Lisboa > Gare Matítima de Alcãntara > 10 de maio de 2015 >painéis de Almada Negreiros
Fotos: © Luís Graça (2015). Todos os direitos reservados
Cais de partida(s)
Sempre detestei os cais de partida,
as estações ferroviárias,
as gares marítimas,
os aeroportos que nos levam aos céus,
as linhas de todas as cores do metro
que vão até ao centro do inferno,
as paragens dos elétricos,
no inverno,
os terminais de autocarro,
em todo o ano,
e mesmo as praças de táxis,
tudo sítios onde há gente vulgar,
apressada, ou mal dormida,
ou com lágrima fácil ao canto do olho
e até pombos ou gaivotas
debicando restos de comida.
São sombrios e tristes os ares das gares,
como é sombrio e triste qualquer lugar
onde se parte e reparte
e há sempre alguém
que fica com a melhor parte (...)
´
(Excerto)v11 28abr 2015
1. A modernização do porto de Lisboa é relativamente recente. As primeiras grandes obras remontam ao ano de 1887, no reinado de D. Luís. Até 1907 não havia cais acostável para os navios de passageiros, de maior tonelagem. Ficavam ao largo do Tejo, fazendo-se o transbordo de passageiros e bagagens, "à moda antiga"...
Datam dos finais da monarquia, os trabalhos de dragagem, na margem norte do rio, a oeste do cais de Alcântara. Em 1918 começaram a poder atracar no porto de Lisboa os transatlânticos de maior arqueação bruta. A atracação de navios de passageiros passou a ser obrigatória em 1927.
O cais de Alcântara e o molhe oeste do cais de Santos ficaram reservados para as companhias de navegação estrangeiras. Os navios nacionais, com destino às ilhas adjacentes e a África, partiam do cais da Fundição, Terreiro do Trigo (junto a Santa Apolónia) e molhe leste do cais de Santos.
É no âmbito do “plano de melhoramentos do porto de Lisboa: margem norte do Rio Tejo”, da iniciativa do Estado Novo, que vão ser construídas as gares marítimas de Alcântara e da Rocha do Conde de Óbidos. Era então ministro das Obras Públicas e Comunicações, o eng Duarte Pacheco (1901-1943).
O projeto destas gares marítimas com 2 pisos, é do arquiteto Pardal Monteiro (1895-1957), um dos grandes aruitetos estadonovistas (autor também do edífício do Instituto Nacional de Saúde dr. Ricardo Jorge e Escola Nacional de Saúde Pública). A gare marítima de Alcântara será inaugurada ainda em plena II Guerra Mundial (7 de julho de 1943), quando afluíam a Lisboa dezenas de milhares de refugiados de um continente devastado pela tragédia da deriva totalitária e da guerra.
A gare marítima da Rocha de Conde de Óbidos (chamava-se assim em virtude do cais estar próximo do palácio do Conde de Óbidos, hoje edifício da Cruz Vermelha) só foi inaugurada em 1948. É aqui se localiza. o estaleiro naval que, em 1936, é concessionado a um empresa do grupo CUF, a
primeira do país a construir navios com casco de aço.
Para muito de nós, ex-combatentes da guerra colonial, o cais da Rocha de Conde de Óbidos Pimeiro foi o local de embarque para a guerra colonial... Vínhamos, geralmente de noite, de comboio, das unidades de mobilização (. no meu caso, vim diretamente do Campo Militar de Santa Margarida, se não erro). Mas não havia tempo sequer para passar pelo Salão Almada Negreiros e admirar os seus paineis (ou frescos), hoje famosos...
Lisboa > Gare Marítima de Alcântara (arq. Pardal Monteiro), inaugurada em 1943 > 10 de maio de 2015 > O cais e a gare, vistos do navio-escola "Sagres".
Fots (e legenda): © Luís Graça (2015). Todos os direitos reservados
Foto: © Luís Graça (2009). Todos os direitos reservados
Lisboa > Gare Marítima da Rocha do Conde de Óbidos > Arquiteto Pardal Monteiro, foi inaugurada em 1948... Foi daqui que partimos, muitos de nós, para a Guiné... Nos últimos anos da guerra, o transporte já se fazia por via aérea, através dos TAM - Transportes Aéreos Militares. (LG)
Foto do domínio público. Cortesia de Wikipedia.
2. No portal do Porto de Lisboa pode ler-se,
(...) "São de 1939 e 1940 os diplomas que autorizaram a celebração dos contratos para a construção das estações marítimas de Alcântara e da Rocha do Conde de Óbidos, sendo entregue ao Arquitecto Pardal Monteiro a tarefa de executar o traçado das mesmas. No hall do 2º piso das Gares podem admirar-se os catorze painéis sobre o Tejo, representando lides ribeirinhas e cenas portuárias, executados segundo a técnica da pintura mural a fresco, pelo pintor José de Almada Negreiros." (...)
Ao que parece o artista, terá levado dois anos e meio de estudos e setenta dias de execução: (i) em 1945, na Gare Marítima de Alcântara, oito pinturas, que se distribuem por dois trípticos e duas composições isoladas; (e (ii) em 1949, na Gare Marítima da Rocha do Conde de Óbidos, seis pinturas distribuídas por dois trípticos.
Na entrada da Wikipédia sobre Almada Negreiros pode ler-se, seguindo nomeadamente o historiador e crítico de arte José Augusto França ("A Arte em Portugal no Século XX, 1911-1961". Lisboa: Bertrand Editora, 1991):
(...) "Na Gare Marítima de Alcântara, Almada faz ainda um compromisso com certa "ideologia decorativa" e socorre-se de formas de representação e de uma espacialidade mais ancoradas na tradição. Este ciclo de obras divide-se em dois trípticos – no primeiro é abordada a lenda da Nau Catrineta; no outro, a vida da Lisboa ribeirinha –, e duas composições isoladas, onde representa uma festa de romaria e a lenda de D. Fuas Roupinho. De modo diferente e mais moderno, em sintonia com a evolução da linguagem cubista que então se registava no Ocidente, na Rocha do Conde de Óbidos Almada fala-nos, num dos dois trípticos, da partida dos emigrantes; no outro centra-se num imaginário de domingo lisboeta à beira rio. (...) .
Ao que parece o artista, terá levado dois anos e meio de estudos e setenta dias de execução: (i) em 1945, na Gare Marítima de Alcântara, oito pinturas, que se distribuem por dois trípticos e duas composições isoladas; (e (ii) em 1949, na Gare Marítima da Rocha do Conde de Óbidos, seis pinturas distribuídas por dois trípticos.
Na entrada da Wikipédia sobre Almada Negreiros pode ler-se, seguindo nomeadamente o historiador e crítico de arte José Augusto França ("A Arte em Portugal no Século XX, 1911-1961". Lisboa: Bertrand Editora, 1991):
(...) "Na Gare Marítima de Alcântara, Almada faz ainda um compromisso com certa "ideologia decorativa" e socorre-se de formas de representação e de uma espacialidade mais ancoradas na tradição. Este ciclo de obras divide-se em dois trípticos – no primeiro é abordada a lenda da Nau Catrineta; no outro, a vida da Lisboa ribeirinha –, e duas composições isoladas, onde representa uma festa de romaria e a lenda de D. Fuas Roupinho. De modo diferente e mais moderno, em sintonia com a evolução da linguagem cubista que então se registava no Ocidente, na Rocha do Conde de Óbidos Almada fala-nos, num dos dois trípticos, da partida dos emigrantes; no outro centra-se num imaginário de domingo lisboeta à beira rio. (...) .
"Considerados por muitos como as melhores pinturas murais portuguesas e o trabalho mais importante da pintura de Almada, o conjunto de painéis da Gare Marítima da Rocha do Conde de Óbidos é significativo de uma espécie de diluição involuntária das fronteiras entre pintura e ilustração. Estes painéis reúnem, em síntese, a sua atividade plástica anterior. Essa síntese ocorre a nível formal, com a frontalidade e fragmentação cubistas a fundirem-se com reminiscências da espacialidade tradicional, perspética, e a acentuação da teatralidade das poses e da ação; e narrativo, com a recorrência de imagens provenientes de trabalhos anteriores (...) .
(...) "Em Almada, as citações, as transposições e as redefinições são aliás frequentes, e não se restringem ao universo das artes plásticas (segundo Rui Mário Gonçalves, Almada aproxima-se de um processo explorado por Picasso na pintura, por Diaghilev nos seus bailados, por Stravinsky na música, por Jean Cocteau na poesia e teatro). 'Muitas vezes, as diversas artes que ele praticou foram-se citando umas às outras e a si próprias, retomando desenhos antigos em novas composições' (...) . Os elementos narrativos e formas que atravessam a sua obra são sobretudo as pessoas, dos saltimbancos e arlequins às mães com os filhos, às mulheres do povo; são também os lugares que todos eles habitam, a cidade com os seus cafés e tascas, as zonas ribeirinhas de Lisboa e os seus portos, povoados de guindastes, escadas, navios." (...) .
3. Confesso que também gosto mais dos painéis da Gare Marítima da Rocha do Conde de Óbidos, pela sua modernidade e ousadia (temática e estética). De qualquer modo, escrevi ontem, em comentário a um poste do José Martins (*) o seguinte:
(...) "Mas já agora diz-me porque é que tu partiste do Cais da Rocha do Conde Óbidos e não do Cais de Alcântara (...). Tu saberás a resposta, mas, olha, eu só a descobri há tempos... E há malta que faz confusão com as duas gares marítima, a "nossa!", a da Rocha de Conde de Óbidos, e a de Alcãntara... Tenho aqui fotos, tiradas há dias, no Salão Almada Negreiros, da Gare Marítima de Alcântara...Há uns anos atrás tambémn andei a (re)visitar a Gare Marítima da Rocha (de) Conde de Óbidos...
"Maldita sorte, que nem direito tivemos a uma 'visita guiada' aos painéis do mestre Almada Negreiros, hoje famosos, obras-primas da pintura portuguesa do séc. XX... Só me lembro de ter chegado, de camboio, ainda de noite, ou pela madrugada, e nos terem enfiado no navio... Ou talvez não: ainda tivemos, os graduados pelo menos, umas horitas para beber um copo e, alguns, mais afoitos, para 'mudar o óleo', na estação de serviço mais próxima, que era o cais do Sodré" (...).
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Notas do editor
(*) Vd, poste de 28 de maio de 2015 > Guiné 63/74 - P14672: O cruzeiro das nossas vidas (21): Os últimos dias, a família, os amigos e finalmente o embarque, em 28/5/1968 (José Martins)
(**) Último poste da série > 23 de maio de 2015 > Guiné 63/74 - P14651: Manuscrito(s) (Luís Graça) (57): Quando o Niassa apitou três vezes... Foi há 46 anos, a 24/5/1969, ias tu a caminho de Bissau, com mais 1734 camaradas, incluindo o 1º cabo PM Jerónimo de Sousa...
5 comentários:
Sobre os TAM - Transportes Aéreos Militares, vd aqui excerto... LG
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SEXTA-FEIRA, 24 DE ABRIL DE 2009 > TAM - Transportes Aéreos Militares
http://notempodosaraujos.blogspot.pt/2009/04/tam-transportes-aereos-militares.html
(...) O esforço de guerra não podia ser mantido só com a linha da TAP e assim a Força Aérea, desde muito cedo, tentou desenvolver os transportes aéreos estratégicos, missão entregue aos TAM (Transportes Aéreos Militares), que começaram a operar na primeira metade dos anos 50 a partir do AB1, em Lisboa, para o que usaram dois C-54 (o equivalente do Skymaster), cedidos pelos americanos para uso nos Açores. Em 1955, os TAM contavam já com uma frota de 11 C-54 ou DC-4, mas todos antiquados.
Quando a luta armada rebentou em Angola, os Constellation da TAP foram requisitados e fizeram viagens como transportes de tropas, enquanto os C-54 dos TAM tentaram manter a ligação regular com Luanda, em voos que demoravam 22 horas. As dificuldades eram muitas para os velhos aviões e quatro deles perderam-se em acidentes.
A renovação da frota de longo curso dos TAM era prioritária, mas os EUA recusaram-se a vender os C-130 ou outros aparelhos modernos, pelo que teve de se recorrer à TAP, que comprou oito DC-6 no mercado civil, passando-os depois aos TAM, os quais mantiveram a ligação regular com Luanda até 1971. Dos dez aviões deste tipo usados pelos TAM nas ocasiões de maiores dificuldades, só um estava operacional e era sempre difícil comprar peças no mercado americano, mesmo através da TAP, por isso os C-54 foram desviados para a rota da Guiné, bastante mais curta.
Em 1970, mais uma vez com recurso a vários subterfúgios, foi possível comprar dois Boeing 707 para os TAM. A primeira via gem para Luanda fez-se em 1971, numa ligação que, com os aparelhos a jacto, só durava dez horas.
Em resumo, o esforço para manter a ligação adequada entre a metrópole e o império foi dos mais significativos e importantes das guerras de África. Em termos de meios aéreos, só no final se encontrou a resposta tecnicamente adequada, em larga medida devido à falta de apoio activo americano. (...)
Os poemas continuam a surgir no blogue mas o LIVRO...näo!
Näo terá Fernando Pessoa ordenado o..."É Tempo"?
Um grande abraco do José Belo.
Zé: é uma grande alegria saber de ti, através do teu comentário... Ainda ontem me lembrei de ti, fui assistir à estreia, em Portugal, do filme do realizador sueco Vilgot Sjoman (1924-2006), "Sou Curiosa", de 1967 [I Am Curious (Yellow) (in Swedish, "Jag är nyfiken - gul") (1967)] com a Lena Nyman (1944-2011) bem como um inepserado... Olof Palme.. Impensável ter passado nessa época no Portugal de Salazar (*). Mas cinquenta anos depois não tem necessariamente o mesmo impacto!...
Quanto ao livro de poemas, está quase-quase pronto... Mas precisa de um editor... Contactei originalmente a Chiado Editora, mas tenho muitas reservas em relação a esta chancela... Em boa verdade, não tenho pressa, apesar da pressão dos filhos (João e Joana) e da mimha Chita...
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(*)Excerto do sítio da Medeia Filmes:
SOU CURIOSA (1967) e CONTINUO A SER CURIOSA (1968), em exclusivo no ESPAÇO NIMAS a partir de 28 de Maio
Símbolos cinematográficos de libertação sexual e política, SOU CURIOSA (1967) e CONTINUO A SER CURIOSA (1968) são duas obras emblemáticas e de culto da autoria do realizador sueco Vilgot Sjöman, que poderão ser vistas a partir do dia 28 de Maio, no ESPAÇO NIMAS, em Lisboa, sendo lançadas logo de seguida em DVD.
Objecto de enorme polémica na altura, SOU CURIOSA (1967) é um importante documento para caracterizar a sociedade sueca durante a década de 60, um período marcado pela revolução sexual no país. Enquanto está a fazer um filme, a jovem Lena (interpretada por Lena Nyman), mantém uma relação com o realizador do seu filme, Vilgot Sjöman, que se interpreta a si próprio. Lena é uma jovem activista, constantemente à procura de novas experiências e descobertas. Nesta busca incessante, Lena inicia um processoum de descoberta sexual e de compreensão das questões políticas e sociais da Suécia na época.
Quando foi lançado, SOU CURIOSA foi objecto de grande controvérsia e chegou mesmo a ser proibido na Noruega. Nos Estados Unidos, o filme foi alvo de uma acesa batalha judicial, objecto de censura e proibido em várias cidades. (...)
http://medeiafilmes.com/noticias/ver/noticia/sou-curiosa-1967-e-continuo-a-ser-curiosa-1968-em-exclusivo-no-espaco-nimas-a-partir-de-28-de-maio/
Viva Luís!
É muito interessante esta notícia sobre as estações de embarque (e desembarque, mas este já representava um alívio e inspirava a auto-estima) em Alcântara e na Rocha do Conde de Óbidos. Vou propor aos meus filhos uma deslocação ao local, onde a dois passos podemos contactar com um interessante espólio oriental.
Um abraço
JD
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