quinta-feira, 21 de novembro de 2013

Guiné 63/74 - P12320: In Memoriam (171): Alferes Miliciano Adelino da Costa Duarte do 3.º Pelotão/CCAÇ 1416/BCAÇ 1856, morto em combate no dia 22 de Novembro de 1965 (Manuel Luís Lomba)

1. Mensagem do nosso camarada do nosso camarada Manuel Luís Lomba (ex-Fur Mil da CCAV 703/BCAV 705, Bissau, Cufar e Buruntuma, 1964/66), com data de 9 de Novembro de 2013:

Prezado Amigo e camarada de armas Carlos Vinhal,
Vivi a ocorrência da morte do alferes Adelino, a leitura do livro Uma Campanha na Guiné, do Manuel Domingues, trouxe-me a sua lembrança e a efeméride da data levou-me a escrever esta narrativa, a evocar o acontecimento e o seu contexto, para editar, se lhe reconhecer mérito. 

Receba um abração, extensivo à malta que dá vida ao blogue
Manuel Luís Lomba


In Memoriam, 48 anos depois...

Alferes Miliciano Adelino da Costa Duarte

A vigília do alferes miliciano Adelino da Costa Duarte à sua própria morte em combate, comandante do 3.º Pelotão, da CCaç 1416, destacada em Nova Lamego, de reforço operacional ao BCav 705, na noite de 21 de Novembro de 1965.

A CCav 703 nomadizava há dois meses em Cufar e, naquele domingo, pelas 22H00, a voz troante de Manuel Alegre, vate da Trova do Vento Que Passa, então locutor da Rádio Portugal Livre, de Argel, anunciou que o seu amigo Amílcar Cabral acabava de abrir a Frente Leste da guerra da Guiné, que os famigerados barbudos de Cuba vinham reforçar o PAIGC e regozijava com a expectativa da derrota dos seus camaradas de armas, em sofrido cumprimento do seu dever na então Província Ultramarina portuguesa.

Depois dos 63 dias dessa nomadização em Cufar, fomos dar com os costados a Buba, via Bissau, e andávamos a passar as penas do inferno de ferro e fogo por Nhala e Incassol (o camarigo João Parreira, dos Comandos Os Fantasmas, recebeu um estilhaço de RPG, próximo de mim), quando a nossa intervenção foi abreviada, para regressamos apressadamente ao Forte da Amura, em prenúncio de algo de novo. A alvorada do dia seguinte aconteceu sem toque de clarim, para não perturbar o sono à Companhia de Polícia Militar 590 nossa vizinha e, cansados, estremunhados e sem outra bagagem, senão armamento e munições, atravessamos a Bissau adormecida, com destino à Base Aérea de Bissalanca, e os Dakota iniciaram uma ponte aérea, a colocarem-nos de emergência em Nova Lamego, capital do Leste da Guiné, com a companhia do próprio Comandante-Chefe, brigadeiro Arnaldo Schulz, logo no primeiro. Distribuíram-nos de imediato, a nível de secção, pelas pequenas tabancas de Pinto da Silva, Cheche, e Camajabá, nas missões de tampão às já então sacrificadas guarnições de Canquelifá, Madina do Boé e Buruntuma.

Iniciamos então o contacto com um território diferente, desarborizado, descampado e também despovoado, pelo trabalho do Vitorino Costa, um dos primeiros comandantes do PAIGC, que não obstante ter recorrido aos requintes de malvadez terrorista, não conseguirá nem escorraçar nem esmorecer a fidelidade das populações fulas a Portugal. Em contraste com o Oio e o Cantanhês, o Gabu era um campo de batalha aberto, que na altura não era exclusivo da malta do PAIGC, porque os Paraquedistas da República da Guiné, da base fronteiriça de Kandica, começaram por lhe proteger a retaguarda e depois associaram-se-lhe ao fogacho contra nós, bazofiadores, a ostentar as suas vistosas boinas vermelhas. Obrigámo-los a vazar “no gosse-gosse”, logo ao segundo contacto e nem todos regressaram à base da partida. Após um ano a guerrear o PAIGC por aqui, ali e acolá, foram esses combates na savana do Gabu que nos fizeram sentir como verdadeiros soldados portugueses de sempre.

A CCav 703 foi destinada à quadrícula em Buruntuma, em plena época das chuvas e a nossa decadência física agravou-se, como pacientes do paludismo, combatido com doses cavalares de comprimidos “Camoquin”. A febre foi debelada, mas eu entre outros, dos quais apenas o Cabo Pedrosa me acode à memória, perdemos as forças, ficamos esqueléticos e dobrados a meio, a movimentarmo-nos arrimados a paus, à laia de bengala, tal o grau da nossa debilidade, dizia-se que em consequência do plasmódio inoculado pelo mosquito anopheles se nos ter alojado nos rins. Buruntuma era como que um labirinto e o capitão Lacerda não dispensava a quem restasse força para puxar o gatilho, no entanto, graças ao alferes médico Dr. Sequeira, condescendeu em mandar passar-nos a guia de marcha para a sede do Batalhão, em Nova Lamego, em demanda do tratamento especializado, ministrado no posto médico da Circunscrição, com valências em paludismo e na doença do sono, criação do Dr. Maurício, lendário missionário da Saúde no chão da Guiné.

Buruntuma

Foto: © Luís Guerreiro (2012). Todos os direitos reservados

Fomos encontrar a CCaç 1416 adida ao nosso Batalhão, como subunidade de intervenção do Sector, que se revelou malta fixe, descontraída e miliciana (a começar pelo seu capitão, Jorge Monteiro), em contraste com os tiques ou complexos elitistas da Cavalaria. Com o tratamento endovenoso as pernas pareciam peadas, o manquejar agravou-se e aqueles camaradas não regateavam o apoio à decrepitude deste mais velho. E uma tarde fui com alguns para o já conhecido bar dum casal libanês, na rua principal da capital do Gabu, que tinha um anúncio escrito a giz, sobre uma padieira: temus bebida gelado. Preferi o verde branco Gatão, de Amarante, à cerveja Sagres, de Lisboa; mal terminara o “desabafo” com a garrafa e já as sequelas me compulsavam para a posição horizontal, fui esticar-me na tarimba e perdi a visão - dei comigo totalmente cego e angustiado.

Um enfermeiro acudiu-me e dialogamos, à moda da caserna:
- “Quantas loirinhas emborcaste?”
- “Nenhuma; perdi-me com coisa melhor, uma bajuda de verde branco!” (o verde branco daquele tempo era loiro).
- “ Oh desgraçado, durante este tratamento só podes beber água e muita! Se te apetece líquido loiro, bebe mijo!”

E da abstinência resultou o regresso da visão.

Os paraquedistas guineanos desapareceram do chão do Gabu, mas a malta do PAIGC mais crescia e se multiplicava, por obra e graça dos cubanos. Naquele tempo, o Senegal dificultava-lhe a circulação de armamento e munições pelo seu território; os seus camiões de reabastecimento às frentes Leste e Norte partiam do Boké, estrada fora por Kondara, Sareboido e Kandica, no estrangeiro, passavam ao largo de Buruntuma, a carga era baldeada para carregadores, além Catabá, que atravessavam o Piai, pequeno rio fronteiriço, para se embrenharem, fortemente escoltados, no sentido de Canquelifá, eleita como central à sua guerra da Frente Leste. A informação da passagem duma dessas colunas chegara ao comando do BCav 705 e o então Major Ricardo Durão aprontou-lhes a Operação Gerês.

Naquele noite de 21 de Novembro a malta foi reunir-se ao convívio de copos, do “abafa” e da “lerpa” nas instalações de aboletamento da 1416, paredes meias com o Posto Administrativo. Encontramos o alferes Adelino no topo daquela mesa corrida, defronte ao gravador, numa atitude de ausência e que continuará alheado daquele ambiente ruidoso, peculiar às casernas. E surgiu o primeiro-sargento, como mensageiro:
- Saída operacional da 1416, pelas 5H00 da manhã; regresso dos convalescentes da 703 a Buruntuma, na volta da escolta que partiria de lá.

O alferes Adelino reagiu alvoroçado, mas sem qualquer afectação na voz, a dizer:
- “Hoje é o meu fim!”

Premiu o botão e o gravador começou a desbobinar a música “Il Silenzio”, orquestrada não sei por quem de apelido Rossi - o disco mais pedido pelos militares à então Emissora Provincial da Guiné Portuguesa. E seguida, sem interrupção. A melodia e o virtuosismo do trompetista começaram a mexer-nos com a alma, a fazer-nos pele de galinha, mas fomo-la suportando, enquanto compensava o rom-rom do motor do electro-gerador, ali ao lado. À meia-noite desligaram-no e então pedimos-lhe para baixar o som, mas ele respondeu:
- “Estou a fazer a minha despedida”.

Alguém começou a rezingar, um seu furriel foi pôr-lhe um braço sobre os ombros, a pedir-lhe para se ir deitar, descansar, e ouvimos a resposta:
- “Calma; dentro em pouco adormecerei para sempre”.

O alferes Adelino não calava O Silêncio, os palavrões e as picardias cessaram, a jogatina entrara na monotonia, o ambiente começou a assemelhar-se a velório, a comoção foi-se apoderando da turma, uma ou outra lágrima nalgum canto do olho, até que cada um se retirou para o seu canto, silenciosamente.

Il Silenzio, interpretado por Nini Rosso

Naquela madrugada de 22 de Novembro de 1965, a malta da 1416 saiu para o palco da Operação Gerês, algures entre Canquelifá e Buruntuma, o 3.º Pelotão a progredir em vanguarda, segundo a escala, e o alferes Adelino ao encontro do seu destino.

A escolta de Buruntuma chegou atrasada, com alguns feridos ligeiros e uns tantos combalidos: accionara uma mina anti-carro, perto de Ajango. Em Camajabá, o rádio-telegrafista informou-nos que havia desgraça com a 1416, pois escutara repetidos pedidos para a evacuação de feridos. Pela recorrência em minas e emboscadas, a partir dali entraríamos na nossa “estrada do Vietname”. Éramos passageiros, sem armas, e cuidamos de providenciar as “pastilhas”, para o inimigo que nos pusesse a mão nos acompanhasse na viagem para a eternidade: duas granadas, a meter nos bolsos superiores das fardas. A do lado esquerdo, bem sobre o coração, cavilha de segurança preparada - bastaria um ligeiro puxar da golpilha...

A escolta voltou a accionar outra mina anti-carro, nessa fatídica “estrada do Vietname”, houve mais projectados pelos ares, mais feridos ligeiros e mais combalidos. Causa da sorte, dada a ausência de casos de maior gravidade: a época das chuvas terminara, mas o terreno ainda estava muito mole. Chegados a Buruntuma, toda a malta nos veio dizer que a 1416 sofrera um morto - o alferes Adelino da Costa Duarte!

Localização da Picada Canquelifá-Buruntuma. Vd. Carta Província da Guiné - 1:500.000

Fora atingido num joelho, logo no primeiro momento do combate; falecerá 6 horas depois, pela demora na evacuação. Constou que terá manifestado ao furriel enfermeiro que o socorria o pedido de ser sepultado ao toque de O Silêncio. A morfina não o livrou do estado de choque e terá sucumbido à embolia que lhe sobreveio, eram 14H00 de 22 de Novembro de 1965.

A música Il Silenzio tornou-se referencial da infelicidade peculiar à condição de soldado. Na Guerra da Secessão, nos Estados Unidos, um capitão da União, após repelir uma tentativa de assalto às suas trincheiras, começou a ouvir gemidos, além do arame farpado. Correu grandes riscos e rastejou até ao ferido, arrastou-o mas chegou com ele morto ao acampamento, onde o reconheceu como o seu próprio filho, estudante de música no Sul, que se havia alistado nos Confederados, sem seu conhecimento. Pediu honras musicais para o seu funeral, que lhe foi indeferido, por se tratar de combatente do outro lado, mas autorizaram-no a escolher um músico; a sua escolha recaiu no melhor trompetista da banda marcial, ao qual pediu que tocasse as notas musicais da pauta encontrada no bolso do filho. Assim nasceu e foi pela primeira tocado O Silêncio, que muitos exércitos adoptaram para toque de finados. O Toque da chamada aos mortos em combate, adoptado pelo Exército Português, será menos melodioso, mas é muito comovedor, causa-nos calafrios e estremecimento.

A destemida e valente malta da 1416 entrou noutros combates de igual teor e acabará a comissão na quadrícula de Madina do Boé e Beli, em rendição à nossa CCav 702. Na tenda montada na “sua” colina, Amílcar Cabral ordenou a sua aniquilação, incumbindo essa missão ao capitão cubano Ulises Estrada, chefe dos internacionalistas cubanos, e a Domingos Ramos(1), então o melhor comandante do PAIGC, furriel miliciano desertor do Exército Português, que chegara a ser o porta-bandeira da então Bateria de Artilharia de Santa Luzia (antes de ser o QG de Bissau), o qual morrerá no combate que lhe oferecera a sacrificada Companhia 1416. Aquele ex-português da Guiné e nosso ex-camarada de armas era o comandante da Frente Leste - o primeiro responsável da morte do malogrado alferes Adelino da Costa Duarte.
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Notas do editor:

(1) - Vd. poste de 12 DE DEZEMBRO DE 2007 > Guiné 63/74 - P2343: PAIGC - Quem foi quem (5): Domingos Ramos (Mário Dias / Luís Graça)

Último poste da série de 19 de Novembro de 2013 > Guiné 63/74 - P12314: In Memoriam (170): O princípio do fim do Amigo e Camarada Sargento-Chefe Fernando dos Santos Rodrigues (2): A sua morte no dia 29 de Outubro de 2013 (Arménio Estorninho)

Guiné 63/74 - P12319: Manuscrito(s) (Luís Graça) (13): Três histórias ganguelas, três pérolas da sabedoria angolana... E onde se fala da atualidade dos Baratas, dos Cavetos e dos Heróis

1. Da Ilha de Luanda, com um Alfa Bravo fraterno para os nossos amigos e camaradas da Guiné que nos leem...

Como aqui  não há muito tempo para escrever para o blogue e a rede sem fios nem sempre é muito fiável, deixo-vos um texto que vou utilizar hoje, de manhã,  nas minhas aulas, sobre psicossociologia do trabalho e das organizações, no âmbito no 1º Curso de Especialização em Medicina do Trabalho, a decorrer em Angola (2013/15), na Clínica da Sagrada Esperança, Ilha de Luanda, Luanda, Angola...(E, a  propósito, sinal de como este país mexe é a quantidade de formadores, tugas e de formandos, angolanos, que estão aqui, esta semana... Gente da clínica e  fora da clínica, que pertence à Endiama, que estão aqui a receber formação nas mais diversas áreas, chegaram, na 4ª feira passada, aos 130, desde  médicos a bombeiros, dissseram-me no gabinete de formação).

Volto a penates, sábado, no avião da TAP que, por enquanto ainda é nosso, português... Não sei se terei coragem de voltar a viajar na TAP quando mais esta "joia da coroa" for alienada, como de há muito o acionista Estada promete ou ameaça... Já nos restam poucos consolos, a nós, tugas, quando vemos, nos tempos que correm, a delapidação do nosso património e a destruição de símbolos fortes da nossa identidade colectiva como é ainda a TAP, a  nossa companhia de bandeira...

E a propósito, gostei de ver a felicidade estampada no rosto  dos tugas de Luanda (e de muitos amigos angolanos), na sequência do apuramento da nossa seleção para o campeonato mundial de futebol, em 2014, no Brasil... Não embandeiro em arco com estas coisas das  proezas futebolísticas, nem sequer vi o jogo contra a Suécia, em direto, transmitido aqui num canal português da África do Sul... Ou melhor, vi no meu quarto o final... Mas vamos abrir hoje, ao almoço uma garrada de tinto Ermelinda,  reserva,  que trouxe do "free-shop" de Lisboa... Há pequenas coisas que têm um sabor especial, fora de casa, longe da Pátria, como por exemplo comer uns jaquinzinhos tugas com arroz malandro, a par de um saladinha de lagosta angolana,  e beber um copo de vinho branco tuga,  na ilha de Luanda, numa marisqueira tuga, muito conhecida, em cima da praia, mesmo em frente da clínica, numa roda de amigos, tugas e angolanos, ou de tugas e de angolanos tugas...

Não sei se estou a ficar velho e sentimental ou se isto não serão já pré-sintomnas da maldita doença do alemão que nos está a matar... Não imagino como outros corações se podem comportar, aqui ou no hemisfério norte... Estou-me a lembrar, por exemplo, do único lusolapão que conheço, o Zé Belo,casaod com uma sueco e com filhos nada tugas,  e para quem vai um xicoração apertado, onde quer que ele esteja, em Kiruna, Estocolmo ou Keywest (Florida). Estendo esse xicoração, comprido como o Rio Corubal  do nosso tempo (que era misterioso, selvagem e belo),  aos demais camaradas da Guiné, tugas e guineenses, espalhados pelas mais diversas diásporas e exílios...

Desculpem lá qualquer coisinha, como diz o tuga, sentimental, quando anda fora de casa... E espero que gostem destas três histórias, da tradição oral dos ganguelas...Como as nossas fábulas e contos populares, também estas histórias ganguelas têm uma moral... Para mim, o  que é mais espantoso, é a sua atualidade, tanto aqui, em Angola,  como na nossa santa terrinha ou na Guiné-Bissau, três sítios onde não é preciso andar com uma lupa para encontrar Baratas e Cavetos... Enfim, apreciaria muito que, um vez lidas as histórias, acrescentassem uma linha, da vossa lavra,  aos ensinamentos morais que se podem tirar delas... Até por que "a" moral e "o" moral são duas coisas muito importantes para gente sair da manhã de nevoeiro (ou cacimbo)  em que estamos mergulhados, dizem que há séculos, desde que el-rei nosso senhor Dom Sebastião partiu para Alcácer Quibir e nunca mais voltou....LG.


Três histórias ganguelas, três pérolas da sabedoria angolana 

(i) O azar do soba Barata

O soba Barata foi ter com o soba Cágado, dizendo:
– Sei tudo sobre a vida, mas nunca tive a sorte de ver um Azar! Amigo Cágado, faz-me o grande favor de me dizeres o que sabes sobre o Azar e como ele é.
– Ah! Ah!... Então o teu problema é esse ? Eu vou-te mostrar. Amanhã às 8 horas apareces com os teus amigos e parentes no terreiro da aldeia e eu mostro-te o Azar.

O soba Cágado pegou em todas as galinhas da sua casa e fechou-as numa gaiola. De manhã, muito cedo levou-as ao terreiro da aldeia e sentou-se em cima da gaiola. Passado algum tempo começaram a chegar as baratas. Perguntou o soba Cágado ao soba Barata:
– Chegaram todas ?
– Sim, chegámos – responderam elas, em coro.

Foi então que o soba Cágado abriu a giola… As galinhas saíram e, num ápice, comeram todas as baratas, aterrorizadas. Um dos galos correu com o soba Barata até à sua casa. O pobre do soba estava desfeito: tinha perdido todos os seus súbditos numa batalha campal e agora estava sozinho. Era o cúmulo do Azar. Depois de tantos sucessos na vida, sabia agora, por dolorosa experiência própria, o que era isso do Azar.

Moral da história: Não é fácil ser soba. É necessário ser inteligente. E mais: ter inteligência emocional… Um chefe que é mau líder faz um mau grupo. Tal chefe, tal grupo. 

(ii) O capataz Caveto

Havia um homem que era excelente na caça. Era conhecido pela alcunha de Caçador Certo dia matou um elefante. Era preciso transportar a carne da floresta para casa. E para isso era preciso arranjar muita gente. Foi falar com os vizinhos e aliciou-os para a tarefa, com a promessa de uma pequena recompensa.

Um dos vizinhos que engrossou a coluna dos carregadores, chamava-se Caveto. Era um tipo esperto. Fez questão logo de assumir o papel de capataz, sem ninguém lhe encomendar o sermão. Com os ramos de uma árvore, fez uma espécie de bastão, para mostrar quem mandava, e começou logo a comandar a operação. Dividiu as tarefas, dando a cada um dos carregadores a quantidade de carne que podia transportar às costas. Passadas algumas horas, a carne do elefante estava toda em casa do Caçador.

Um homem de confiança do Caçador preparou-se para fazer o pagamento do serviço, que não era em espécie, era em géneros. Ordenou as todos os carregadores que ficassem junto à peça que cada um tinha carregado. De cada peça cortou um bom bocado e deu-a ao respectivo carregador como forma de pagamento. Todos voltaram felizes para suas casas, não só por terem ajudado um vizinho mas também por que nesse dia havia carne para o almoço. Foi então que o tal Caveto se dirigiu com maus modos ao pagador e interpelou-o:

– Ouve lá, e então a minha parte ?

Respondeu o pagador:

– Tu não tens nada a receber. Como não carregaste nenhuma peça, não tens donde tirar o teu pagamento!

– Como assim ? Então eu estive orientar as pessoas e a despachar o serviço!

Retorquiu o pagador:

–Pode ser até que fales verdade, mas eu não tenho com que te pagar, uma vez que não transportaste nenhuma peça de carne.

O Caveto, de cabeça baixa, lá voltou para casa e foi comer o seu fungi sem conduto.

Moral da história: Nunca penses que és mais esperto que os outros. E não escolhas o caminho do oportunismo, gerador de makas e conflitos. Não basta, por outro lado, quereres ser líder, é preciso que os outros te reconheçam como tal e que tu saibas assumir e desempenhar esse papel fundamental numa equipa de trabalho.



"Ganguela (ou Nganguela) é o nome de uma pequena etnia que vive dispersa a Leste e Sudeste do Planalto Central de Angola. O seu nome é desde os tempos coloniais usado para designar, não apenas esta etnia, mas um conjunto de povos que vivem no Leste de Angola"... 

Infografia: "Mapa étnico de Angola em 1970 (Área dos povos designados como Ganguela marcada a verde)".


(iii) Por favor, nunca apagues as peugadas do leão…

Um dia um rapaz e uma rapariga fizeram uma viagem através da floresta, onde tinham que passar por um sítio muito perigoso, cheio de animais ferozes.

No mais recôndito da floresta, o rapaz, armado em valentão, tomou a dianteira, pensando com isso proteger a rapariga. No trilho arenoso, o rapaz viu as peugadas, frescas, de um leão. Com medo que a rapariga se assustasse, o rapaz apagou de imediato as peugadas.

Quando o leão viu o casal, emboscou-se atrás de uma árvore. O rapaz ia muito tenso, olhando para um lado e para o outro. O leão viu que ele estava em alerta, pelo que deixou-o passar, até ele atravessar a clareira. A rapariga, mais atrás, vinha muito descontraída, não se apercebendo do perigo. Fez até uma paragem para fazer xixi (sim, por que as rapariugas não mixam, fazem xixi...). Foi nesse preciso momento que o leão se lançou sobre ela, devorando-a a seguir. Alertado pelos gritos lancinantes da vítima, e temendo pela sua vida, o nosso herói pôs-se em fuga.

Moral da história: ignorar ou escamotear a verdade, acaba por ter consequências negativas. As makas (problemas, em angolês) e os conflitos resolvem-se, enfrentando-os e encontrando soluções inteligentes e  construtivas. Não adianta fugir de (ou negar , ignorar, escamotear) a realidade.

Fonte: Adaptação  livre de L.G.

Menongue, Diocese. Secretariado da Pastoral (ed. lit) – O mundo cultural dos Ganguelas. Menongue: Diocese, [ D.L. 2000] (Porto: Humbertipo)], 642 pp



2. Comentário de L.G.:

É interessante a explicação dada pelo editor  literário desta obra, o Secretariado da Pastoral da Diocese de Menongue, lá na martirizada província do sudeste angolano, o Kuando Kubango, sobre o seu propósito didáctico (em 2000, data da sua edição, quando ainda a paz era uma miragem)... Vale a pena transcrever essa explicação que vem no livro, à laia de preâmbulo. Passo a citar:

"Durante uma conferência sobre o conflito angolano, 'Causas e consequências', um participante comparou a complexa situação vivida no país a um conto, 'A cobra sobre os ovos':
"Um fazendeiro encontra na capoeira uma cobra sobre os ovos. Como matá-la ? Se for à paulada ele quebra os ovos, e a cobra, esperta que é, foge. Se não a mata, ela devora todos os ovos.

"Que solução ?

"O conto foi partilhado por todos os participantes e, de forma inteligente, serviu de exemplo para refelectir sobre possíveis soluções para o conflito angolano e outros conflitos no mundo".
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Nota do editor:

Último poste da série > 11 de novembro de 2013 > Guiné 63/74 - P12279: Manuscrito(s) (Luís Graça) (12): Servir duas pátrias, Portugal e Angola... O caso do sr. C..., furriel mil em 1974/75, no exército colonial português, tenente das FAPLA em 1975/89

quarta-feira, 20 de novembro de 2013

Guiné 63/74 - P12318: Memória dos lugares (256): Missirá, Zacarias Saiegh e Jobo Baldé em 1968 (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 15 de Novembro de 2013:

Meu caro Luís,
Pedi à minha irmã para pôr ordem numas largas dezenas de fotografias dos nossos avós, pais e da nossa meninice, preciso de referências para o livro tendencialmente autobiográfico que comecei a escrever “O Fedelho Exuberante”.
Daquele amontoado de papel, a Manuela encontrou estas três imagens. Seguirão pelo correio, terás a amabilidade de juntar ao conjunto de imagens que ficam em teu poder e que darás destino quando eu bater a bota.
Curiosamente, as três têm grande significado para mim: são as únicas fotografias que tinha (falo já no pretérito, estas imagens pertencem ao blogue e a quem as vai arrecadar) do Zacarias Saiegh, do Benjamim Lopes da Costa e do Jobo Baldé, nomes indispensáveis da minha passagem pela Guiné. Será com orgulho que as verei estampadas no nosso blogue.

Um abraço do
Mário


Fotos avulsas: Zacarias Saiegh, a ressureição de Missirá, Jobo Baldé

Beja Santos

Fotografia tirada em 5 de Setembro de 1968, véspera da primeira flagelação a Missirá. Foi enviada à minha querida Mãe, no verso referencio o Zacarias Saiegh, o meu furriel mais antigo, que vai sentado no Unimog 411, matrícula ME-81-53, o meu inesquecível “burrinho”, vi-o sair do meio da lama profunda da bolanha de Finete não poucas vezes, Finete está ao fundo, aproximamo-nos do rio Geba, o capim é enorme; quem conduz é o Quim, que nunca mais vi, bem gostava de lhe dar um grande abraço pelo bem que nos fez, escrevi-lhe o meu primeiro louvor, saiu de um jato, era bem sentido. Estou por trás do Saiegh, a rir com satisfação, vivo há pouco mais de um mês no Cuor, estou profundamente feliz. Termino a legenda dizendo: “No centro das mais desvairadas tribulações, louvor ao Altíssimo, o amor deste filho, Mário”.

Imagem da única epopeia da minha vida: a ressurreição de Missirá, praticamente destruída em 19 de Março de 1968. Estamos em Maio, constrói-se à lufa-lufa os últimos abrigos, este tinha dimensões quase gigantescas, aqui ficou a Breda e seis homens, não muito longe do cavalo de frisa. Andei à procura desta fotografia para mostrar ao Benjamim Lopes da Costa, que veio recentemente visitar-me, vem regularmente a Portugal para tratamentos à próstata. Na noite de 3 de Agosto de 1969 perdeu a cabeça numa emboscada e chamou-me “branco assassino”, fizemos as pazes pouco tempo depois, tínhamos e temos um entendimento perfeito. Ele aparece encurvado, a figura central é o meu querido amigo Mamadu Camará, mais tarde membro da 2ª Companhia de Comandos Africana, foi ferido em Salancaur, é desde 1973 deficiente das forças armadas. A mourejar, empunhando o martelo, está outro querido amigo, Mamadu Djau, visitei-o em Amedalai em Novembro de 2010, continua a insistir que quer ir trabalhar para Portugal, não entende todos os louvores e condecorações que recebeu terem ficado sem qualquer recompensa. Não há nada mais humilhante que não ter uma resposta plausível para lhe dar.

Chama-se Jobo Baldé, era o padeiro de Missirá, empreendedor topo de gama, sacrificava todos os seus lazeres para fazer pãozinho para a população civil. Não sei se esta fotografia já apareceu no blogue, não faz mal, vai ser remetida para o Luís Graça, fiel depositário de todos os meus materiais. Revejo sempre esta fotografia com orgulho e olhos humedecidos. O Jobo prepara o pãozinho num cunhete de granadas de bazuca. Enviei esta fotografia à minha noiva e digo: “Jobo, o padeiro que Rossini esqueceu para as suas óperas”. O Jobo tinha um fio de voz, quase ciciava, seguia bem perto do seu alferes. Escreveu-me anos a fio, também queria vir trabalhar para Portugal. Em Dezembro de 2010, procurei vê-lo. O Fodé Dahaba telefonou-lhe, não tinha dinheiro para se deslocar da região de Galomaro a Bambadinca, e nós não podíamos lá ir. Caí na asneira de lhe dizer que regressaria à Guiné, alguém ouviu, e é por isso que de vez em quando me escrevem para saber quando eu volto…
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Nota do editor

Último poste da série de 19 DE NOVEMBRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P12313: Memória dos lugares (254): Aquartelamento de Bambadinca, c. 1970 (Fotos de Humberto Reis, CCAÇ 12, 1969/71) (Parte II)... Daqui da ilha de Luanda e enquanto tenho acesso à rede sem fios, mando um abraço madrugador a um bom camarada que também passou pela "cova do lagarto" , e que hoje faz anos, o Mário Miguéis da Silva. (Luís Graça)

Guiné 63/74 - P12317: (In)citações (56): Meditação (Abel Santos)





1. Em mensagem do dia 13 de Novembro de 2013, o nosso camarada Abel Santos (ex-Soldado Atirador da CART 1742 - "Os Panteras" - Nova Lamego e Buruntuma, 1967/69), enviou-nos esta "meditação", escrita nos anos sessenta do século passado, algures nas matas da Guiné:





MEDITAÇÃO

Novo cigarro, mais um fósforo riscado na raspa da caixa, uma pequenina chama, umas baforadas de fumo que se perdem acima da cabeça, olhos fixos no além, pensamento veloz através da vidraça do tempo na procura da recordação do dia de ontem ou na meditação sobre como será o amanhã.

Tudo, sem esquecer o tempo de agora a que se convencionou chamar presente. Um bom par de minutos deixa que o cigarro se vá gastando até que, num gesto de rotina, seja jogado num cinzeiro, indo juntar-se a outros, que depois de consumidos ali aguardam o momento "solene" de se fazer limpeza.

Rápido como o vento, corre o pensamento em dia de cerração plúmbea, com o sol a aparecer timidamente por entre densas nuvens que cobrem o firmamento. Um leve mover de folhas lembra a aragem morna que corre e deixa que se respire melhor perante a intensa humidade que contempla o ar em circulação.

Um mundo de interrogações percorre a mente de encontro a valores esquecidos, a princípios quebrados, a objectivos pouco expectantes, a injustiças e a guerras indesejadas. O mundo surge incómodo, ornamentado de azedume e negritude que atemoriza as sociedades. Por sua vez, estas apresentam-se incapazes na procura e na oferta de soluções para crises intermináveis.

A massa humana é frágil e não suporta as adversidades que ela própria criou. Não é sem razão que se diz que o homem é um mistério profundo que nunca se chegará a compreender. Continuam hoje, os homens, a serem escravos da tirania, de honrarias e ambições, ansiando por atingir todas as posições e títulos, muitas vezes sem medirem os meios usados na prossecução daqueles objectivos. É a isto que vulgarmente se diz não olhar a meios para atingir os fins.

Apesar de tudo, os homens continuam a percorrer os caminhos da vida, nele encontrando vitórias e derrotas, mas em definitivo, ganhando poder sobre o universo e sobre a própria vida… Daí a tentação permanentemente renovada de se julgarem "auto-suficientes", capazes de se tornarem deuses sozinhos. E a estrada continua aberta, sem que o percurso tenha terminado. Nem o homem está acabado, ainda que se interrogue sobre onde o conduzirá o seu desenvolvimento.

De repente, pensa em humanizar-se mais, em personalizar-se sempre mais, tendo como força motivadora a vida que lhe foi dada e as próprias forças vitais que brotam das suas caminhadas. Mas… numa análise fria e desapaixonada, depressa se conclui que o que dá valor aos homens não são os títulos nem as honrarias e que muitos são aqueles que proclamam a sua ignorância e a sua incompetência quando chamados a lugares de responsabilidade. É aqui que se afirmam os interesses e as situações de favor.

Não é de hoje nem de ontem a afirmação de que só cumpre deveres quem tem ideias. Mas os tempos, todos os tempos, acabam sempre definir e mostrar que os ideais rareiam, que os carácteres se definham e que as vocações se burocratizam. Depois surge o rol infindável de interrogações sobre caracteres sólidos e firmes; sobre as existências de ideais. Quantas vezes se vende a Honra para afivelar uma máscara; quantas para usar um título, se conspurca a Dignidade; quantas, para ocupar um lugar se esfrangalha o Carácter; quantas, para se obter uma situação se atraiçoa a vocação.

Não raro se ouve e se diz do lodo que inunda os caminhos do mundo e da vida; não raro se evoca a dignidade, o amor e a justiça, para que o caminhar nas estradas da vida seja sereno em consciências rectas. Porém, as sociedades já não ouvem nem se ouvem. Constroem-se nesse acumular dúbio das negras nuvens da mentira, da intolerância, do facilitismo e do comodismo do ter, fazendo constante vista grossa ao ser e ao estar.

A esfera enorme consignada como planeta Terra, que dizem ser achatada nas extremidades do seu eixo imaginário, continua a girar e construir dois movimentos rotineiros que não deixam de nos mostrar essa realidade e, mais do que isso, a necessidade de uma luta sem tréguas a favor de personalidades capazes de formar e de manter sociedades sólidas, que saibam dizer sim e não quando as circunstâncias o exigirem. Contudo, nada pode resistir ao desenvolvimento e à expansão da vida em cada um, na medida em que a vida é o fruto perene do amor de Deus por si… Nada. Excepto a liberdade, que é a única fronteira que Deus não pode atravessar sem o nosso consentimento e a nossa participação.

Cada um é livre de receber e de desenvolver o melhor possível a vida que lhe foi dada e de a transmitir como muito bem entender. Como é livre de a desperdiçar afastando-a completamente do seu fim. A ninguém é exigido que seja cego ou ingénuo, mas sim que esteja plenamente consciente das suas carências e da sujidade repugnante da vida que gravita à volta do universo. Costuma dizer-se que se reforça a confiança na medida do crescimento da fé.

Foi-se o cigarro neste espaço de tempo. Subiu em novelos o fumo acinzentado espalhando no ar um doce cheiro a tabaco. Tal como a atmosfera, os pulmões acumularam um mais de pó de carvão e são agora, mais do que ontem, potenciais candidatos ao cancro que os atrofiará.

Neste viver e morrer, sucedem-se os dias e as noites e, com eles a vontade enorme para que o amanhã seja pleno de vitalidade para que a vida possa prosseguir na sua caminhada geradora de histórias e meditações.

P.S. - Texto escrito em 1968, aquando do cumprimento do serviço militar na Guiné-Bissau.
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Nota do editor

Último poste da série de 30 DE SETEMBRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P12103: (In)citações (55): Eu desejo acreditar na Guiné-Bissau, nos seus jovens, mulheres e homens de boa vontade, que trabalham nas bolanhas, nas matas, nos rios e no mar... (Paulo Salgado, ex-alf mil, cav, op esp, CCAV 2721, Olossato e Nhacra, 1970/72; cooperante)

terça-feira, 19 de novembro de 2013

Guiné 63/74 - P12316: Blogoterapia (240): Penso na Mata do Morés e chego a sonhar que a conheci (Francisco Baptista)

1. Mensagem do nosso camarada Francisco Baptista*, ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 2616/BCAÇ 2892 (Buba, 1970/71) e CART 2732 (Mansabá, 1971/72), com data de 12 de Novembro de 2013:

Sete meses em Mansabá na CART 2732, tão perto do Morés e nunca lá entrei. No Morés o PAIGC tinha uma base importante e por esse motivo, de acordo com a estratégia da guerra adoptada nesse tempo pelos nossos comandantes militares somente as tropas especiais eram mobilizadas para operações de ataque a bases do inimigo.

Em finais de 1971, estava eu em Mansabá, houve uma grande operação realizada por duas Companhias de Comandos Africanos, segundo recordo e onde foi de heli o Major Gaspar (conhecido por Siga a Marinha) na altura comandante do COP 6.

Na antevéspera do dia da operação foram deslocadas armas pesadas de longo alcance para o destacamento de Cutia que bombardearam durante muito tempo.as referidas bases. Aviões, bombardeiros e a jacto também bombardearam intensamente a zona.

No dia da operação segundo o major Gaspar que me encontrou no bar quando regressou somente encontraram população, velhos, mulheres e crianças que não terão sido muito bem tratados. Depois do barulho dos morteiros, dos obuses e dos aviões dos dias anteriores, que nós sentimos no quartel, não seria de prever outra coisa. O objectivo da operação seria penso eu, amedrontar as populações sujeitas à influência do inimigo e expulsá-las dessas áreas Para esse tipo de operações, já que praticamente não havia confronto com a guerrilha talvez, por outros motivos, até fosse mais vantajoso usar tropa normal.
Porém a guerra limpa ou suja era feita nos gabinetes de ar condicionado, pelos nossos comandantes em Bissau e ordens não se discutiam.

Terá sido a última operação em que o major Gaspar participou pois alguns dias depois foi chamado a Bissau e constou-se que numa noite de bebedeira andou ele e outro camarada aos tiros à bandeira nacional. Foi internado por psiquiatria e enviado para Lisboa. Segundo já li no nosso bloge terá morrido cedo. Foi uma vitima de muitas guerras. Esteve na Índia, na Guiné duas vezes e não sei se também Angola ou Moçambique. Por tédio, desilusão, cansaço da vida, terá procurado no álcool a paz que não encontrou na realidade dura duma guerra muito prolongada. Era um homem bem disposto e com tiradas muito cómicas, de que ouvi falar antes de o conhecer e que eram comentadas por toda a Guiné. Do pouco tempo que convivi com ele guardo a impressão dum homem bom e sensível. Um poeta que por erro de vocação foi para a vida militar e que por uma contingência histórica desfavorável teve que combater em vários teatros de operações.

Voltando ao Morés, o que me atraia nele não era o confronto militar mas antes a possibilidade de percorrer uma grande floresta tropical.
Na Guiné havia muitas árvores, havia muita matas, mas a mata grande de que se falava era a do Morés.


Na aldeia onde nasci e vivi até à idade adulta havia e há muitas árvores, muitas matas. Cresci a contemplar essas árvores tão variadas entre elas, umas mais largas e frondosas, outras mais altas, com folhagem em vários tons de verde, umas de folha perene, outras de folha caduca.
Há uma área grande de oliveiras, plantadas pelo homem, em décadas e séculos anteriores em socalcos nas encostas do rio Sabor. Quando a cultura do trigo e do centeio deixou de ser rentável os lavradores passaram também a plantar no planalto onde já há grandes olivais.

Nos vales e lameiros, zonas mais frescas, há ainda muitos freixos. Havia também muitos olmos mas há cerca de 30 anos veio uma praga da Europa e os olmos secaram todos. Havia também um grande souto de castanheiros que estando embora em terrenos pertencentes à Junta da Freguesia eram propriedade dos naturais da aldeia. Infelizmente também veio uma doença, o cancro do castanheiro e morreram todos.Alguns pinhais, não muito extensos.

Há uma mata de sobreiros bastante extensa, com muitos arbustos sobretudo giestas e estevas a disputar-lhe o espaço.
Há outras árvores dispersas tais como o carvalho, o carrasco, o zimbro, a amoreira e a figueira.

Todas úteis pela gama de produtos variados que proporcionam à economia da terra, casca, folhas, frutos, madeira, lenha e até uma sombra acolhedora nos dias quentes de verão. Do sobreiro estrai-se a cortiça para o fabrico de rolhas e outros derivados, dá ainda a bolota para alimento dos animais. Da oliveira o azeite. As folhas do freixo e do olmo também eram boas para alimento dos animais.

Todas as árvores e até os arbustos tais como as estevas e giestas boas para queimar nas lareiras, cozinhar os alimentos e aquecer as noites frias de inverno.
Da madeira de algumas também se faziam os arados, os carros de bois, as vigas das casas e outros bens necessários à comunidade.

Durante muitos anos ajudei a família a extrair os vários produtos que elas generosamente proporcionavam, aprendendo a conhecer a sua utilidade, sem me surpreender com a sua beleza. A distância, a ausência, a novidade ajudam a revelar o encanto e a beleza que o convívio quotidiano por vezes esconde.

Pela distância aprendi a amar mais a minha terra, aprendi a amar mais as árvores da minha aldeia quando estive longe delas na Guiné. Lá aprendi a amar as suas grandes árvores tropicais pela sua altura e pelo mistério das suas florestas semelhantes a grandes catedrais com muitas colunas verdes.

A idade dá-nos também uma visão mais calma, mais abrangente. A experiência dos anos ensina-nos a utilizar os vários sentidos e a conjugá-los com o raciocínio mental. A beleza na sua plenitude revela-se mais quando atingimos as alturas da idade e da nossa sabedoria.

Há muita poesia nos olhos dos mais velhos. Quem não recorda a miséria das populações da Guiné, que tinham de ser alimentadas com arroz importado pelo governo, por causa da guerra e apesar disso os homens grandes das tabancas tinham sempre um ar nobre e calmo.

Porque nasci no campo, porque fui lá criado, tinha muita curiosidade em conhecer os campos e as florestas da Guiné, daí a minha vontade em conhecer a mata do Morés.

A floresta da minha aldeia é muito diferente. É floresta mediterrânica ao passo de que a da Guiné é floresta tropical. Mas quem aprendeu a amar uma também facilmente pode gostar da outra. Dos meus tempos de Buba recordo com saudade uma árvore enorme e frondosa que havia não longe do terminus do rio Grande de Buba. Bem, este era um falso rio, já que na realidade era um braço de mar, como havia tantos na Guiné, a cerca de 3 quilómetros de Buba acabava o rio. Não longe, numa mata de árvores com alguma extensão sobressaía uma pela altura, pelo um tronco largo, com veios salientes que entravam na terra e pela ramagem farta.
Aquela árvore era um monumento vivo. Hoje quando penso em Buba ela vem quase sempre associada. Tinha saúde para viver ainda muitos anos, oxalá ainda exista.

Penso na mata do Morés e chego a sonhar que a conheci.

Um abraço a todos os camaradas
Francisco Baptista
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Nota do editor

Último poste da série de 22 DE OUTUBRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P12186: Blogoterapia (239): O meu primeiro contacto com a África selvagem e misteriosa (Francisco Baptista)

Guiné 63/74 - P12315: Memória dos lugares (255): Aquartelamento de Bambadinca, c. 1970 (Fotos de Humberto Reis, CCAÇ 12, 1969/71) (Parte III)...


Guiné > Zona leste > Setor L1 > Bambadinca > 1970 > Foto nº 1 > Mais uma excelente foto aérea do quartel e posto adminidtrativo de Bambadinca, tirada de heli AL III, do lado da pista... Ao fundo, vê-se uma parte da extensa bolon ha de Bambadinca.

Foto do arquivo de Humberto Reis (ex-furriel miliciano de operações especiais, CCAÇ 12, Bambadinca, 1969/71)- Trata-se de mais uma foto da sua coleção de "slides", digitalizados. (Re)publicamos hoje mais 
esta foto de Bambadinca, "by air". Tendo o original uma boa resiluação resolução (superior a 2,3 MB), decompusemo-la em várias imagens (1A, 1B, 1C e 1D).

Vd. postes anterior, P12310, P12312 e P12313 (*)


Guiné > Zona leste > Setor L1 > Bambadinca > 1970 > Foto nº 1 A > Em prirmeiro plano,   o arame farpado e o sistema de iluminação, e a seguir o edifício do comando (em U) e, ao fundo, uma parte da extensa bolanha de Bambadinca. O quartel ficava numa pequena elevação ou  morro, sendo praticamente inatacável do lado leste (bolanha). No momento em que o fotógrafo tirou a foto, jogava-se uma partida de futebol de 11.. Havia, junta ao edifício do comando, um campo para futebol de 5...


Guiné > Zona leste > Setor L1 > Bambadinca > 1970 > Foto nº 1 B >  Um maior aproximação ao edifício do comando e à bolanha.



Guiné > Zona leste > Setor L1 > Bambadinca > 1970 > Foto nº 1 C >  Havia duas anetans de transmissões, uma militar e outra possivelmente da administração civil.




Guiné > Zona leste > Setor L1 > Bambadinca > 1970 > Foto nº 1 D > Do lado direito, vê-se o complexo  (civil) formado pela escola e casa da professora, posto dos correios (com telefone)   e casa do chefe de posto.

Guiné 63/74 - P12314: In Memoriam (170): O princípio do fim do Amigo e Camarada Sargento-Chefe Fernando dos Santos Rodrigues (2): A sua morte no dia 29 de Outubro de 2013 (Arménio Estorninho)




1. Segunda parte do trabalho dedicado ao Sargente-Chefe Fernando dos Santos Rodrigues, de autoria do nosso camarada Arménio Estorninho (ex-1.º Cabo Mec Auto Rodas, CCAÇ 2381, IngoréAldeia Formosa, Buba e Empada, 1968/70), chegado até nós em mensagem do dia 12 de Novembro de 2013, desta feita com apontamentos da última e derradeira homenagem àquele ex-combatente e artista no manuseamento do barro da região de Lagoa-Algarve.



O princípio do fim do amigo e camarada Sargento-Chefe Fernando dos Santos Rodrigues (2)

O Sargento-Chefe Aposentado e Mestre Oleiro, Fernando dos Santos Rodrigues, apercebendo-se das maleitas que o seu corpo sofria (problema cardíaco e outros) adquiriu uma scooter elétrica de quatro rodas para pessoa com deficiência, tendo como finalidade de lhe facilitar deslocar-se para os mais diversos locais do seu lazer e convívios.

Jardim Municipal 5 de Outubro, Lagoa Abril de 2013 - O Sargento-Chefe Aposentado e Mestre Oleiro, Fernando dos Santos Rodrigues, montado na sua scooter elécrica para pessoa deficiente.

Durante o mês de Outubro verificava-se-lhe um certo transtorno de expressão e físico. Por três vezes foi à consulta no Centro de Saúde de Lagoa, por duas vezes tropeçou e caiu, fazia dieta alimentar mas o seu peso não era regressivo. Finalmente na noite de 29 de Outubro de 2013, chega a notícia que falecera subitamente aos oitenta anos, vítima de doença cardíaca e outras pequenas mazelas, mas que antes não o impedia de continuar a dar algumas aulas e a manufacturar peças de artesanato.

O seu funeral realizou-se a 01 de Novembro de 2013, com as inerentes exéquias, saindo da Igreja da Misericórdia de Lagoa (Algarve), para o Cemitério Local onde foi a enterrar em campa. O Município de Lagoa, no dia 30 de Outubro 2013, prestou Homenagem Pública Póstuma ao amigo e camarada Sarg-Chefe Aposentado e Mestre Oleiro Fernando dos Santos Rodrigues:


Igreja da Misericórdia de Lagoa, 01/11/13 - Militares do RI 1 de Tavira colocando a Bandeira Nacional sobre a urna que continha os seus restos mortais.

Igreja da Misericórdia de Lagoa, 01/11/13 - Preparativos para o início da cerimónia da missa de corpo-presente.

Igreja da Misericórdia de Lagoa, 01/11/13 - Presença de familiares e amigos, nas exéquias.

Cemitério de Lagoa, 01/11/13 - Sob o Comando do 1º Sargento Domingues esteve presente uma Secção de Militares do RI 1 de Tavira, fazendo Guarda de Honra e com Salvas de Tiros.

Cemitério de Lagoa, 01/04/13 - Destino final de um Militar que pertenceu à CCaç 5 - Os Gatos Pretos, Canjadude - Guiné, 1968/70. Que a sua Alma descanse em Paz.

No Funeral estiveram presentes muitos Familiares e Amigos, o Presidente da Câmara Municipal de Lagoa, Sr. Francisco José Malveiro Martins e Vereadores, o Presidente da Assembleia Municipal de Lagoa, Dr. Águas da Cruz e o Presidente da Junta de Freguesia de Lagoa, Sr. Joaquim João, todos lhe quiseram prestar o último e sentido adeus. À família enlutada, à qual por de outra forma não ter podido o fazer, apresento as minhas condolências. Que a Alma do seu ente querido descanse em Paz.

Arménio Estorninho
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Nota do editor

Vd. poste anterior de 17 DE NOVEMBRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P12308: In Memoriam (169): O princípio do fim do Amigo e Camarada Sargento-Chefe Fernando dos Santos Rodrigues (1): Dia 20 de Abril de 2013, Homenagem, em Lagoa, ao Mestre Oleiro (Arménio Estorninho)

Guiné 63/74 - P12313: Memória dos lugares (254): Aquartelamento de Bambadinca, c. 1970 (Fotos de Humberto Reis, CCAÇ 12, 1969/71) (Parte II)... Daqui da ilha de Luanda e enquanto tenho acesso à rede sem fios, mando um abraço madrugador a um bom camarada que também passou pela "cova do lagarto" , e que hoje faz anos, o Mário Miguéis da Silva. (Luís Graça)


Guiné > Zona leste > Setor L1 > Bambadinca > 1970 >  Foto  nº 1 > Vista aérea do aquartelamento e posto administrativo de Bambadinca (que pertencia ao município de Bafatá) > Vista aérea, obtida de helicóptero,

Em primeiro plano o edifício do comando e as instalações de oficiais e sargentos. Bambadinca (em mandinga, "cova do lagarto") ficava numa pequena elevação ou morro, sobranceiro à extensa bolanha (a leste, à direita da imagem) e ao rio Geba (a norte), e de que vê uma nesga, ao fundo do lado esquerdo.

Nesta altura, por volta do 1º trimestre de 1970, Bambadinca albergava mais de 700 militares (incluindo a CCS/BCAÇ 2852, prestes a terminar a sua comissão, mais um companhia de intervenção, a CCAÇ 12, 1 pelotão de morteiros, 1 pel rec daimler, 1 pel caç nat, mais 1 pelotão de intendência (embora este tivesse instalações próprias, junto ao porto fluvial de Bambadinca, na margem esquerda do Rio Geba Estreito).

Guiné > Zona leste > Setor L1 > Bambadinca > 1970 > Foto nº 2 >  Outra vista parcelar do aquartelamento: em primeiro plano, a rede de arame farpado e as valas de proteção ao longo do perímetro do quartel e posto administrativo (que além das instalações do posto, incluia ainda uma estação dos CTT, uma capela, uma escola com alojamento  para a professora, que era cabioverdiana)...

A tabanca de Bambadinca, propriamente dita, ficava entre o aquartelamento e o rio, ou seja, a norte, já fora do perímetro de arame farpado... Além de diversas moranças, incluia pelo menos 3 estabelecimentos comerciais, incluindo a Casa Gouveia, e as lojas do Zé Maria e do Rendeiro.  A sul do aquartleamento, a menos de um quilómetro, havia outra tabanca, reordenada, chamada Bambadincazinho.


Guiné > Zona leste > Setor L1 > Bambadinca > 1970 > Foto nº 3 > Na altura estava em contrução, a cargo da empresa TECNIL,  a nova estraada (alcatroada) Xime-Bambadinca, fazendo depois ligação à estrada Bambadinca-Bafatá, que já existia,,, Na imagem acima, vê-se parte das movimentações de terra, necessárias para a terraplanagem... A nova estrada contornava Bambadinca, pelo lado da bolanha (pelo lado leste).



Guiné > Zona leste > Setor L1 > Bambadinca > 1970 >  A foto original, com resolução igual a 1,75 MB, a partir da qual obtivemos as três  imagens, inseridas acima, permitindo um maior detalhe do aquartelamento.

Foto do arquivo de Humberto Reis (ex-furriel miliciano de operações especiais, CCAÇ 12, Bambadinca, 1969/71), que tem seguramente algumas das melhores fotos  aéreas da da zona leste (Bambadinca, Xime, Mansambo, Xitole, Bafatá...) tiradas de helicóptero... São fotos de "slides", digitalizados. Ele tinha na altura uma boa relação com um ou mais dos pilotos da FAP, o que lhe permitiu apanhar algumas boleais e ver a Guiné "by air"... Enfim, um pequeno privilégio que não era para todos... (Re)publciamos hoje mais uma foto de Bambadinca, "by air", tirada de heli AL III, na aproximação ao heliporto, que ficava do aldo direito fa foto. Vd. poste anterior, P12310 (*).



Guiné > Zona leste > Setor L1 > Bambadinca > 1970 > Nesta outra foto,  tirada de terra, veem-se os trabalhos de construção da nova estrada Xime-Bambadinca que iria fazer a ligação à estrada Bambadinca-Bafatá... A obra estava a cargo da empresa Tecnil para a qual irá trabalhar, uns largos anos depois, o nosso amigo e camarada Rosinha. Nesta imagem, à esquerda vê-se o morro de Bambadinca e uma nesga da messe de oficiais. Do lado direito, era a grande bolanha de Bambadinca ("cova do lagarto", na língua dos mandingas).

Apoveito para, daqui da ilha de Luanda e enquanto acesso à erde sem fios, mandar  um abraço madrugador, a um bom camarada que passou também por Bambadinca, e que hoje faz anos, o  Mário Miguéis da Silva... (LG).


Fotos: © Humberto Reis (2006). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem: L.G.]

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Nota do editor: 

Guiné 63/74 - P12312: Parabéns a você (653): Mário Miguéis da Silva, ex-Fur Mil Rec Inf (Guiné, 1970/72)

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Nota do editor

Último poste da série de 16 DE NOVEMBRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P12301: Parabéns a você (653): José António Viegas, ex-Fur Mil do Pel Caç Nat 54 (Guiné, 1966/68)

segunda-feira, 18 de novembro de 2013

Guiné 63/74 - P12311: Notas de leitura (535): "Pequenas Histórias de Guerra", por Carlos Alexandre Morais e "Spínola o anti-general", por Eduardo Freitas da Costa (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 2 de Julho de 2013:

Queridos amigos,
O coronel Carlos Alexandre Morais era um indefetível admirador de Spínola, sabíamos que nutria esses sentimentos num livro que lhe dedicou e que confirma nestas curtas memórias onde, em todas as circunstâncias, o general é um espelho do humanismo, do irreprimível sentido do dever e da bravura.
Eduardo Freitas da Costa escreveu a zurzir Spínola, um ambicioso e um exibicionista (diz ele) que soube explorar a indecisão de Caetano, ambos, pela ambiguidade, foram coniventes isto quando a esmagadora maioria dos generais já não confiava na orientação de Caetano em relação às guerras africanas.
Pouco fica para a história deste libelo acusatório, mas ele existe e há que lhe prestar a devida atenção.

Um abraço do
Mário


Memórias do coronel Carlos Alexandre de Morais

Beja Santos

A seu tempo, já aqui se fez recensão ao livro “António de Spínola, o Homem”, por Carlos Alexandre de Morais, Editorial Estampa, 2007. Em edição de autor, temos agora “Pequenas Histórias da Guerra”, dadas ao público em 1998. O autor recorda a Índia, Angola e a Guiné, comissão em que desempenhou as funções de chefe interino da Repartição de Pessoal e Logística do Quartel-General do Comandante-Chefe. São três curtas memórias que aqui se registam.

Na primeira, conta que “Uma tarde o Comandante-Chefe convocou-me ao Palácio. Mal entrei no seu gabinete entregou-me uma carta que acabara de receber. Foi um dos documentos mais comoventes que chegaram até mim. Tratava-se da mãe de um alferes que ali morrera em combate, durante um ataque ao seu aquartelamento. A senhora permanecia inconsolável perante a morte do filho e decidira ir à Guiné para conhecer o local onde ele perdera a vida”.
O Comandante-Chefe determinou que ele tomasse em mãos o assunto, havia que marcar um helicóptero que os transportasse ao referido aquartelamento. No dia seguinte à sua chegada, logo embarcaram em direção ao fatídico local. O autor comenta: "não me recordo do nome do local. Lembro-me do seu aspeto visto do ar. Era uma área totalmente desarborizada em que a tropa, submetida a frequentes bombardeamentos, vivia em abrigos subterrâneos”.
O helicóptero sobrevoa o local, os militares saem para montar a segurança, abrem-se as portas, o comandante do aquartelamento encaminha-se em direção à aeronave. E assim se atinge o clímax da história, a mãe do falecido alferes lança-se a correr em direção do jovem alferes, que nada sabe do que se está a passar: “Naquele momento ele simbolizava o filho que perdera. Com os olhos rasos de lágrimas, abraçou-o convulsivamente. Todos ficámos estáticos com aquela comovente cena. Através da conversa que se seguiu, o alferes acabou por conhecer a razão de tão dramática visita. Não mais a terá esquecido”.

O segundo episódio regista a morte de três majores e um alferes do CAOP de Teixeira Pinto, em 20 de Abril de 1970, aqui largamente documentado. Sabe-se como foi um duro golpe para a resolução pacífica do “chão manjaco”. O que o coronel Carlos Alexandre de Morais não esqueceu é que logo a seguir à visita que Spínola fez ao local para constatar o bárbaro massacre, ele foi convocado para iniciar, de imediato, os processos de condecoração dos militares mortos, assim reconfirmou a presença de espírito de Spínola que ele considera ser o seu irreprimível sentido do dever a sobrepor-se a tudo.

O terceiro episódio prende-se com os briefings que diariamente se realizavam à noite na Fortaleza da Amura. Os mísseis terra-ar estavam a provocar um desnorteamento na Força Aérea, era já considerável o número de baixas, o impacto psicológico afetava tudo e todos. Nessa atmosfera, dá-se o cerco de Guidage. Spínola dirigiu-se ao coronel piloto-aviador Moura Pinto, ordenando-lhe que mandasse preparar para a manhã seguinte um helicóptero a fim de se ele se deslocar a Guidaje. O comandante da zona aérea argumentou com enorme perigo falando em 80 % de probabilidades de insucesso. O general manteve-se calado, mas no fim do briefing virou-se para o coronel Moura Pinto dizendo-lhe com a maior naturalidade: “… quanto ao helicóptero mantenho a hora da partida e trate lá de baixar essa percentagem de risco…”.

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Spínola, o anti-general, por Eduardo Freitas da Costa

O jornalista Eduardo Freitas da Costa tinha convicções ultranacionalistas, foi um temível polemista e distinguiu-se, no plano da investigação, por um trabalho em torno de Fernando Pessoa, trabalho esse injustamente esquecido. A seguir ao 25 de Abril, redigiu várias catilinárias, Marcello Caetano e Spínola foram os seus alvos principais. No seu ensaio sobre Spínola, o jornalista pretendia “a desmontagem do mito e a incontestável exautoração do desmistificado”. Como é óbvio, aqui só se regista o que tem a ver com Spínola e a Guiné. Ambicioso e oportunista, incoerente e paradoxal, impertinente e arrivista, foram alguns dos mimos com que Freitas da Costa tratou Spínola neste livro publicado pelas Edições do Templo, em 1979. A primeira crítica vai logo para a carta que o tenente-coronel Spínola escreveu a Salazar, em Abril de 1961, sugerindo-lhe a remodelação imperativa dentro do regime, libertando-o de gente desacreditada, o militar arvorou-se em político e pena foi, observa o autor, que Salazar não lhe tenha dado o devido corretivo. A questão será também grave quando Salazar o nomeou para governador da Guiné, em Maio de 1968, também aqui Spínola apareceu com ideias fantasistas que levavam, a terem sido concretizadas, à independência. Depois, o governador contou com o marcelismo como aliado, foi assim possível ter andado em negociações com o presidente Senghor com o objetivo de se chegar, imagine-se, a uma autodeterminação provável em dez anos. Para mostrar como havia conivência entre Spínola e Marcelo, Freitas da Costa invoca o testemunho do antigo Presidente do Conselho e que tinha a ver com o pedido de fundos para serem usados na absorção do PAIGC da região, no chão manjaco: “Para isso necessitava de umas dezenas de milhares de contos, que lhe mandei entregar por fundos secretos. Regressou com o dinheiro a Bissau e a promessa de em breve anunciar esse grande êxito. Mas tudo o que houve foi o assassínio dos três majores que iam ao encontro dos mensageiros dos que diziam querer entregar-se, assassínio que ocorreu numa emboscada habilmente preparada. Não se viu nada mais nem se soube do dinheiro entregue para o efeito”.

O autor trata Spínola como um ingénuo que pôde agir em total impunidade graças ao marcelismo, enleado em indecisão e que não soube fazer frente à tentação de Spínola no abismo da rendição perante o inimigo.

Freitas da Costa envolve permanentemente Caetano e Spínola devido à duplicidade e ambiguidade de Caetano que levou naturalmente Spínola a considerar que uma coisa era o que o Caetano dizia para português ver e outra o que no fundo pensava e praticava.

Spínola conseguiu dissimular o seu fracasso militar na Guiné, diz Freitas da Costa contundente. Rotulado de chefe carismático, era necessário contê-lo politicamente, e por isso fora nomeado vice-chefe do Estado-Maior general das Forças Armadas. É na circunstância à atmosfera propícia que garante a Spínola, com a anuência de Costa Gomes, em publicar “Portugal e o Futuro” e que encontrou pela frente o desesperado desejo de Marcello Caetano de fugir às responsabilidades de uma situação que desencadeara e se não se sentia já capaz de dominar – é nesses termos, diz o autor, que Marcello quando recebeu em audiência Spínola e Costa Gomes lhes aconselhou que se dirigissem ao Presidente da República pedindo-lhe “a entrega do poder às Forças Armadas”. A revolução estava em curso, inevitável.
O resto do livro é outra forma de libelo acusatório da inépcia de Spínola face ao surto revolucionário sob a égide da Comissão Coordenadora do MFA.
Mas isso já é outra história que não cabe nesta recensão.
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Nota do editor

Último poste da série de 15 DE NOVEMBRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P12298: Notas de leitura (534): Escravos e Traficantes no Império Português, por Arlindo Manuel Caldeira (2) (Mário Beja Santos)

Guiné 63/74 - P12310: Memória dos lugares (253): Aquartelamento de Bambadinca, c. 1970 (Fotos de Humberto Reis, CCAÇ 12, 1969/71) (Parte I)


Foto nº 1


Foto nº 2 


Foto nº 3


Foto nº 4


Foto nº 6


Guiné > Zona Leste > Sector L1 > Bambadinca > 1970 > Espectacular vista aérea do aquartelamento, tirada no sentido leste-oeste, ou seja, do lado da grande bolanha de Bambadinca (vd. mapa da região)... A foto original, com resolução superior a 2,3 MB, decomposta em vários quadrantes (fotos parcelares de 1 a 5), permitindo um maior detalhe do aquartelamento. Aceitam-se melhorias e correções.

Legenda:

(1) Do lado esquerdo da imagem, para oeste, era a pista de aviação (1) e o cruzamento das estradas para Nhabijões (a oeste), o Xime (a sudoeste) e Mansambo e Xitole (a sudeste);

(2) Uma nesga da placa, em cimento,  heliporto;

(3) O campo de futebol (3),  entre o arame farpado (24) e pista de aviação; 

(4) A CCAÇ 12 começou também a construir um campo de futebol de salão (4), com cimento literalmente roubado à engenharia nas colunas logísticas para o Xitole; 

(5/6/7/8/9/10) Conjunto de edifícios em U: constituía o complexo do comando do batalhão  [, no nosso tempo apanhámos dois, o BCAÇ 2852, 1968/70, e o BART 2917, 1970/72] (5) e as instalações (dormitóriso) de oficiais (6) e sargentos (8), para além da messe e bar dos oficiais (8) e dos sargentos (9); apesar segregação sócio-espacial que vigorava então, não só na sede dos batalhões, como em muitas unidades de quadrícula, uns e outros, oficiais e sargentos, tinham uma cozinha comum (10); do lado direito do bar e messe de sargentos, vê-se uma fiada de bidões cheios de areia, que serviam de protecção para a saída para as valas (22);

(22/24/27) Do lado direito, ao fundo, a menos de um quilómetro corria o Rio Geba, o chamado Geba Estreito, entre o Xime e Bafatá; o aquartelamento de Bambadinca situava-se numa pequena elevação de terreno, sobranceira a uma extensa bolanha (a leste) que lhe dava uma aparência de fortaleza inexpugnável, vista do lado da bolanha (ou, seja, de leste para oeste); são visíveis as valas de protecção (22), abertas (... também pela CCAÇ 12, companhia de intervenção duramente explorada pelo comando dos dois batalhões...)  ao longo do perímetro do aquartelamento que era todo, ele, cercado de arame farpado e de holofotes (24); a luz eléctrica era produzida por gerador que deve estar algures por aí,  nas imagens, perto da antena de transmissões (27);

(23/25/26) Junto ao arame farpado, ficavam vários abrigos (26), o espaldão de morteiro (23), o espaldão da metralhadora pesada Browning, 12.7 (25)... (Em 1969/71, na altura em que lá estivemos, ainda não havia artilharia (obuses  14).

(3/11/12) A caserna (ou uma das casernas) das praças da CCS (11) ficava  junto ao campo de futebol (3);   o pessoal do pelotão de morteiros e/ou do pelotão Daimler deveria ficar instalado no edifício (12), que se situava do outro lado da parada, em frente ao edifício em U. 

(13/14/28) Mais à direita, situava-se a capela (13) e a secretaria da CCAÇ 12 (14);  por detrás ficava o refeitório das praças (28);

(15/16/17) Em frente havia um complexo de edifícios de que é possível identificar o depósito de engenharia (15) e as oficinas auto (16); à esquerda da secretaria, eram as oficinas de rádio (17).

(18/19/20)   Uma arruamenmto ao meio (no sentido sul-norte)  dividia o aquartelamento em duas partes (oeste e leste);  tínhamos o armazém de víveres (20), a parada e os memoriais da unidades e subunidades que  haviam  passado por Bambadinca (18), a escola primária antiga (incluindo a casa da senhora professora, Dona Violete, que era caboverdiana) (19) e depósito da água (de que se vê apenas uma nesga) (21).

(29, fora da foto) ainda mais para esquerda, o edifício dos correios, a casa do administrador de posto, e outras instalações que chegaram a ser utilizadas por camaradas nossos que trouxeram as esposas para Bambadinca (foi o caso, por exemplo, do alf mil op esp Carlão, nosso camarada da CCAÇ 12).

Esta reconstituição feita, de memória, apoiada em documentação fotográfica, nomeadamente por Humberto Reis, Luís Graça, Gabriel Gonçalves e Arlindo Roda (CCAÇ 12, Bambadinca, 1969/71), bem como por outros camaradas do nosso tempo (Benjamim Durães, CCS/BART 2917, 1970/72; José Carlos Lopes, CCS/BCAÇ 2852, 1968/70; Mário Beja Santos, Pel Caç Nat 52; Jorge Cabral, Pel Caç Nat 63, 1969/71... e ainda  com base noutros elementos informativos publicados no blogue.

Foto do arquivo de Humberto Reis (ex-furriel miliciano de operações especiais, CCAÇ 12, Bambadinca, 1969/71), a quem mando, da ilha de Luanda, um abraço fraterno, bem como aos meus queridos coeditores que vão aguentar o barco esta semana. Vim no mesmo avião da TAP com o António Duarte, economista, formador bancário, que esteve na CCAÇ 12, em Bambadinca,  depois de mim, em 1973/74. Falámos um bom  e agradaável bocado no aeroporto. Por cá, tudo calmo.  (LG). 

Foto: © Humberto Reis (2006). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem: L.G.]
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Nota do editor:

Último poste da série > 12 de novembro de 2013 > Guiné 63/74 - P12284: Memória dos lugares (252): Bafatá ao tempo do Esq Rec Fox 2640 (1969/71) (Manuel Mata)

domingo, 17 de novembro de 2013

Guiné 63/74 - P12309: Fragmentos de Memórias (Veríssimo Ferreira) (2): O meu amigo felupe, o 44

1. Em mensagem do dia 11 de Novembro de 2013, o nosso camarada Veríssimo Ferreira (ex-Fur Mil, CCAÇ 1422 / BCAÇ 1858, Farim, Mansabá, K3, 1965/67) enviou-nos o segundo episódio da sua série Fragmentos de Memórias, dedicado ao seu amigo 44:


FRAGMENTOS DE MEMÓRIAS

2 - O meu amigo felupe, o 44

O meu amigo felupe, o 44, propôs-se a tirar-me a arreliadora matacanha.

Devidamente desinfectado tinha já um afiado alfinete de dama, sentou-se de frente a mim, pegou-me nos pézinhos tamanho do sapato 43, e olhou-os assim estilo quando miro aqueles de coentrada. Eu entretinha-me a tomar Cavalo Branco 12 anos, que era dia de festa. enquanto ele me olhava sequiosamente esperando também anestesiar-se.

Disse-lhe:
-Tira lá essa porra sem me magoares, que bebes a seguir...

Bebeu após me apresentar aquela bolha cheia de bichinhos lá dentro, fazendo lembrar os cachos de chocos a nascer, que se vêem nas praias.

Pé com matacanha* 
Fotos reproduzidas, com a devida vénia, de: (Parasitoses-astrópodes)

Este rapaz, de quem fui muito amigo e ele meu também, mereceu-me toda a atenção e dediquei-lhe algum do meu tempo disponível.

Fazia perguntas e queria saber mais... ele fosse sobre o nosso modo de viver em Portugal... os costumes, os usos... o significado de palavras e custava-lhe acreditar que o Mundo fosse da forma como eu lho descrevia.
No fundo, o meu também só era o Alentejo do Alto e foi presunção querer Alentejanizá-lo.

Divertia-se quando lhe expliquei que comíamos o porco de várias maneiras o que de todo ele repudiava com o "bé" que suponho ser assim uma espécie de "porra".

Ensinei-o a jogar dominó com umas peças com desenhos de posições sexuais e ria, ria muito, o que também ainda hoje faço quando se m'alembra a cena.

Perguntou-me também sobre os Deuses, sim que ele estranhava haver mais do que um.

Dentro do pouco que sabia sobre tal, lá lhe fui explicando o possível. Falei-lhe de quando menino de escola, ter quase obrigatoriamente que frequentar a igreja e saber até o Pai-Nosso, mas só até àquele certo dia em que descobri que as senhas que recebia por ir à catequese e com as quais me davam pelo Natal 125g de manteiga, ou mais, dependendo do número de presenças, eram a forma de me cativarem para a religião, o que me desgostou.

E mais ainda... ao saber que a manteiga vinha da América oferecida e para ser distribuída pelos mais pobres, revoltei-me.
O que se passava é que a coisa era pois para ser de borla para os necessitados, mas o senhor padre queria uma contrapartida e por isso abandonei a confissão da fé.

Mas mais lhe disse. Contudo, não deixei de lá ir, mas ficando cá fora, aquando da saída das missas e para ver as miúdas internas do colégio, que bem lindas eram e se apresentavam, com aquela farda própria... mostrando a perna até ao joelho, que na altura era só o que nos ofereciam de engodo.

Mais lhe contei sobre o dito que as mães e avós diziam às "piquenas":
- "Até ao joelho é para quem quiser ver, do joelho para cima só para quem merecer".

De qualquer forma, continuei. O teu a quem chamas Alá, gosta mesmo de mim, e tanto, tanto, qu'até te mandou criares porquinhos e não os comeres, qu'esse será crime a ser cometido por este teu amigo, já pecador confesso.

- Mas "nôsso furié"... o meu deixa as mulheres andarem nuas da cintura pra cima e o teu obriga-te a despir as da tua raça...

E enquanto assim falava, lá punha de novo a bocarra escancarada, com a dentuça branca toda à vista e batendo ruidosamente os pés no chão barrento.

- Ganhaste malandro, pensei... mas deixa que havemos de voltar ao assunto.

 Grande amizade ficou entre nós e para além disso foi óptimo colaborador militar da CCAÇ 1422, pois que sendo conhecedor do terreno que nos competia gerir ali no K3, foi um excelente guia para além de também e disfarçadamente houvesse sido meu segurança particular:
- "Não se cheguem ao "nôsso furié" que têm de se haver comigo" - parecia ele dizer olhando para a mata.

Aí aprendi com ele a disparar com arco e seta o que me fez sentir o Robin dos Bosques.
Muitos pombos verdes comemos assadinhos na brasa ou fritos e apanhados sem gastar balas e sem ruídos.

O sonho dele era poder vir a "conduzir" aviões e helicópteros e fez-me vários pedidos para que eu intercedesse nesse sentido. Na verdade e sem saber como lhe responder sem o magoar, adiei a questão até que um dia lá consegui dizer-lhe a verdade e em contrapartida convidei-o para ir aprender primeiro a "pilotar" a GMC que costumava ir à frente quando em coluna, íamos recolher os abastecimentos no caminho esburacado que nos ligava a Mansabá.
Para tal tive a permissão superior, embora um senhor alferes se tenha mostrado contra, argumentando que ele poderia desertar e levar-nos a viatura.

Por acaso até nem estava mal pensado, mas dada a conduta do rapaz e conhecendo as famílias, lá se procedeu conforme o meu pedido e era vê-lo todo vaidoso e já encartado, ao volante do Unimog da água.

Conheci-lhe a família toda na sua tabanca em Farim, partilhámos bianda e galinha de chabéu preparada pela sua mais bela mulher, a Fátima e não gostei mas tive de aceitar muito honrado, que pusesse o meu nome num dos filhos que houvera nascido.

E se há quem pense que não há estrelas cá em baixo na Terra, desiluda-se, porque já dizia o poeta: 
- NUM MONTE DE PEDRAS PODE NASCER UMA FLOR

(continuará ?)
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Notas do editor

(*) Vd. poste de 17 DE OUTUBRO DE 2010 > Guiné 63/74 - P7138: Doenças e outros problemas de saúde que nos afectavam (2): Matacanha (Rui Silva)

Último poste da série de 10 DE NOVEMBRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P12274: Fragmentos de Memórias (Veríssimo Ferreira) (1): Chegada a Bissau e deslocação para o Óio