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quinta-feira, 22 de maio de 2025

Guiné 61/74 - P26832: Facebok...ando (78): Bissássema (cor GNR ref João Manuel Pais Trabulo, ex-alf mil, CCAÇ 2314, Tite e Fulacunda, 1968/69) - Parte I: Fichas de unidade: BCAÇ 2834 e CCAÇ 2314

1. Temos apenas 7 referências à CCAÇ 2314 (e nenhum representante na Tabanca Grande, até agora, mas  o ex-fur mil Joaquim Caldeira já aceitou ser o primeiro, o que muitos nos honra, a todos nós amigos e camaradas da Guiné: vai sentar-se no lugar nº 904, à sombra do nosso poilão).

Por sua vez, há uma página do Facebook CCAÇ 2314 - Age Quod Agis (o lema da companhia que, em latim, quer dizer "faz o que tens a fazer", ou "faz bem o que fazes").

Foi nesta página que li uma série de postagens sobre a história (trágica) de Bissássema, da autoria do cor GNR ref João Manuel Pais Trabulo (que esteve na CCAÇ 2314, como alf mil at inf),

Um poste recente, do nosso camarada Aníbal Silva chamou-nos a atenção para esta CCAÇ 2314 / BCAÇ 2834, a que pertenceu o fur mil Joaquim Caldeira (*). E o Aníbal trouxe-nos o Joaquim, uma grande história de camaradagem e amizade.

2. Para já vamos conhecer as fichas de unidade do BCAÇ 2834 e da CCAÇ 2314:

Ficha de unidade > Batalhão de Caçadores nº 2834

Identificação: BCaç 2834

Unidade Mob: RI 15 - Tomar

Cmdt: TCor Inf Carlos Barroso Hipólito | 2.0 Cmdt: Maj Inf Rui Barbosa Mexia Leitão | OInfOp/ Adj: Maj Inf Albino Simões Teixeira Lino

Cmdts Comp: CCS: Cap SGE António Freitas Novais | Cap Mil Art António Dias Lopes | Cap Inf Eugénio Baptista Neves
CCaç 2312: Cap Mil Inf Júlio Máximo Teixeira Trigo
CCaç 2313: Cap Inf Carlos Alberto Oliveira Penim
CCaç 2314: Cap Inf Joaquim de Jesus das Neves

Divisa: "Juntos Venceremos" - "Para vencer, convencer"

Partida: embarque em 10Jan68; desembarque em 15Jan68 | Regresso: embarque em 23Nov69 

Síntese da atividade operacional

(i) em 16Jan68, rendendo o BArt 1904, assumiu a responsabilidade do sector de
Bissau, com a sede em Bissau e abrangendo os subsectores de Brá, Nhacra e
Quinhámel, comandando e coordenando a actividade das subunidades ali estacionadas, por forma a garantir a segurança e defesa das instalações e populações da área; as suas subunidades foram então atribuídas a outros sectores;

(ii) em 24Jun68, foi substituído no sector de Bissau pelo BCaç 1911 e assumiu
em 25Jun68 a responsabilidade do Sector S2, com sede em Buba e abrangendo
os subsectores de Sangonhá, que viria a ser extinto em 29Ju168, Gadamael,
Cameconde, que desde 28Dez68, passou a subsector de Cacine, Guileje,
Gandembel e Buba, onde rendeu o BArt 1896;

(iii) de 20Ag068 a 07Dez68, a sua zona de acção foi reduzida dos subsectores
de Guileje e Gandembel, que foram atribuídos temporariamente ao COP 2;

(iv) em 15Jan69, a sua sede foi transferida para Aldeia Formosa, onde substituíu
COP1 e sendo então o subsector de Aldeia Formosa, incluído na sua zona de
acção;

(v) em 29Jan69, o subsector de Gandembel foi extinto e em 19Jan69, o
subsector de Buba foi atribuído ao COP 4, então criado;

(vi) em 10Ju169, por transferência da sede do COP 4 para Aldeia Formosa, o batalhão deslocou a sua sede para Gadamael, abrangendo nesta altura os subsectores de Guileje, Cacine e Gadamael;

(vi) desenvolveu intensa actividade operacional de patrulhamento, reconhecimentos, emboscadas e segurança e controlo dos itinerários, bem como operações e acções sobre as linhas de infiltração e bases inimigas, orientada para a desarticulação dos grupos inimigos que procuravam fixar-se na sua zona de acção e ainda para a segurança e protecção dos trabalhos da estrada Buba-Aldeia Formosa;

(vi) dentre o material capturado mais significativo, salienta-se: 2 pistolas-metralhadoras, 1 espingarda, 115 granadas de armas pesadas, 20 cunhetes de munições de armas ligeiras e 92 minas anticarro e antipessoal, destas, parte detectada e levantada nos itinerários;

(vii) em 30Set69, recolheu a Bissau, a fim de aguardar o embarque de regresso,
sendo a sua zona de acção integrada no Sector S3, então sob responsabilidade
do BArt 2865.
 
Ficha de unidade > CCAÇ 2314

(i) a CCaç 2314 seguiu em 15Jan68 para Tite, a fim de efectuar a adaptação operacional sob orientação do BArt 1914 e seguidamente reforçar este batalhão,  depois o BCav 2867, como subunidade de intervenção e reserva do sector, tendo realizado patrulhamentos e acções ofensivas nas regiões de Jufá, Bissilão e Nova intra, entre outras e guarnecendo, temporariamente, a povoação de Bissássema, de 03Fev68 a 03Mar68, na sequência de frequentes ataques inimigos;

(ii) em 06Ag068, rendendo a CCaç 1624, assumiu a responsabilidade do subsector de Fulacunda, no mesmo sector, vindo a ser substituída mais tarde na
intervenção pela CArt 2414;

(iii) entretanto, pelotões seus colaboraram ainda em operações efectuadas noutras regiões, ou em reforço temporário de outras guarnições, nomeadamente em Bedanda, Xitole, Nova Sintra e Jabadá e também na organização das autodefesas de Cansonco e Chumael, de princípios de Jan69 a 24Fev69, no sector do BCaç 2852;

(iv) em 30Jun69, por troca com a CCav 2482, voltou a Tite, onde assumiu a
responsabilidade do respectivo subsector;

(v) em 290ut69, iniciou o deslocamento por fracções, para Bissau, sendo substituída em Tite por três pelotões da CCav 2484, até à chegada da CCav 2443, após o que se manteve aguardando o embarque de regresso.
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Observações - O BCAÇ 2834 tem História da Unidade (Caixa nº 71 - 2ª Div/4ª Sec, do AHM). As CCaç 2312, CCaç 2313 e CCaç 2314 têm História da Unidade (Caixa n.º 76 - 2ª Div/4ª Sec, do AHM). 

Fonte: Excerto de Portugal. Estado-Maior do Exército. Comissão para o Estudo das Campanhas de África, 1961-1974 [CECA] - Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África (1961-1974). 7.º volume: Fichas das Unidades. Tomo II: Guiné. Lisboa: 2002, 
pp. 104-106.

3. Desta subunidade fazia parte o hoje cor GNR ref João Manuel Pais Trabulo. 

Natural de Meda, onde nasceu em julho de 1945, foi alf mil at inf da CCAÇ 2314. Enveredou depois pela carreira mitar, primeiro no Exército e depois na GNR, onde se reformou com o posto de coroenl, em 2008. Atualmente, na situação de reforma, vive na cidade de Gouveia, desde 1984. É o Presidente do Núcleo de Meda da Liga dos Combatentes. Tem hoje como centros  de interesse a rádio, a investigação histórica e a fotografia. 

(Fonte: Correio da Guarda, 02.06.21)

Em próximo poste apresentaremos um apontamento do Pais Trabulo sobre "a tragédia de Bissássema", da qual ainda sabemos pouco...

Sobre o o topónimo "Bissássema" temos apenas 14 referências. Os camaradas que lá lutaram, sofreram, morreram e, por fim, venceram (o PAIGC), merecem mais! A começar pelos prisioneiros que o PAIGC fez, em 3 de fevereiro de 1968, todos da CCAÇ 1743, estacionada em Tite, e só libertados na sequência da Op Mar Verde, em 22 de novembro de 1970:

  • António Júlio Rosa, ex-alf mil inf (Mangualde, 1946- Lisboa, 2019);
  • Geraldino Marques Contino, , ex-1º cabo nº 093526/66,
  • Victor Manuel de Jesus Capítulo, ex-sold nº 034660/66, 
(**) Último poste da série >14 de maio de 2025 > Guiné 61/74 - P26797: Facebook...ando (77): 24º encontro anual da 26ª CCmds (Brá, 1970/72), na Quinta do Paúl, Ortigosa, Leiria ... Homenagem poética à "Geração Afro" (Angelino Santos Silva)

Guiné 61/74 - P26831: Álbum fotográfico de João Moreira (ex-Fur Mil Cav da CCAV 2721 - Olossato e Nhacra, 1970/72) (29)

Foto 228 > Janeiro de 1972 > Nhacra > João Moreira > Posto retransmissor da Emissora Oficial da Guiné, no terreno ao lado do quartel.
Foto 229 > Janeiro de 1972 > Nhacra > João Moreira > Posto retransmissor da Emissora Oficial Guiné.
Foto 230 > Janeiro de 1972 > Nhacra > João Moreira > Morança em construção.
Foto 231 > Janeiro de 1971 > Quartel de Nhacra > João Moreira num espaldão de morteiro
Foto 232 > Janeiro de 1972 > Nhacra > João Moreira > Estrada de Nhacra para o Cumeré
Foto 233 > Janeiro de 1972 > Nhacra > João Moreira > Heliporto
Foto 234 > Janeiro de 1972 > Quartel de Nhacra > João Moreira
Foto 235 > Janeiro de 1972 > Nhacra > João Moreira > Fonte do Vale

(continua)
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Nota do editor

Último post da série de 15 de maio de 2025 > Guiné 61/74 - P26803: Álbum fotográfico de João Moreira (ex-Fur Mil Cav da CCAV 2721 - Olossato e Nhacra, 1970/72) (28)

Guiné 61/74 - P26830: Álbum fotográfico do Fur Mil Cav Aníbal José da Silva - Pel Caç Nat 56 em São João

1. Mensagem do nosso camarada Aníbal José Soares da Silva, ex-Fur Mil Vagomestre da CCAV 2483 / BCAV 2867 (Nova Sintra e Tite, 1969/70), com data de 18 de Maio de 2025:

Caro Carlos Vinhal
Hoje volto ao tema "Pelotão de Caçadores Nativos 56", que depois de terem estado afetos à minha Companhia (CCAV 2483), entre Março e Junho de 1969, no aquartelamento de Nova Sintra, foram continuar a sua missão no destacamento de S. João

O meu amigo José Manuel Rodrigues Cunha, ex-Fur Miliciano da rendição individual, esteve em Nova Sintra aquando da permanência da CART 2771, (Set70 a Set72, de os "Duros de Nova Sintra". No final da comissão dos DUROS, o Cunha foi destacado para S. João, para integrar o Pel Caç Nat 56, onde permaneceu até 1973. Creio ter sido contemporâneo do camarada José Câmara, colaborador deste Blogue.

O amigo Cunha, conhecedor da minha ligação àquele Pelotão, há uma década, teve a gentileza de me oferecer as fotografias que envio em anexo e que agora pretendo partilhar com o distinto Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné.

Bom Domingo e um abraço
Aníbal Silva



S. João > 1973 > Fur Mil José Cunha


S. João > Pel Caç Nat 56


S. João > Pel Caç Nat 56


Pel Caç Nat 56 patrulhando a estrada S. João-Nova Sintra


Pel Caç Nat 56 patrulhando a estrada S. João-Nova Sintra


Pel Caç Nat 56 patrulhando a estrada S. João-Nova Sintra


Pel Caç Nat 56 na estrada S. João-Nova Sintra


Painel de aulejos no muro da Fonte de S. João, colocado em 1945


Ruina do Fontanário de S. João em 2014, sendo visível o painel de aulejos de 1945


Escola de S. João em 1972/73


(Fotos: © Fur Mil José Manuel Rodrigues Cunha)
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Nota do editor

Último post da série de 11 de maio de 2025 > Guiné 61/74 - P26791: Álbum fotográfico do Padre José Torres Neves, ex-alf graduado capelão, CCS/BCAÇ 2885 (Mansoa, 1969/71) - Parte XXIV: Mais fotos de Mansabá, novembro de 1970

Guiné 61/74 - P26829: Recordações de um furriel miliciano amanuense (Chefia dos Serviços de Intendência, QG/CTIG, Bissau, 1973/74) (Carlos Filipe Gonçalves, Mindelo) - Parte III: Desembarque e colocação em Bissau, na CEFINT, 1ª Rep QG/CTIG, em Santa Luzia




Guiné > Bissau > Avenida marginal > c. fevereiro / abril  de 1970

Foto (e legenda): © Jaime Machado (2023). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]






1. O Carlos Filipe Gonçalves, de alcunha Kalu Nhô Roque (como consta na sua página no facebook) nasceu em 1950, no Mindelo, ilha de São Vicente, Cabo Verde. 
É uma figura conhecida na sua terra: radialista, jornalista, historiógrafo musical, e escritor, vive na Praia, a capital.

É membro da nossa Tabanca Grande desde 14 de maio de 2019, sentando-se à sombra do nosso poilão, no lugar nº 790. Tem mais de 2 dezenas de referências no nosso blogue.

Estamos a reproduzir excertos das suas recordações, a publicar eventualmente em livro, do seu tempo de tropa, que cumpriu, nos serviços auxiliares, como fur mil amanuense, na Chefia dos Serviços de Intendência (CHEFINT) 1ª Rep, QG/CTIG, Santa Luzia, Bissau, 1973/74.

Na Metrópole, durante a recruta, a especialidade e a mobilização em rendição individual para o CTIG, passou por Tavira, Vendas Novas, Leiria e Lisboa.

A fonte que utilizamos é a página do Facebook da Tabanca Grande.


Recordações de um furriel miliciano amanuense (Chefia dos Serviços de Intendência, QG/CTIG, Bissau, 1973/74) (Carlos Filipe Gonçalves, Mindelo) (*)

Parte III:  Chegada  e colocação em Bissau


(i) O fim da viagem

Os dias foram passando naquela rotina de banhos de sol, comer, dormir, ver a jogatina à batota, ver filmes à noite, etc. Agora, sentia-se cada vez mais calor, um sol abrasador fustigava a pele branquinha dos meus camaradas… As faces começaram a ficar vermelhas, o suor escorria, andava-se despido nos camarotes, os blusões esquecidos nas maletas, andámos agora em camisa de manga curta, alguns de calções e meias altas. 

O Gabarolas deixou de me atrapalhar, parece que me esqueceu, depois daquela descompostura que lhe dei logo no início da viagem. Na sexta-feira de manhã cedo, avistamos terra, o mar azul deu lugar a uma água castanha, cheia de troncos e ramos de árvores, toda a espécie de detritos vinha na corrente: sapatos e roupa velha, garrafas de plástico e os objectos mais incríveis! 

Não há dúvida, chegamos à Guiné! Estamos a subir o rio Geba. Lá pelas 10 da manhã entramos no porto de Bissau, logo avistamos o casario e carros a passar na marginal, o pessoal que tinha rádio sintonizou uma emissão e começamos a ouvir música, locutores a falar… ouvia-se música Pop em moda… de repente, passa música de Cabo Verde! Uma surpresa! Ouço o cantor Bana… depois o conjunto Voz de Cabo Verde… o som inconfundível do clarinete, ou o sax do Luís Morais! O navio Uíge fundeou ao largo e recebemos a informação que o barco só atracaria no dia seguinte.


(ii) Desembarque e colocação em Bissau, na CEFINT, 1ª Rep QG/CTIG, em Santa Luzia


Sábado de manhã, 3 de março de 1973 teve início o desembarque. Logo depois de pisar o cais, ouvi alguém a chamar: “Quem é o Carlos Filipe Gonçalves!” Fiquei surpreendido, mas, respondi logo: “Sou eu!” 

Era, um furriel veterano, abraçou-me e disse: “Bem-vindo meu periquito! Há meses que estou à tua espera!" 

O recém-chegado à Bissau era logo identificado, pela farda nova de um verde impecável, cara avermelhada de tanto calor, pele de um branco alvo, desajeitados... Por isso, o “maçarico” na metrópole, era aqui chamado «periquito», porque essa ave típica da Guiné, tem uma penugem verde intensa e um andar desajeitado. Os militares mais antigos tinham a farda desbotada e a tez mais escura. Claro, que quanto a mim, só se evidenciava a farda novinha de um verde intenso, afinal eu era «chocolate» e estava orgulhoso disso. 

Depois de uma breve conversa que não fazia sentido para mim, pois, eram problemas que ele enfrentava e ainda por cima explicados numa linguagem de siglas e na gíria da tropa local, aquele furriel veterano volta-se para mim e diz: “Como vais de Berliet, encontramo-nos no QG ! Estarei lá à tua espera!”

Fomos transportados nos camiões para o Quartel-General em Santa Luzia, onde logo encontro o tal furriel veterano em final de comissão e que estava todo feliz, porque finalmente ia regressar à Metrópole depois de seis meses a mais, desde o final da comissão de dois anos! Ele começou logo a me explicar o funcionamento da repartição do QG onde trabalhava, porque ele tinha planos para partir o mais tardar na próxima quarta-feira. Claro, eu ouvia, mas não percebia nada… 

Fiquei então alojado num pré-fabricado coberto de telhas de zinco, sem quaisquer condições a que os veteranos chamavam: "Biafra"! Havia apenas beliches, numa pequena camarata sem nada, nem armários, nem cadeiras. Nada! Com o aproximar do meio-dia, havia um Sol abrasador, o calor era intenso, o "Biafra" ficava insuportável! A porta estava sempre aberta, não havia chaves…

Fomos almoçar na messe de sargentos ali em frente, o furriel veterano, agora meu guia, não me largava um minuto, dizia empolgado: “Vamos tomar uma cerveja! … Vamos fazer isso e aquilo etc.” Naquela tarde veio ter comigo e disse: “Vamos a Bissau, para eu te mostrar a cidade!” E logo explicou: “Há um serviço de autocarros da tropa, de hora a hora!”

 E lá fomos, ele sempre a mostrar, a descrever, enfim, foi um acolhimento de primeira. Constatei então que Bissau era uma cidade muito maior que a minha Mindelo, na Ilha de S. Vicente, com muitas árvores, ruas direitas e longas, casario baixo do tipo vivendas, com alpendres e pátios envolventes,  cheios de plantas. 

Apesar de ser sábado à tarde, havia muito movimento nas esplanadas e cafés, todos repletos de militares «brancos». Há muitos indígenas vestidos tradicionalmente, são os «djilas», vendedores dos produtos mais esquisitos e quinquilharia: pulseiras, colares, objectos em pele de crocodilo ou de cobra, artesanato, etc. etc.; há ainda as «badjudas» e rapazinhos, que vendem mancarra (amendoim) e caju, ou então, veludo e alfarroba (frutos secos tipo amêndoas felpudas), uma novidade para os meus colegas, mas que eu já conhecia desde a minha infância em Cabo Verde. 

Estes vendedores são insistentes, mesmo depois de um não, continuam a propor o produto, fazem novas ofertas de preço, elogiam os produtos… Vejo-os a discutir com outras pessoas: “São tantos pesos… posso baixar! Toma por tantos pesos!” 

O furriel, meu guia, diz-me: “Não ligues pá! Tens de acostumar e não levar esses gajos a sério!” 

Eu estava cansado da viagem, por isso regressei cedo ao quartel em Santa Luzia. Mais um banho e fui dormir.

Naquela noite aconteceu a habitual brincadeira para amedrontar os “periquitos”: depois das 22 horas, os veteranos, lançaram um «ataque» ao "Biafra"! Atiravam garrafas vazias de cerveja sobre o telhado de zinco do alojamento onde estavam os recém-chegados. Era um barulho medonho a que se juntaram gritos e um alarido. O pessoal recém-chegado pensou logo que se tratava de um ataque dos «terroristas» … logo saíram a correr, outros deitavam-se no chão a rastejar… Os veteranos às gargalhadas e a gozar com o espectáculo! Essa era uma cena que se repetia, sempre que chegava um novo grupo de "periquitos"!

Na segunda-feira de manhã apresentamo-nos na 1.ª Repartição do QG onde trabalhava o tal furriel veterano que estava empolgado com a minha chegada. Mandaram-nos subir para o auditório no primeiro andar, onde decorriam os «briefings» do Estado-Maior. Todos sentados, em silêncio ouvimos as boas-vindas por um oficial de alta patente. O meu amigo furriel veterano, veio ter comigo e tranquilizou-me: “Vais ficar em Bissau de certeza! Mas, olha, descobri que afinal o meu periquito não és tu!” 

Pensei logo: outra vez,  não me querem numa repartição sensível! Os corações batiam de ansiedade, pois avizinhava-se o momento das colocações. Sabíamos que embora nos serviços auxiliares, podíamos ser colocados numa CCS algures no mato onde havia «porrada»,  como se dizia na gíria militar, quando se referia aos ataques e emboscadas.

Depois de uma preleção sobre o dever para com a Pátria, o sentido de disciplina, a prontidão para o combate, etc. etc. , teve início a chamada dos nomes e indicação das colocações. Alto e bom som, o oficial chamou: “Fulano de tal! Colocado em Pirada!” 

Ouviu-se logo um resmungo baixinho, eu diria, um choro disfarçado…. Pudera! Pirada era uma localidade na fronteira… Desde sábado que os «periquitos» ouviam relatos dos veteranos sobre os quartéis mais perigosos no mato. Pirada, já se sabia, era constantemente flagelada pelos «turras». 

E continuou o oficial: “Passe pela secretaria, para tomar a guia de marcha e saber do seu transporte para a unidade!” 

E, assim, prosseguiu a chamada de nomes e indicação das colocações. Logo depois da indicação de cada localidade ou unidade de colocação, ouvia-se/sentia-se, ou um resmungar de aflição, ou… expressões de alegria! 

Quando, chegou a minha vez, o oficial indicou a minha colocação: “Chefia da Intendência!” 

Fiquei ali parado sem saber o que fazer, pois não sabia onde era, nem o que era! O amigo furriel veterano que estava ao meu lado disse-me logo: “Vai-te embora, pá, antes que mudem de ideias! É mesmo aqui ao lado!” 

Saí a correr, cheguei à «parada», desorientado perguntei onde ficava a tal repartição, alguém respondeu: “CHEFINT? Passe pela porta de armas, vire à esquerda, siga em frente pela rua, à direita encontra uma outra porta de armas, entre. No rés-do-chão é o BINT , a CHEFINT é no primeiro andar!”

E assim vou tendo contacto com esta linguagem de siglas, vejo que o QG é um enorme complexo com vários quartéis (todos cercados com muros de protecção e porta de armas); do lado de fora, moradias para oficiais superiores, vários alojamentos para oficiais e sargentos, interligados por ruas alcatroadas… 

Havia ainda as messes de oficiais e sargentos, uma piscina, um cinema ao ar livre e diversos serviços (como a Chefia de Contabilidade, Tribunal Militar etc.) a funcionar em instalações que antes teriam sido alojamentos; todo este conjunto, cercado / circundado, por uma enorme e longa cortina de arame farpado! Só há duas portas de entrada/saída para o exterior, todas também com casa da guarda e sentinelas! 

Mais tarde, ouvia de vez em quando, umas explosões… Ouço dizer que para lá do arame farpado havia uma área minada… As explosões, diziam-me, eram devidas a bovinos e outros animais que, deambulando na pastagem, entravam na área minada e… BUM! Mas, nunca lá fui, nem nunca vi de perto esse local. 

Verdade ou não, o que me diziam era evidente, porque havia uma guerra, ouvia-se a guerra, sobretudo à noite! Bissau, era cercada de campos de minas e tinha dois ou três «checkpoints” que controlavam as entradas e saídas!

Ao me apresentar na Chefia de Intendência (CHEFINT), foi uma alegria para o chefe, um tenente-coronel, homem já de meia-idade. Mal entrei no gabinete, bastante frio, devido ao ar condicionado, ele riu-se e disse-me logo: “Seja bem-vindo, oh nosso furriel! Estamos a lutar com falta de pessoal! Venha, vou-lhe mostrar a sua secção e o que tem a fazer!” 

Saímos do gabinete fresquinho, passamos pelo corredor, um verdeiro forno, entramos numa sala mesmo ao lado, todo mundo levantou-se e ele diz: “Oh nosso alferes, aqui tem um reforço! Desta vez temos de acabar com esse atraso na resolução dos autos. Têm três meses para resolver todos os pendentes!” E retirou-se. 

O alferes apresenta-me então o pessoal da “Secção Autos de Víveres e Artigos de Cantina”,  aponta e comenta: “Militares, aqui, agora somos três, eu, aqui o nosso furriel e você. Temos três civis!” E aponta: “O Demba, o Issa e o Claudino!” 

Cumprimento os civis; logo noto, que o furriel veterano, é dos serviços auxiliares, pois tem uns óculos de míope com lentes muito mais grossas que as minhas! Ele mostra-me, todo ufano, um gráfico de barras com os 24 meses da comissão! Vejo que, ele assinala cada mês que passa, preenchendo uma coluna com lápis azul! Constato logo, que para ele, já cantam, um ano e um mês de comissão. Vendo a minha curiosidade ele sugere: “Posso arranjar-te um gráfico destes, toda malta tem um!” Respondi logo: Contar os meses? Não tenho pachorra para isso! Comigo pensei: isso é uma tortura, prefiro deixar o tempo correr e quando a comissão chegar ao fim… pronto, acabou-se! 

Embora espantado com a minha reacção, o agora meu colega de serviço não comenta, volta-se para mim e diz: “Estás a ver aquela estante aí cheia de pastas de arquivo? Pois é, naquele monte de papéis, estão mais de mil autos que temos de resolver! Ouviste o que disse o chefe? Temos três meses para acabar com isso tudo! Portanto, ao trabalho!”

(Revisão / fixação de texto: LG)

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Nota do editor:

(*) ÚLtimo poste da série > 20 de maio de 2025 > Guiné 61/74 - P26819: Recordações de um furriel miliciano amanuense (Chefia dos Serviços de Intendência, QG/CTIG, Bissau, 1973/74) (Carlos Filipe Gonçalves, Mindelo) - Parte II: De Lisboa a Bissau, no T/T Uíge

quarta-feira, 21 de maio de 2025

Guiné 61/74 - P26828: (In)citações (271): Eu vivo na Lisboa que amo (Juvenal Amado, ex-1.º Cabo CAR)


1. Em mensagem  de 20 de Abril de 2025, o nosso camarada Juvenal Amado, ex-1.º Cabo Condutor Auto Rodas da CCS/BCAÇ 3872 (Galomaro, 1971/74), fala-nos de Lisboa:


Lisboa

A recordação mais antiga que tenho de Lisboa é a vista que do rio, se alcançava de uma pequena janela da casa dos meus tios. Ficava à janela vendo o vai e vem dos barcos. De vez enquanto passava um grande navio majestoso que à distância parecia de brincar. A casa ficava na Rua da Saudade, onde era visita assídua, bem como ao Castelo de São Jorge que quase servia de recreio, tão perto que rapidamente se alcançava.

Dali também era ponto de partida para ir ao cinema ali para os lados dos Restauradores, ou ir a pé percorrer as ruas até ao Tejo, ali na Praça do Comércio, não resistindo ao chamariz das lojas com roupas que os jovens gostavam em especial os Porfírios, ou até ao cais do Sodré para apanhar o comboio da linha até Paço D’Arcos onde tinha família e com quem ia à praia, ou simplesmente gozava da sua companhia.

Lisboa era assim um local de diversão e descoberta para um jovem oriundo da província com horizontes muito limitados.

Foram-se passando os anos até gravar a fogo a minha partida para África, para o serviço militar obrigatório, num dia de nevoeiro, uma cidade cinzenta, apática e triste de tão habituada estar a ver-nos partir, já não se sobressaltava nem dignava a olhar. Regressei 27 meses depois a uma Lisboa soalheira e luminosa onde em meados de Abril, numa madrugada um grupo de soldados corajosos, devolveu a cidade, e o país, ao povo que encheu as ruas e foi a festa da minha vida. Milhões onde os corações em uníssimo exultaram pela a democracia e a Paz. Quem tinha chegado da Guiné saboreava a paz, como um sabor doce que se estendia a todos os sentidos.

Passaram-se 50 anos, até que vim viver para onde a cidade se confunde com os lugares que formam a grande metrópole de várias cores e aromas, que lhe dão aquela imagem de ter o Mundo todo dentro de si. Lisboa é descoberta, são jovens e idosos, já não há pregões, frequenta-se hipermercados na vez de jardins, ainda sobrevivem esplanadas, algumas onde se dança normalmente música brasileira na sua alegria contagiante. De noite ouvem-se as sirenes a provar que a cidade não dorme na sua dolência morena de miscigenação através da memória do tempo.

Eu vivo na Lisboa que amo

Há quem a queira tornar só branca, retirar-lhe o mistério, apagar os sons e os sabores de outras paragens, acabando com os contornos que os séculos levaram a desenhar.

Os ignorantes nunca sabem o que fazem na verdade.

20 de Maio 2025
Juvenal Sacadura Amado


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Nota do editor

Último post da série de 20 de maio de 2025 > Guiné 61/74 - P26823: (In)citações (270): Um abraço forte, fraterno e amigo, ao cor inf ref Vasco Lourenço (Eduardo Estrela, ex-fur mil at inf, CCAÇ 2592 / CCAÇ 14, Cuntima e Farim, 1969/71)

Guiné 61/74 - P26827: Historiografia da presença portuguesa em África (482): A Província da Guiné Portuguesa - Boletim Oficial do Governo da Província da Guiné Portuguesa, estamos em 1920 (36) (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá, Finete e Bambadinca, 1968/70), com data de 4 de Dezembro de 2024:

Queridos amigos,
Como seria de esperar, a turbulência política do Sidonismo e da sua queda, a intervenção ditatorial subsequente, a incursões monárquicas de Monsanto, as lutas partidárias com sucessivas formações e quedas de Governo tiveram os seus reflexos em nomeações de governadores que não se revelaram brilhantes, virá em 1921 uma figura de projeção, Vellez Caroço, deixou marcas. Tudo parece insípido, rotineiro, publicam-se as medidas legislativas de âmbito nacional, só esporadicamente há uma nota ou outra que nos permite observar o que evolui na Guiné; achei particularmente relevante a medida de Sousa Guerra numa tentativa de evitar a exploração dos arrendatários, sobretudo em Bissau, não há aumentos de vencimento de funcionários públicos, não se constrói, tudo encareceu, o governador Sousa Guerra toda medidas extraordinárias; novamente se fala de Graça Falcão, é castigado, já não é novidade; é tempo de se sonhar com modernização agrícola, maquinaria moderna, sonha-se com uma agricultura de grande escala, como aqui se refere com o caso da Companhia do Fomento Nacional, 25 mil hectares, tudo rapidamente no fundo.

Um abraço do
Mário



A Província da Guiné Portuguesa
Boletim Oficial do Governo da Província da Guiné Portuguesa, estamos em 1920 (36)


Mário Beja Santos

A Guiné está a atravessar um período de extremas dificuldades económicas, repercute inevitavelmente as perturbações do fim do sidonismo, da ditadura militar subsequente, das incursões monárquicas, das nomeações e quedas dos sucessivos Governos. Não há qualquer referência na leitura que fiz do Boletim Official do ano de 1919 que permita ficarmos a saber o grau de tensões que ali se vivem, o que ali se publica é uma enxurrada de regulamentos e legislação metropolitana, para além das posições burocráticas e administrativas que envolvem nomeações e demissões, orçamentos, movimento marítimo, etc.

E assim chegamos a 1920 e logo em 24 de janeiro, no Boletim Oficial n.º 4, no suplemento chama a atenção uma medida de política social, jamais se encontrara menção a uma abordagem como esta, tem a ver com a política de habitação e os arrendamentos:
“De há muito vem agravando as já difíceis condições de vida das classes menos abastadas o elevado preço das rendas de casa em quase toda a província e muito especialmente em Bissau, onde ultimamente atingiu proporções de tal forma exageradas que exigem do Governo da província a adopção de providências excecionais que impeçam que, ainda mais, se acentue a elevação sempre progressiva do aluguer das casas.
Para as classes proletárias e para o funcionalismo público, a não ser estabilizado o custo das rendas, impossível se tornaria, em breve, a sua permanência em Bissau, absorvida a quase totalidade dos seus salários e vencimentos, com as despesas do aluguer de casas.

O Governo da província vai, com urgência requerida, mandar proceder à construção de edifícios próprios para a habitação de funcionários e à venda de terrenos para construções urbanas no novo bairro, medidas que reputa suficientes para debelar a crise que atravessamos. De momento, porém, e dado que as construções a fazer levarão tempo a concluir-se, urge adoptar providências excepcionais, de carácter transitório, que impeçam que mais se agrave o custo já exagerado das rendas de casa.

Para o que, tendo ouvido o Conselho do Governo e com o seu voto afirmativo, determino:
1 – Os senhorios de prédios urbanos não poderão aumentar a renda dos seus prédios durante 1 ano, a partir da data da publicação desta portaria, aos actuais inquilinos.
2 – Nos futuros contratos de arrendamento, a renda não poderá em caso algum ser superior à que estiver inscrita na matriz predial em vigor.
3 – Os senhorios que arrendarem os seus prédios por quantia superior à fixada no artigo anterior serão punidos como desobedientes e obrigados a restituir ao próprio arrendatário a importância que houverem recebido a mais.
4 – Os senhorios dos prédios urbanos que não queiram os seus prédios para a sua habitação, não podem recusar a renovação do arrendamento aos seus atuais inquilinos, quando estes sejam funcionários públicos em efetivo serviço.”


Pelo Boletim Oficial n.º 22, de 29 de maio, vamos saber que Graça Falcão, outrora um militar altamente condecorado, continua a fazer das suas, e o Governo não lhe tolera as tropelias:
“Considerando que o administrador da 6.ª Circunscrição Civil, Jaime Augusto da Graça Falcão, querendo justificar a impossibilidade de incumprimento da ordem que em meu nome lhe fora transmitida pela Secretaria dos Negócios Indígenas, de contratar para o serviço de tráfego comercial em Bolama alguns indígenas da sua circunscrição, o fez em termos que, não constituindo justificação aceitável, revelam a par do seu desinteresse dos serviços que lhe competem, o mais claro propósito de desrespeito; e
Sendo indispensável manter, para a regularidade e boa ordem dos serviços públicos a máxima disciplina, do que resulta a necessidade de rigorosa e imediata punição dos actos dos funcionários públicos que signifiquem quebra da mesma ou visem a perturbar o regular funcionamento dos mesmos serviços, mormente quando praticados por funcionários que pela sua situação oficial devem ser os melhores auxiliares do Governo da colónia da sua administração;

Considerando que a falta praticada pelo administrador Graça Falcão se acha verificada em documento escrito, cuja autenticidade não pode ser posta em dúvida, o que dispensa, para ser punida a formalidade de audiência do culpado,
Hei por conveniente aplicar ao referido administrador a pena de 30 dias de suspensão de exercício do seu cargo, percebendo durante o mesmo período 50% do seu vencimento de categoria.”

Esmiuçando Boletim por Boletim os movimentos de pessoal, chegadas e partidas, nomeações e promoções, cheguei a algo que me interessou pessoalmente muito, e que no fundo corrobora o que já lera na correspondência dos chefes de delegação do Banco Nacional Ultramarino neste período, a corrida à criação de empresas agrícolas na região onde eu vivi em 1968 e 1969, empresas essas que pareciam nascer até grande sucesso e muito rapidamente caíram no chão. O caso que se vai citar é um deles. É um aviso publicado no Boletim Oficial n.º 35, de 28 de agosto de 1920:
“Tendo a Companhia do Fomento Nacional requerido, na área da Circunscrição Civil de Bafatá, a concessão de 25 mil hectares de terreno, que está situado na margem direita do rio Geba, abrangendo as regiões de Joladu-Cuor e Mansomini, ficando a referida concessão compreendida entre as populações de Sare e Quéda, Sare Carvalho e Farato, no regulado de Joladu, envolvendo as seguintes povoações do mesmo regulado: Ieró-Cunda, Sambá-Bina, Gã-Tumane, Chuel, Sare-Mankali, Temati, Cofiá, Sare-Ganha, Sare-Sissau e Buali, regulado de Mansomini, e Sare-Duá, tendo os extremos Sul na povoação de Ganturé, regulado do Cuor, e envolvendo mais as seguintes povoações deste regulado: Adêa, Dá-Salume, Caraquecunda, Gã-Cumba, Sancorlã, Mansena, Gã-Samena e Cusarandim.”

Tratava-se de regiões muito férteis, os presumíveis empreendedores contavam em trazer equipamento moderno, montar instalações perto do rio Geba, mas esqueceram-se do essencial, a sensibilização dos agricultores e a proposta de renumerações justas, estes agricultores, deste sempre e até mesmo hoje, confiavam na agricultura nos seus terrenos e não trabalhavam por conta dos colonos, preferiam entregar as suas produções aos agentes das grandes empresas. Por falta de capacidade de saber negociar com os régulos e com os próprios agricultores faltou mão de obra e todas estas empresas que laboraram tiveram curta vida.

Primeiras notícias das insurreições do Monsanto
Notícia da derrota da incursão monárquica no norte do país, Paiva Couceiro teve que fugir para a Galiza
Notícia das perturbações que avassalaram o país, devido às incursões monárquicas
Nomeação do governador interino, capitão-tenente José Luís Teixeira Marinho
Chegada de novo governador em 1919, o capitão de Infantaria Henrique Alberto de Sousa Guerra
Dançarinos Mancanhas, 1910

(continua)
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Nota do editor

Último post da série de 14 de maio de 2025 > Guiné 61/74 - P26800: Historiografia da presença portuguesa em África (481): A Província da Guiné Portuguesa - Boletim Oficial do Governo da Província da Guiné Portuguesa, 1917 e 1918 (35) (Mário Beja Santos)

Guiné 61/74 - P26826: S(C)em Comentários (68): Fome, camaradas ?!.... Não, em Nova Lamego, São Domingos, Bissau (Virgílio Teixeira ex-alf mil SAM, BCAÇ 1933, 1967/69): sim, "aos poucos de cada vez" na Ponta do Inglês, Xime (Manuel Vieira Moreira, 1945-2014, ex-1º cabo mec auto, CART 1746, 1967/69)


Guiné > Zona Leste > Regão de Gabu > Nova Lamego > CCS / BCAÇ 1933 (Nova Lamego e São Domingos, 1967/69) > 4º trimestre de 1967 > Mais um jantar-convívio com o pessoal – condutores auto – nas suas instalações, bar ou dormitórios, não sei bem identificar. A ementa deve ser de frango, como habitual. E a cerveja que se bebia era a Cristal, em formato "bazuca" (0,6 l).O Virgílio Teixeira, ex-afl mil SAM, era o primeiro da direita.

Foto (e legenda): © Virgílio Teixeira (2019). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Comentário do Virgílio Teixeira, ex-alf mil SAM, BCAÇ 1933 (1967/69) ao Poste P26816 (*):


A FOME NA GUERRA

por Virgílio Teixeira


Este tema é controverso, cada um sabe da sua história e vivência.

Eu não me posso enquadrar em muitos dos relatos aqui apresentados ao longo dos anos. Acho que apesar de tudo fui um privilegiados.

A minha guerra passou-se praticamente junto do comando do batalhão e da CCS.
Em locais não tão graves como outros, mas também com as suas deficiências.
Nós tínhamos sempre quer em Nova Lamego quer em São Domingos a nossa messe de oficiais, havia a messe de sargentos e a cantina das praças. Era assim, não sei porquê, nem interessa agora.

Sempre me fiz acompanhar pelo grupo dos condutores e outras praças, que estavam ligadas de alguma maneira aos comes & bebes, porque apanhavam muitos animais que depois cozinhávamos para alguns.

Frequentava mais a messe de sargentos, para os copos, do que a de oficiais, que era um casino fora de horas.

Fiz muitos serviços de oficial de dia, e tinha que supervisionar o rancho geral, o que fazia sempre, depois havia as provas – como o demonstram as fotos que já estão publicadas – e aproveitava muitas vezes comer no refeitório do rancho geral e da sua comida, igual à dos outros. Nada a lamentar, quer do lado das praças, quer da minha parte. Reconheço que nunca vi outros a fazerem o mesmo, são formas de estar.

Por isso ganhei um lugar à parte na classe das praças, e sempre que havia petisco novo fora das messes e rancho, lá estava eu convidado, e tenho dezenas de fotos que o demonstram. 

Porquê? A malta gostava da minha maneira e nada de superioridades, sempre respeitei todos e eles a mim. O comandante é obvio que não gostava mas nunca me disse nada.

 
Por isso, fome não. Carências de vária ordem sim, também quando não havia nada, comia-se sopa de estrelinhas acompanhadas de casqueiro.

Mas, nas tantas vezes de convívio com os praças, nunca existia fome. Surpreende-me agora saber do que se passava na grande generalidade dos casos. Mas havia também muita malta de todos os escalões que levavam boa vida estomacal.

Por causa disso, fiz muitas colunas de reabastecimento, e entrei naquelas duas loucuras de viagem de Sintex entre S. Domingos e Susana, para ir trazer umas batatas, bananas e se possivel um animal vivo. Da última vez correu mal e perdemo-nos e safei-me. Não me lembro de fome, mas talvez de sede.

Nada disto é comparável às ações de combate e patrulhas de dias, com rações de combate, que não eram o meu forte.

Depois tinha a grande vantagem de todos os meses poder ir a Bissau e matar a barriga de misérias, a verdade seja dita.

Nos últimos meses em S. Domingos, a Companhia de intervenção, a CART 1744, por intermédio do sargento e um cabo da secretaria, com o aval do Capitão, construíram um tipo de restaurante ambulante, com frangos assados criados ali na horta e tantos legumes frescos como nunca tínhamos visto. Foi um fartar, mas pagava-se!

Diga-se em abono da verdade, que estas situações que conto, não eram normais, só alguns participavam nelas, eu quase sempre, um ou outro furriel ou sargento, e ocasionalmente um alferes que se juntava, não sei os critérios porque não era da minha organização.

Agora que havia uma segregação entre tropa branca, segundo os escalões, é verdade, mas só constato isso agora por estarmos a falar, senão para mim seria o normal, porque não vi nunca outra postura de solidariedade, para todos.

Quando o Luis diz que não se sentou junto dos seus soldados no refeitório ou outro local , acredito, mas para mim isso foi uma normalidade.

Os meus cumprimentos e abraços
Virgilio Teixeira


2025 M05 21, Wed 00:15:54 GMT+1




2. Excerto do poste P1009 (*)


Manuel Vieira Moreira  (1945-2014) (ex-1.º cabo mecânico auto, CART 1746, Bissorã, Xime e Ponta do Inglês, 1967/69; natural de Águeda; ppoeta popular e letrista de fados, entrou paraa Tabanca Grande em 27/11/2008; tem 33 referências no blogue).

O destacamento da Ponta do Inglês, na foz do Rio Corubal, subsetor do Xime, setor L1 (Bambadinca), era um dos sítios mais desgraçados da Guiné.  Foi dos aquartelament0s abandonados pelas NT logo no início do "consulado" de Spínola.

 

CANÇÃO DA FOME

por Manuel Vieira Moreira (1945-2014)


Estamos num destacamento,
A favor de sol e vento,
Na Ponta do Inglês,
Não julguem que é enorme
Mas passamos muita fome,
Aos poucos de cada vez.

A melhor refeição
Que nos aquece o coração,
É de manhã o café;
Pão nunca comi pior
Nem café com mau sabor
Na Província da Guiné.

Ao almoço atum a rir
E um pouco de piri-piri,
Misturado com bianda,
E sardinha p´ró jantar
E uma pinga acompanhar
Sempre com a velha manga.

Falando agora na luz
Que de noite nos conduz
As vistas par' ó capim:
Se o gasóleo não vem depressa,
Temos Turras à cabeça,
Não sei que será de mim.

Quando o nosso coração bole,
Passamos tardes ao sol
Junto ao rio, a esperar
De cerveja p'ra beber
E batatas p'ra comer
Que na lancha hão-de chegar.

A fome que aqui se passa
Não é bem p'ra nossa raça,
Isto não é brincadeira
E com isto eu termino
E desde já me assino:
Manuel Vieira Moreira.

Xime, Ponta do Inglês, 28/01/1968


______________

Notas de L.G.

(*) Vd, poste de 20 de maio de 2025 > Guiné 61/74 - P26821: S(C)em Comentários (67): P*rra, dou agora conta, 50 e tal anos depois, que nunca me sentei no rancho geral, para partilhar uma refeição com os meus cabos, que eram metropolitanos, e que tinham uma barriga igual à minha... Em Bambadinca, existia o "apartheid", nobreza, clero e povo, devidamente segregados, em termos sociais e espaciais (Luís Graça)


Vd. também poste de 19 de maio de 2025 > Guiné 61/74 - P26816: Contos com mural ao fundo (Luís Graça) (40): Quem não arrisca, não petisca

(**) Vd. poste de 31 de julho de 2006 > Guiné 63/74 - P1009: Cancioneiro do Xime (1): A canção da fome (Manuel Moreira, CART 1746)

Guiné 61/74 - P26825: (Ex)citações (433): Ao pesquisar na Net informações relacionadas com o aquartelamento de Nova Sintra, li as crónicas do Fur Mil Joaquim Caldeira, da CCAÇ 2314, e numa delas com o título “Um tronco sem pernas e sem braços”, verifiquei que, pelas piores razões, eu era um dos protagonistas da história (Aníbal José da Silva, ex-Fur Mil Vagomestre)

1. Em mensagem enviada ao blogue, o nosso camarada Aníbal José Soares da Silva, ex-Fur Mil Vagomestre da CCAV 2483 / BCAV 2867 (Nova Sintra e Tite, 1969/70), a propósito do seu incidente, contado no post P26820 de ontem, conta-nos como um acaso de pesquisa na net, o levou até um camarada da CCAÇ 2314, o ex-Fur Mil Joaquim Caldeira, que comandava a coluna apeada que saiu de Tite em direcção a Nova Sintra. Neste percurso, o malogrado soldado da CCAV 2483, de seu nome Domingos da Conceição Verdade Ventinhas, natural do Concelho de Moura, pisou uma mina antipessoal reforçada, que além da sua morte, originou ferimentos graves ao Aníbal que seguia muito perto dele.
O título do texto que se segue diz tudo.



1 - EMOÇÕES E AMIZADES FORTES

Ao pesquisar na Net informações relacionadas com o aquartelamento de Nova Sintra, na Guiné, tive acesso ao Blogue do Batalhão de Artilharia 1914, que o meu, Batalhão de Cavalaria 2867, rendeu na região do Quínara em Março de 1969.

Nele li as crónicas do Furriel Joaquim Caldeira, da CCAÇ 2314, e numa delas com o título “Um tronco sem pernas e sem braços”, verifiquei que, pelas piores razões, eu era um dos protagonistas da história (ver recorte de imprensa abaixo). Fiquei com muita curiosidade e vontade de falar com o Caldeira.

Através do mensenger do facebook fiz-lhe chegar, em 30/11/2016, a seguinte mensagem:

Amigo Joaquim Caldeira

Peço desculpa por o tratar assim, mas creio que não me levará a mal este tratamento. Não nos conhecemos pessoalmente, muito embora tivéssemos tido um contacto pessoal, no, para mim, trágico dia 04/08/69.

Na net, ao pesquisar informaçoes e relatos sobre Nova Sintra, encontrei as suas crónicas e numa delas a referência àquele dia trágico com o título “Um tronco sem pernas e sem braços”. Eu era o vagomestre da CCAV 2483 sediada em Nova Sintra, que naquela madrugada chuvosa, fomos comboiados de Tite para Nova Sintra, numa coluna apeada que o meu amigo comandava e que segundo refere na crónica “tinha perdido os dois olhos”.

As lesões que sofri nos olhos e de que tenho sequelas, não foram tão graves quanto à aparência daquele dia. Estive quarenta dias no Hospital Militar de Bissau, trinta dos quais internado e dez na consulta externa. Nos primeiros vinte dias não via rigorosamente nada, para além das dores horríveis nos olhos.

E passo a apresentar-me. O meu nome é Aníbal (...) e quero agradecer-lhe o muito que fez por mim naquele dia.


Dias depois o Caldeira telefonou-me, mas não foi possível estabelecer qualquer conversa, tendo ele enviado a seguinte mensagem:

“Boa tarde, sou o Caldeira. Ainda estou comovido com a notícia de que, o homem que ficou cego naquela manhã, afinal vê. Levei quase 50 anos com estes demónios que me atormentavam desde então. Desculpa não ter conseguido falar. È muita emoção para gerir. Temos muito que falar , muitas memórias para recordar. Afinal, consegues ver e estou muito feliz por isso. Em boa hora me lembrei de escrever aquela aventura. Sem isso nunca teria tido paz e sossego. Também nunca cheguei a saber quem foi que pisou a mina. Assim que puder eu ligo. Ficas a pertencer ao meu grupo de combate.

Um abraço sentido,
J Caldeira”.


********************

Poucos dias depois o Caldeira, já refeito das emoções, voltou a ligar e então lembramos o acontecimento do tal dia, falamos sobre a vida pessoal e profissional de cada uma. Passamos a trocar mensagens nos aniversários, pela Páscoa e pelo Natal, mas faltava um encontro cara a cara para um melhor conhecimento pessoal. Tal tornou-se realidade no dia 22 de Setembro de 2018, data em que a sua companhia (CCAÇ 2314) realizou no Porto mais um almoço/convívio.
Fui convidado e estive presente.

Houve uma missa na Igreja do Cristo-Rei, à Boavista, e foi aí o local de concentração do pessoal. Só conhecia o Caldeira pela fotografia do facebook, bem como ele a mim. Ao chegar ao local identifiquei-o, embora estivesse de costas para mim. Os camaradas que o rodeavam não me conheciam e não sabiam o que ia acontecer. Toquei-lhe no ombro, ele virou-se e disse “tu és o Aníbal”.

Seguiu-se um abraço forte e emocionado por breves momentos e um humedecer dos olhos. Depois fixou-me olhos nos olhos e disse sentir uma enorme alegria pelo facto dos seus receios, de que ficara cego, não serem reais. Novo abraço e a minha apresentação aos seus amigos, dizendo, lembram-se daquela coluna apeada de Tite para Nova Sintra, em que um soldado desta companhia pisou uma mina e morreu e um Furriel tinha ficado sem ver?

Pois é, o ceguinho é este que está aqui à vossa frente e com os olhos bem abertos. Ficaram surpreendidos e satisfeitos e um deles à boa maneira da linguagem da tropa disse: "Oh pá, tiveste uma sorte do c@r@lho, nunca pensamos que voltases a ver, tanta a lama que tinhas na cabeça".

Seguiu-se a missa em homenagem a um camarada que falecera no ano anterior e a deposição de um ramo de flores na sua sepultura no cemitério da Foz do Douro, no Porto, seguida de animado almoço em Leça da Palmeira.

E ficou para sempre, a amizade, forte, sincera e desinteresada, construída na adversidade.

Arcozelo, 17 de Abril de 2025
Aníbal Silva



2 - UM TRONCO SEM PERNAS E SEM BRAÇOS

Lá vou eu, de novo, a caminho de Nova Sintra, desta vez comboiar alguns militares da unidade lá aquartelada. Meus, eram para aí vinte homens. De Nova Sintra apenas quatro. Mas alguém havia de fazer segurança para que eles chegassem bem. Saímos de Tite pelas três horas, numa madrugada chuvosa e escura. Pedi ao Zé Carlos, o enfermeiro, que seguisse ao meu alcance. Sempre poderiamos falar se fosse preciso.

Desta vez não me fazia acompanhar de guia, pois que o caminho era já sobejamente conhecido, embora nunca trilhássemos o mesmo. Lá fomos seguindo perto da picada que já nos era familiar, umas vezes à direita, outras à esquerda. Tínhamos passado Gatangó e informei, via rádio, que tudo seguia normal. A chuva era cada vez mais intensa, mas chuva civil não molha militares. A previsão de chegada era pelas oito horas e tinha combinado que um pelotão de Nova Sintra viria ao meu encontro logo, que houvesse luz para nos podermos juntar sem problemas.

BUMMMMMMMMMM... grande estrondo. Alguém tinha pisado uma mina. Após os procedimentos que se impunham, tentei saber quem tinha sido o infeliz. Mas ninguém sabia quem teria sido e não se via nada que pudesse indicar homem ferido. Tanto pior. Um soldado dos meus, já não me recordo de qual, disse-me que tinha voado por cima de mim e estava bastante ferido num braço, provocado pela queda. Entrguei-o ao Zé Carlos e continuei as buscas ajudado por quem estivesse são. Três homens vieram ter comigo. Um caminhava amparado pelos outros dois e pensei que estivesse encontrado o infeliz. Mas não. Era mais um, Furriel de Nova Sintra, que nunca cheguei a conhecer, que tinha perdido os dois olhos. Já não tinha dúvidas de que ainda havia outro. Este tinha os dois pés. O Zé Carlos não tinha mãos a medir e o Lourenço, o radiotelegrafista, não parava de comunicar com o Furriel Garcia, este em Tite, o que se ia passando.

Após algum tempo de buscas, alguém tropeçou numa coisa que parecia um corpo. Sem luz não era fácil saber do que se tratava, porque até podia ser um animal que tivesse, ao fugir de nós, ter pisado a mina. Fui verificar e após ter revirado o que restava, apurei que era uma cabeça presa a um tronco sem pernas e sem braços. Despi o blusão e embrulhei-o o melhor que pude, pedi a alguém que o carregasse e pedi ao Zé Carlos que o mantivesse vivo. A Força Aérea não evacuava mortos. A única maneira, disponível, era injetar CORAMINA e, sem saber, abreviámos-lhe a morte.

Pobre dele. Já não sentia sequer que vivia. Nunca cheguei a saber quem era. Chegados a Nova Sintra, consegui convencer a enfermeira paraquedista a levá-lo no avião, como se ainda estivesse vivo. Ela não era trouxa, mas compreendeu o meu problema, pois sabia que eu teria de carregá-lo de regresso a Tite, o que só poderia acontecer no dia seguinte durante a noite.

E assim se passou mais um episódio. Júlio Garcia, tu lembras-te muito bem. Comenta este episódio, tal como poderás comentar os restantes. Tu também os viveste. Só o Zé Carlos não pode por ter falecido pouco tempo após termos regressado a Portugal.

Joaquim Caldeira
Furriel Miliciano da CCAÇ 2314

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Notas do editor

Vd. post de 20 de Maio de 2025 > Guiné 61/74 - P26820: Vivências em Nova Sintra (Aníbal José da Silva, Fur Mil Vagomestre da CCAV 2483/BCAV 2867) (11): O meu acidente

Último post da série de 4 de maio de 2025 > Guiné 61/74 - P26764: (Ex)citações (432): Gosto de arquivar para mais tarde recordar e por vezes surpreender os amigos com peripécias vividas há anos (Aníbal José da Silva, ex-Fur Mil Vagomestre)