sábado, 13 de novembro de 2010

Guiné 63/74 - P7275: Notas de leitura (169): O Império dos Espiões, de Rui Araújo (Mário Beja Santos)

1. Mensagem de Mário Beja Santos* (ex-Alf Mil, Comandante do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 9 de Novembro de 2010:

Queridos amigos,
As questões da Guiné andarão connosco até ao fim dos tempos. Aquela terra até espionagem teve, como se refere no livro do Rui Araújo. O que acontece é que ele dá a versão do que os britânicos sabiam sobre os alemães. Era importante saber quem eram os agentes dos Aliados na Guiné. A nossa missão em catar títulos é uma surpresa interminável.
Ainda há dias me dizia o Sousa Pires se eu tinha lido o romance do Mário G. Ferreira “Tempestade em Bissau”. Disse-lhe que não conhecia o livro e o autor, ao que parece, foi médico em Bambadinca, ao tempo do BART que veio substituir o BCaç 2852. Confrades como o Benjamim Durães poderão certificar quem foi o Mário G. Ferreira.

Um abraço do
Mário


A espionagem na Guiné, durante a II Guerra Mundial

Beja Santos

“O Império dos Espiões – A espionagem em Portugal e nas colónias”, de Rui Araújo (Oficina do Livro, 2010) propicia uma leitura absorvente e levanta mais questões do que os problemas que parecem ter ficado esclarecidos quanto a quem e para quem praticou espionagem em Portugal, na II Guerra Mundial.

Por diferentes razões, mas no decurso de todo o conflito, os principais serviços de informações das forças em contenda aqui actuaram, pagaram colaboração a cidadãos de diversa proveniência: marujos, estivadores, jornalistas, diplomatas, polícias, legionários, militares e até desportistas. A polícia política portuguesa não tinha meios para despistar a tempo e horas as actividades dos outros ou dividia-se claramente em apoios ao Eixo ou aos Aliados, favorecendo ou trabalhando discretamente por conta doutrem.

Rui Araújo baseia-se nos 12 volumes dos Diários de Guy Liddell, uma personagem fascinante da espionagem britânica. O autor investigou fontes nacionais que lhe permitiram ter acesso a informação inédita: Cândido Oliveira, futebolista e jornalista foi agente dos serviços secretos britânicos; o capitão Agostinho Lourenço, director da Polícia de Vigilância e Defesa do Estado era Jimmy, nome de código que lhe foi atribuído pelos norte-americanos. Terá sido um auxiliar muito útil na decepção dos serviços secretos japoneses, em Lisboa. O nosso Império Colonial não ficou à margem dos diferentes serviços de informações: em Cabo Verde, havia refugiados políticos, actuavam agentes italianos, portugueses e alemães; em Angola, foram patentes as actividades de espionagem alemãs e que tinham a ver com tráfego marítimo britânico, o movimento de tropas e a situação política no Congo e na África Austral; na Guiné, a espionagem alemã estava muito activa, os alemães estavam particularmente interessados no que se passava na Gâmbia e Serra Leoa mas também o movimento no porto de Dakar. Os principais dirigentes e agentes da polícia política portuguesa estavam bem identificados pela espionagem internacional: quem era pró-britânico ou pró-alemão. A polícia política procurava estar atenta às reacções, conversas e tomadas de posição públicas tanto dos intelectuais como dos militares. Um diplomata britânico em Lisboa escreveu: “Creio que a melhor forma de penetrar a Polícia Internacional é elogiar a vaidade natural e nacional dos seus responsáveis, que até muito recentemente não eram objecto de atenções por parte do lado britânico e só ouviam dizer mal de nós. Também são sensíveis a pequenas atenções, como charutos e cigarros, uísque, almoços, jantares, passeios de carro e chocolates para as esposas, etc., despesas até hoje inteiramente suportadas por mim”. Ronald Campbell, embaixador britânico, tinha uma noção clara da lealdade de Agostinho Lourenço a Salazar e sabia que a sua demissão acarretaria consequências desastrosas para a espionagem britânica. Esta julgava também que Lourenço trabalhava para os alemães e por quantias elevadíssimas. O capitão José Catela do Vale Teixeira, secretário-geral da polícia política, teria tido um relacionamento privilegiado com os serviços britânicos.

Pois bem, vejamos em concreto o que Rui Araújo refere sobre a Guiné Portuguesa. Ele refere exclusivamente a espionagem alemã, dirigida a partir de Lisboa. A informação seria enviada do arquipélago dos Bijagós para Lisboa. As mensagens da espionagem alemã também chegavam por correio, com o recurso a agentes que viajavam em navios portugueses. Recorria-se à tinta simpática, o processo de dissimulação mais usado na época. O juiz Dr. Elmano “Armando” Cunha e Costa seria uma das figuras mais importantes da espionagem em Bissau. Os alemães queriam fundamentalmente saber o movimento das tropas e tráfego marítimo dos aliados. Os emissores estariam colocados na ilha de Bubaque, onde havia uma firma alemã de óleo de palma, a Companhia Agrícola e Fabril da Guiné. De acordo com as informações existentes, os agentes alemães forneceriam comida e mensagens aos submarinos alemães. Para além do Dr. Elmano, Rui Araújo elenca outros importantes associados à organização de espionagem alemã. Eram eles: Hussein Jabre; Wilhelm e Ernesto Koenig; August Lohendorf (assim classificado: proprietário de um comércio e de uma plantação em Geba, é um selvagem); Paul Nienhaber (director da firma Sociedade Comercial Ringel, era um especialista em transmissões); Eduard Nicolai (português com ligações à firma alemã de Bubaque, trabalhava para um notório agente alemão de Lisboa); Eric Ortelbach (chegou a Bissau em Fevereiro de 1942, era controlador do tráfego telegráfico); Abel Valente de Oliveira (negociante ligado a negócios com a África Ocidental Francesa); capitão Horácio Faria Pereira (director da aviação da colónia, era abertamente pró-nazi); Paul Seifort (cônsul alemão em Bissau, vivia lá há 25 anos).

E nada mais se fica a saber. Talvez algum dos nossos confrades possua pistas para se espiolhar o que faziam os agentes aliados, com Cabo Verde a 500 quilómetros, era inteiramente impossível os aliados não terem informadores na Guiné.
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Notas de CV:

(*) Vd. poste de 12 de Novembro de 2010 > Guiné 63/74 - P7269: Operação Saudade 2010 (Mário Beja Santos) (5): Páginas de um diário quase improvável, antes de viajar para a Guiné (3) 1 de Novembro

Vd. último poste da série de 10 de Novembro de 2010 > Guiné 63/74 - P7259: Notas de leitura (168): Crónica da Libertação, de Luís Cabral (5) (Mário Beja Santos)

1 comentário:

Anónimo disse...

Em 2008 a mesma editora,publicava
um livro,também de Rui Araújo,base_
ado nos mesmos diários de Guy Li_
dell.Intitulado "O Diário Secreto
Que Salazar Não Leu"Caramba,aquilo foram uns tempos.Desde o Minho até
Timor,era: espionagem;contra espio_
nagem;agentes duplos.Toda a gente
era espiã ou correio.Desde por_
teiras;sopeiras,até altos fucioná_
rios.Todo o mundo espiava,sem qual_
quer intenção política, muitos só
queriam ganhar dinheiro.Vendiam in_
formações,recebendo determinadas
quantias, conforme a classificação
da informação.Devem ter sido uns tempos.Senão vejamos o que nos con_
ta Rui Araújo.
"Advogado espião provoca desmante_
lamento de rede na Guiné"
"Marinheiro ganha uns trocos à cus_
ta do afundamento de navios alia_
dos.
"Diplamata português condenado à morte escapa in extremis ao enfor_
cameto a pedido de Salazar"
"Mecânico de aviões junta o útil ao
agradável:espionagem e sexo(James
Bond portugês, digo eu).
Banqueiros de Lisboa cúmplices das
forças do Eixo"
"Caixeiro-viajante capturado tenta suicidar-se em Londres".
Aquilo deve ter sido cá um rega-bo_
fe.O livro tem cópias de: cartas;
mensagens codificadas;fotos de es_
piões;esboços ou rascunhos(croquis)
dos mais variados,etc,etc.
Carlos Nabeiro.