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sábado, 12 de julho de 2025

Guiné 61/74 - P27008: S(C)em Comentários (75): Filhos de tuga ?!... Muito bem, serão "centenas, serão milhares", diz a Catarina Gomes... "Restos de tuga", diria a "Maria Turra", com sarcasmo, crueldade, desumanidade e racismo... E então os "filhos da guerra" de pais cabo-verdianos, guineenses, angolanos, moçambicanos, e quiçá goeses, macaenses e timorenses ? E os "filhos de Amílcar Cabral" ? E os filhos dos "combatentes da liberdade da Pátria" ? E os "filhos dos cubanos" ?... São "restos... de quê" ? ...Parece aqui haver também alguma ingenuidade...





Guiné > Região de Tombali > Guileje > CART 1613 (1967/68) > O Dauda "Viegas", "filho do vento" e "mascote da companhia"... Cresceu, casou, teve duas filhas, vivia  em Bissau, morreu por volta de 2009, com cerca de 45 anos... Em miúdo, em 1967/68,  vivia em Guileje praticamente com os militares, que o alimentavam e cuidavam dele... Dizia-se, na caserna, que era a cara chapada do pai.

Foto do album do nosso saudoso capitão José Neto, ex-cap SGE (1929-2007).

Foto (e legenda): © José Neto (2005). Todos os direitos reservados, [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Quantos filhos, de mulheres angolanas, guineenses e moçambicanos, e de soldados portugueses, "ficaram para trás" ? É uma pergunta dolorosa, mas tem que ser feita... Ou noutros termos: quantos "filhos de tuga" ficaram sem pai ?

Não gosto da expressão "filhos de tuga"... Nem muito menos da expressão profundamente cruel, desumana, racista, usada pelo PAIGC, "restos de tuga"...

Também não gosto da expressão "filhos do vento", da autoria do meu amigo e camarada José Saúde... 

Vejamos: Portugal mobilizou cerca de 800 mil homens para os teatros de operações da guerra colonial. Mas desses 30% eram soldados do recrutamento local, que também deixaram filhos nos sítios por onde passaram... Todos eles, brancos e negros, tinham capacidade de procriar...

Sendo africanos, mas deslocados, os eventuais filhos dos nossos camaradas oriundos de Angola, Guiné e Moçambique também seriam "mestiços" (termo genérico e mais "neutro"  para designar pessoas com ascendência de duas ou mais etnias diferentes) ... 

Mas não  teriam, tal como os filhos de portugueses da metrópole, traços do fenótipo caucasiano... Logo, seriam mais fáceis de passar "despercebidos" nas suas comunidades...  E não seriam tão facilmente vítimas de discriminação, perseguição e "bullying", com base na "cor da pele", tal como os "filhos de tuga"...

Enfim, é bom não esquecer esta realidade, complexa e sensível, da mestiçagem (filhos de um branco e de uma negra, filhos de negros de diferentes territórios e etnias, filhos de brancos e de mestiços filhos de mestiços e mestiços)...que vem complicar as nossas contas, a nossa abordagem do problema e sobretudo a procura de soluções para este "drama social" criado pela guerra...

Mas também serve para "desmistificar" muita coisa... Há filhos da guerra de pais portugueses, cabo-verdianos, guineenses, angolanos, moçambicanos, goeses, macaenses, timorenses...

Por que razão  é que falamos "apenas" dos "fidjus di tuga" ?

Os americanos também tiveram esse problema... Chamaram a esses filhos bastardos da guerra "amerasians", amerasianos, "G.I. Babies" e outros "mimos", filhos de soldados americanos, brancos e agro-americanos,  e de mulheres vietnamitas, mas também cambojanas, laocianas, coreanas, tailandesas... Parte desses soldados eram de origem afro-americana (sobrerrepresentados no seio dos G.I., a "tropa-macaca" norte-americana) ... Os seus filhos teriam um fenótipo diferente...

Cabo Verde, que não conheceu a guerra, também deu homens para a guerra. Tal como Macau. E provavelmente São Tomé e Príncipe. Sem esquecer Goa, Damão e Diu, que só foi ocupada pela Índia, em finais de 1961.

Com toda a certeza, ou com base na lei das probabilidades, os 30 % de militares que integraram o "exército colonial", os guineenses, os angolanos e os moçambicanos , também espalharam alegremente o seu ADN por aquelas terras. Muitas das relações com mulheres locais, mesmo consentidas ( o que provavelmente terá sido o caso, mesmo que "assimétricas", do ponto de vista do poder) eram desprotegidas... Ainda não havia o HIV / SIDA e pensava-se que a "bala mágica", a penicilina, curava tudo (as doenças sexualmente transmissíveis).

E os cubanos que fizeram a a guerra da Guiné ? E combateram, a partir de 1975, em Angola ? E os "combatentes da liberdade da Pátria" ? Enfim, os " filhos de Amílcar Cabral"... são restos de quê...? A pergunta não ofende...Todos tinham, afinal, uma moral, "revolucionária", uns , "reacionária", outros...


2. Em Portugal (mas também em Angola, Guiné e Moçambique) nunca saberemos responder à questão: " Quantos foram, ou ainda são, os filhos dos militares portugueses, metropolitanos e do recrutamento local, que ficaram para trás ?"...

Catarina Gomes, que tem feito jornalismo de investigação nesta área (tem livros e um documentário, a passar na RTP, "Filhos de Tuga"), diz que não sabe: fala numas centenas, que podem ser uns milhares... 

A associação guineense "Fidju di Tuga" tem 50 membros

A Embaixada Portuguesa em Bissau nunca fez, ao que saibamos, nenhum levantamento de pessoas (hoje na casa dos 50/60 anos) com eventual origem portuguesa, filhos de militares portugueses, que passaram pela Guiné, entre 1961 e 1974... Tem nunca saberemos os que já morreram, como o Dauda, ou  foram vítimas de infanticídio.

Acho que temos que voltar à "guerra do Vietname", revisitar o drama dos "children of the dust", os "amerasians", cujo númeo se estima em 25 mil / 50 mil... 

(Continua)

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 Nota do editor LG. : 

2 comentários:

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Macaenses ?!... Sim, também os havia na Guiné, integrados na nossa tropa... Afinal, eram portugueses como eu... Encontrei um, em Bambadinca, que adorava comer "bebés" de macaco-cão, grelhados na brasa...Não os deixava para o "jagudi"...Quem somos, afinal, para julgar os outros ?!...

Tabanca Grande Luís Graça disse...

... Naturalmente, se feridos ou acabados de morrer. Os bebés.