quinta-feira, 9 de janeiro de 2020

Guiné 61/74 - P20541: Questões politicamente (in)correctas (48): Op Cabeça Rapada I, II, III e IV, no setor L1 (Bambadinca), março-maio de 1969: mobilizados milhares de civis, recrutados pela administração do concelho de Bafatá... Não sabemos se foram "voluntários" e "devidamente remunerados"... (Luís Graça / Torcato Mendonça / Albano Gomes / Carlos Marques Santos)



Guiné > Zona Leste > Região de Bafatá > Sector L1 (Bambadinca( > Mansambo > CART 2339> Março / Maio de 1969 > Op Cabeça Rapada (1)

Foto do álbum do Albano Gomes, que vive em Chaves, e que foi 1º cabo op cripto, CART 2339 (Mansambo, 1968/69).

Foto (e legenda): © Albano Gomes (2008). Todos os direitos reservados.  [Edição e legendagem complemementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



Guiné > Zona Leste > Região de Bafatá > Sector L1 (Bambadinca( > Mansambo > CART 2339> Março / Maio de 1969 > Op Cabeça Rapada (2)


Guiné > Zona Leste > Região de Bafatá > Sector L1 (Bambadinca( > Mansambo > CART 2339> Março / Maio de 1969 > Op Cabeça Rapada (3)


Guiné > Zona Leste > Região de Bafatá > Sector L1 (Bambadinca( > Mansambo > CART 2339> Março / Maio de 1969 > Op Cabeça Rapada I > Milhares de nativos são requisitados pela administração do concelho de Bafatá para capinar a estrada de Bambadinca - Mansambo - Xitole (cerca de 30 Km), de um lado e de outro, numa faixa (variável) de 100 a 200 metros.

Fotos do álbum de Torcato Mendonça (ex-alf mil, CART 2339, Mansambo, 1968/69)

Fotos (e legendas): © Torcato Mendonça (2007). Todos os direitos reservados.  [Edição e legendagem complemementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]




Guiné > Zona Leste > Região de Bafatá > Sector L1 > Bambadinca > Comando e CCS/BCAÇ 2852 (1968/70) > Dada ordem, pela administração de Bafatá,  de mobilização de milhares de nativos para os trabalhos de desmatação das orlas da floresta na estrada Bambadinca-Xitole (e depois Bambadinca-Xime). Aqui na foto, forças da CART 2339 (Mansambo, 1968/69).


Guiné > Zona Leste > Região de Bafatá > Sector L1 (Bambadinca) > Mansambo > CART 2339> Março / Maio de 1969 >  Estrada Bambadinca - Mansambo >  Op Cabeça Rapada: a espingarda, a enxada, a pá, a picareta, a maceta...



Guiné > Zona Leste > Região de Bafatá > Sector L1 (Bambadinca) > Mansambo > CART 2339> Março / Maio de 1969 >  Estrada Bambadinca - Mansambo >  As catanas a funcionar


Guiné > Zona Leste > Região de Bafatá > Sector L1 (Bambadinca) > Mansambo > CART 2339> Março / Maio de 1969 >  Estrada Bambadinca - Mansambo >  Aspecto do trabalho de desmatação.


Guiné > Zona Leste > Região de Bafatá > Sector L1 (Bambadinca) > CART 2339 > Estrada Bambadinca - Mansambo > Montando a segurança às brigadas de trabalhadores.

Fotos do álbum do Carlos Marques Santos (1943-2019), ex-fur mil, CART 2339 (Mansambo, 1968/69)

Fotos (e legendas): © Carlos Marques dos Santos  (2006). Todos os direitos reservados.  [Edição e legendagem complemementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



Guiné > Zona leste > Região de Bafatá > Setor L1 (Bambadinca) >  Estrada Bambadinca . Mansambo - Xitole > Pel Rec Daimler 2046 (1968/70 > Fotos do álbum de Jaime Machado,  duas imagens que falam por si e que documentam a participação das velhinhas Daimlers na escolta de segurança a colunas logísticas bem como a colunas de transporte de tropas e civis, incluindo a participação na Op Cabeça Rapada.
  . 
Fotos (e legendas): © Jaime Machado  (2006). Todos os direitos reservados.  [Edição e legendagem complemementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


Operação Cabeça Rapada I, III e  III  (Estrada Bambadinca- Mansambo - Xitole, março-maio de 1969) e IV (Bambadinca - Xime, maio de 1969)



1. Comentou o nosso editor LG, no poste P20538 (*)

(...) Morreu muita gente [, na guerra da Guiné, entre 1961 e 1974,] e não vem nas estatísticas...da "guerra". Morreram muitos civis,  de um lado e do outro... Estes estivadores [, ao serviço da Intendência, mortos em de março de 1974, em Cufar], por exemplo: quem eram ? A Intendência devia ter, pelo menos, uma folha de pagamentos com os seus nomes...

E os "carregadores" do PAIGC, nas chamadas "regiões libertadas" ?... Era trabalho "revolucionário"..., tão "forçado" como o das populações que eram arrebanhadas, pelos régulos e pelos administradores, para "capinar" as bordas das estradas...e outros "trabalhos públicos".

Isto ainda acontecia no nosso tempo: 1969, no 1º ano do consulado de Spínola!... No Setor L1 (Bambadinca), houve um operação de capinagem, no 1º semestre de 1969, que envolveu... muitos milhares de civis! Op Cabeça Rapada, I, II, III e IV... E lembro-me de, em certas operações, levarmos civis para carregar jerricãs de água e granadas (de bazuca e de morteiro)... Por ex., na Op Tigre Vadio, março de 1970...

No caso da Operação Cabeça Rapada, os capinadores foram "recrutados" de entre as populações Fula, Mandinga e Balanta de Badora (e talvez do Corubal).

2. A propósito da Op Cabeça Rapada, escreveu o Torcato Mendonça (ex-alf mil, CART 2339, Mansambo, 1968/69) (**):

"Operação Cabeça Rapada: uma mente, com um QI superior, resolveu juntar talvez milhares de africanos e capinar, limpar toda a vegetação, de ambos os lados da estrada Bambadinca/Mansambo, nos locais onde o IN atacava com mais frequência. Talvez 20 a 50 metros de cada lado.

A madeira cortada ficou empilhada na zona final do corte. Resultado: fizeram abrigos para o IN e limpámos-lhe o campo de tiro.

Palavras para quê? Eram artistas portugueses.

Atenção junto a aquartelamentos e em determinadas zonas foi positivo."

3. Notas de TM / LG:

As foto e as legendas. acima reproduzidas, referem-se à Operação Cabeça Rapada I, iniciada em 26 de março de 1969, às 5  horas da manhã, com duração de 2 dias e envolvendo cerca de 7000 nativos. Foram trabsportados em camionetas dos comerciantes da região: os Rodrigo Rendeiro, de Bambadinca, os Regala, de Galomaro,  os Jamil Nasser, do Xitole... E traziam as suas próprias alfaias agrícolas... Nem a administração de Bafatá nemo BCAÇ 2852 tinham catanas para tanta gente...
 
Na história do BCAÇ 2852 (Bambadinca, 1968/70), diz-se que a operação foi para montar segurança aos trabalhos de desmatação, de 200 metros para cada lado (!), do itinerário Bambadinca - Mansambo, compreendido entre Samba Juli e Mansambo.

Esta operação envolveu 3 destacamentos, num total de 14 Gr Comb (cerca de 400 homens em armas):

(i) Destacamento A: CCAÇ 2405, a 2 Gr Comb  + 2 Gr Comb da CCS/BCAÇ 2852, o Pel Caç Nat 53 e o Pel Caç Nat 63:

(ii) Destacamento B: CART 2339, a 3 Gr Comb +  CART 1746, a 2 Gr Comb  + 2314, a 2 Gr Comb

(iii) Destacamento C: Pel Mil 103, 104 e 145.

Em 8 de março (e até 18) tinha havido a Op Lança Afiada, envolvendo 1300 efetivos (entre tropa e carregadores civis)… Era necessário dizer ao PAIGC: "A população está connosco"…

Não houve contacto com o IN...

Em 9 de abril desenrolou.se a Op Cabeça Rapada II, com duração de dois dias. O objetivo era novamente montar segurança aos trabalhos de desmatação a cargo da administração do concelho de Bafatá.

O itinerário escolhido, desta vez,  foi Mansambo / Ponte dos Fulas. Envolveu "2150 nativos" (sic).

Em 30 de abril e até 2 de maio, teve lugar a Cabeça Rapada III: não está descrita na história do BCAÇ 2852:  o itinerário escolhido foi Bambadinca, Candamã, Galomaro e Samba Cumbera. 

A 3 de maio, com início às 3 da manhã, houve ainda  a Op Cabeça Rapada IV, com duração de 3 dias, para desmatar o intinerário Bambadinca - Xime.

Neste caso, foram envolvidos  cerca de 150 homens em armas, ou sejam, 2 Gr Comb / CART 1746  + 2 Gr Comb / CCAÇ 2405 + 1 Gr Comb / CART 2413 + Pel Rec Daimler 2046 (comandado pelo camarada Jaime Machado)..

Também não houve contacto. Não é referido o número de civis recrutados. Mas também terão sido da ordem das centenas ou milhares

"A população envolvida era Fulas e Mandingas. Os Balantas estiveram e muito bem, como carregadores, integrados na minha Companhia, na Op Lança Afiada. Um dia contarei…Tanta estória…" (Torcato Mendonça)


4. Comentário do editor LG (***):

É um número impressionante de trabalhadores  de etnia fula e mandinga, mas também  balanta, naturais dos regulados de Badora (e talvez do Corubal). Desconheço se foram recrutados "voluntariamente" e "devidamente pagos"... É muito provável que tenham sido apenas pagos em "géneros": arroz... A tradição da administração colonial, antes do início da guerra, e teoricamente até pelo menos a 1961, era a do "trabalho forçado", puro e duro... (****)

Recorde-se que, segundo a História do BCAÇ 2852 (Bambadinca, 1968/69), "a população de um modo geral é-nos favorável [no sector L1], sendo de destacar o regulado de Badora que tem como Chefe/Régulo um homem de valor e considerado pela população como um Deus (sic). Esse homem é o Tenente Mamadu, já conhecido no meio militar pelos seus feitos valorosos e dignos de exemplo. Da outra população [balantas, beafadas e mandingas...] fortes dúvidas se tem especialmente as dos Nhabijões, Xime e Mero" (Cap. II, pag. 1).

Conheci o tenente de 2ª classe, régulo e chefe máximo das milícias de Badora. O apontamento do escriba castrense da BCAÇ 2852 é manifestamente exagerado: acho que o Tenente Mamadu era respeitado e sobretudo temido pelos seus súbditos, mas é manifestamente grosseiro, etnocênctrico e até ofensivo dizer que a população, muçulmana, o "considerava como um Deus"...Convenhamos que é uma figura de estilo"... 

O administrador do concelho de Bafaté e o régulo de Badora eram, na altura, figuras poderosas, com capacidade para recrutar milhares de braços...

Recorde-se que, segundo a Convenção nº 29 da OIT - Organização Internacional do Trabalho (adotada em 1930, e ratificada por Portugal em...  1956)), trabalho forçado ou obrigatório é todo trabalho ou serviço exigido de uma pessoa sob a ameaça de uma sanção e para o qual a pessoa não se ofereceu espontaneamente (nº 1 do artº 2ª)...Mas depois havia as exceções do nº 2 do artº 2º...


5. Texto (excertos) do Carlos Marques dos Santos (ex-fru mil, CART 2339, Mansambo, 1968/69) (*****),  receém falecido, no final do ano:

Prenúncio da abertura definitiva da estrada Bambadinca - Mansambo Xitole, intransitável desde novembro de 1968 a 4 de agosto de 1969 (Op Belo Dia).

[Recorde-se que desde novembro de 1968 o itinerário Mansambo-Xitole estava interdito. Nessa altura, uma coluna logística do BCAÇ 2852, no regresso a Bambadinca, sofrera duas emboscadas (uma das quais, a primeira, com mina comandada), a cerca de 2 km da Ponte dos Fulas, na zona de acção da unidade de quadrícula aquartelada no Xitole [não era ainda CART 2413, mas sim a CART 2339]. A coluna prosseguiu com apoio aéreo. Nove meses depois, fez-se a abertura desse itinerário, mais exactamente a 4 de Agosto de 1969. Na Op Belo Dia, participou o 2º Gr Comb da CCAÇ 12 com forças da CART 2339 (Mansambo), formando o Destacamento A"... (LG)]

Haverá concerteza alguns dos tertulianos que estiveram envolvidos nesta série de operações... Então relembremos:

Nós, CART 2339, especialmente na segundo Operação [Op Cabeça Rapada II], vibrámos com o movimento. Espantoso: caldeirões de arroz (meio bidão de gasóleo, em fogueiras espalhadas pelo aquartelamento, movimento de viaturas e homens, um barulho ensurdecedor, homens deitados por tudo o que era sítio, em suma,  uma anarquia bem controlada).

Passemos à exposição dos factos:

Op Cabeça Rapada I: em 25 de março de 1969, uma semana depois da Op Lança Afiada, inicia-se a primeira Op Cabeça Rapada, com a duração de 2 dias, no itinerário Bambadinca/Mansambo.

Picagens, seguranças de flanco, etc. Trabalhos de nativos em desmatação das bermas da estrada. Estava dado o pontapé de saída, para maior segurança nas deslocações na estrada Bambadinca/ Xitole. Mas, do nosso ponto de vista, maior exposição à observação IN.

Em 5 de abril inicia-se o aperfeiçoamento na desmatação do itinerário Bambadinca/ Mansambo, o mesmo acontecendo nos dias seguintes, 6, 7 e 8 de abril, sempre das 6.00h às 17.00h (nota jocosa: em horário de expediente).

Op Cabeça Rapada II

Em 9 de Abril, às 5.40h, inicia-se com a duração de 3 dias a Op Cabeça Rapada II, no itinerário Mansambo/ Ponte dos Fulas. (....)

Foi efectuada a picagem e estacionamentos laterais, para segurança, no sentido Mansambo / Ponte Fulas, antes e durante os trabalhos.

Foram detectadas 2 minas A/P e uma A/C, mas sem incidentes (...) O trabalhos envolveram 2150 trabalhadores nativos, que dormiram e comeram em Mansambo, tendo a segurança ficado montada de noite no itinerário.

Em 10 de abril de 1969 retomam a actividade, pela manhã, tendo os trabalhadores sido recolhidos em Mansambo ao final do dia, regressando ao seus destinos.

Às 18.00h, desse dia, os vários destacamentos militares regressam a Mansambo e aguardam a sua vez de regressar aos quartéis, sem incidentes, com muitos vestígios. (...)

No dia seguinte, a 3 de maio, a CART 2339 estava envolvida em nova operação, a Op Espada Grande, iniciada às 00.00h e terminada - para a CART 2339 - às 8.00h do dia 4 (Galo Corubal e Satecuta) (...).

Não havia tempo para descansar. As acções de segurança e combate iriam prosseguir. (...) 
___________

Notas do editor:



Vd. também poste de 27 de fevereiro de 2012 > Guiné 63/74 - P9541: Nós da memória (Torcato Mendonça) (12): Cabeça Rapada - Fotos falantes IV

24 comentários:

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Convenção nº 29 da OIT sobre o trabalho forçado ou obrigatório:

(...) Artigo 2

1. Para fins desta Convenção, a expressão "trabalho forçado ou obrigatório" compreenderá todo trabalho ou serviço exigido de uma pessoa sob a ameaça de sanção e para o qual não se tenha oferecido espontaneamente.

2. A expressão "trabalho forçado ou obrigatório" não compreenderá, entretanto, para os fins desta Convenção:

a) qualquer trabalho ou serviço exigido em virtude de leis do serviço militar obrigatório com referência a trabalhos de natureza puramente militar;

b) qualquer trabalho ou serviço que faça parte das obrigações cívicas comuns de cidadãos de um pais soberano,

c) qualquer trabalho ou serviço exigido de uma pessoa em decorrência de condenação judiciária, contanto que o mesmo trabalho ou serviço seja executado sob fiscalização e o controle de uma autoridade pública e que a pessoa não seja contratada por particulares, por mpresas ou associações, ou posta á sua disposição;

d) qualquer trabalho ou serviço exigido em situações de emergência, ou seja, em caso de guerra ou de calamidade ou de ameaça de calamidade, como incêndio, inundação, fome, tremor de terra, doenças epidêmicas ou epizoóticas, invasões de animais, insetos ou de pragas vegetais, e em qualquer circunstância, em geral, que ponha em risco a vida ou o bem-estar de toda ou parte da população;

e) pequenos serviços comunitários que, por serem executados por membros da comunidade, no seu interesse direto, podem ser, por isso, considerados como obrigações cívicas comuns de seus membros, desde que esses membros ou seus representantes diretos tenham o direito de ser consultados com referência á necessidade desses serviços. (...)

https://www.ilo.org/wcmsp5/groups/public/---ed_norm/---normes/documents/normativeinstrument/wcms_c029_pt.htm

Tabanca Grande Luís Graça disse...

HISTÓRIA
Trabalho forçado nas colónias portuguesas "bastante disseminado" até aos anos 60
Trabalhadores presos com “grilhetas” ao pescoço, castigos corporais, violações, “iniquidades e abusos”. José Pedro Monteiro publicou em livro resultado de uma investigação sobre o período 1944-1962.

Lusa 9 de Janeiro de 2019, 19:16


https://www.publico.pt/2019/01/09/sociedade/noticia/trabalho-forcado-colonias-portuguesas-bastante-disseminado-ate-anos-60-1857244

(...) Os registos históricos não permitem averiguar a escala, mas o trabalho forçado nas colónias portuguesas era uma realidade "bastante disseminada", pelo menos até à década de 1960, segundo o historiador José Pedro Monteiro, num novo livro sobre o tema.


(...) Depois de concluída a tese de doutoramento (A internacionalização das políticas laborais 'indígenas' no império colonial português (1944-1962)), José Pedro Monteiro apresenta, na quinta-feira, em Lisboa, o livro daí resultante: Portugal e a questão do trabalho forçado: Um império sob escrutínio (Edições 70).

Questionado sobre a dimensão do trabalho forçado nas colónias portuguesas durante o período estudado, José Pedro Monteiro respondeu que o material disponível não permite chegar a números precisos: "É muito difícil conseguir-se ter uma ideia global à escala do império. Primeiro, há realidades geográficas muito distintas. Em Cabo Verde, Timor e, eventualmente, na Guiné a questão do trabalho forçado não se coloca da mesma maneira que se coloca em São Tomé, Angola e Moçambique.” (...)

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Adriano MOreira, em entrevista ao Sol:


https://sol.sapo.pt/artigo/605527/-aquilo-que-acabou-nao-foi-o-imperio-portugu-s-foi-o-imperio-euromundista-

POLITICA 26 de março 2018
‘Aquilo que acabou não foi o império português. Foi o império euromundista’


(...) Eu julgo que foi importante, difícil e num ambiente que não foi muito simpático sempre. Por exemplo, andam aí muito agitados com o passado da escravatura e transporte de escravos, digo o seguinte: eu não amo o meu país a benefício de inventário, portanto, assumo as coisas do passado de que não gosto. Não gosto que tenham expulsado os judeus, não gosto dos excessos da Inquisição, não gosto da escravatura, mas há uma coisa que eu gosto que é de ser português. Nós tivemos escravatura, todos tiveram. Quem acabou com a escravatura aqui foi o Marquês de Pombal. Quem acabou com a escravatura nas colónias foi o Sá da Bandeira, mas ficou alguma coisa, o indigenato. No indigenato não eram cidadãos, não estavam protegidos pela lei, até se podia duvidar se se deviam considerar portugueses.

Revoguei o estatuto dos indígenas, com isso revoguei o trabalho forçado, publiquei um Código do Trabalho que o Bureau International du Travail [órgão permanente da OIT] concluiu que era o código mais avançado de África. Criei vários liceus, instituí o ensino superior em Angola e Moçambique. Isto foi em dois anos e pouco [1961-63].

Nessa altura, o presidente do Conselho disse-me, numa conversa no forte que agora está naquele estado [o forte de Santo António da Barra], ‘eu tenho cumprido a promessa de que o senhor faria as reformas todas, mas a reação está a ser de tal ordem que eu próprio não tenho a certeza de poder continuar a ser presidente do Governo, temos de mudar de política’ e eu respondi-lhe ‘acaba de mudar de ministro’. (...)

Tabanca Grande Luís Graça disse...

O Decreto-lei 43893, de 6 de Setembro de 1961, é uma dos 7 diplomas reformistas do Ministro do Ultramar, Adriano Moreira. Veio revoga o Decreto-Lei n.º 39666, de 20 de maio de 1954, que promulga o Estatuto dos Indígenas Portugueses das Províncias da Guiné, Angola e Moçambique.

Leia-se o que escreveu aqui o nosso conhecido António Duarte Silva, no seu blogue "Malomil":

(…) Entre todas estas medidas, aquela que o próprio Adriano Moreira mais destacou foi a revogação do Estatuto dos Indígenas considerando-a «tão importante na história da evolução legislativa portuguesa como os diplomas que puseram termo à escravidão e ao tráfego» (...).

Já em 20 de Maio de 1960, em conferência proferida na Associação Académica de Coimbra, na qualidade de autor consagrado e Presidente da Comissão Ultramarina das Comemorações do V Centenário da Morte do Infante D. Henrique, Sarmento Rodrigues considerara entre os problemas de primeira importância na vida interna das províncias ultramarinas o da «civilização dos indígenas». Na sua opinião, a palavra “indígena” era um mero conceito legal mas começava a ser difícil não reconhecer a todos os portugueses o direito de cidadania[16]. Até porque – acrescente-se – na opinião pública internacional, o “indigenato” passara a ser contestado como uma das mais reprováveis manifestações de racismo e de colonialismo e tinha sido abolido pela França em 1946. (…)

http://malomil.blogspot.com/2017/02/adriano-moreira-e-as-reformas-de-1961.html

Tabanca Grande Luís Graça disse...

É também de Adriano Moreira o texto do diploma reformista, que croiu o Código do Trabalho Rural:

Decreto n.º 44309, de 27 de abril de 1962...

Aprova o Código do Trabalho Rural, para vigorar nas províncias de Cabo Verde, Guiné, S. Tomé e Príncipe, Angola, Moçambique e Timor - Revoga o Código do Trabalho Indígena, aprovado pelo Decreto n.º 16199, e os regulamentos provinciais do mesmo código, assim como todos os regulamentos, portarias e demais diplomas publicados em cada uma das mencionadas províncias em regulamentação complementar daquele código e as instruções e toda a mais legislação em contrário

Valdemar Silva disse...

Uff.. só em 1960!!! toda aquela nova legislação para os 'portugueses' da Guiné.
Até parece, ou não, que foi feita à pressa por causa do início da guerra nas nossas colónias de África.

Da minha CART11 'Os Lacraus' esteve um Pelotão (revezando-se) destacado na segurança da construção de várias pequenas pontes na estrada/picada entre Nova Lamego-Cabuca, que em vários locais do percurso ficava intransponível no tempo das chuvas. Os pedreiros e ajudantes, talvez um total de cinco, eram todos indígenas contratados em Nova Lamego. Não me lembro se os próprios pedreiros eram os 'arquitectos a olho' ou traziam algum croqui de como deveriam fazer as pontes.

Valdemar Queiroz

José NASCIMENTO disse...

Essa desmatação deve ter sido muito mal feita, ou foi só para o inglês ver. Cheguei ao Xime no dia 2 de Junho de 1969 e no dia 4 fui do Xime a Mansambo passando por Bambadinca. Mesmo como "piriquito" não me pareceu que tivesse havido um trabalho de desmatação, pois a mata chegava até à estrada. Lembro-me que na estrada para Mansambo em certos sítios até as ramagens batiam-nos na cara.
Um abraço.
José Nascimento

Fernando Gouveia disse...

Em março/abril de 69 estive de férias e não me recordo destas operações de desmatamento, no entanto assisti várias vezes a pequenas capinagens organizadas pelo Administrador da altura. As coisas eram sempre feitas da mesma forma: o Administrador recrutava à força, sem violência, os nativos de que precisava e levava-os para os locais a capinar, como junto à pista de Bafata e onde precisava.
Sempre foi do meu conhecimento, disso lembro-me bem, que pagava a cada elemento 15 escudos por dia, o que me faz pensar que alguns não gostariam da situação mas outros sim.
Abraços
Fernando Gouveia

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Fernando, esse elemento informativo é importante:

"o Administrador recrutava à força, sem violência, os nativos de que precisava e levava-os para os locais a capinar, como junto à pista de Bafata e onde precisava. Sempre foi do meu conhecimento, disso lembro-me bem, que pagava a cada elemento 15 escudos por dia."

Neste caso foi um operação que envolveu quase toda a população masculina, válida, do regulado de Badora... Estamos a falar 7 mil homens, só na Op Cabeça Rapada I...

Aqui foi preciso seguramente a colaboração ativa do régulo de Badora, o poderoso Mamadu Bonco Sanhá, tenente de 2ª linha, comandante da companhia de milícia do Cuor.Vogal do conselho logístico da Província (, ao lado, por exemplo, de outro grande aliado dos portugueses, o régulo manjaco Joaquim Baticã Ferreira.)

Talvez o Torcato Mendonça, da CART 2339 (Mansambo, 1968/69)., que não tem dado, há muito, "sinais de vida", nos pudesse explicar algo mais sobre o planeamento e a execução da Op Cabeça Rapada...

António J. P. Costa disse...

Olá Camaradas

Não vejo as Daimler, mas devem lá andar. A AM que está em grande é uma Humber ou uma Fox.

Quanto à operação, parece-me que seria necessária para negar ao In locais onde se acoitar.
Aqui põe-se a questão de saber se a Pop. estava ou não do lado das NT. Se assim fosse não se poria a questão de se saber se se tratava de "voluntários da corda" ou de trabalhadores indígenas assalariados gratuitamente.
Se não estavam francamente do lado das NT iriam voluntariamente obrigados, o que é difícil de provar. Uns iriam outros não, como sempre sucede em casos idênticos. Os que não quisessem ir, se fossem poucos, não poderiam manifestar-se; se fossem muitos, já estaríamos na 5.ª fase da subversão ou próximo dela...
Sei que houve múltiplas operações deste tipo, visando criar espaços para as passagens das estradas, criando "espaços de segurança" que impedissem o In de se aproximar a curta distância das colunas.
As desmatações para os trabalhos agrícolas eram levadas a cabo pela Pop e normalmente com a respectiva protecção.

Um Ab.
António J. P. Costa

Anónimo disse...

Caros amigos,

Sobre este tema de trabalhos forçados, porque é disto mesmo que se trata, eu desafio ao Fernando Gouveia, a mostrar provas ou evidências que os trabalhadores recrutados a força e com violência sim, porque havia a violência psicológica e o medo, as pessoas eram coagidas e ninguém o fazia de livre vontade. De pagamentos nunca ouvi falar, talvez aos Régulos, não sei, não posso confirmar. O território de alto Casamansa que era quase despovoado até principios do séc. XIX, acabou por ser povoado por populações que fugiam em massa dos trabalhos forçados da parte portuguesa. Ainda hoje aquelas populações se identificam como fulas e mandingas de Gabu (Gaabunkés).

E nesses recrutamentos forçados feitos junto das familias, nem as crianças escapavam, pois cada familia tinha que indicar uma ou duas pessoas conforme o numero solicitado pelas autoridades coloniais. Uma vez, aconteceu comigo, entre 1973/74 no tempo da CCaç.3549, ser listado para a limpeza da estrada que ligava Fajonquito a Canhamina (3km), por falta de adultos disponíveis na familia, teria 13/14 anos. Já sabia da violência dos trabalhos de genero e recusei-me a ir e fui esconder-me no quartel junto dos meus amigos condutores. Depois, o Agente (Sipaio), foi lá a minha procura, tentando mostrar autoridade, mas foi corrido quase a pontapé pelo Dias o mais agressivo dos meus patrões e nunca mais me chateou. A partir desse acontecimento eu percebi que os soldados portugueses, obrigados a fazer a guerra na Guiné, não conheciam e não colaboravam com o sistema colonial de opressão contra as nossas populações o que por si constituia um grande paradoxo, pois em condições normais deveria ser ao contrário pelo facto de que estariam ali para defender o sistema de dominação colonial de Portugal sobre as populações nativas.

Das poucas vezes que conseguiram arrastar-me, por indicação do meu pai que não tinha outra alternativa, nem água, nem comida e muito menos dinheiro. No entanto muitos estavam convencidos que os brancos davam dinheiro para o efeito, mas que o Régulo e seu séquito se apropriavam do mesmo, facto que não posso confirmar em virtude da minha idade, na altura.

Com um abraço amigo,

Cherno Baldé

PS: Uma observação que gostaria de fazer relativamente a observação do José Nascimento é que a flora da região Sul da Guiné é muito diferente em relação ao resto do país pois devido a fertilidade do solo os arbustos e suas ramificações têm um ritmo de crescimento espantoso que em poucos dias atingem vários metros de comprimento. Quem viajou pelas estradas da zona sul, incluindo o triangulo Bambadinca-Xime-Xitole sabe do que estou falando.

Antº Rosinha disse...

Nunca se devia colonizar as pessoas, aliás os europeus em 1880 na conferência de berlim só pensavam nas riquezas do subsolo...mas uma coisa leva a outra.

Como é que um colonialista europeu, na África subsaariana, conseguiria convencer um "indígena" a trabalhar às suas ordens?

Quando o indígena não sentia nem motivação social, política ou económica?

Quando para a sua subsistência (alimentar, habitação, educação, saúde, desporto, vestuário...) estava tudo adquirido há séculos?

Digo eu que devia ser muito difícil convencer aquela sociedade pôr-se ao serviço de qualquer europeu.

Claro que havia uma maneira, que era "a mal", outra maneira que era "a bem".

Com ou sem dinheiro, só poderia ser a bem ou a mal.

Hoje após 50 anos livres dos europeus, dirigentes africanos continuam a recorrer a "capatazes" europeus...e a investidores chineses, e de toda a ordem.

Se não for a bem, vai a mal.

Sorte tiveram os Zulus que ficou lá muito ouro em cofre, todos os outros os cofres ficaram vazios.



Tabanca Grande Luís Graça disse...

Quem é que fez as "autoestradas dos romanos" ? Uma rede viária impressionante que chegou ao séc. XIX, em Portugal e em todas as regiões conquistadas e colonizadas pelos romanos... A nossa rede viária na Idade Média era a dos romanos...

E quem é que assentou aquelas lajes enormes, das calçadas por onde passavam as legiões romanas mas por onde também circulavam mercadorias, ideias, homens livres e escravos, cristão e pagãos, bárbaros e romanos... ? Quem construiu a Bracara Augusta (Braga) ou a Myrtilis Iula (Mértola) ou a Olissipo (Lisboa) ? Os habitantes da Lusitânia, os "lusitanos", feitos escravos depois da conquista... É claro que alguns foram sendo "assimilados" e chegaram a "cidadãos romanos"...Nessa altura a capital era em Mérida (Emerita Augusta), hoje na Estremadura Espanhola...

É que os senhores romanos deviam também usar um "eufemismo" para designar esses trabalhos públicos: para eles, devia ser "trabalho comunitário"...

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Fernando e Cherno: 15 escudos na época (anos sessanta) era dinheiro... Os meus soldados da CCAÇ 12 ganhavam 20 escudos por dia... tanto quanto um trabalhador rural indiferenciado no interior de Portugal...

Os meus soldados tinham, além disso, mais 24$50, para comer, tal como eu: eles eram "desarranjados", recebiam em dinheiro; eu recebia, em "géneros", tinha direito a comer na messe... ou uma ração de combate (quando em operações)...

24$50 era igual para todos... do soldado ao general!

É evidente que se eu fosse um jovem fula também queria ir para a tropa, que era "manga de ronco", e deixava de estar sujeito às pequenas prepotências dos chefes de posto, dos administradores, dos régulos e dos cipaios...

Isto não me impede de reconhecer que para a população de Badora era importante ter as estradas (Xime-Bambadinca-Bafatá e Bambadinca- Mansambo-Xitole- Saltinho) "capinadas"... Por elas circulavam não apenas os "tugas" mas também os fulas, os mandingas, os balantas, os comerciantes (europeus, libaneses, cabo-verdianos...).

Sei, de experiência própria, quanto nos custou, a todos, no setor L1, "reabriu", em setembro de 1969, grande parte do troço da estrada Bambadinca - Mansambo - Xitole - Saltininho, que estava interdito desde o último trimestre de 1968...

Anónimo disse...

Caro Luis,

Hoje, mais lúcidos e libertos da propaganda dos Paigecistas, podemos reconhecer a impotância das vias abertas no periodo colonial mesmo com trabalho forçado, porque são as únicas que ainda existem. Mas, devemos dar as coisas o seu nome. Aqueles trabalhos de limpeza das estradas eram feitos por "voluntários" a força, recrutados com a ajuda ou imposição dos Régulos e seus agentes de repressão. Se os trabalhos fossem pagos a 15 Pesos, não seria preciso implicar as autoridades gentílicas, pois os innteressados seriam aos milhares e podiam até vir de outras regiões, porque os rendimentos que tiravam da terra e outros trabalhos eram muito inferiores. Se não comparem os preços praticados na compra do amendoim que era o principal produto de renda na zona Leste, e o custo de produção para a obtenção de uma tonelada ou saco de 100 Kg.

Abraços,

Cherno Baldé

Anónimo disse...

Sobre a capinagem, também tivemos pessoal do recrutamento local a capinar as margens das pistas de aviação, quer em Nova Lamego, quer em S. Domingos, após as chuvas, Eram bastantes, talvez 20, não sei. Também faziam o arranjo, juntamente com as NT, do piso, que ficava todo esburacado, tenho fotos de uma operação destas.-
Não me lembro se era trabalho forçado, nem sei quanto lhes pagávamos, não era da minha lavra este problema. Mas não era grátis e certeza.

Agora um aparte meu, se o território era dos guineenses e por nós também utilizado, as pistas e estradas eram benéficas para todos, tropa e para a população toda, por isso também lhes competia trabalhar nas suas terras, penso eu!

Virgilio Teixeira


Fernando Gouveia disse...

Para o Cherno e não só:
Concordo que havia violência psicológica e intimidação mas não violência física. Muitas vezes vi camionetas carregadas de africanos, a mando do administrador, para executar trabalhos necessários, aos quais pagavam os tais 15 escudos (ou pesos, como se queira). Efetivamente quando lá no Comando do Agrupamento precisavam de pessoal para esses trabalhos era só pedir ao Administrador e rapidamente aparecia uma camioneta cheia de gente. Reafirmo que se alguns iam contrariados outros agradava-lhe irem ganhar os tais 15 pesos.(ponto final)
Fernando Gouveia

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Cherno, nas tabancas, fulas, por onde passava e onde ficava uma semana ou mais, de cada vez, em reforço do sistema de autodefesa, a minha secção ou o meu grupo de combate, da CCAÇ 12 (BambadincA, 1969/71)M, era costume comprar, mesmo a custo, galinhas e frangos, a sete pesos e meio por bico (o equivalente hoje 2,22 €)...

Em 1969, recordo-me que os soldados da CCAÇ 12 (que eram praças de 2ª classe, oriundos do recrutamento local), recebiam de pré 600 pesos/mês (, equivalente, a preços de hoje, a 177, 51 €), além de mais uma diária de 24$50 (=7,25€) por serem desarranchados.

600 pesos deviam dar para comprar duas sacas de arroz de 100 kg cada... O arroz, que era a bse da alimentação dos guineenses, custava então 3 escudos /pesos o quilo...

15 escudos por um dia de trabalho (árduo), ao serviço da administração do concelho de Bafatá, dava para comprar 5 kg...

A questão que se pode pôr é: quem ficava com a massa ? Na Op Cabeça Rapada I, 7 mil capinadores durante 2 dias custariam à administração 210 mil escudos...Muita massa!... Havia cabimento orçamental ?

Valdemar Silva disse...

Lembro-me do 1º. Sarg. Ferreira Júnior, quando fomos para Paunca, devido a não haver instalações militares para a nossa CART11, ter de requisitar casas civis para instalar a nossa tropa, dado que nos abrigos existentes já estavam ocupados pela tropa da outra Companhia e neles apenas reforçávamos a segurança de noite durante umas horas.
Falou-me da requisição ser feita ao abrigo de…..………(não fixei) em situações de guerra. E assim foi feito e passamos a 'viver' na tabanca em moranças requisitadas à população.
Na situação da capinagem teria funcionado, também, com esta 'requisição do tempo de guerra' ??

Sete mil a 15 pesos era muito patacão.

Valdemar Queiroz

Anónimo disse...

A propósito das populações serem obrigadas a trabalhar a mando das autoridades é verdade, se não fossem a bem iam a mal e não precisavam de andar a bater todos os dias porque as pessoas tinham medo e umas vezes receberiam alguma coisa outras alguém recebia por eles.
E não era só na África aqui há muitas estradas nacionais não estou a falar de caminhos que no tempo dos nossos pais foram construidas com a colaboração das populações por onde elas passavam mais ou menos da mesma forma. Ou seja as autoridades das aldeias reuniam com a população e cada família tinha de dar uns tantos dias por semana de trabalho ou aqueles que tinham mais possibilidades forneciam animais, carros e até criados para transportar coisas.E nós também não ía-mos para lá obrigados e depois de mortos os nossos pais se quisessem cá o corpo para fazer o funeral tinham de pagar cerca de 15 contos, pelo menos até 68 foi assim.Diziam eles que aquilo era nosso mas eu nunca tive lá nada.

Manuel Carvalho

Anónimo disse...

Caro amigo Luis,

A tropa em geral, sobretudo no consulado do Gen. Spinola, cumpria e era correcta nas suas relações com as populações onde estavam estacionadas e não só. Temos que saber separar a tropa (que foi obrigada a fazer a guerra) e a administração colonial que era do sistema e funcionava em conformidade. Eu tenho sérias dúvidas sobre os pagamentos feitos as populações recrutadas para trabalhos obrigatórios.

O mais provável é que sériam requisições, como refere o Valdemar Silva (O Régulo de Gabu), cuja opinião é ainda reforçada pelas observações do Manuel Carvalho. Pois o regime do estado novo era o mesmo em toda a parte e a sua mesquinhez também, obviamente.

O Luis pagava as galinhas porque não tinha espirito colonialista, senão era só requisitar as autoridades gentílicas que terias o suficiente para um banquete durante a semana, como faziam muitos.

Abraços

Cherno Baldé

Manuel Luís Lomba disse...

No tempo dos pré-Portugueses, o exército ocupante romano construía estradas para serventia militar (a via Antonino, etc.) e aplicava às populações servidas o ónus anual da "geira" - dois dias de trabalho gracioso, como cantoneiros, pela sua conservação.
Em 1965 e 1966 desempenhei-me um ano como "patrão" da APSICO em Buruntuma e pagava a capinadores, carregadores etc o mesmo pré dos soldados, na base de 430 pesos/mês, abonados pelo Exército.

Manuel Luís Lomba

Tabanca Grande Luís Graça disse...

16 DE MAIO DE 2013
Guiné 63/74 - P11575: Op Lança Afiada (Setor L1, Bambadinca, 8 a 19 de Março de 1969): I Parte: Cerca de 1300 efetivos: 36 oficiais, 71 sargentos, 699 praças, 106 milícias e 379 carregadores


Só esta operação, de 11 dias, em que se bateu todo o triângulo Bambadinca - Xime - Xitole, expulsando da margem direita do Rio Corubal o PAIGC e as populações sob o seu controlo (calculadas na época em 5 mil, entre balantas e biafadas), envolveu 375 carregadores.. Se eles fossem pagos a 15 pesos por dia, o exército terá desembolsado cerca de 60 mil pesos (60 contos), o que não era nada em termos de custo da máquina de guerra não era nada: um helicóptero custava só a módica quantia de 15 contos por hora, mais que ganhavam, por mês, dois alferes...

Esta operação,tal como a primeira Op Cabeça Rapada, foi em março de 1969, e eu só cheguei à Guiné em finais de maio de 1969... Mas nunca mais, no meu tempo e no setor L1 (Bambadinca), se realizaram operações com esta envergadura e sobretudo duração... O conceito foi abandonado e, por outro lado, em nome da política da "Guiné Melhor", Spínola reprimiu muitos dos abusos ainda em vigor, quer da administração, quer da PIDE, quer do exército...

Faltam-nos testemunhos dos nossos 1ºs sargentos, encarregues da "contabilidade criativa" das nossas companhias... Eles é que podiam "abrir o livro"... Não me parecem que o tenham feito nem queiram fazer... Muitos deles já morreram... Eram todos mais velhos do que nós uns 15 anos...

De qualquer modo, suspeito que havia indícios da persistência do "trabalho forçado ou obrigatório" no 1º ano do consulado do Spínola, época em que se realizaram operações, mobilizando grande quantidade de civis como capinadores ou carregadores: caso da Op Cabeça Rapada I, II, III e IV e Op Lança Afiada...

Quanto ao PAIGC, foi useiro e vezeiro no recurso ao "trabalho forçado ou obrigatório": a população sobre a bandeira do PAIGC não só alimentava a guerrilha (trabalhando nas bolanhas...) como fazia o transporte de armas, equipamentos e mantimentos... É uma assunto pouco falado... Fica aqui o desafio ao Jorge Araújo, o nosso especialista da "guerra do outro lado"...

Tabanca Grande Luís Graça disse...

E os meus da CCAÇ 12, a quem tu deste a recruta, também alinhavam pelo mesmo diapasão... Trabalho de pá e pica era indigno de um guerreiro fula...

Infelizmente, a alguns dos nossos oficiais superiores faltava-lhes a inteligência emocional que é um requisito fundamental da liderança...

O meu amigo Renato Monteiro, com quem convivi, em Contuboel, um mês e dezoito dias era (é) um grande ser humano...

Valdemar, quanto a seres promovido, pelo Cherno Baldé, a régulo do Gabu, mesmo que simbolicamente (e sem as competentes prerrogativas...) considera isso uma honra. O nosso irmãozinho Cherno é um homem de inteligência superior, dotado de grande sensibilidade sociocultural, que era outra coisa que também faltava a alguns dos nossos comandos de batalhão...