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domingo, 23 de junho de 2019

Guiné 61/74 - P19914: Manuscrito(s) (Luís Graça) (156): Quando eu morrer vou ter saudades da... Tabanca de Candoz





















Marco de Canaveses >  Freguesia de Paredes de Viadores e Manhuncelos > Candoz > Quinta de Candoz > 15/ 22  de junho de 2019 > 


Fotos (e legenda): © Luís Graça (2019. Todos os direitos reservados. [Edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Não sei quantos habitantes tem a Tabanca de Candoz, entre indivíduos das diferentes  espécies da fauna e da flora, do grilo à andorinha, sem esquecer o "homo sapiens sapiens"... que cultiva a vinha e cuida da horta...ou  do javali que  de vez em quando desce dos montes.


Vou lá meia dúzia de vezes por ano, pelo Natal, Carnaval, Pàscoa, Festa de Nossa Senhora do Socorro, vindimas, Festa da Família (31 de agosto)... e pelos batizados, casamentos e funerais. Fica a 400 quilómetros de Lisboa (itinerário: IC 17, A8, A17, A25, CREP, A4, Marco de Canaveses, Paredes de Viadores, Candoz...). De Candoz vê-se Cinfães, o rio Douro, o Porto Antigo, a serra de Montemuro... 

Tenho uma grande ternura pela Tabanca de Candoz, e sobretudo pelas suas gentes, incluindo bichos, árvores e plantas...Fui lá há dias, casou-se um sobrinho querido, do Porto. Fiquei lá mais uns dias...Há sempre coisas novas para descobrir na Tabanca de Candoz, e outras para confirmar: o amor, a amizade, a ternura, a solidariedade (, coisas estas que são mais difíceis de captar pela máquina fotográfica)...

Quando eu morrer,  vou ter saudades de muitas coisas e gentes, a começar pela Tabanca de Candoz onde fui feliz...  Foi lá que aprendi coisas que não existiam nos lugares da minha infância, no Oeste Estremenho, como comer as cebolinhas do talho com presunto e um naco de broa de milho, acompanhadas com o vinho  verde tinto bebido pela caneca  de porcelana, para não falar do anho assado com o arroz de forno ou da dança do fado ao som da rebeca... Ou ver o avô a brincar com o neto macho,  sentado nos joelhos, e a cantarolar: "O fadinho é bonito, os c... ao pé do p...". Ou conhecer a rota do românico...
  
Tem de se passar vários testes até se ser aceite na Tabanca de Candoz, ainda para mais quando se é mouro, se usa barbas e cabelo comprido ... Fui lá pela primeira vez no verão quente de 1975, quando o meu país estava a arder... Percebo agora  melhor a história deste país que nasceu entre dois vales apertados, o do Sousa e o do Tâmega...
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Nota do editor:

Último poste da série > 7 de junho de  2019 > Guiné 61/74 - P19866: Manuscrito(s) (Luís Graça (155): (i) "as noites" (2010), de Teresa Klut, "que mora numa ilha"... poemas escolhidos; (ii) fotomontagem: para o Rui, a Cristina e a Sara,que moram na mesma ilha

Guiné 61/74 - P19913: Agenda cultural (690): Rescaldo da Sessão de autógrafos de José Ferreira da Silva, na 89.ª Feira do Livro de Lisboa, onde esteve com o seu livro "Memórias Boas da Minha Guerra", vol III


As “MEMÓRIAS BOAS DA MINHA GUERRA” 
estiveram na Feira do Livro de Lisboa, através do vol. III

Não, não foram feixes de vassouras de giesta feitas pela Ti’Alice de Labercos; não foi o carrego de cestos de vime, encastrados, feitos pelo Ti’Manel do Engenho; nem, tão pouco, foi a giga de nabos, couves, grelos ou de cebolas da T’ímilia do Canto, que chegou para vender na “Feira dos 10”, em Lourosa. Nada disso! Nem foram outros artigos do antigamente, fabricados na minha aldeia, à qual me sinto umbilicalmente ligado.
Foi outra coisa, outro produto rural, com origens idênticas que, desta vez, teve o condão de chegar mais longe. Imaginem! Chegou à Feira do Livro de Lisboa!

Como sabem, assumi escrever as “Memórias boas da minha guerra”. Não é mais que um rol de histórias vividas por mim durante o período da guerra do ultramar. Agora, ninguém quer saber dessa guerra maldita que nos marcou e que muito parece envergonhar os nossos governantes. Todavia, há uma particularidade inédita que vem dando algum realce às minhas histórias: - o facto de assinalarem "memórias boas… da guerra”.

Talvez por se tratar já do III volume, a Editora Chiado levou a obra à 89.ª Feira do Livro de Lisboa e “obrigou-me” a ir lá rabiscar uns autógrafos tipo imitação de verdadeiros escritores. E eu, para não chegar à Feira de mãos a abanar, lembrei-me de levar duas dúzias de garrafas de Porto Reserva, rotuladas com o cartaz do lançamento do III volume, que me haviam sobrado daquele evento.

E foi por isso que logo chegado à Feira, aos pavilhões da Chiado, aproveitei para abrir a primeira garrafa nos “bastidores” (quer dizer, nas traseiras…) e promover uns brindes (in)oportunos


com os camaradas que foram chegando. Levei copos azuis e outros vermelhos (não havia verdes), para que cada um pudesse brindar sem restrições ou inibições clubísticas.


Cinco Combatentes da Guiné: (Eu, Hélder Valério, Nelito, Branquinho e Carlos Silva. Na segunda posição, outro Combatente (Eugénio Alves) da guerra contra o fascismo (esteve em Caxias em 1972).

O Mestre Branquinho é um dos nossos. Vive lá em Lisboa mas nunca renega as suas origens nortenhas, as quais exibe orgulhosamente, como Bom Português. Desde o IV Curso de Rangers de Lamego (já lá vai mais de meio século!), que nos condenaria a fazer a guerra da Guiné (integrados na Cart 1689), que mantenho uma óptima relação com o nosso Alfero Branquinho (hoje, Escritor e Advogado).

Embora prejudicado pelo tempo ocupado pelo escritor que me antecedeu, mandaram-me sentar num cadeirão, ao lado de outro vazio que seria ocupado pelos interessados no meu livro. Eis-me devidamente instalado no Pavilhão A50 da Chiado Editora, 89.ª Feira do Livro de Lisboa, para iniciar a Sessão de Autógrafos.

O meu cunhado Eugénio Alves, que vive em Lisboa, esse sim, um Homem de Letras muito ligado ao jornalismo, fez questão de receber a primeira dedicatória. Porra! Foi preciso este acontecimento para que estes dois Crestumenses se encontrassem por “terras de São Sebastião da Pedreira”, onde foi colocada a maior bandeira de Portugal e um grande carago do João Cutileiro!

O Diniz é o Bandalho que nos representa na corte lisboeta. Amigo do peito, mantém ligação permanente às actividades do Bando. Para além do agradecimento ao Diniz Faro, convém referir a simpatia que merecemos da funcionária Vânia. Infelizmente não é todos os dias que sentimos assim o calor dos nossos jovens.

Um abraço especial para o Melro Maior, Gondomarense Carlos Silva, que embora a exercer advocacia em Lisboa, muito se tem dedicado no apoio à Tabanca Amiga, aos Guineenses e à implantação do nosso Museu em Fânzeres (Choupal dos Melros).

O Hélder veio de Setúbal para nos abraçar e mandar mais umas larachas acerca dos “morcões lá do norte”, nomeadamente contra os seguidores do nosso “Papa”.


Quando ele começa a dissertar justificações sobre os assuntos melindrosos da Capital do Império, especialmente daquelas trapacices da Catedral, mais me vale estar caladinho, feito morcão, à espera que o tempo "bire".
Benfiquista ferrenho, o Hélder recusou brindar com copo azul.


Brincalhão, o Helder veio a responder:
- Não foi bem "recusar"... havia alguma suspeita de que pudesse estar "armadilhado", com toupeiras ou coisa assim, ou então com algum produto para "virar gostos e opiniões" mas, disse que o vinho era muito bom! E, além disso, o "ferrenho" é só para os "ferrenhos" e enquistados portistas....

Uma dupla “à maneira”; um a rabiscar umas sentidas dedicatórias e o outro a fazer de repórter com uma máquina sorteada na farinha Amparo. Grande abraço ao nosso incansável e insubstituível Presidente vitalício, Jorge Teixeira, mais conhecido por Jotex.

O camarada Eduardo Amaral, vindo de Cascais, foi o que recebeu mais apoio da lindíssima funcionária Iurky, mesmo sem saber uma palavra de japonês.

Acusado de aparecer nas funções de “emplastro” e não a de tradutor, o camarada Hélder justificou:
- É verdade, o “emplastro” está "quase" em todas, mas neste caso eu tentava, apenas, explicar ao Eduardo que a japonesinha (de ascendência) era brasileira.


Tive também a oportunidade de conviver um pouco com a escritora de renome Adelaide Vilela. Com um currículo notável, esta portuguesa, a viver em Montreal, no Canadá, percorre o Mundo mostrando o que faz de bom da língua de Camões. Senti-me muito honrado com a sua atenção e simpatia.

Resta-me agradecer a toda a malta que me visitou e ajudou neste evento. Para além da agradável surpresa que senti no seu aparente sucesso, registo a camaradagem, a satisfação e a amizade que me envolveram.

José Ferreira (Silva da Cart 1689)
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Notas do editor

Vd. poste de 7 de junho de 2019 > Guiné 61/74 - P19867: Agenda cultural (688): Convite do autor e da editora: dia 14 de junho, sexta-feira, às 20h00, no Espaço Chiado, Parque Eduardo Sétimo, Lisboa, 89ª Feira do Livro de Lisboa; Sessão de autógrafos: José Ferreira da Silva, "Memórias Boas da Minha Guerra", vol III

Último poste da série de 16 de junho de 2019 > Guiné 61/74 - P19893: Agenda cultural (689): Lançamento do livro de Mário Leitão, "Heróis Limianos da Guerra do Ultramar", Museu da Farmácia, Lisboa, dia 17 de junho, às 18h30

Guiné 61/74 - P19912: Blogpoesia (626): "Sábado de sol", "Sempre de pé" e "Um cacho de flores vermelhas", da autoria de J. L. Mendes Gomes, ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 728

1. Do nosso camarada Joaquim Luís Mendes Gomes (ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 728, Cachil, Catió e Bissau, 1964/66) estes belíssimos poemas, da sua autoria, enviados, entre outros, ao nosso blogue, que publicamos com prazer:


Sábado de sol

Largos horizontes por estas bandas do Oeste.
Suaves colinas verdejantes, desdobradas ao largo.
Vales profundos.
Escarpas agrestes arrostando o mar.
Núvens ao alto, pairando acesas.
Caminhadas pedestres e excursões em liberdade.
Uma brisa do mar. Carregada de iodo.
Descansam no porto os barquinhos da pesca.
Vagueiam gaivotas mirando cardumes.
Banhistas não há. A água está fria.
Vultos surfistas rasgam as sombras, desafiando a morte.
Prefiro segurança nos pés, mesmo sem asas.
Vale mais um sábado de sol à borda do mar que uma noitada de festa, mesmo com baile.

Café Setemomentos, arredores de Mafra,
9h1m
Jlmg

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Sempre de pé

Cair, uma e outra vez, só acontece a quem anda de pé.
O que importa é levantar e seguir caminho.
Cuidar das feridas e nunca desanimar.
Nada é fácil. O que tem valor custa sempre a alcançar.
A não ser o que nos é oferecido.
Ainda assim, nossa atitude terá de ser o reconhecimento e a gratidão.
Está é a cadeia do nosso estar e viver em paz e com gosto.
Semear o bom. Recusar o mau.
Nada nos pese na consciência ao fim de cada dia.
E, se algo falhou, o caminho será repor na medida do que for possível.
Prontamente. Sem adiamentos.
Esquecer é outra das falhas e irreparável.

Ouvindo Martha Argerich - Chopin: Piano Concerto No. 1 in E minor, Op. 11

Mafra, 19 de Junho de 2019
8h42m
Dia cinzento
JLmg

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Um cacho de flores vermelhas

No meio dum campo verde sobressai isolado um grande cacho de flores vermelhas.
Nasceram ali, por arte do destino.
Lembrando ao milho que nem só de pão vive o homem.
As flores têm o condão de dar beleza à mesa de um festim.
Como de alegria o vinho.
Um mar de espigas é fartura e morte à fome.
Ó sublime beleza dum campo vasto de papoilas, ao vento bailarinas.
E aqueles valados de giestas amarelas, perfumadas, que ladeiam as estradas.
Tudo prendas com que nos brindam, de graça, a Natureza para regalo de nossos olhos.

Ouvindo Oh! Khatia Buniatishvili Plays Chopin Sonata N.º 2 Op 35

Bar Caracol, arredores de Mafra, 20 de Junho de 2019, dia do Corpo de Deus,
10h30m
JLmg
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Nota do editor

Último poste da série de 16 de junho de 2019 > Guiné 61/74 - P19895: Blogpoesia (625): "Frente ao mar", "Estão em sentido rigoroso as casas e as janelas da cidade..." e "Espero-te, sol...", da autoria de J. L. Mendes Gomes, ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 728

Guiné 61/74 - P19911: Parabéns a você (1643): João Carvalho, ex-Fur Mil Enfermeiro da CCAÇ 5 (Guiné, 1973/74)

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Nota do editor

Último poste da série de 22 de Junho de 2019 > Guiné 61/74 - P19908: Parabéns a você (1642): Coronel Art Ref António José Pereira da Costa, ex-Alf Art da CART 1692 (Guiné, 1968/69), ex-Cap Art, CMDT das CARTs 3494 e 3567 (Guiné, 1972/74)

sábado, 22 de junho de 2019

Guiné 61/74 - P19910: Os nossos seres, saberes e lazeres (333): Na Bélgica, para rever e para descobrir o nunca visto (2) (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 22 de Janeiro de 2019:

Queridos amigos,
Com a visita à exposição da coleção Wolfers pôs-se termo ao primeiro dia em Bruxelas, seguiu-se um belo passeio nos jardins da comuna de Watermael-Boitsfort, um grande amigo octogenário anda com as forças derribadas, decidiu ir viver para uma residência, receia dar tombos em casa. Não deixa de ser uma opção dolorosa, confidencia ao viandante.
E na manhã seguinte, esse mesmo viandante parte por sua conta e risco para andarilhar no bairro popular de Bruxelas, Marolles, sobretudo a Feira da Ladra, mas passear-se por lugares icónicos, que lhe são muito familiares, como a Rue Haute, Rue des Minimes, Rue des Tanneurs, será aqui que irá almoçar num tasquinho económico, ajoujado de alguma tralha adquirida no mercado. E como se verá adiante, mesmo ajoujado não resistiu a investir nas livrarias de obras em segunda mão, para ele uma espécie de paraíso na terra.

Um abraço do
Mário


Na Bélgica, para rever e para descobrir o nunca visto (2)

Beja Santos

O viandante anda pela exposição dedicada à joalharia dos irmãos Wolfers em deslumbramento, talvez mesmo em transe hipnótico, são artes decorativas de valor excecional, sempre que visita em Lisboa o Museu Gulbenkian demora-se no espaço reservado as artes decorativas de outro génio, René Lalique, Philippe Wolfers foi contemporâneo de Lalique. Mas o viandante não só se enamora da ourivesaria e objetos decorativos, compraz-se com a articulação do mobiliário concebido por outro génio, o arquiteto Victor Horta, alguém que deixou edifícios públicos e privados sem paralelo, pode bem acontecer a todos aqueles que vão a reuniões a Bruxelas que não saibam que a Gare Central é projeto de Victor Horta, como o Palácio das Belas-Artes, como a celebérrima Maison du Peuple, criminosamente deitada abaixo. E noutra oportunidade já aqui se enalteceu o Museu Horta, situado na Comuna de Saint-Gilles, em Bruxelas, a casa e ateliê do génio, figura de proa do vanguardismo arquitetónico mundial.




O viandante não está interessado em fatigar o leitor, deixam-se aqui algumas imagens destes tesouros, pode dar-se o caso de o leitor um dia visitar Bruxelas, pode vir até ao Museu do Cinquentenário e usufruir destas belezas, algumas delas fazem parte da coleção permanente do museu.






O segundo dia, o viandante continua em Bruxelas, é dia de semana, a Place du Jeu de Balle, onde se situa a Feira da Ladra de Bruxelas, está entregue a pequenos comerciantes árabes que compram os recheios das casas, tudo se encontra, desde restos da casa de banho, caixas com fotografias, vestuário da avó, as mais inconcebíveis tralhas de sótão, e livros, discos compactos, quadros, esta praça é uma exposição pública de cavernas de Ali Babá de interiores muito incómodos para os herdeiros que tudo despejam a pataco, atenda-se ao que se vê nestas imagens.






Manhã trabalhosa para o viandante, trabalhosa e rendosa, sai daqui com uma caixa de leques completa, um prato de Companhia das Índias com cabelo, um lenço de pescoço de senhora da casa Dior, do final dos anos 50, pedaços de rendas, uma edição encadernada de Balzac, com belas ilustrações, segue agora para o almoço e a penalizar-se da sua falta de juízo, os voos low cost são implacáveis, não pode andar com esta traquitana avulsa em exibição. Agora é tarde, as compras estão feitas e a verdade é que dias depois embarca com uma caixa de leques a tiracolo e este imenso saco de tralha, que não lhe dá mais saúde à sua tão maltratada coluna. Paciência, é o preço de ser um acumulador desenfreado.

(continua)
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Nota do editor

Último poste da série de 15 de junho de 2019 > Guiné 61/74 - P19891: Os nossos seres, saberes e lazeres (332): Na Bélgica, para rever e para descobrir o nunca visto (1) (Mário Beja Santos)

Guiné 61/74 - P19909: In Memoriam: Os 47 oficiais oriundos da Escola do Exército e da Academia Militar mortos na guerra do ultramar (1961-75) (cor art ref António Carlos Morais da Silva) - Parte XXIV: Manuel Carlos Conceição Guimarães, cap art (Lisboa, 1937 - Geba, Guiné, 1967)


Guiné > Zona Leste > Geba > CART 1690 > 1967 > O cap art Manuel Carlos da Conceição Guimarães,  primeiro comandante da CART 1690 (Geba, 1967), então com 29 anos. Foi um dos 26 capitães que morreram no TO da Guiné (*). Neste caso, em comabte,  na estrada Geba-Banjara, em 21 de agosto de 1967, na sequência de deflagração de uma mina A/C. Tem 4 referências no nosso blogue. (**)

Foto (e legenda): © A. Marques Lopes (2007). Todos os direitos reservados. [Edução e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]







1. Continuação da publicação da série respeitante à biografia (breve) de cada um dos 47 Oficiais oriundos da Escola do Exército e da Academia Militar que morreram em combate no período 1961-1975, na guerra do ultramar ou guerra colonial (em África e na Ásia). (***)

Trabalho de pesquisa do cor art ref António Carlos Morais da Silva [, foto atual à direita], instrutor da 1ª CCmds Africanos, em Fá Mandinga, adjunto do COP 6, em Mansabá, e comandante da CCAÇ 2796, em Gadamael, entre 1970 e 1972.

Morais da Silva foi cadete-aluno nº 45/63, do corpo de alunos da Academia Militar. É membro da nossa Tabanca Grande, com o nº 784, desde 7 do corrente.

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Notas do editor:



Guiné 61/74 - P19908: Parabéns a você (1642): Coronel Art Ref António José Pereira da Costa, ex-Alf Art da CART 1692 (Guiné, 1968/69), ex-Cap Art, CMDT das CARTs 3494 e 3567 (Guiné, 1972/74)

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Nota do editor

Último poste da série de 20 de Junho de 2019 > Guiné 61/74 - P19904: Parabéns a você (1641): Cherno Baldé, Amigo Grã-Tabanqueiro, Engenheiro e Gestor de Projectos, natural da Guiné-Bissau

sexta-feira, 21 de junho de 2019

Guiné 61/74 - P19907: Notas de leitura (1189): Missão cumprida… e a que vamos cumprindo, história do BCAV 490 em verso, por Santos Andrade (11) (Mário Beja Santos)



1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 6 de Março de 2019:

Queridos amigos,
Estamos ainda nos primeiros meses da Comissão do BCAV 490, agosto e setembro de 1963. A batalha do Como ainda vem longe, será em fevereiro do ano seguinte. Aí teremos documentação suficiente, basta pensar nesse arauto que é o Armor Pires Mota e o seu magnífico "Tarrafo". Mas não só. Na biografia de Alpoim Calvão, intitulada "Honra e Dever", os três autores descrevem minuciosamente a Operação Tridente, a participação da Marinha e as belas páginas escritas pelo mais condecorado Oficial da Marinha Portuguesa.
António Santos Andrade repertoria os primeiros acidentes graves, recorda os jogos de futebol, fala em guerrilheiros capturados e no muito terror que por ali se espalhou, o muito sofrimento de vítimas inocentes, como é uso e costume em todas as guerras.

Um abraço do
Mário


Missão cumprida… e a que vamos cumprindo (11)

Beja Santos

“O Alferes Brasil foi ferido.
Que triste coisa passaram,
o Teodomiro e o Peixeiro
nessa rodada calharam!

Saindo para a missão
que tinha a desempenhar,
teve grande azar
o Alferes do 1.º Pelotão.
No lado oposto ao coração
um tiro lhe foi metido.
O homem deu um gemido
não há ninguém que se esqueça
e com estilhaços na cabeça,
o Alferes Brasil foi ferido.

Apanhámos muitos prisioneiros:
um deles, sapador,
fez umas coisas de terror.
Ele e os seus companheiros
malvados e traiçoeiros,
duma infeliz preta abusaram,
e uma pobre rapariga cegaram.
Aquilo metia dó,
a seguir a Mamboncó
que triste coisa passaram.

Um dia de manhã cedo,
nesse dia eu não fui lá,
entre Bissorã e Mansabá,
os rebentamentos metiam medo.
No meio daquele arvoredo,
feriu-se o Cassifre, bom companheiro,
o Gaimota do morteiro
foi ferido noutra altura;
e sofrendo grande amargura,
o Teodomiro e o Peixeiro.

Agora vou-lhes contar
qual era a minha distracção.
Quando havia ocasião
a bola ia jogar.
Também gostava de conversar
com os bandoleiros que se aprisionaram.
Um dia uma mina armaram
dando-se um rebentamento que estremecia
e três rapazes da Companhia
calharam nessa rodada.”

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Bissorã e Mansabá são sinónimos, logo em 1963, de que a região do Morés dinamizava a guerrilha, espalhava-se o terror, raptava-se, destruíam-se tabancas, executavam-se os recalcitrantes, são regras de ouro do caos, as populações abandonam haveres, os seus lugares, recolhem-se aos destacamentos militares ou atravessam as fronteiras. O bardo dá notícias de gente ferida, temos aqui nova oportunidade para voltar à companhia de “As Ausências de Deus”, de António Loja:
“Depois de uma emboscada sofrida na estrada Mejo-Guileje fiz seguir de helicóptero para o Hospital Militar de Bissau, gravemente ferido, o Cabo Calçada, um dos mais genuínos cavalheiros que encontrei na guerra. Apanhara uma rajada de metralhadora no tórax e olhei apreensivo para a ferida. O furriel-enfermeiro não me encorajou:
- É muito grave, disse.

Há homens que morrem antes da morte chegar, outros que a recusam com convicção, mesmo quando ela se agarra vorazmente ao corpo da sua vítima, dedos enclavinhados e dentes afiados de vampiro. Calçada era um desses homens. Na estrada, quando lhe dirigi uma palavra de encorajamento, ao ajudar a içá-lo para o helicóptero, ele olhou-me bem a direito, olhos nos olhos, tentou fazer um sorriso que pareceu um esgar e (cúmulo da malícia para espantar a morte) piscou-me o olho. Não conseguia falar mas o gesto expressivo não poderei jamais esquecê-lo.
O contacto com o hospital, que fiz posteriormente através de um alferes que se deslocou a Bissau, foi optimista mas ainda problemático: tinham-lhe extraído um pulmão e ele estava por um fio. Mas o alferes referiu a imensa vontade de viver que transbordava da sua atitude, posto que não das suas palavras. É que a falta do pulmão o impedia ainda de falar e só a sua atitude de desafio face à morte convencia quem o encontrava que o homem era invencível.

Dois meses depois fui chamado ao Quartel-General em Bissau e inclui no meu itinerário uma passagem pelo hospital para visitar os meus soldados lá internados, entre eles o Calçada. Na recepção identifiquei-me, colhi informação do quarto onde ele se encontrava e para lá me dirigi. A cama onde ele deveria estar, impecavelmente arrumada, fez-me pensar no pior. Teria morrido e nada me teria sido comunicado? Saí para o corredor em direcção à recepção, para uma informação precisa. De repente, vejo avançar em sentido oposto um homem magro, em pijama, agarrado a um suporte metálico com rodízios onde se suspendia um invólucro transparente com soro. O homem olhava fixamente para mim, que de tão perturbado, mal via o que se passava à minha volta. Mas, quando levantei para ele o meu olhar descobri a cara risonha do Calçada, que de novo me piscava o olho e me dizia, arfando:
- Ainda cá estou, meu capitão.
E estava. Para ficar. Porque era mesmo invencível. Dera um pontapé na morte. Dispensado da guerra veio lutar por uma causa mais digna: o dia-a-dia de um ser humano com vontade de viver.” 

A guerra é farto pasto para desentendimentos entre armas, hierarquias, desenvolve contenciosos que têm na raiz a petulância do estatuto, vaidade das vaidades. E António Loja conta um episódio quase parente de uma ópera-bufa vivido entre um alferes de infantaria e um tenente dos helicópteros:
“O dia seguinte, em Mejo, iniciou-se sem novidades. Como previsto, o helicóptero de apoio à nossa operação veio pousar no campo de futebol anexo ao quartel e, montada a segurança àquele, o piloto veio confraternizar com o Alferes Ávila, que o tratou com a maior urbanidade possível no cu de Judas que era Mejo. Em chegando a hora de almoçar, o Ávila, que não escondia as dificuldades de providenciar uma hospitalidade mais generosa, convidou o piloto para uma ração de combate. O que obviamente desagradou ao tenente, habituado às mordomias da messe da Força Aérea em Bissau. E disse, com o ar superior de quem fez exame de condução de helicópteros e tem por isso o rei na barriga, que ia almoçar a Bissau. Aí as coisas aqueceram. O Alferes Ávila, Comandante interino do quartel de Mejo, olhou de frente o tenente, que apenas comandava o helicóptero e disse-lhe, nariz no ar:
- O meu tenente veio a Mejo para dar apoio à operação e está às ordens do meu capitão, que o chamará, se for preciso. E só sai daqui quando eu receber instruções dele e para o local que ele indicar. 
O aviador achou que chegava ostentar os galões e voar para a capital:
- Vou até Bissau e volto quando acabar de almoçar.
Mas estava enganado. Ávila respirou fundo e deu um berro:
- Não vai, não! O meu tenente sabe onde tenho montada a doze sete? Na casamata que fica sobre o campo de futebol. Mesmo em frente do seu ‘brinquedo’.
Parou para tomar fôlego e deu outro berro, já noutra direcção:
- Cabo Chico, vai para a metralhadora e, se o helicóptero levantar, dá-lhe uma rajada das grossas.
Chico era a obediência em pessoa. Levava à risca o princípio de que ordens são para obedecer. E ninguém se lembrava de desobedecer ao Ávila.
O cabo correu para a casamata e preparou-se para actuar. O tenente-aviador viu as coisas mal paradas. Voltou cabisbaixo para a messe onde o Ávila, generosamente, lhe ofereceu um uísque. E com este abriu o apetite para a ração de combate que era ainda pior do que dobrada desidratada”.

O nosso bardo fala em jogos de futebol, há muita literatura avulsa sobre lazeres desta natureza, era uma belíssima forma de descarregar a tensão. Não havia destacamento sem campo de futebol, as unidades, grandes e pequenas, formavam equipas, combinavam-se encontros para o tempo de folga. Recordo da minha vida em Missirá (no Cuor) que se incentivava jogos entre caçadores nativos e milícias, a pequenada tinha todos os apoios possíveis, os candidatos a guarda-redes até se podiam ufanar de ter luvas e joelheiras e bonés, indumentária a preceito para aqueles tempos. Deverá ter ficado memória entre gerações, dos jogos e respetivos equipamentos, pois quando ali regressei, em janeiro de 1990, um dos bilhetinhos trazia o pedido de equipamentos, bola, redes, como no passado. E comovi-me muito, mesmo sabendo como pesa a narrativa oral e o desfiar da memória africana. Em Bambadinca, houve jogo entre oficiais e sargentos, guarda-se fotografia no blogue, fui para guarda-redes e comportei-me como um bom frangueiro. A equipa incluía o 2.º Comandante do BCAÇ 2852, Major Ângelo da Cunha Ribeiro, o nosso médico, David Payne Pereira, o Ismael Augusto, o Fernando Calado, o Abel Rodrigues e o Carlão, da CCAÇ 12, entre muitos outros. E foi num jogo de futebol que o nosso oficial de transmissões, o Fernando Calado, se acidentou com gravidade, ele aparece numa fotografia com um braço engessado, numa parede bem estilhaçada durante a flagelação de 28 de maio de 1969.
A guerra também passava pelo campo de futebol…

(continua)
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Notas do editor:

Poste anterior de 14 de junho de 2019 > Guiné 61/74 - P19890: Notas de leitura (1186): Missão cumprida… e a que vamos cumprindo, história do BCAV 490 em verso, por Santos Andrade (10) (Mário Beja Santos)

Último poste da série de 18 de junho de 2019 > Guiné 61/74 - P19900: Notas de leitura (1188): Uma história antiga, do livro "Brunhoso, Era o Tempo das Segadas - Na Guiné, o Capim Ardia", da autoria de Francisco Baptista, com lançamento no próximo dia 24 de Agosto de 2019, pelas 15 horas, no Salão Nobre da Câmara Municipal de Mogadouro