________


(**) Último poste da série > 8 de julho de 2025 > Guiné 61/74 - P26994: S(C)em Comentários (73): Filhos do vento, náufragos do império: e tudo o vento levou... (Domingos Robalo / Luís Graça)

11 comentários:

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Infelizmente o Exército (neste caso, o Depósito Geral de Adidos, na Ajuda, em Lisboa) não tinham equipas especializadas (incluindo psicólogo) para dar, pessoalmente, em primeira mão, à família, a dolorosa notícia da morte (ou desaparecimento) de um militar. A mensagem chegava em três ou quatro linhas de um telegrama entregue por um pobre de um carteiro (ou "boletineiro", em muitas aldeias do Portugal dos anos 60/70).

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Trágica ironia... Nessa época os pobres não recebiam telegramas, a não ser estes, a dizer que o filho tinha morrido em África..

Eduardo Estrela disse...

" infelizmente o exército não tinha equipas especializadas"

Não Luís!!
Não tinham porque não queriam!!!!!
Fomos e somos carne para canhão, antes e agora e tudo em defesa da pátria dos cabedais da CUF e outros mais .
A pátria somos somos todos nós e o chão de nos viu abrir os olhos, mas uns quantos exploram e agrilhoam os restantes
Grande abraço
Eduardo Estrela

João Carlos Abreu dos Santos disse...

1.- o sobrenome do militar n/m 17217572 foi deficientemente grafado na comunicação nº 602787 do DGA supra reproduzida: é Vieira Martinho, induzindo sucessivos lapsos em pessoas desinformadas (mas... interessadas em divulgar leituras enviesadas).

2.- no 2º caso o nome do militar n/m 01849372 é Arsénio Bonifácio Marques da Silva (primo direito do mencionado PQ).

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Agradece-se o reparo em relação ao apelido do nosso camarada João Carlos Vieira Martinho, e não Oliveira Martinho... No poste P19824, a primeira vez que o seu nome apareceu no nosso blogue, estava correto. Aqui ficam as nossas desculpas, aos leitores e à família.

25 de maio de 2019 > Guiné 61/74 - P19824: Efemérides (302): Faz hoje 46 anos que morreu, na sequência de ferimentos em combate (, um estilhaço de RPG 7, ) o fur mil cav João Carlos Vieira Martinho, do EREC 8740/73, sediado em Bula... Era meu amigo e vizinho do Sobreiro Curvo, A dos Cunhados,Torres Vedras, e eu fui o último dos seus conhecidos a vê-lo, ainda com vida, mas já em coma profundo, no HM 241, em Bissau (Eduardo Jorge Ferreira, ex-alf mil da Polícia Aérea, BA 12, Bissalanca, jan 1973 / set 1974)

Tabanca Grande Luís Graça disse...

O João Carlos Vieira Martinho faz parte da toponímia da sua terra (vizinha da Lourinhã):

Largo João Carlos Vieira Martinho
Sobreiro Curvo, A-dos-Cunhados
2560-048 Torres Vedras

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Quanto ao segundo caso, não tem razão o nosso leitor, o nome correto é mesmo Arsénio Marques Bonifácio da Silva, por sinal primo direito, duplo (os pais de ambos eram irmãos) do autor do livro "Não esquecemos...", o Jaime Bonifácio Marques da Silva (ex-alf mil pqdt, BCP 21, Angola, 1970/72).

Marques é apelido materno, Bonifácio é apelido paterno...

Arsénio Marques Bonifácio da Silva é o nome que consta do livro "Não esquecemos..." (pp. 149/154), da certidão do registo civil, da certidão de óbito, do processo individual...

O nome vem errado (Arsénio Bonifácio Marques da Silva, em vez de Arsénio Marques Bonifácio da Silva...) é na base do monumento da Lourinhã, erigido em 2005, aos mortos do concelho bem como na listagem dos Mortos da Guerra do Ultramar do Concelho da Lourinhã, do portal UTW (Dos Veteranos da Guerra do Ultramar).

Esta chamada de atenção para este pequeno lapso não nos impede de reconhecer que é um magnífico, gigantesco, generoso e escrupuloso trabalho, aquele que foi feito pela equipa do portal UTW, de resgate da memória dos nossos camaradas que morreram nos vários teatros de operações, um verdadeiro serviço público que saudamos sem quaisquer reservas.

Um erro, um lapso, uma gralha... não invalidam o esforço que todos nós, nas redes sociais, fazemos, diariamente, para exercer o nosso direito e o nosso dever de memória... Sem enviesamentos, sem ressentimentos.

23 de junho de 2025 > Guiné 61/74 - P26949: Notas de leitura (1811): O livro do Jaime Bonifácio Marques da Silva, "Não esquecemos os jovens militares do concelho da Lourinhã mortos na guerra colonial" (2025) (235 pp.) - Parte I: apresentação de Luís Graça

Tabanca Grande Luís Graça disse...

O que consta do livro do Jaime (pp149 e ss.) (excertos sem foto):

8. ARSÉNIO MARQUES
BONIFÁCIO DA SILVA

Localidade do falecimento - ANGOLA
Soldado atirador infantaria nº 018493/72
Naturalidade - Caldas da Rainha
Local da sepultura - Cemitério da Lourinhã
_____
(17.10.1951- 04.09.1972)

1. REGISTO DE NASCIMENTO
Arsénio Marques Bonifácio da Silva nasceu às 12.00 horas e 15 minutos do dia 17 de outubro de 1951, na Freguesia e Concelho de Caldas da Rainha. Filho de Arsénio Bonifácio, de 32 anos de idade, casado, natural da Freguesia e Concelho de Lourinhã e de Felicidade Marques da Conceição, de 27 anos de idade, casada, ambos naturais da Freguesia e Concelho de Lourinhã e residentes no Casal da Boa Vista nas Caldas da Rainha. Neto paterno de António Bonifácio e Elvira Eugénia da Silva e materno de José Marques e Vitória da Fonseca. Registo de nascimento nº840 da Conservatória das Caldas da Rainha. (...)(pág. 149)

(...)Certidão de óbito: Da certidão, passada pela 3ª Conservatória do Registo
Civil de Lunda, da Província de Angola, consta que no dia 4 de setembro de 1972 às 03H45, no Hospital Militar de Luanda faleceu de um Edema agudo e Embolia pulmonar – Arsénio Marques Bonifácio da Silva, de vinte e um anos de idade, natural da Freguesia e Concelho de Lourinhã.(...) (pág. 152).

O Jaime (que está agora no Porto) prometeu-nos esclarecer melhor este assunto amanhã quando chegar à Lourinhã...

João Carlos Abreu dos Santos disse...

... «na listagem dos Mortos da Guerra do Ultramar [...] (Dos Veteranos da Guerra do Ultramar)» - de minha autoria e responsabilidade -, 'de facto' o nome inscrito é «Arsénio Bonifácio Marques da Silva» e bem assim consta na Lápide nº 129 - do Memorial Nacional 'Aos Combatentes do Ultramar' solenemente descerrado na manhã de 05Fev2000 -, o nome gravado em pedra lioz é «Arsénio Bonifácio Marques da Silva»; mau grado imprecisões que constam a págs.490 do Vol.8-I-2 da RHMCA e em assentos de nascimento, supra reproduzidos por v/excertos de livro publicado por s/primo PQ, os quais contêm inconsistências, a saber:
a) [...] «nasceu na Freguesia e Concelho de Caldas da Rainha. Filho de Arsénio Bonifácio» [...] «e de Felicidade Marques da Conceição» [...] cfr «Registo de nascimento nº840 da Conservatória das Caldas da Rainha».
b) mas cfr «3ª Conservatória do Registo Civil de Lu[a]nda» [...] «natural da Freguesia e Concelho de Lourinhã».
Assim sendo, aguardemos devidas quanto necessárias clarificações.

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Obrigado, esperamos pelo autor para poder esclarecer alguns dúvidas relativas aos registos do nosso infortunado camarada da Areia Branca, José Henriques Mateus... que por outro lado é dado como "analfabeto", mas frequentou, com o Jaime Silva (dois anos mais novo), a escola primária do Seixal, e que no CTIG tinha pelo menos uma madrinha de guerra com quem se correspondia.

João Carlos Abreu dos Santos disse...

Remeto à consideração a seguinte adenda ao p27000:

Desambiguação, sobre Arsénio Bonifácio Marques da Silva: nascido às 12:15 de 17Out1951 no Seixal, freguesia e concelho da Lourinhã, filho de Felicidade Marques e de Arsénio Bonifácio da Silva.
Para melhor entendimento, sendo inequicovamente: "Arsénio" nome pessoal herdado do progenitor, "Bonifácio" nome de família, "Marques" sobrenome da senhora sua mãe e "da Silva" sobrenome do senhor seu pai.
Relativamente ao Lapidário Nominal em mármore lioz - complementar ao Monumento Nacional de homenagem "Aos Combatentes do Ultranar" -, em Set1999 finalizado no exterior do Forte do Bom Sucesso e em 05Fev2000 inaugurado: o nome Arsénio Bonifácio Marques da Silva, pode ser lido no final da 130ª placa (não na 129ª que por lapso mencionei), gravado Arsénio Bonifácio Silva.