AS COLÓNIAS PORTUGUESAS ANTES DA GUERRA (3)
GUINÉ E CABO VERDE
A descoberta da Guiné aconteceu em 1446 por Nuno Tristão, morto pelos habitantes que sempre deram luta renhida à presença dos portugueses.
Tem uma superfície de 36.125 Km, cerca de um terço da de Portugal.
A penetração e a exploração começaram a partir das Ilhas de Cabo Verde e as primeiras operações de comércio de escravos realizou-se através de cabo-verdianos que iniciaram, talvez assim o seu estabelecimento no território, evidentemente, porque Cabo Verde havia sido objecto de povoamento anterior ao início do da Guiné.
No século XVII havia já alguns centros de europeus no litoral, sempre em luta com os africanos.
Os ingleses que vinham cobiçando os resultados dos portugueses através de cabo-verdianos, quiseram apossar-se da Guiné, chegando a instalar-se na Ilha de Bolama de onde saíram em 1879, por arbitragem do Presidente americano Ulisses Grant.
Como exemplo da luta que as populações locais sempre deram à presença dos europeus, a etnia Papel só foi submetida em 1916.
É um território quase plano com poucas e pequenas elevações mas com uma rede hidrográfica intensa e complexa, cruzado por rios, canais, zonas alagadas e tarrafo.
Não possui as riquezas das outras colónias portuguesas, nem em variedade nem em quantidade, ainda assim, com alguns recursos suficintemente importantes para atraírem grupos capitalistas portugueses, americanos, holandeses e mesmo japoneses.
Arroz, oleaginosas, madeiras de boa qualidade, são alguns dos produtos em exploração.
A pesquisa e a concessão de petróleo foi entregue a americanos e a bauxite a um grupo holandês.
NOTAS FINAIS
EXPLORAÇÃO DO TRABALHO E DAS RIQUEZAS
A característica principal do capitalismo internacional que intervém num processo colonial, é sem dúvida, a exploração das riquezas existentes, aliada à exploração da força de trabalho local, com maior ou menor formação técnica e profissional, conforme a política e o desenvolvimento económico do País colonizador, neste caso, Portugal, o mais atrasado de todos os seus vizinhos europeus como já se disse e nem carece de grandes provas confirmá-lo, uma mão de obra africana e mesmo branca de fraca ou nenhuma formação técnica.
Acresce e agrava esta situação nas colónias portuguesas, o facto da existência de uma sociedade fortemente dividida e marcada em termos de hierarquização social, tendo à cabeça os técnicos e administradores coloniais enviados de Lisboa e os quadros técnicos e gestores das grandes sociedades e companhias monopolistas nacionais e estrangeiros; em segundo lugar os chamados “brancos de segunda”, portugueses já nascidos nos territórios africanos, exploradores de pequenas roças ou postos comerciais na costa ou no interior, e trabalhadores indiscriminados actuando no comércio, nos transportes, na construção civil, etc.; mais abaixo na escala os mestiços que trabalhavam nos escritórios da Administração Pública ou privada e empregados de comércio; depois ainda os negros assimilados, já possuidores de BI de cidadão português; finalmente os indígenas sem quaisquer direitos excepto o de prestar trabalho barato e obrigatório, às claras ou mais ou menos mascaradamente.
Desse modo, o topo vivia da exploração do esforço branco de segunda, este do terceiro , quarto e quinto escalões, a par da exploração brutal de todos pelas grandes empresas monopolistas na área da agricultura e das minas, sobretudo.
MONOPÓLIO COMERCIAL E EXPORTAÇÃO DE CAPITAIS
Outro direito de que se arroga o capital internacional no caso colonial para vender os seu produtos a preços e com lucros superiores às cotações mundiais, e para se apropriarem das matérias primas a preços inferiores ao custo, é o do privilégio de monopólio comercial.
Caem neste caso os produtos minerais, o café, o chá, o açúcar, as oleaginosas, o arroz, a madeira, etc., das explorações e exportações dos territórios africanos para o exterior, e do de outros produtos do exterior para África, como o aço, máquinas e utensílios, viaturas automóveis, que, devido ao atraso económico de Lisboa, são colocados pelo capital exterior, deixando a Portugal apenas alguns produtos difíceis de colocar no mercado internacional, como os tecidos de algodão e o vinho.
Não me parece de grande necessidade demonstrar que a prática do colonialismo, seja ele qual for, é o da exportação das mai- valias e dos lucros, quer através dos produtos estratégicos, quer dos capitais gerados.
Vale a pena, por exemplo, comparar aqui os dividendos distribuídos aos accionistas das sociedades anónimas com sede em Portugal, quer na parte do capital monopolista nacional, quer na parte do capital imperialista internacional, no ano de 1956.
Em Portugal…………….9,87%
Nas Colónias………….19,95%
Estes números parecem bastar para entender o que se diz acima, sobretudo se comparássemos as produtividades do trabalho no Continente e nas Colónias, bastante mais baixo este, apesar do atraso de toda a economia portuguesa em relação à das outras potências coloniais.
INVESTIMENTO
Tornar-se-ia fastidioso aprofundar aqui a importância do capital financeiro actuando nas Colónias, o carácter primitivo da economia, e o auto-financiamento, mas ainda assim, pelo seu significado, abordar a questão do investimento público, realizado quase sempre às custas do individamento externo e para colocar ao serviço das grandes sociedades anónimas e companhias concessionárias monopolistas, praticamente de borla.
De facto, as obras realizadas nessas operações, têm pouco a ver com as necessidades do território, face ao seu estágio de desenvolvimento, mas mais com as necessidades das grandes empresas colocadas no terreno.
São obras na área dos transportes internos, nos portos, na hidroeléctrica e na prospecção geológica, postos depois ao serviço do capital monopolista, na verdade sem retribuição e pesando na parte dos custos financeiros do Orçamento de Estado durante anos, em juros e amortizações.
CONCENTRAÇÃO DE CAPITAIS
Outra das características coloniais de Portugal é a enorme concentração dos capitais em presença em África, praticamente em meia dúzia de trusts internacionais, directamente, através de participações em bancos portugueses ou através da proliferação de empresas pertencentes de facto aos mesmos grupos de capitais internacionais, quase sempre aliados na criação de grandes conglomerados que actuavam nas Colónias portuguesas, no Katanga, na Rodésia e na África do Sul, capitais americanos, belgas, ingleses, franceses e alemães, algumas vezes suecos e dinamarqueses e até, como num caso na Guiné, japoneses.
Conclusão (apressada)
Aqui chegados, embora fique muito aquém do que poderia, parece-me dispensável continuar este trabalho porque:
1.º - O que se inclui é mais do que suficiente para provar o que afirmei no comentário ao poema do camarada Juvenal Amado, isto é, os interesses que se defendiam nas colónias portuguesas no início e durante a guerra colonial, eram estrangeiros, de capital financeiro, colonialistas e imperialistas, nos objectivos e práticas de exploração da mão de obra barata e do saque de matérias primas estratégicas e altamente lucrativas, bem como de alguns grupos portugueses da mesma natureza e objectivos, nomeadamente a CUF, o BNU e o BES, e ainda um pouco o Banco Burnay, tudo agravado pela circunstância do não aproveitamento de mais valias e lucros no desenvolvimento de Portugal Continental, pelo seu estágio de potência colonial profundamente atrasada, e pela natureza do seu regime político dos últimos 50 anos;
2.º nem ser objectivo deste trabalho aprofundar história, provas e elementos mais alargados e ainda que fosse, não me bastarem as ferramentas que pessoalmente possuo;
3.º apesar do gozo que me deu pesquisar e juntar elementos, estar isto a tornar-se uma espécie de gozo masoquista, já farto de estar aqui enrolado no sofá, na recuperação cardíaca, trabalhando como mouro e em más condições, com papelada espalhada à minha volta.
Não abandonarei a tarefa, porém, sem referir, ainda que escassamente, os grupos portugueses em presença significativa a à altura dos grupos exteriores, a CUF, na Guiné através da sua filial, a casa Gouveia) por vias várias, e nas outras colónias, em muitos outros e importantes sectores, em especial pela via financeira, intervindo associado no sector mineiro, na agricultura, nos transportes, o BES, o Banco Burnay, peão às ordens de capitais belgas (e americanos através destes) e franceses e o Banco Nacional Ultramarino, sempre como grupos monopolistas.
José Brás
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Notas:
(1) Gulf Oil Company, de Delaware, dominada pelo magnata Mellon, “rei dos alumínios”
(2) Societé General de la Belgique, trust financeiro criado em 1906 por Leopoldo II, com 65 filiais espalhadas pelas colónias portuguesas, Katanga e Tanganica nas mais variadas actividades, dos minérios aos caminhos de ferro,em algumas associada ao Banque L’Union Parisienne e com com Banco Burnay, sua ponta de lança na África portuguesa
(3) Anglo-American Corporation of South África, trust formado numa aliança de capitais americanos do Banco Morgan, do grupo inglês Opepnheimer. Os magnatas americanos Guggnheim, “rei do estanho” e Thomas F. Ryan, a companhia dos diamantes belgo-americana Forminière e a Sociedade Anglo-Belga Union Minière du Haut Katanga, associaram-se na Diamang
(4) Tanganika Concessions, fundada em 1899 por Cecil Rhodes por encargo da British Soud África Co. (família Oppenheimer) para explorar o urânio, o cobre e outros minerais
(5) British South África Company da família Openheimer
(6) African Consolidating Investments Corporation de capital americano do milionário Schelsinger que reside na África do Sul e preside a 107 sociedades.
(7) T.D. Horning com sede em Londres com várias filiais, como a Refinaria Colonial, em Lisboa; a Companhia do Comércio de Moçambique; a Sociedade de Chá Oriental; a Sociedade Agrícola de Malange (Angola) e controla a Agência Colonial de Moçambique, a Agência Comercial e Marítima e a Sociedade Industrial do Ultramar
(8) Franley, Bobone and Co + Hambro’s Bank com capitais ingleses e dinamarqueses que controla a Sociedade Agrícola do Madal, fundada em 1904 pelo Príncipe do Mónaco
(9) Lever Brothers & Unilever, trust inglês com estabelecimentos em Bissau, Bafatá, Bolama, Farim, Binta, Olossato e Bissoram.
Referências:
- Cester Bowles, “África, Challenge to América”
- William Top, “O Valor do Trabalho dos Assalariados Africanos”
- George Boulanger, “O Trabalhador Africano”
- Edition du Seuil ,Presence Africaine, “Le travail en afrique noire”
- Cunha Leal, “Incrível Sonefe” empresa algodoeira de Benguela, 1958
- - Boletim da Associação Industrial de Angola
- Statistical Year Book ONU
- Boletim Estatístico de Angola
- Armando Castro, “O Sistema Colonial Português (meados do século XX)”, 1962
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Nota de CV:
Vd. postes da série de:
27 de Dezembro de 2011 Guiné 63/74 - P9278: (Ex)citações (167): As colónias portuguesas antes da Guerra (1): Introdução e Angola (José Brás)
e
28 de Dezembro de 2011 > Guiné 63/74 - P9282: (Ex)citações (169): As colónias portuguesas antes da Guerra (2): Moçambique (José Brás)