domingo, 23 de junho de 2019

Guiné 61/74 - P19912: Blogpoesia (626): "Sábado de sol", "Sempre de pé" e "Um cacho de flores vermelhas", da autoria de J. L. Mendes Gomes, ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 728

1. Do nosso camarada Joaquim Luís Mendes Gomes (ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 728, Cachil, Catió e Bissau, 1964/66) estes belíssimos poemas, da sua autoria, enviados, entre outros, ao nosso blogue, que publicamos com prazer:


Sábado de sol

Largos horizontes por estas bandas do Oeste.
Suaves colinas verdejantes, desdobradas ao largo.
Vales profundos.
Escarpas agrestes arrostando o mar.
Núvens ao alto, pairando acesas.
Caminhadas pedestres e excursões em liberdade.
Uma brisa do mar. Carregada de iodo.
Descansam no porto os barquinhos da pesca.
Vagueiam gaivotas mirando cardumes.
Banhistas não há. A água está fria.
Vultos surfistas rasgam as sombras, desafiando a morte.
Prefiro segurança nos pés, mesmo sem asas.
Vale mais um sábado de sol à borda do mar que uma noitada de festa, mesmo com baile.

Café Setemomentos, arredores de Mafra,
9h1m
Jlmg

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Sempre de pé

Cair, uma e outra vez, só acontece a quem anda de pé.
O que importa é levantar e seguir caminho.
Cuidar das feridas e nunca desanimar.
Nada é fácil. O que tem valor custa sempre a alcançar.
A não ser o que nos é oferecido.
Ainda assim, nossa atitude terá de ser o reconhecimento e a gratidão.
Está é a cadeia do nosso estar e viver em paz e com gosto.
Semear o bom. Recusar o mau.
Nada nos pese na consciência ao fim de cada dia.
E, se algo falhou, o caminho será repor na medida do que for possível.
Prontamente. Sem adiamentos.
Esquecer é outra das falhas e irreparável.

Ouvindo Martha Argerich - Chopin: Piano Concerto No. 1 in E minor, Op. 11

Mafra, 19 de Junho de 2019
8h42m
Dia cinzento
JLmg

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Um cacho de flores vermelhas

No meio dum campo verde sobressai isolado um grande cacho de flores vermelhas.
Nasceram ali, por arte do destino.
Lembrando ao milho que nem só de pão vive o homem.
As flores têm o condão de dar beleza à mesa de um festim.
Como de alegria o vinho.
Um mar de espigas é fartura e morte à fome.
Ó sublime beleza dum campo vasto de papoilas, ao vento bailarinas.
E aqueles valados de giestas amarelas, perfumadas, que ladeiam as estradas.
Tudo prendas com que nos brindam, de graça, a Natureza para regalo de nossos olhos.

Ouvindo Oh! Khatia Buniatishvili Plays Chopin Sonata N.º 2 Op 35

Bar Caracol, arredores de Mafra, 20 de Junho de 2019, dia do Corpo de Deus,
10h30m
JLmg
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Nota do editor

Último poste da série de 16 de junho de 2019 > Guiné 61/74 - P19895: Blogpoesia (625): "Frente ao mar", "Estão em sentido rigoroso as casas e as janelas da cidade..." e "Espero-te, sol...", da autoria de J. L. Mendes Gomes, ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 728

8 comentários:

Fernando Ribeiro disse...

Uma bela descrição da Ericeira, o poema "Sábado de Sol". Com poucas ou nenhumas alterações, aliás, também poderia ser uma descrição de S. Julião, por exemplo. Quanto ao terceiro poema, imagino que os campos de Mafra estejam neste momento cheios de papoilas. A longínqua memória da minha passagem pela E.P.I. há 48 anos e por esta altura do ano (como o tempo passa!) invoca tais gritos de cor vermelha.

Quanto à música, nada a objetar. A argentina Marta Argerich é o Leonel Messi do piano (e a portuguesa Maria João Pires é o Cristiano Ronaldo), enquanto a georgiana Khatia Buniatishvili, além de ser uma talentosíssima pianista, é um pedaço de mulher. Vinte valores!

Joaquim Luís Mendes Gomes disse...

Tudo que disseste está certíssimo. Eu calcorreei o COM de Mafra em 1963!...Ano em que mataram o Kennedy.


Um abração.
Joaquim

Anónimo disse...

O Fernando Ribeiro já disse tudo sobre o primeiro poema, lembrei-me logo da Ericeira, como poderia ser em tantos outros locais deste país.
O segundo poema, pode lembrar um pouco Mafra, pois por lá a gente também era obrigada a cair.
Sobre o terceiro, as tais papoilas, não me lembro desse panorama, andei por lá jan-fev-março 67, a fazer a recruta do COM, e não me lembro de flores, só frio e chuva.
Isto é preciso puxar pela memória, é um exercício salutar que faço sempre.

Tenho pena de não conhecer essa Georgiana Khatia, vou ver se procuro no google, para ver se vale os 20 valores.

Um abraço,

Virgilio Teixeira

Anónimo disse...

georgiana Khatia Buniatishvili,

Já via algumas dezenas de fotos desta bela pianista.

Fico pelos 19 valores, pois, como disse um antigo professor meu de Matemática, não me dava 20 valores, porque,

- 20 são para os Deuses
- 19 são para mim (ele)
- O resto é para vocês, os alunos

Gostei deste pedaço de mulher e pianista!

Virgilio Teixeira


Joaquim Luís Mendes Gomes disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Valdemar Silva disse...

Mendes Gomes
Conheço bem as 'bandas do Oeste' e o 'campo vasto de papoilas, ao vento bailarinas'.
É, tudo aqui, não muito longe de casa.
Em tempos, julgo que nos anos 80, do século passado, fui ouvir os carrilhões da Basílica de Mafra tocando musicas dos Beatles. 'Penny Lane' foi como diria a letra da canção:
'...Penny Lane está nos meus ouvidos e nos meus olhos...'
Inesquecível. E, depois, acabar com uns tintos à mistura com mexilhões de cebola na Ericeira ' onde o mar é mais azul, das belas praias do sul'.

Abraço
Valdemar Queiroz

Joaquim Luís Mendes Gomes disse...

Boas memórias Valdemar. Os carrilhões andam muito calados...Mas, caracóis há muitos.
Um abraço.
Joaquim

Fernando Ribeiro disse...

Eu pertenci à 2.ª incorporação no C.O.M. no ano de 1971. No 1.º ciclo, que decorreu entre abril e junho, a minha companhia teve três mortos por afogamento e dois feridos por estilhaços na cara, que causaram a cegueira num olho a um deles, tudo durante a instrução. Fiquei com um ódio à tropa que nem vos conto.

Como fui destinado a ser oficial miliciano de Infantaria, fiz também o 2.º ciclo do C.O.M. em Mafra, que decorreu entre julho e setembro de 1971. Embora duro, o 2.º ciclo foi mais humano do que o 1.º e não houve baixas. Fosse como fosse, eu é que não estava com disposição para aturar aquela coboiada e não estudava para os testes nem um bocadinho. Como resultado, tirava negativas atrás de negativas nos testes. Como só podia ir passar os fins de semana a casa quem tivesse positiva nos testes, eu passava os meus fins de semana em Mafra, de castigo. Passava os fins de semana em Mafra... é uma maneira de dizer. Como era no verão, eu apanhava a camioneta para a Ericeira e passava os fins de semana na praia, isso sim. Só regressava a Mafra à noite para dormir.