
Caros amigos: É com enorme dor que vos escrevo para comunicar o falecimento do meu querido avô, Zé Neto. Ainda não sei grandes pormenores, pois soube ontem por volta das 23.45h e a minha mãe foi de seguida para casa da minha avó e passou lá a noite. Não sei se me será possível comunicar-vos via e-mail outros detalhes como o velório e funeral, sendo assim deixo-vos o meu contacto telefónico que estará à vossa inteira disposição: 937317762.Um abraço, Leonor.
2. Mensagem do editor do blogue (que acaba de circular pela nossa tertúlia, por e-mail):
Amigos e camaradas:
O camarada Zé Neto faleceu esta noite, no Hospital Militar. Enfrentou com coragem este difícil período da sua vida mas perdeu a sua última batalha, a mais terrível de todos que enfrentou, a batalha contra o cancro do pulmão... A sua neta, Leonor, deu-me a notícía, a mim e a mais alguns camaradas, logo de manhã... Ela tem 17 anos e está desolada... Tinha uma belíssima relação com o avô. Mas aos 17 anos é difícil perceber e aceitar a morte de um ente querido.
Façamos um minuto de silêncio à memória do primeiro membro da nossa tertúlia que nos deixa, pelas leis imperativas da vida. O Zé era o nosso patriarca. Estive com ele apenas uma vez, na minha escola. Almoçámos juntos, eu, o Nuno Rubim e o Pepito (O PIpo, como ele carinhosamente o chamava). De resto, contactámos-nos durante um ano por e-amail e por telefone. A Guiné aproximou-nos e tornou-nos amigos...
E o seu contributo, em termos de blogue, foi reconhecidamente importante para o trabalho de reconstituição da memória de Guileje que está a ser feito pelo Pepito, pelo Nuno Rubim e por outros camaradas, também com a nossa participação. Os seus escritos e as fotos começaram por dar visibilidade a Guileje. Ele também tinha muito apreço pelo Pepito e pelo projecto de Guileje. É também uma notícia triste, esta, para os nossos amigos da Guiné-Bissau.
Em jeito de pequena homenagem, irei republicar as suas memórias de Guileje, originamente publicadas na anterior versão, menos amigável, do nosso blogue, entre 10 de Janeiro e 25 de Fevereiro de 2006 (num total de 10 posts) (1)... Vou aproveitar para divulgar mais fotos do seu álbum de Guileje, a partir dos seus slides (graças às diligências do nosso Albano Costa, foi melhorada a qualidade destas fotos, que inicialmente ficaram muito azuladas).
O Zé era um homem que se integrava muito bem, no seio das comunidades em que vivia. E Guileje foi um exemplo disso: ele também achava que havia mais vida para além da tropa, da burocracia e da guerra... Era, além disso, um homem com grande sentido de humor, com sentido de justiça e com coragem, física e moral...
Como muitos homens da sua geração e da sua classe socioprofissional, fumava muito... Não sei quantas comissões de serviço terá feito no Ultramar... Sei que esteve em Macau, de que falava com saudade...
- Então, Zé, como vai isso ?
- Olha, entregue aos médicos, que agora me querem tirar um pulmão... Estão aqui reunidos em junta médica...
- Tu és forte e ainda vais vencer essa batalha.
- Eu quero é viver, mesmo com um pulmão a menos...
- Pois...
- Sabes, fui estúpido...Quando era novo, vendia saúde... Lembras-me da minha fotografia no Saltinho ? Eu era um atleta... Mas cheguei a fumar cinco maços!... A gente pensa que a doença só acontece aos outros... – rematava ele, sem mágoa, com lucidez, com coragem, e ainda com esperança.
Grande Zé, até sempre! Privei pouco tempo contigo, mas gostei de te conhecer. Vamos ter saudades tuas. Mas não te esqueceremos, na blogosfera e fora dela... Tens uma neta fantástica que vai pôr em ordem os teus escritos e cultivar a tua memória.
Luís Graça & Camararadas da Guiné
PS – Leonor: Um beijinho muito grande dos camaradas do teu querido avô. Um abraço também para o teu primo Afonso. Tens o nosso blogue para escrever, se te apetecer. Ou para publicar outras coisas do teu avô... Tu podes continuar a representá-lo, na nossa tertúlia, colmatando de algum modo o tremendo e difícil vazio que fica sempre com a morte de alguém que nos é querido... Dá também um beijinho nosso à tua mãe, e às tuas duas tias, bem como à tua avó que muito sofreu nestes últimos quatro meses...
Com os melhores cumprimentos, Leonor Neto.
Guiné > Região de Tombali > Guileje > CART 1613 (1967/68) > O 2º sargento Neto, que fazia as funções de 1º sargento da companhia, fotogrado junto a um abrigo e à viatura blindada Fox.
Foto: © Zé Neto / AD - Acção para o Desenvolvimento (2007). Direitos reservados .
4. Resposta à Leonor, por e-mail de 14 de Maio último:
Leonor: O seu avô é o mais velho de todos nós, membros desta caserna virtual, tertúlia ou tabanca grande, como queira... Formamos um grupo de amigos e camaradas que hoje já são, também, velhos amigos e conhecidos...
Guiné > Região de Tombali > Guileje > CART 1613 (1967/68) > O Zé Neto fotografado entre os putos da tabanca.
Foto: © Zé Neto / AD - Acção para o Desenvolvimento (2007). Direitos reservados .
Todos apreciámos, muito, o contributo do seu avô para a preservação da memória de Guileje... Publicámos o seu diário, divertimo-nos com os seus apontamentos bem humorados sobre as misérias e grandezas dos seus camaradas de armas, admirámos a sua frontalidade, invejámos a sua juventude de espírito... Com os melhores cumprimentos, Leonor Neto.
Falo do passado, por que ele há meses que já não escreve para o blogue... Conheci-o depois, pessoalmente. Teve a gentileza de visitar-me ao meu local de trabalho, no verão passado, juntamente com o coronel Nuno Rubim e o Eng. Carlos Schwarz (Pepito), todos irmanados no mesmo entusiasmo, o Projecto Guileje.
E de vez em quando eu telefonava-lhe. Apoiei-o bastante quando decidiu deixar de fumar... Infelizmente demasiado tarde. Aqui ficam alguns excertos de mensagens que trocámos (em dois deles, fala dos netos com ternura, incluindo a Leonor). A última vez que lhe falei disse:
- Zé, travaste muitas batalhas, não serás desta que te vais deixar ir abaixo...
Senti-o bem agarrado à vida... Quero ver se o visito no Hospital Militar... Infelizmente esta semana vou estar fora, na Madeira, em trabalho... Leonor: Vá estando em contacto comigo/connosco...
Um beijinho grande para si, força para a sua mãe, tias, avó e primos. Luís Graça
5. Excertos de e-mails do e para o Zé Neto (selecção de L.G.)
Zé Neto > 8/1/06 > Memórias de Guilege >
Foto: © Zé Neto / AD - Acção para o Desenvolvimento (2007). Direitos reservados .
Todos apreciámos, muito, o contributo do seu avô para a preservação da memória de Guileje... Publicámos o seu diário, divertimo-nos com os seus apontamentos bem humorados sobre as misérias e grandezas dos seus camaradas de armas, admirámos a sua frontalidade, invejámos a sua juventude de espírito... Com os melhores cumprimentos, Leonor Neto.
Falo do passado, por que ele há meses que já não escreve para o blogue... Conheci-o depois, pessoalmente. Teve a gentileza de visitar-me ao meu local de trabalho, no verão passado, juntamente com o coronel Nuno Rubim e o Eng. Carlos Schwarz (Pepito), todos irmanados no mesmo entusiasmo, o Projecto Guileje.
E de vez em quando eu telefonava-lhe. Apoiei-o bastante quando decidiu deixar de fumar... Infelizmente demasiado tarde. Aqui ficam alguns excertos de mensagens que trocámos (em dois deles, fala dos netos com ternura, incluindo a Leonor). A última vez que lhe falei disse:
- Zé, travaste muitas batalhas, não serás desta que te vais deixar ir abaixo...
Senti-o bem agarrado à vida... Quero ver se o visito no Hospital Militar... Infelizmente esta semana vou estar fora, na Madeira, em trabalho... Leonor: Vá estando em contacto comigo/connosco...
Um beijinho grande para si, força para a sua mãe, tias, avó e primos. Luís Graça
5. Excertos de e-mails do e para o Zé Neto (selecção de L.G.)
Zé Neto > 8/1/06 > Memórias de Guilege >
"Meu caro Luis: Depois de muito meditar cheguei à conclusão de que, pelo menos tu, mereces a minha confiança para partillhar contigo uma parte muito significativa das memórias da minha vida militar.
"São trinta e três páginas retiradas (e ampliadas) das 265 que fui escrevendo ao correr da pena para responder a milhentas perguntas que o meu neto Afonso, um jovem de 17 anos, que pensava que o avô materno andou em África só a matar pretos enquanto que o paterno, médico branco de Angola, matava leões sentado numa esplanada de Nova Lisboa (Huambo). Coisas de família...
"Já cedi este modesto trabalho à AD do Pepito e conto não o fazer mais, por enquanto. É, como já te disse, uma perspectiva um tanto diferente dos relatos do blogue, mas é assim que sei contar as minhas angústias e sucessos. Diz qualquer coisa. Até breve. Um abraço do patriarca Zé Neto”.
Foto: © Zé Neto / AD - Acção para o Desenvolvimento (2007). Direitos reservados .
Luís Graça > 8/1/06 > Memórias de Guilege >
“Já recebi o teu texto, acabo de fazer uma primeira leitura em diagonal, fiquei entusiasmo... Peço autorização de divulgá-lo no nosso blogue para que os meus netos, quando os tiver, também possam ter o privilégio, como os teus, de conhecer o grande homem e militar que tu és, bem como as misérias e as grandezas dos tugas e dos turras em terras da Gioné...
"É um magnífico documento que deves partilhar com os teus ex-camaradas e amigos da Guiné... Dás-me autorização para publicar isto, em quatro ou cinco partes ? Um grande abraço. Luís”.
Zé Neto > 9/1/06 > Memórias de Guilege
“Meu caro Luis: Concordo com a tua sugestão. Não quero ofender o homenzinho Santana. Mesmo se tiveres de fazer arranjos, confio na tua técnica avançada para a coisa sair decente. Avança !!!
“Acabei de ler a odisseia do Pepito a contar-nos as prepotências dos novos sobas de S. Domingos. O Pepito, com quem conversei demoradamente quando fomos apresentados pelo seu colega, conterrâneo e condiscípulo Estácio, tem um espírito puro de mais para enfrentar os viciados que nós, portugueses, lá deixamos, infelizmente. Isto a brincar... Aos ingénuos africanos basta pendurar-lhes no peito e nos ombros uns emblemas dourados, bem polidos, para termos um ditador em potência. Era a nossa técnica!
“Vou a seguir consolar o nosso Pepito. Até breve. Zé Neto”.
Luís Graça > 10/1/06 > Memórias de Guileje >
“Zé, obrigado, pela tua confiança em mim... Vou fazer o melhor que sei, fica descansado, que vais ficar bem na fotografia...
"Quanto à Guiné-Bissau e o que lá se passa hoje: não devemos interferir nos assuntos internos dos guineenses, mas também não podemos deixar passar em claro tudo o que tiver a ver com violação de direitos e garantias dos cidadãos... A Guiné-Bissau vai conquistar o deu direito a ser um país respeitado no concerto das Nações, mas para isso o Estado, o poder político, vai ter que garantir o respeito pelos direitos humanos dos guineenses... Este assunto ultrapassa a esfera do nosso blogue: se nos pusermnos a discutir política (a nossa e a dos outros...), a tertúlia desfaz-se... O que não quer dizer que não possamos exercer alguma influência, individualmente, como cidadãos e amigos da Guiné. Um abraço. Luís”.
Zé Neto > 12/1/06 > As malditas formigas pretas do José Teixeira >
“Luis: A minha intenção era ficar aqui caladinho no meu canto para não entupir a formidável sequência de factos das campanhas da Guiné. (Creio que estamos a construir um monumento histórico e inédito). Mas o José Teixeira tem o condão de me despertar recordações dispersas, pois fala de sítios por onde andei. Admiro-o muito” (…).
Zé Neto > 10/1/06 > Envio de foto >
“Luís: Falaste em eu não ficar mal na fotografia e lembrei-me que ainda nbinguém, no blogue, conhece a minha cara. Do tempo da Guiné não tenho, por enquanto, porque, como já disse, estão todas em Leiria [ na Escola Supetrior de Educação de Leiria,]para digitalizar. Das recentes tenho para aqui umas, mais engravatado, menos retocado, mas escolhi esta que é mais retrato do que foto que a minha neta Leonor captou e usa no ecrã do telelé. Guarda aí até virem as outras. Um abraço do Zé Neto”
Luís > 10/1/06 > Envio de foto >
“Zé: Estás todo janota... Já percebi que és um sortudo, tens uns netos amorosos... Comecei hoje a publicar as tuas memórias de Guileje (eu escrevo Guileje e não Guilege, como tu, ou Guiledje, como o Pepito; Guileje de acordo com a grafia usada pelos Serviços Cartográficos do Exército” (...).
Zé Neto > 14/1/06 > Gato escondido com o rabo de fora >
“Luís: Estive agora a ver a segunda parte das minhas memórias de Guilege e... falhou o nosso compromisso. Estava combinado que não apareceria o nome do Santana, mas sim S., porém deixaste escapar a verdade no parágrafo : O Santana lá foi vendendo uns quilos de de farinha... Emenda lá isso por favor. Um abraço do Zé Neto”.
Foto: © Zé Neto / AD - Acção para o Desenvolvimento (2007). Direitos reservados .
Zé Neto > 14/2/06 > Notícias >
“Meu caro Luís: Amanhã às 10h00 vou estar com o Pepito no Instituto Marquês Valle Flôr, Rua de S. Nicolau, 105, para uma sessão de trabalho com o arquitecto que está a colaborar na reconstituição do Quartel e Tabanca de Guileje. Entretanto espero combinar com o Pepito um encontro entre nós os três, ou quatro, ou cinco. Quem aparecer é benvindo.
“Estou a gostar da tua inserção dos meus slides no blogue. E a propósito vou meter uma cunha para meteres a minha lavadeira, Maria (não é o nome dela, mas eu baptizava todas as minhas lavadeiras com este nome por comodidade de comunicação e elas gostavam. A de Colibuia já não queria ser tratada de outra maneira). A Maria de Guileje é a que está rigorosamente vestida com trajo local e com um guarda-sol verde que eu lhe ofereci. Pode ser? Um abração e até breve. Zé Neto”
Zé Neto > 10/4/06 > Mudança de e-mail >
"Luís: O meu Endereço mudou porque passei para a Clix o mês passado. Julgava que tinhas recebido a mensagem que enviei a todos os meus correspondentes. Falhou... Mas não foi só a tua. Ando muito chocho com a falta dos cigarros e não tenho cabeça para nada. Mas hei-de conseguir!!! Um abraço do Zé Neto".
Zé Neto > 11/4/06 > Apelo do Pipo >
“Por agora é tudo, não esquecendo o meu agradecimento pelas muitas mensagens de força Zé, resiste ao cigarro que tu, Luis, desencadeaste na malta do blogue. Abraça-vos o velho Zé Neto”.
Zé Neto > 22/5/06 > Gandembel >
“Meu caro Luís: Não. Não desapareci. Apenas hibernei para vencer o tabágico vício. E estou a conseguir. Vou a caminho do quarto mês sem cigarro. Mas o assunto é a chegada do Idálio Reis ao blogue” (...).
_________
Notas de L.G.:
(1) Vd. posts de:
10 de Janeiro de 2006 > Guiné 63/74 - CDXXXVII: Memórias de Guileje (1967/68) (Zé Neto) (1): Prelúdio(s)
13 de Janeiro de 2006 > Guiné 63/74 - CDXLVII: Memórias de Guileje (1967/68) (Zé Neto) (2): Ordem de marcha
21 de Janeiro de 2006 > Guiné 63/74 - CDLXVII: Memórias de Guileje (1967/68) (Zé Neto) (3): Dauda, o Viegas
23 de Janeiro de 2006 > Guiné 63/74 - CDLXXIII: Memórias de Guileje (1967/68) (Zé Neto)(4): os azares dos sargentos
3 de Fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - CDXCVII: Memórias de Guileje (1967/68) (Zé Neto)(5): ecumenismo e festa do fanado
8 de Fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - DVII: Memórias de Guileje (1967/68) (Zé Neto)(6): dos Lordes e das bestas
11 de Fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - DXXI: Memórias de Guileje (Zé Neto, 1967/68) (7): Francesinho e Cavaco, o belo e o monstro
14 de Fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - DXXXIV: Memórias de Guileje (1967/68) (Zé Neto) (8): Gazela com chouriço à moda do Celestino
16 de Fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - DXLIV: Memórias de Guileje (1967/68) (Zé Neto) (9): a Operação Bola de Fogo
25 de Fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - DLXXXV: Memórias de Guileje (1967/68) (Zé Neto) (Fim): o descanso em Buba
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