Blogue coletivo, criado por Luís Graça. Objetivo: ajudar os antigos combatentes a reconstituir o "puzzle" da memória da guerra colonial/guerra do ultramar (e da Guiné, em particular). Iniciado em 2004, é a maior rede social na Net, em português, centrada na experiência pessoal de uma guerra. Como camaradas que são, tratam-se por tu, e gostam de dizer: "O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande". Coeditores: C. Vinhal, E. Magalhães Ribeiro, V. Briote, J. Araújo.
quarta-feira, 22 de fevereiro de 2017
Guiné 61/74 - P17074: Consultório militar do José Martins (20): Pelotão de Reconhecimento AML/Panhard 1106 (Guiné, 1966/68)
1. Em mensagem do dia 3 de Fevereiro de 2017, o nosso camarada José Marcelino Martins (ex-Fur Mil Trms da CCAÇ 5, Gatos Pretos, Canjadude, 1968/70), responde a mais uma solicitação ao seu consultório militar, a propósito da busca de elementos sobre o malogrado Soldado Atirador Explorador António Dias Simão, por parte da sua sobrinha Cristina Carvalho, conforme a mensagem que se publica:
Data 2 de Fevereiro de 2017
Assunto: Combatentes da Guiné
Saudações cordiais.
Estou neste momento a tentar fazer um memorial acerca do meu tio António Dias Simão que morreu na Guiné em 15 de janeiro de 1967.
Se puderem ajudar-me com algumas informações ficaria muito grata. Da família já só vive a minha mãe, irmã mais nova dele e as recordações são poucas para além de algumas fotos.
Não queria que o nome do meu tio caísse no esquecimento e por isso vou tentar escrever um pequeno livro.
Grata pela atenção
Maria Cristina Pereira
____________
Nota do editor
Último poste da série de 5 de setembro de 2016 > Guiné 63/74 - P16451: Consultório militar do José Martins (19): Notícia da criação da "Agência de Leiria" da Liga dos Combatentes da Grande Guerra, em 12 de abril de 1924, sendo seu presidente o cor inf Francisco de Lacerda e Oliveira, comandante do RI 7
Guiné 61/74 - P17073: Álbum fotográfico de Luís Mourato Oliveira, ex-alf mil, CCAÇ 4740 (Cufar, dez 72 / jul 73) e Pel Caç Nat 52 (Mato Cão e Missirá, jul 73 /ago 74) (12): Bambadinca (a "cova do lagarto", em mandinga) e algumas das suas gentes
Foto nº 1 > Tabanca mandinga
Foto nº 2 > Na messe de Bambadinca, o Luís Oliveira, à direita, fardado
Foto nº 3 > Na ação psicossocial, ou "psico", simplesmente
Foto nº 4 > Ferreiro
Foto nº 4 A> As ferramentas do ferreiro
Foto nº 5 > Ajudante de ferreiro
Foto nº 5 A > A forja
Guiné > Zona leste > Região de Bafatá > Setor L1 > Bambadinca > c. 1973/74 > Fotos várias
Fotos (e legenda): © Luís Mourato Oliveira (2016). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné].
1. Continuação da publicação do extenso e valioso álbum fotográfico do Luís Mourato Oliveira, nosso grã-tabanqueiro, que foi alf mil da CCAÇ 4740 (Cufar, 1972/73) e do Pel Caç Nat 52 (Mato Cão e Missirá, 1973/74). (*)
Foi o último comandante do Pel Caç Nat 52. Irá terminar a sua comissão em Missirá, depois de Mato Cão, e extinguir o pelotão em agosto de 1974.
Foi o último comandante do Pel Caç Nat 52. Irá terminar a sua comissão em Missirá, depois de Mato Cão, e extinguir o pelotão em agosto de 1974.
De vez em quando ia a Bambadinca, sede do setor L1, Para isso tinha de cambar o Rio Geba. Levava sempre a sua máquina fotográfica.
_________________
_________________
Nota do editor:
(*) Último poste da série > 21 de fevereiro de 2017 > Guiné 61/74 - P17068: Álbum fotográfico de Luís Mourato Oliveira, ex-alf mil, CCAÇ 4740 (Cufar, dez 72 / jul 73) e Pel Caç Nat 52 (Mato Cão e Missirá, jul 73 /ago 74) (11): Bambadinca, o porto fluvial, onde atracavam os heróicos e lendários "barcos turras"Guiné 61/74 - P17072: Os nossos seres, saberes e lazeres (200): Central London, em viagem low-cost (2) (Mário Beja Santos)
1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70) com data de 17 de Outubro de 2016:
Queridos amigos,
O viandante sente a alma libertária, Londres está com bom tempo e alguns dos melhores museus do mundo podem acolhê-lo a custo zero. Escreveu na lista: Tate Britain, Tate Modern, Museu Alberto e Victória, Museu Britânico, National Gallery, National Portrait Gallery, Wallace Collection, Royal Academy of Arts... Impossível dar vazão a tantos empreendimentos.
Seja o que Deus quiser, começa o passeio de Old Street para Liverpool de Street Station, compra de um passe para o centro. Aqui, houve hesitações e depois decisões categóricas. Voltar à National Gallery e seguir os princípios de José Saramago: ver de manhã o que já se viu à tarde, assombrar-se com os Girassóis de Van Gogh, cumprimentar Miguel Ângelo, e por aí fora. Foi um dia e peras, até deu para comer Fish and Chips e à noite salsichas Cumberland, puré de batata e legumes com uma boa cerveja.
Amanhã vou para o mundo das guerras, daquelas que trucidaram milhões, em trincheiras, desembarques e batalhas.
Um abraço do
Mário
Central London, em viagem low-cost (2)
Beja Santos
A National Gallery é sinónimo de pintura, ninguém que goste de arte pode fugir a este poderoso espaço onde nos aguardam obras, entre outros, de Botticelli, Leonardo, Rafael, Bruegel, Michelangelo, Rembrandt, Velázquez, Cézanne, Goya, Turner e Van Gogh. A entrada é sumptuosa e tem história, o que estamos a ver era a entrada de um palácio concebido por Jorge IV, que delapidou uma fortuna em construções e obras de arte. O Parlamento secou-lhe a teta, ficou esta entrada, e depois surgiu o projeto da Galeria Nacional, uma das mais ricas do mundo.
O chão da entrada é uma obra de arte. Estão aqui os famosos mosaicos de Boris Anrep (1885-1969) que nasceu na Rússia mas deixou o seu trabalho em Inglaterra. Nos anos 1920 começou a trabalhar na Tate Gallery e depois veio para a National Gallery onde durante décadas foi compondo uma série de trabalhos que desafiam a imaginação: encontramos musas e outros temas clássicos, em que Virginia Wolf é Clio, Greta Garbo aparece como a musa da tragédia. O viajante está pronto a regressar só para aqui passar calmamente uns bons pares de horas a deleitar-se com este génio do mosaico. Não se esqueçam de ver atentamente Churchill a enfrentar o monstro, já sabem quem.
Depois da pintura segue-se o retrato em diferentes formas no museu ao lado, a National Portrait Gallery, há aqui retratos de tudo e de todos do Reino Unido: os Tudor, os Stuart, o século XVIII em peso, os vitorianos, muita profusão do século XX. Andava o viandante a deliciar-se com escultura e pintura dos contemporâneos quando encontrou o busto de um escritor a todos os títulos famoso, John Buchan (1875-1940), é o autor de uma prodigiosa história de espionagem "Os 39 Degraus" que Hitchcock passou a cinema em 1935. Acontece que o viajante levava consigo uma destas edições para aprendizes de inglês, ele fala um inglês de sobrevivência e nestas viagens tem a manifesta ilusão de que está mais protegido quando lê romances condensados e num inglês facilitado. O importante foi a coincidência. Olha John Buchan, obrigado pela boa companhia que me dás!
Em frente à National Portrait Gallery temos St Martin-in-the-Fields, é um lugar de culto e um santuário da música, entra-se gratuitamente para visitar o templo e pode dar-se a circunstância da assistir a um ensaio-geral, e foi isso que aconteceu, o viandante descansava as pernas, contemplava a cúpula da igreja, ouvia Hendel, Pergolesi e Vivaldi. Em low-cost mais é impossível.
Esta é a fachada do famoso Coliseu, noite de estreia de ópera. Benevolentes, os empregados deixaram entrar o viandante enquanto saíam de carros luxuosos a clientela da estreia. Entrada sumptuosa, temos aqui um dos indicadores da Londres feérica.
Estamos agora no segundo dia, o viandante vai para a outra margem do Tamisa, para Barbican, é aqui que se situa o Imperial War Museum, casa impressionante. Anos atrás, o viandante apanhou uma exposição sobre a I Guerra Mundial, ficou paralisado a ler cartas de militares aos seus familiares, cartas que foram as últimas comunicações de quem em breve morreria nas trincheiras ou fora delas. Aqui encontrou substância para um trecho que faz parte de um dos seus trabalhos A mulher grande. Vamos adiante. Sai-se do metro e como é habitual anda-se uns quilómetros até chegar ao destino. Eis se não quando se dá de frente com um dos mais míticos teatros do mundo, o Old Vic. Para quem gosta de teatro, estamos em Roma, em Meca ou no Ganges, nesta casa representaram figuras lendárias e neste momento Glenda Jackson faz de Rei Lear. Vamos adiante.
Ameaça chuva pelo que à cautela se fotografa a opulenta fachada com canhões de meter medo. O viandante sabe o que lhe espera: aviões, bombas voadoras, carros de combate, cenas estarrecedoras de guerra. Neste momento em que acaba de fotografar a fachada a que se seguirá um café servido num quiosque por uma brasileira de Campinas, ele ainda não sabe que lá dentro o espera uma fotografia que lhe lembrará, como ferrete em brasa, os seus tempos de combatente.
Lá chegaremos.
(Continua)
____________
Nota do editor
Último poste da série de 18 de fevereiro de 2017 Guiné 61/74 - P17058: Os nossos seres, saberes e lazeres (199): Central London, em viagem low-cost (1) (Mário Beja Santos)
Guiné 61/74 - P17071: O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande (108): O reencontro, através do nosso blogue, de dois camaradas da Polícia Aérea, BA 12, Bissalanca, 1972/74: os ex-alf mil Francisco Feijão de Oliveira, nosso próximo grã-tabanqueiro, e o nosso grã-tabanqueiro Eduardo Jorge Ferreira
1. Mensagem do nosso leitor e camarada Francisco Feijão de Oliveira, com data de 20 do corrente:
Meus Caros
Estive na Guiné de 1972 a 1974 na Base Aérea n.º 12, como Alferes Miliciano.
Que devo fazer para pertencer à vossa Tabanca?
Abraço
Francisco Feijão
2. Resposta dos nossos editores:
Olá, Francisco: é muito simples, mandas duas fotos, uma do teu tempo de tropa ou de guerra, e outra atual, além de uma pequena apresentação da tua pessoa, com um breve CV militar...
Se tiveres fotos e histórias para partilhar, melhor ainda... Somos já 736 camaradas e amigos ("paisanos", menos de 10%, sobretudo filhos e outros familiares de camaradas falecidos, malta da Guiné, investigadores...), dos quais 52 infelizmente já morreram, desde 2004, ano em que nasceu a Tabanca Grande... Também estamos no Facebook: Tabanca Grande
Do teu tempo da BA12, devemos conhecer ou lembrar-te de camaradas como os pilav Miguel Pessoa e António Martins de Matos ou o alf mil PA Eduardo Ferreira Jorge... Vou-lhes dar conhecimento... (Mas temos mais malta da Força Aérea, malta do BCP 12 e enfermeiras paraquedistas.)
Somos um blogue de partilha de memórias (e de afetos). Como camaradas que somos, tratamo-nos por tu... E costumamos reunir-nos todos os anos em Monte Real, na primavera... Este ano será a 29 de abril... Sê bem vindo à Tabanca Grande..
Um alfabravo do
Luís Graça
3. Resposta do Francisco Feijão:
Do Miguel lembro-me bem pelas razões, sobejamente conhecidas, da sua história na Guiné. Ao Eduardo conheço ainda melhor porque era meu comandante de pelotão na 1.ª Companhia da PA.
Vou arranjar as fotos e enviá-las com o tal descritivo da minha passagem pelas Forças Armadas..
Abraço
Francisco Feijã
4. Comentário do Eduardo Jorge Ferreira [ex-alf mil, Polícia Aérea, BA 12, Bissalanca, 1973/74, presidente da assembleia geral da Associação para a Memória da Batalha do Vimeiro]
Data: 21 de fevereiro de 2017 às 01:36
Assunto: Tabanca Grande
Boa noite aos dois - meu grande amigo Luís e meu antigo camarada e Comandante de Companhia (a 1ª) da PA da BA 12, Feijão de Oliveira.
Realmente, é bem verdade o que se afirma no blogue: "O mundo é pequeno e a ... nossa tabanca é grande"! Longe estava eu de dar de caras com o Feijão e ele aparece-me no meu mail graças ao Luís Graça.
Já desesperava de "encontrar" mais camaradas da BA12 do meu tempo pois além de alguns Especialistas (que também vou encontrando no respetivo blogue) só tenho mantido contacto (muito pouco, infelizmente) com o [Miguel] Pessoa, o Martins de Matos e a Giselda, frequentadores assíduos da Tabanca Grande e das suas atividades. Mas pilotos, eles, e a Giselda, enfermeira paraquedista muito pouco tempo lhes sobrava para conviver com os camaradas de outras especialidades.
Agora com o Feijão o caso é bem diferente pois partilhávamos os mesmos espaços e as mesmas preocupações no dia a dia, quase posso afirmar, na hora a hora. Nós, os 9 alferes milicianos da Esquadre de Defesa Terrestre da Base éramos bem unidos pese embora o facto de irmos em rendição individual (assim como todos os soldados, sargentos e demais oficiais) e termos frequentado incorporações diferentes. E daí regressarmos em datas diferentes sem contactos uns dos outros e por isso com muito poucas probabilidades de organizar encontros anuais como os camaradas dos outros ramos.
Foi com muita alegria que li o mail do Luís a dar as boas vindas ao novo - assim o espero - Grã-tabanqueiro Feijão de Oliveira! Também eu te dou as Boas vindas e espero com ansiedade o momento de nos reencontrarmos.
Por sinal visitei o Feijão, não sei se te recordas, uns breves anitos depois da vinda da Guiné, no seu/teu local de trabalho no Calhariz em Lisboa. E apenas reencontrei há meses, um camarada desse tempo, o Sérgio Vaz. Dos restantes nada mais sei.
Um grande abraço aos dois
Eduardo Jorge Ferreira
__________________
Meus Caros
Estive na Guiné de 1972 a 1974 na Base Aérea n.º 12, como Alferes Miliciano.
Que devo fazer para pertencer à vossa Tabanca?
Abraço
Francisco Feijão
2. Resposta dos nossos editores:
Olá, Francisco: é muito simples, mandas duas fotos, uma do teu tempo de tropa ou de guerra, e outra atual, além de uma pequena apresentação da tua pessoa, com um breve CV militar...
Se tiveres fotos e histórias para partilhar, melhor ainda... Somos já 736 camaradas e amigos ("paisanos", menos de 10%, sobretudo filhos e outros familiares de camaradas falecidos, malta da Guiné, investigadores...), dos quais 52 infelizmente já morreram, desde 2004, ano em que nasceu a Tabanca Grande... Também estamos no Facebook: Tabanca Grande
Do teu tempo da BA12, devemos conhecer ou lembrar-te de camaradas como os pilav Miguel Pessoa e António Martins de Matos ou o alf mil PA Eduardo Ferreira Jorge... Vou-lhes dar conhecimento... (Mas temos mais malta da Força Aérea, malta do BCP 12 e enfermeiras paraquedistas.)
Somos um blogue de partilha de memórias (e de afetos). Como camaradas que somos, tratamo-nos por tu... E costumamos reunir-nos todos os anos em Monte Real, na primavera... Este ano será a 29 de abril... Sê bem vindo à Tabanca Grande..
Um alfabravo do
Luís Graça
3. Resposta do Francisco Feijão:
Do Miguel lembro-me bem pelas razões, sobejamente conhecidas, da sua história na Guiné. Ao Eduardo conheço ainda melhor porque era meu comandante de pelotão na 1.ª Companhia da PA.
Vou arranjar as fotos e enviá-las com o tal descritivo da minha passagem pelas Forças Armadas..
Abraço
Francisco Feijã
4. Comentário do Eduardo Jorge Ferreira [ex-alf mil, Polícia Aérea, BA 12, Bissalanca, 1973/74, presidente da assembleia geral da Associação para a Memória da Batalha do Vimeiro]
Data: 21 de fevereiro de 2017 às 01:36
Assunto: Tabanca Grande
Boa noite aos dois - meu grande amigo Luís e meu antigo camarada e Comandante de Companhia (a 1ª) da PA da BA 12, Feijão de Oliveira.
Realmente, é bem verdade o que se afirma no blogue: "O mundo é pequeno e a ... nossa tabanca é grande"! Longe estava eu de dar de caras com o Feijão e ele aparece-me no meu mail graças ao Luís Graça.
Já desesperava de "encontrar" mais camaradas da BA12 do meu tempo pois além de alguns Especialistas (que também vou encontrando no respetivo blogue) só tenho mantido contacto (muito pouco, infelizmente) com o [Miguel] Pessoa, o Martins de Matos e a Giselda, frequentadores assíduos da Tabanca Grande e das suas atividades. Mas pilotos, eles, e a Giselda, enfermeira paraquedista muito pouco tempo lhes sobrava para conviver com os camaradas de outras especialidades.
Agora com o Feijão o caso é bem diferente pois partilhávamos os mesmos espaços e as mesmas preocupações no dia a dia, quase posso afirmar, na hora a hora. Nós, os 9 alferes milicianos da Esquadre de Defesa Terrestre da Base éramos bem unidos pese embora o facto de irmos em rendição individual (assim como todos os soldados, sargentos e demais oficiais) e termos frequentado incorporações diferentes. E daí regressarmos em datas diferentes sem contactos uns dos outros e por isso com muito poucas probabilidades de organizar encontros anuais como os camaradas dos outros ramos.
Foi com muita alegria que li o mail do Luís a dar as boas vindas ao novo - assim o espero - Grã-tabanqueiro Feijão de Oliveira! Também eu te dou as Boas vindas e espero com ansiedade o momento de nos reencontrarmos.
Por sinal visitei o Feijão, não sei se te recordas, uns breves anitos depois da vinda da Guiné, no seu/teu local de trabalho no Calhariz em Lisboa. E apenas reencontrei há meses, um camarada desse tempo, o Sérgio Vaz. Dos restantes nada mais sei.
Um grande abraço aos dois
Eduardo Jorge Ferreira
__________________
Nota do editor;
Último poste da série > 25 de novembro de 2016 > Guiné 63/74 - P16759: O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande (106): meninos do Xime: a Sene Sancó era minha prima porque a irmã mais nova da minha mãe era madrasta dela e a tia dela (irmã mais nova do pai dela) era minha madrasta (José Carlos Mussá Biai, engenheiro florestal, Lisboa)
Último poste da série > 25 de novembro de 2016 > Guiné 63/74 - P16759: O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande (106): meninos do Xime: a Sene Sancó era minha prima porque a irmã mais nova da minha mãe era madrasta dela e a tia dela (irmã mais nova do pai dela) era minha madrasta (José Carlos Mussá Biai, engenheiro florestal, Lisboa)
terça-feira, 21 de fevereiro de 2017
Guiné 61/74 - P17070: Convívios (778): XI Encontro dos Combatentes da Guerra do Ultramar do Concelho de Matosinhos, a realizar-se no próximo dia 11 de Março de 2017, em Leça da Palmeira (Carlos Vinhal)
XI CONVÍVIO DOS COMBATENTES DA GUERRA DO ULTRAMAR DO
CONCELHO DE MATOSINHOS
DIA 11 DE MARÇO DE 2017
LEÇA DA PALMEIRA
LEÇA DA PALMEIRA
O dia começará às 11 horas da manhã com uma Missa de Sufrágio, celebrada pelo senhor Padre Marcelino, na Capela do Ruas, pelos camaradas caídos em Campanha e pelos que regressados, ao longo do tempo nos foram deixando. Lembramos a propósito que em 2016 partiram os nossos saudosos amigos José Eduardo Alves e Manuel Castanheira.
Depois da foto de família começará o convívio com o almoço servido, às 13 horas no Tryp Expo Porto Hotel, o mesmo do ano passado, junto à Exponor, com o mesmo preço também, 20€.
Da ementa constarão:
Entradas variadas,
Sopa
Bacalhau com broa
Grelhada mista de carnes
Sobremesas variadas
Vinhos tintos e brancos, cerveja, água mineral e refrigerantes
Café
Bolo comemorativo e espumante
Durante a tarde haverá animação musical a cargo do Grupo Coral do Núcleo de Matosinhos da Liga dos Combatentes, assim como dos espontâneos que a isso se propuserem.
As inscrições estão já abertas, podendo ser feitas para:
Carlos Vinhal - 916 032 220
Ribeiro Agostinho - 969 023 731
email: combatentesdematosinhos@gmail.com
Chamamos a atenção para a lotação da sala, máximo 120 pessoas.
Camarada Combatente, traz outro camarada, traz a tua família!!!
Os organizadores
Abel Santos
Francisco Oliveira
Ribeiro Agostinho
Carlos Vinhal
____________
Nota do editor
Último poste da série de 20 de Fevereiro de 2017 > Guiné 61/74 - P17067: Convívios (777): Encontro do pessoal do BCAV 3846, a realizar-se no próximo dia 12 de Março em Ourém (Delfim Rodrigues)
Guiné 61/74 - P17069: Outras memórias da minha guerra (José Ferreira da Silva) (26): Sonhos em perigo
Furriéis da CART 1689 na Av. de Bissau, no final da comissão. Silva, Campos, Valente, Carvalho, Lopes, Miranda, Cepa, Borges e Faria.
1. O nosso camarada José Ferreira da Silva (ex-Fur Mil Op Esp da CART 1689/BART 1913, Fá, Catió, Cabedu, Gandembel e Canquelifá, 1967/69), em mensagem do dia 17 de Fevereiro de 2017 enviou-nos mais uma das suas outras memórias da guerra.
Outras memórias da minha guerra
25 - Sonhos em perigo
Aqueles pesadelos que nos atormentavam as noites, durante os primeiros meses, foram-se diluindo e amenizando à medida que o tempo ia passando. Pelo caminho, ficavam os intermináveis dias de sofrimento, carregados de angústia, de tristeza e de medo. Por melhores que fossem os camaradas e por maiores que fossem as bebedeiras, nada nos fazia esquecer os dias mais marcantes das nossas vidas.
Com a aproximação do fim da comissão acentuavam-se os anseios pela concretização dos nossos principais sonhos. Não havia dia nem hora em que não nos imaginássemos num outro mundo cheiinho de projectos, onde a felicidade é obrigatória. As habituais manifestações de lamento e de revolta deram lugar à vontade de cada um falar dos seus próximos projectos. Tudo coisas bem pensadas e aparentemente de fácil resolução. Paralelamente, íamos antegozando a alegria do regresso, recuperando, desta forma, a alegria de viver que nos fora roubada.
Foi a 3 de Dezembro de 1968 que a nossa CART 1689 iniciou o seu percurso do ansiado regresso. Ficámos em Bambadinca e no dia 5 dali seguiram para Bissau mais de 2/3 dos nossos camaradas. Eu e os restantes, ficámos ali à espera de novo transporte fluvial até ao dia 9.
Embora o ambiente fosse de paz e de relaxamento, nós, os que ficámos em terra, sentimos algum refreamento na alegria que vínhamos vivendo e muita angústia nos dias seguintes. E, tal como acontecera nos dias anteriores a 1 de Maio de 1967, quando outros militares esperavam no cais pela chegada do “seu” barco, lá estávamos nós na situação invertida, olhando de manhã à noite, para o horizonte do Rio Geba, a reclamar, ansiosamente, pela chegada do “nosso”.
Depois do jantar, não apetecia ir para a cama, nem havia sono que chegasse. Eram horas de espera em que a “sede” se acentuava.
Precisamente na véspera (dia 8), fui chamado por um Furriel (de serviço) da tropa local, para ajudar a resolver uma situação anormal, com possibilidade de consequências dramáticas. Sussurrou-se no bar que na casa do Comando, haviam visto uma senhora branca, curiosidade difícil de admitir pelos nossos militares, porque não as viam (mulheres brancas) há cerca de 20 meses.
O Areosa, já com um copito, exteriorizando um exagerado à vontade, não acatou o conselho/ordem/advertência do Furriel e, armado em conquistador, parou por ali e continuava a lançar piropos, à moda do norte e em voz alta. Fiquei preocupado com o seu comportamento, agravado com a desobediência e desrespeito ao Furriel. Puxei o Areosa e empurrei-o para que saísse dali. Claro que me devo ter excedido em linguagem para com o Areosa, mas teria que o libertar de uma provável participação do Furriel. Por outro lado, desta forma, assumi a responsabilidade da condenação de tal comportamento.
O Areosa, possivelmente ferido no seu orgulho, acabou por acelerar o passo e adiantar-se de mim. Ia a praguejar e, de repente, correu na direcção onde os nossos militares estavam acantonados com os seus haveres. Pegou numa G3, veio para o meio da rua, virou-se na minha direcção. Nunca esquecerei aquela imagem, iluminada pelo luar, mais parecendo uma cena de um duelo de “cowboys”, no Texas. Apontou-me a arma, em posição de tiro instintivo e gritou:
- Vou-te matar! Vais com o caralho!
Como não parei, ele repetiu o grito, ao mesmo tempo que puxou o gatilho. Não houve disparo porque não havia bala na câmara. Porém, quando ouvi o estalido, fiquei fora de controlo e avancei sobre ele, a murro e a pontapé. Valeu-lhe a malta que se envolveu a afastar-me.
Foi uma noite muito mal dormida, a última vivida no interior da Guiné. Massacravam-me a cabeça um montão de coisas. Podia ter sido atingido por um soldado do meu próprio grupo. Nós, que tivemos em comum tantas lutas contra o IN. E eu que estava convencido de que o Areosa era um dos militares mais dedicados.
Logo de manhã, apercebi-me da excitação dos militares. A barcaça já se avistava ao longe e ninguém parava naquele alegre frenesim. Apenas o Areosa estava parado. Estava à minha espera e, cabisbaixo, abeirou-se mais de mim:
- Ó Silva, estou aqui sem dormir. Quero pedir-lhe perdão pelo meu comportamento de ontem. Sabe que nunca tive nada contra si. Tem de me perdoar.
Eu não sabia que dizer, nem o que cobrar.
E ele continuou:
- Eu estava “alegre”, comecei a cantar e veio o caralho do Furriel gozar comigo. Fiquei ainda mais fodido quando chamou por si. Pensava que o Silva me ia defender e ainda ajudou à missa. Eu estava tão marado que nem vi que você me estava a safar. Sempre que bebo um copo a mais, faço merda.
Este dia 9 de Dezembro também foi muito marcante. As fortes emoções parecem ter sido abençoadas pela brisa refrescante que nos acariciava, cada vez mais, à medida que nos aproximávamos de Bissau. Até deu para relaxar e descansar na viagem.
Chegados a Bissau, foi o reencontro de toda a família da CART 1689. Parecia que já estávamos salvos. Foi, possivelmente, o dia mais alegre que lá sentimos. E eu fiquei duplamente feliz e grato porque o grupo dos Furriéis estava à minha espera para exteriorizar tanta alegria. Foi uma noite de arromba. Quase não se dormiu naquele quarto do Quartel-General, onde se meteram 8 camas (!), para ficarmos juntos até ao ansiado regresso. Um tanto contra a corrente de alegria, o nosso Primeiro Viscoso, com o seu permanente aspecto trombudo, continuava a procurar ensombrar a alegria dos outros, especialmente a dos Furriéis.
Logo de manhã, fomos convocados para uma reunião com o 2.º Comandante do Quartel-General. Fomos perdoados e compreendidos pelos excessos, mas avisados de que teríamos que respeitar o silêncio a partir da meia-noite. Foi o Viscoso quem fez a queixa. Havia-se aproveitado da ausência do Capitão da nossa CART e, ultrapassando os nossos Alferes, foi-se “armar” junto do Comando do QG.
Entre os serviços e as folgas, o tempo passava-se da melhor forma. Porém, o Primeiro Viscoso continuava atento e pronto para destilar o seu ódio aos milicianos, especialmente aos que não lhe falavam (que era o meu caso).
Faltavam menos de 15 dias para o regresso. Estava eu de serviço no QG e as orientações superiores eram que, numa Companhia de 150 militares, apenas um terço estava autorizada a sair do Quartel. Ordens são ordens, mas nem sempre se levavam à risca, especialmente em quartel de maior acalmia.
Ora, os soldados, mesmo sem dispensa, procuravam “desenfiar-se”. Por norma e lealdade, antes do “desenfianço”, cada um perguntava se podia sair. E eu só lhes dizia: Se acontecer alguma coisa, avisem logo, porque tenho que fazer o relatório das anomalias antes das 8H00 horas (hora do render da guarda). Era arriscado, mas, como estávamos nos últimos dias, sentia-me bem com a satisfação da “malta”.
- Aquele que vai ali não é o Tripeiro? - perguntava o 1.º Sargento ao Sargento que o acompanhava, ambos a passear na avenida do Pilão.
- É mesmo, respondeu-lhe.
- Ouve lá, ó Tripeiro, anda cá - chamou - Como é que andas cá fora, se estás detido, e sem qualquer dispensa?
- Sabe, é o Furriel Silva que está de serviço e com ele não há problema. É um gajo porreiro – confiou o Tripeiro.
- Ah, sim? Então quando é o Furriel Silva, é tudo à balda? – questionava de, fala amolecida, o Viscoso, que, para melhor tirar dele, aproveitou para lhe pagar uma cerveja no Bar Jagudi.
Era caso de admiração, porque o somítico, para não gastar um tostão, só bebia água del cano. Cerveja só se alguém lhe pagasse. E assim, estando no Bar a beber, também se mostrava à nossa tropa, a confraternizar!
- Silva, acorda que estás fodido. O detido, o Tripeiro, foi visto pelo Primeiro perto do Pilão – alertou-me, bastante aflito, o Campos.
Virei-me para o outro lado e, meio a dormir e meio acordado, devo ter-lhe respondido mais ou menos:
- Caga nisso, que eu cago no Primeiro.
Seriam cerca de 8h30 quando entraram no meu quarto o Machado e o Faria, e em tom muito sério, dispararam:
- Olha que o Primeiro esteve à espera para ver se apresentavas faltas até ao render da guarda. Agora está a fazer uma participação contra ti, por o Tripeiro andar a passear em Bissau. Já mandou chamar o Tripeiro para depor. E aquele gajo, que gosta tanto de ti, vai-te foder. Mexe-te rapidamente.
Vi num relance a gravidade da situação. Mas, que hei-de fazer? (questionava-me repetidamente). Tantas vezes debaixo de fogo, estava, afinal, numa outra situação perigosa. Tudo de mau me vinha à cabeça e por momentos fiquei paralisado. Qualquer processo naquela altura iria obrigar-me a ficar na Guiné, como tantos outros condenados, e precisamente no momento mais ansiado e carregado de projectos. Havia de aparecer aquele filho da mãe a lançar, mais uma vez, a peçonha, a sua inveja e a gozar com o sofrimento alheio.
Assaltou-me uma ideia. Dirigi-me rápido à caserna e vi que os soldados pareciam já estar à minha espera, adivinhando o que me ia na mente. Logo ali, à entrada, perguntei em voz alta:
- Atenção malta, Vocês viram ou não viram o Tripeiro, ontem, no recolher obrigatório?
A resposta surgiu unânime e categórica:
- Vimos! - Por acaso ele até estava mesmo à minha beira – respondeu logo em voz alta e firme o Cabo Felgueiras.
- Ok, era só isso. E afastei-me. (Por sinal o Cabo Felgueiras não tinha estado na formatura do recolher.)
Assim, o Viscoso não conseguiu testemunhas para promover o processo. E o próprio Tripeiro, chamado a depor, também negou tudo, incluindo a cerveja que tanto havia custado a esse nosso querido Primeiro-Sargento.
____________
Nota do editor
Último poste da série de 9 de agosto de 2016 > Guiné 63/74 - P16374: Outras memórias da minha guerra (José Ferreira da Silva) (25): Relatório de Operações do último almoço-convívio da CART 1689
1. O nosso camarada José Ferreira da Silva (ex-Fur Mil Op Esp da CART 1689/BART 1913, Fá, Catió, Cabedu, Gandembel e Canquelifá, 1967/69), em mensagem do dia 17 de Fevereiro de 2017 enviou-nos mais uma das suas outras memórias da guerra.
Outras memórias da minha guerra
25 - Sonhos em perigo
Aqueles pesadelos que nos atormentavam as noites, durante os primeiros meses, foram-se diluindo e amenizando à medida que o tempo ia passando. Pelo caminho, ficavam os intermináveis dias de sofrimento, carregados de angústia, de tristeza e de medo. Por melhores que fossem os camaradas e por maiores que fossem as bebedeiras, nada nos fazia esquecer os dias mais marcantes das nossas vidas.
Com a aproximação do fim da comissão acentuavam-se os anseios pela concretização dos nossos principais sonhos. Não havia dia nem hora em que não nos imaginássemos num outro mundo cheiinho de projectos, onde a felicidade é obrigatória. As habituais manifestações de lamento e de revolta deram lugar à vontade de cada um falar dos seus próximos projectos. Tudo coisas bem pensadas e aparentemente de fácil resolução. Paralelamente, íamos antegozando a alegria do regresso, recuperando, desta forma, a alegria de viver que nos fora roubada.
Foi a 3 de Dezembro de 1968 que a nossa CART 1689 iniciou o seu percurso do ansiado regresso. Ficámos em Bambadinca e no dia 5 dali seguiram para Bissau mais de 2/3 dos nossos camaradas. Eu e os restantes, ficámos ali à espera de novo transporte fluvial até ao dia 9.
Militares da CART 1689 na barcaça de transporte de Bambadinca para Bissau.
Embora o ambiente fosse de paz e de relaxamento, nós, os que ficámos em terra, sentimos algum refreamento na alegria que vínhamos vivendo e muita angústia nos dias seguintes. E, tal como acontecera nos dias anteriores a 1 de Maio de 1967, quando outros militares esperavam no cais pela chegada do “seu” barco, lá estávamos nós na situação invertida, olhando de manhã à noite, para o horizonte do Rio Geba, a reclamar, ansiosamente, pela chegada do “nosso”.
Depois do jantar, não apetecia ir para a cama, nem havia sono que chegasse. Eram horas de espera em que a “sede” se acentuava.
Precisamente na véspera (dia 8), fui chamado por um Furriel (de serviço) da tropa local, para ajudar a resolver uma situação anormal, com possibilidade de consequências dramáticas. Sussurrou-se no bar que na casa do Comando, haviam visto uma senhora branca, curiosidade difícil de admitir pelos nossos militares, porque não as viam (mulheres brancas) há cerca de 20 meses.
O Areosa, já com um copito, exteriorizando um exagerado à vontade, não acatou o conselho/ordem/advertência do Furriel e, armado em conquistador, parou por ali e continuava a lançar piropos, à moda do norte e em voz alta. Fiquei preocupado com o seu comportamento, agravado com a desobediência e desrespeito ao Furriel. Puxei o Areosa e empurrei-o para que saísse dali. Claro que me devo ter excedido em linguagem para com o Areosa, mas teria que o libertar de uma provável participação do Furriel. Por outro lado, desta forma, assumi a responsabilidade da condenação de tal comportamento.
O Areosa, possivelmente ferido no seu orgulho, acabou por acelerar o passo e adiantar-se de mim. Ia a praguejar e, de repente, correu na direcção onde os nossos militares estavam acantonados com os seus haveres. Pegou numa G3, veio para o meio da rua, virou-se na minha direcção. Nunca esquecerei aquela imagem, iluminada pelo luar, mais parecendo uma cena de um duelo de “cowboys”, no Texas. Apontou-me a arma, em posição de tiro instintivo e gritou:
- Vou-te matar! Vais com o caralho!
Como não parei, ele repetiu o grito, ao mesmo tempo que puxou o gatilho. Não houve disparo porque não havia bala na câmara. Porém, quando ouvi o estalido, fiquei fora de controlo e avancei sobre ele, a murro e a pontapé. Valeu-lhe a malta que se envolveu a afastar-me.
Foi uma noite muito mal dormida, a última vivida no interior da Guiné. Massacravam-me a cabeça um montão de coisas. Podia ter sido atingido por um soldado do meu próprio grupo. Nós, que tivemos em comum tantas lutas contra o IN. E eu que estava convencido de que o Areosa era um dos militares mais dedicados.
Logo de manhã, apercebi-me da excitação dos militares. A barcaça já se avistava ao longe e ninguém parava naquele alegre frenesim. Apenas o Areosa estava parado. Estava à minha espera e, cabisbaixo, abeirou-se mais de mim:
- Ó Silva, estou aqui sem dormir. Quero pedir-lhe perdão pelo meu comportamento de ontem. Sabe que nunca tive nada contra si. Tem de me perdoar.
Eu não sabia que dizer, nem o que cobrar.
E ele continuou:
- Eu estava “alegre”, comecei a cantar e veio o caralho do Furriel gozar comigo. Fiquei ainda mais fodido quando chamou por si. Pensava que o Silva me ia defender e ainda ajudou à missa. Eu estava tão marado que nem vi que você me estava a safar. Sempre que bebo um copo a mais, faço merda.
Este dia 9 de Dezembro também foi muito marcante. As fortes emoções parecem ter sido abençoadas pela brisa refrescante que nos acariciava, cada vez mais, à medida que nos aproximávamos de Bissau. Até deu para relaxar e descansar na viagem.
Chegados a Bissau, foi o reencontro de toda a família da CART 1689. Parecia que já estávamos salvos. Foi, possivelmente, o dia mais alegre que lá sentimos. E eu fiquei duplamente feliz e grato porque o grupo dos Furriéis estava à minha espera para exteriorizar tanta alegria. Foi uma noite de arromba. Quase não se dormiu naquele quarto do Quartel-General, onde se meteram 8 camas (!), para ficarmos juntos até ao ansiado regresso. Um tanto contra a corrente de alegria, o nosso Primeiro Viscoso, com o seu permanente aspecto trombudo, continuava a procurar ensombrar a alegria dos outros, especialmente a dos Furriéis.
Logo de manhã, fomos convocados para uma reunião com o 2.º Comandante do Quartel-General. Fomos perdoados e compreendidos pelos excessos, mas avisados de que teríamos que respeitar o silêncio a partir da meia-noite. Foi o Viscoso quem fez a queixa. Havia-se aproveitado da ausência do Capitão da nossa CART e, ultrapassando os nossos Alferes, foi-se “armar” junto do Comando do QG.
Entre os serviços e as folgas, o tempo passava-se da melhor forma. Porém, o Primeiro Viscoso continuava atento e pronto para destilar o seu ódio aos milicianos, especialmente aos que não lhe falavam (que era o meu caso).
Faltavam menos de 15 dias para o regresso. Estava eu de serviço no QG e as orientações superiores eram que, numa Companhia de 150 militares, apenas um terço estava autorizada a sair do Quartel. Ordens são ordens, mas nem sempre se levavam à risca, especialmente em quartel de maior acalmia.
Ora, os soldados, mesmo sem dispensa, procuravam “desenfiar-se”. Por norma e lealdade, antes do “desenfianço”, cada um perguntava se podia sair. E eu só lhes dizia: Se acontecer alguma coisa, avisem logo, porque tenho que fazer o relatório das anomalias antes das 8H00 horas (hora do render da guarda). Era arriscado, mas, como estávamos nos últimos dias, sentia-me bem com a satisfação da “malta”.
- Aquele que vai ali não é o Tripeiro? - perguntava o 1.º Sargento ao Sargento que o acompanhava, ambos a passear na avenida do Pilão.
- É mesmo, respondeu-lhe.
- Ouve lá, ó Tripeiro, anda cá - chamou - Como é que andas cá fora, se estás detido, e sem qualquer dispensa?
- Sabe, é o Furriel Silva que está de serviço e com ele não há problema. É um gajo porreiro – confiou o Tripeiro.
- Ah, sim? Então quando é o Furriel Silva, é tudo à balda? – questionava de, fala amolecida, o Viscoso, que, para melhor tirar dele, aproveitou para lhe pagar uma cerveja no Bar Jagudi.
Era caso de admiração, porque o somítico, para não gastar um tostão, só bebia água del cano. Cerveja só se alguém lhe pagasse. E assim, estando no Bar a beber, também se mostrava à nossa tropa, a confraternizar!
- Silva, acorda que estás fodido. O detido, o Tripeiro, foi visto pelo Primeiro perto do Pilão – alertou-me, bastante aflito, o Campos.
Virei-me para o outro lado e, meio a dormir e meio acordado, devo ter-lhe respondido mais ou menos:
- Caga nisso, que eu cago no Primeiro.
Seriam cerca de 8h30 quando entraram no meu quarto o Machado e o Faria, e em tom muito sério, dispararam:
- Olha que o Primeiro esteve à espera para ver se apresentavas faltas até ao render da guarda. Agora está a fazer uma participação contra ti, por o Tripeiro andar a passear em Bissau. Já mandou chamar o Tripeiro para depor. E aquele gajo, que gosta tanto de ti, vai-te foder. Mexe-te rapidamente.
Vi num relance a gravidade da situação. Mas, que hei-de fazer? (questionava-me repetidamente). Tantas vezes debaixo de fogo, estava, afinal, numa outra situação perigosa. Tudo de mau me vinha à cabeça e por momentos fiquei paralisado. Qualquer processo naquela altura iria obrigar-me a ficar na Guiné, como tantos outros condenados, e precisamente no momento mais ansiado e carregado de projectos. Havia de aparecer aquele filho da mãe a lançar, mais uma vez, a peçonha, a sua inveja e a gozar com o sofrimento alheio.
Assaltou-me uma ideia. Dirigi-me rápido à caserna e vi que os soldados pareciam já estar à minha espera, adivinhando o que me ia na mente. Logo ali, à entrada, perguntei em voz alta:
- Atenção malta, Vocês viram ou não viram o Tripeiro, ontem, no recolher obrigatório?
A resposta surgiu unânime e categórica:
- Vimos! - Por acaso ele até estava mesmo à minha beira – respondeu logo em voz alta e firme o Cabo Felgueiras.
- Ok, era só isso. E afastei-me. (Por sinal o Cabo Felgueiras não tinha estado na formatura do recolher.)
Assim, o Viscoso não conseguiu testemunhas para promover o processo. E o próprio Tripeiro, chamado a depor, também negou tudo, incluindo a cerveja que tanto havia custado a esse nosso querido Primeiro-Sargento.
____________
Nota do editor
Último poste da série de 9 de agosto de 2016 > Guiné 63/74 - P16374: Outras memórias da minha guerra (José Ferreira da Silva) (25): Relatório de Operações do último almoço-convívio da CART 1689
Guiné 61/74 - P17068: Álbum fotográfico de Luís Mourato Oliveira, ex-alf mil, CCAÇ 4740 (Cufar, dez 72 / jul 73) e Pel Caç Nat 52 (Mato Cão e Missirá, jul 73 /ago 74) (11): Bambadinca, o porto fluvial, onde atracavam os heróicos e lendários "barcos turras"
Foto nº 1
Foto nº 1A
Foto nº 1B
Foto nº 2
Guiné > Zona leste > Região de Bafatá > Setor L1 > Bambadinca > c. 1973/74 > Rio Geba Estreito, porto fluvial, visto da margem esquerda (do lado de Finete e Missirá)...
Parece que a grua do nosso tempo (novembro de 1969, a autogrua Galion) terá sido substituída (?)... Ou então não aparece na foto... È possível que, com o aumento do tráfego fluvial, o porto de Bambadinca se tenha modernizadio em termos de equipamentos... A grua, com cabine, era mais potente que a Galion (?)... Pelo menos parece ter um braço maior....
Parece que a grua do nosso tempo (novembro de 1969, a autogrua Galion) terá sido substituída (?)... Ou então não aparece na foto... È possível que, com o aumento do tráfego fluvial, o porto de Bambadinca se tenha modernizadio em termos de equipamentos... A grua, com cabine, era mais potente que a Galion (?)... Pelo menos parece ter um braço maior....
Foto nº 2 C
Foto nº 2 D
Guiné > Zona leste > Região de Bafatá > Setor L1 > Bambadinca > c. 1973/74 > Rio Geba Estreito, porto fluvial, visto da margem direita
Fotos (e legenda): © Luís Mourato Oliveira (2016). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné].
1. Continuação da publicação do extenso e valioso álbum fotográfico do Luís Mourato Oliveira, nosso grã-tabanqueiro, que foi alf mil da CCAÇ 4740 (Cufar, 1972/73) e do Pel Caç Nat 52 (Mato Cão e Missirá, 1973/74). (*)
Lisboeta, com família do lado materno na Lourinhã (Miragaia e Marteleira), hoje bancário aposentado, cicloturista, o Luís Mourato Oliveira esteve na Guiné, em rendição individual de 1972 1974. Foi, portanto, um dos últimos "guerreiros do Império"...
Foi, seguramente, o último comandante do Pel Caç Nat 52. Ele irá terminar a sua comissão em Missirá e extinguir o pelotão em agosto de 1974. Também visitava Bambadinca (a cujo batalhão estava adido) e Fá Mandinga e dava a devida importância aos convívios (entre militares e entre estes e a população).
Em meados de 1973 (por volta de julho), o Luís Mourtao Oliveira veio de Cufar, no sul, região de Tombali, para o CIM de Bolama, para fazer formação específica antes de ir comandar, em agosto, o Pel Caç Nat 52, no setor L1, zona leste (Bambadinca), região de Bafatá, subunidade que era composto maioritariamente por fulas. Enfim, terras que vários de nós conheceram bem, do "alfero Cabral" ao Beja Santos, do Joaquim Mexia Alves ao Henrique Matos.
Recorde-se que a missão principal do destacamento do Mato Cão era proteger as embarcações que circulavam no Rio Geba Estreito, entre o Xime e Bambadinca. As condições de alojamento e segurança eram precárias.
Sobre o Mato Cão, que era um lugar mítico, temos já mais de 70 referências... Pertencia ao subsetor do Xime.
O Luís Mourato Oliveira conheceu os dois últimos batalhões de Bambadinca, o BART 3973 (1972/74) e o BCAÇ 4518/73 (que "fechou a guerra").
Pelas fotos acima publicadas, fica-se com uma ideia da dimensão (e importância) do porto fluvial de Bambadinca que, a par do Xime, era o grande porto de entrada de abastecimentos do leste. O porto fluvial de Bambadinca eram sobretudo demandado pelas embarcações civis, fretadas pela Intendência. Os lendários e heróicos "barcos turras", como a tropa lhes chamava, que tinham passar por pontos sensíveis como a Ponta Varela e o Mato Cão, no Geba Estreito... . Na foto nº 2C são visíveis as amplas instalações (armazéns) do pelotão de intendência de Bambadinca.
Ao Xime aportavam sobretudo as LDG (Lanchas de Desembarque Grande) com homens e material (incluindo viaturas, armamento, equiamentos mais pesados, etc.) que depois seguiam a estrada (alcatroada) do leste que, no final da guerra, ia praticamente até à fronteira com a Guiné-Conacri: Xime, Bambadinca, Bafatá, Nova Lamego, Piche, Buruntuma...
____________
Em meados de 1973 (por volta de julho), o Luís Mourtao Oliveira veio de Cufar, no sul, região de Tombali, para o CIM de Bolama, para fazer formação específica antes de ir comandar, em agosto, o Pel Caç Nat 52, no setor L1, zona leste (Bambadinca), região de Bafatá, subunidade que era composto maioritariamente por fulas. Enfim, terras que vários de nós conheceram bem, do "alfero Cabral" ao Beja Santos, do Joaquim Mexia Alves ao Henrique Matos.
Recorde-se que a missão principal do destacamento do Mato Cão era proteger as embarcações que circulavam no Rio Geba Estreito, entre o Xime e Bambadinca. As condições de alojamento e segurança eram precárias.
O Luís Mourato Oliveira conheceu os dois últimos batalhões de Bambadinca, o BART 3973 (1972/74) e o BCAÇ 4518/73 (que "fechou a guerra").
Pelas fotos acima publicadas, fica-se com uma ideia da dimensão (e importância) do porto fluvial de Bambadinca que, a par do Xime, era o grande porto de entrada de abastecimentos do leste. O porto fluvial de Bambadinca eram sobretudo demandado pelas embarcações civis, fretadas pela Intendência. Os lendários e heróicos "barcos turras", como a tropa lhes chamava, que tinham passar por pontos sensíveis como a Ponta Varela e o Mato Cão, no Geba Estreito... . Na foto nº 2C são visíveis as amplas instalações (armazéns) do pelotão de intendência de Bambadinca.
Ao Xime aportavam sobretudo as LDG (Lanchas de Desembarque Grande) com homens e material (incluindo viaturas, armamento, equiamentos mais pesados, etc.) que depois seguiam a estrada (alcatroada) do leste que, no final da guerra, ia praticamente até à fronteira com a Guiné-Conacri: Xime, Bambadinca, Bafatá, Nova Lamego, Piche, Buruntuma...
____________
Nota do editor:
(*) Último poste da série > 23 de janeiro de 2017 > Guiné 61/74 - P16981: Álbum fotográfico de Luís Mourato Oliveira, ex-alf mil, CCAÇ 4740 (Cufar, dez 72 / jul 73) e Pel Caç Nat 52 (Mato Cão e Missirá, jul 73 /ago 74) (10): 28 de outubro de 1973, dia de festa ecuménica, a festa do fim do Ramadão (Eid-ul-Fitr) no... Mato Cão
Guiné 61/74 - P17067: Convívios (777): Encontro do pessoal do BCAV 3846, a realizar-se no próximo dia 12 de Março em Ourém (Delfim Rodrigues)
Pede-nos o nosso camarada Delfim Rodrigues (ex-1.º Cabo Auxiliar de Enfermagem da CCAV 3366/BCAV 3846, Suzana e Varela, 1971/73) para publicarmos o anúncio do Convívio deste ano do seu Batalhão, a levar a efeito no próximo dia 12 de Março em Ourém.
____________
Nota do editor
Último poste da série de 10 de janeiro de 2017 > Guiné 61/74 - P16941: Convívios (776): XXIX Encontro do pessoal da Magnífica Tabanca da Linha, dia 19 de Janeiro de 2017, em Cascais (Manuel Resende / Jorge Rosales)
____________
Nota do editor
Último poste da série de 10 de janeiro de 2017 > Guiné 61/74 - P16941: Convívios (776): XXIX Encontro do pessoal da Magnífica Tabanca da Linha, dia 19 de Janeiro de 2017, em Cascais (Manuel Resende / Jorge Rosales)
Guiné 61/74 - P17066: Parabéns a você (1210): Veríssimo Ferreira, ex-Fur Mil Inf da CCAÇ 1422 (Guiné, 1965/67)
____________
Nota do editor
Último poste da série de 17 de fevereiro de 2017 > Guiné 61/74 - P17054: Parabéns a você (1209): António Carvalho, ex-Fur Mil Enf da CART 6250 (Guiné, 1972/74) e Fernando Chapouto, ex-Fur Mil Op Esp da CCAÇ 1426 (Guiné, 1965/67)
Nota do editor
Último poste da série de 17 de fevereiro de 2017 > Guiné 61/74 - P17054: Parabéns a você (1209): António Carvalho, ex-Fur Mil Enf da CART 6250 (Guiné, 1972/74) e Fernando Chapouto, ex-Fur Mil Op Esp da CCAÇ 1426 (Guiné, 1965/67)
segunda-feira, 20 de fevereiro de 2017
Guiné 61/74 - P17065: Notas de leitura (931): “Baía dos Tigres”, por Pedro Rosa Mendes, Publicações Dom Quixote, 1999 (1) (Mário Beja Santos)
Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 7 de Dezembro de 2015:
Queridos amigos,
Em 1999, Publicações Dom Quixote davam à estampa uma obra ímpar da literatura de viagens, onde há um véu de romance e se sente desde a primeira página o poderoso artífice que nos introduz na guerra, nos revela todo um teatro de horrores como se estivesse a ver e se recusasse a sentir, todos aqueles figurantes e toda aquela classe de sofrimento parecem saídos de um bloco de notas de alguém que não quer tomar partido pelas demências que lhe são contadas. Em nenhum outro livro encontrei tantas semelhanças com "Kaputt", de Curzio Malaparte, outro viajante que anotou horrores num dado período da II Guerra Mundial, ouviu monstros deleitados com as suas doutrinas da supremacia racial e ouviu povo anónimo, agarrados às raízes da humanidade. De algum modo, são estes os cenários da "Baía dos Tigres", um livro extraordinário, irrecusável, uma paleta espantosa daquele pesadelo que deu pelo nome da guerra civil angolana.
Um abraço do
Mário
Baía dos Tigres, por Pedro Rosa Mendes:
uma obra-prima na descida aos infernos (1)
Beja Santos
O escritor e jornalista Pedro Rosa Mendes, em 1997, propôs-se realizar a travessia do continente africano, por terra, “De Angola à Contracosta”. Queria afoitar-se a levar por diante o itinerário seguido por Capello e Ivens, como escreveu José Eduardo Águalusa, “um século depois, muitas guerras depois, através de estradas já mortas e campos semeados de minas”. O relato desta aventura é um livro esplêndido, uma pedra preciosa da literatura de viagens, um género literário em que damos cartas, seguindo a herança, ao melhor estilo, do que escreveu e viveu Fernão Mendes Pinto.
O que nos oferece esta “Baía dos Tigres” é um género de odisseia, voltando a José Eduardo Águalusa, com heróis anónimos, habitantes dos limites da vida, e também monstros, estranhos monstros reinventado o horror no seu vasto território de sombras. Portugal precisava de um livro como este. Um livro capaz de justificar todo um passado comum de errância pelo mundo e de renovar a chamada literatura de viagens.
O núcleo central da obra descreve situações da guerra civil angolana. Dentro da banalização do horror com que nos atrai do princípio ao fim, vamos começar exatamente perto do final na Pousada Número Um da Jamba:
“Tem 16 hóspedes que estão lá para sempre. Não tem iluminação porque é melhor assim para eles. Não se vê e a escuridão tem pudor do pesadelo que esconde, recortado contra um cheiro nauseabundo. Quando se entra os olhos ganham a vertigem do chão e o estômago quer voltar para trás. Os ocupantes são 6, quartos e um corredor de homens amontoados, quase todos cegos ou amputados e ainda outros que são surdos. Na verdade, o grupo maior é daqueles que estão cumulativamente imóveis em todas essas desgraças: não vêem, não ouvem, não mexem. Todos falam e mesmo os que não têm língua olham de uma maneira ensurdecedora.
A Pousada Número Um foi o primeiro centro de acolhimento de deficientes das FALA, criado no início da guerra quando Savimbi e um punhado de homens fizeram quartel-general no canto inferior direito da sua retirada de Luanda. Em Angola, a morte é um luxo barato. O preço maior é ficar vivo quando a vida é uma mercadoria insuportável. Em 1976, a Pousada era o exemplo Número Um do carinho que o Galo Negro dedicava aos heróis da luta: os homens que tinham pago esse preço exorbitante em lascas do próprio corpo. Têm minas na ponta das muletas, granadas onde faltam as mãos e bombas ao alcance das pestanas. Comércio de troca direta, a guerra deles: um pé por cada passo, um dedo por cada atraso, um homem por cada palmo, um grito por cada dor”.
Pedro Rosa Mendes não aterrou em Luanda à procura de uma reportagem de guerra, embora soubesse que a guerra aqui permanecia, tinha pela frente uma linha sinuosa que vai de Luanda a Quelimane. Uma odisseia, iria descobrir, cheia de campos de minas, o repórter vai descobrir aqueles azares da fortuna em que um guerrilheiro se desencantará, passando para o adversário, encontrará durante a viagem algumas dessas histórias em Angola e Moçambique. E logo descreve a batalha de Cuíto Cuanavale, onde combateram angolanos das FAPLA, guerrilheiros da SWAPO, tropas cubanas e aviões soviéticos contra angolanos da UNITA, comandos sul-africanos e aviões franceses:
“Milhares de homens morreram com bombas, morteiros, rockets, minas, tanques, metralhadoras, fome, pântanos, crocodilos. Com a loucura: é incontável o número de todos os outros que deixaram ali a vida e regressaram a Moscovo, Havana ou Joanesburgo contrabandeando a sua bagagem de pesadelos. O Cuíto Cuanavale é um epicentro do nada mas possui a única pista asfaltada da região preciosa para o transporte de tropas e material. O seu controlo podia decidir a guerra, como veio a acontecer”.
O repórter anda por perto, deambula por ruínas de alvenaria, ali não há eletricidade, água canalizada ou potável, é a desolação absoluta. As histórias sucedem-se, nenhuma é verdadeiramente feliz, Pedro Rosa Mendes prossegue viagem num doloroso anda-pára, tomas notas sobre vidas fantasmáticas e a descida aos infernos prossegue com minas à frente, atrás, à esquerda, à direita, mais dor parece impossível, como ele escreve:
“Andar de dia. Andar de noite. Comer fuba ou não comer nada. Poupar a última lata. Ferver chá colhido em arbustos. Cozinhar em panelas negras na terra lavrada pelos pneus. Comer a última lata. Comer à mão em pratos de esmalte esboroado. Imaginar água fresca. Salivar línguas de sal. Quebrar de frio uma hora depois da Lua. Abafar de calor uma hora depois do Sol. Sonhar com uma cama. Acordar com ratos. Adormecer com um susto. Desprezar as lágrimas. Evitar os cães. Defecar à frente dos outros. Tomar banho nos rios, nadar na sesta dos crocodilos, fugir das cobras, secar o corpo com as mãos. Colher os arrepios por fora dos ossos, vestir a pele da roupa imunda. Vomitar o próprio cheiro. Dormir ao relento, dormir em alerta, em trânsito, em casas abandonadas, em colchões de palha e piolhos, em cobertores com buracos e sarna”.
O repórter tem que atravessar a Jamba, é retido, ali passa horas intermináveis à espera de autorização para continuar. Sabe escutar, apercebe-se de dramas, daquelas guerras em que rapidamente se passa de herói a traidor, de quinta-essência a refugo. E vamos sendo atormentados com histórias macabras com a do Fogacho:
“Fogacho estava condenado. Como oficial das FALA, foi integrado no exército único ao abrigo do Protocolo de Lusaca. Era uma das patentes da UNITA nas FAA; tenente-coronel. Há um ano que tinha trocado o mato pela cidade. Agora ia à Jamba, por terra, buscar a mulher, os filhos e duas viaturas que lá continuavam. Mas ninguém chega à Jamba por terra. Nem mesmo um tenente-coronel da casa. Ou talvez, melhor: muito menos um tenente-coronel que trocou de casa.
- Luanda é só traição. Esses ditadores se passeiam lá nos governos, comendo do nosso petróleo. Eles financiam o totalitarismo com o petróleo. Enquanto lhes bastar o petróleo não vamos ter cheiro de pluralismo. Devíamos ter estendido a guerrilha nas plataformas. Quando lhes estoirar nas mãos, aí eles percebem.
(…) Fogacho era estrangeiro. De Angola para Angola, do Bailundo para Luanda, mudara para sempre de país. Na UNITA, que sempre fanatizou a pureza, não há dupla nacionalidade. Fogacho foi para não voltar. Além disso, a cidade é uma sedução em si, depois de 20 anos no mato”.
A viagem prossegue, o escritor desorienta-nos com histórias e situações entre Angola, a Zâmbia e Moçambique, histórias de horror, de corrupção, daquela pura maldade que só é possível nas guerras insanas, onde foram esquecidos todos os princípios.
(Continua)
____________
Nota do editor
Último poste da série de 17 de fevereiro de 2017 > Guiné 61/74 - P17055: Notas de leitura (930): “O PAIGC perante o dilema Cabo-Verdiano (1959-1974)”, por José Augusto Pereira, Campo da Comunicação, 2015 (3) (Mário Beja Santos)
Queridos amigos,
Em 1999, Publicações Dom Quixote davam à estampa uma obra ímpar da literatura de viagens, onde há um véu de romance e se sente desde a primeira página o poderoso artífice que nos introduz na guerra, nos revela todo um teatro de horrores como se estivesse a ver e se recusasse a sentir, todos aqueles figurantes e toda aquela classe de sofrimento parecem saídos de um bloco de notas de alguém que não quer tomar partido pelas demências que lhe são contadas. Em nenhum outro livro encontrei tantas semelhanças com "Kaputt", de Curzio Malaparte, outro viajante que anotou horrores num dado período da II Guerra Mundial, ouviu monstros deleitados com as suas doutrinas da supremacia racial e ouviu povo anónimo, agarrados às raízes da humanidade. De algum modo, são estes os cenários da "Baía dos Tigres", um livro extraordinário, irrecusável, uma paleta espantosa daquele pesadelo que deu pelo nome da guerra civil angolana.
Um abraço do
Mário
Baía dos Tigres, por Pedro Rosa Mendes:
uma obra-prima na descida aos infernos (1)
Beja Santos
O escritor e jornalista Pedro Rosa Mendes, em 1997, propôs-se realizar a travessia do continente africano, por terra, “De Angola à Contracosta”. Queria afoitar-se a levar por diante o itinerário seguido por Capello e Ivens, como escreveu José Eduardo Águalusa, “um século depois, muitas guerras depois, através de estradas já mortas e campos semeados de minas”. O relato desta aventura é um livro esplêndido, uma pedra preciosa da literatura de viagens, um género literário em que damos cartas, seguindo a herança, ao melhor estilo, do que escreveu e viveu Fernão Mendes Pinto.
O que nos oferece esta “Baía dos Tigres” é um género de odisseia, voltando a José Eduardo Águalusa, com heróis anónimos, habitantes dos limites da vida, e também monstros, estranhos monstros reinventado o horror no seu vasto território de sombras. Portugal precisava de um livro como este. Um livro capaz de justificar todo um passado comum de errância pelo mundo e de renovar a chamada literatura de viagens.
O núcleo central da obra descreve situações da guerra civil angolana. Dentro da banalização do horror com que nos atrai do princípio ao fim, vamos começar exatamente perto do final na Pousada Número Um da Jamba:
“Tem 16 hóspedes que estão lá para sempre. Não tem iluminação porque é melhor assim para eles. Não se vê e a escuridão tem pudor do pesadelo que esconde, recortado contra um cheiro nauseabundo. Quando se entra os olhos ganham a vertigem do chão e o estômago quer voltar para trás. Os ocupantes são 6, quartos e um corredor de homens amontoados, quase todos cegos ou amputados e ainda outros que são surdos. Na verdade, o grupo maior é daqueles que estão cumulativamente imóveis em todas essas desgraças: não vêem, não ouvem, não mexem. Todos falam e mesmo os que não têm língua olham de uma maneira ensurdecedora.
A Pousada Número Um foi o primeiro centro de acolhimento de deficientes das FALA, criado no início da guerra quando Savimbi e um punhado de homens fizeram quartel-general no canto inferior direito da sua retirada de Luanda. Em Angola, a morte é um luxo barato. O preço maior é ficar vivo quando a vida é uma mercadoria insuportável. Em 1976, a Pousada era o exemplo Número Um do carinho que o Galo Negro dedicava aos heróis da luta: os homens que tinham pago esse preço exorbitante em lascas do próprio corpo. Têm minas na ponta das muletas, granadas onde faltam as mãos e bombas ao alcance das pestanas. Comércio de troca direta, a guerra deles: um pé por cada passo, um dedo por cada atraso, um homem por cada palmo, um grito por cada dor”.
Pedro Rosa Mendes não aterrou em Luanda à procura de uma reportagem de guerra, embora soubesse que a guerra aqui permanecia, tinha pela frente uma linha sinuosa que vai de Luanda a Quelimane. Uma odisseia, iria descobrir, cheia de campos de minas, o repórter vai descobrir aqueles azares da fortuna em que um guerrilheiro se desencantará, passando para o adversário, encontrará durante a viagem algumas dessas histórias em Angola e Moçambique. E logo descreve a batalha de Cuíto Cuanavale, onde combateram angolanos das FAPLA, guerrilheiros da SWAPO, tropas cubanas e aviões soviéticos contra angolanos da UNITA, comandos sul-africanos e aviões franceses:
“Milhares de homens morreram com bombas, morteiros, rockets, minas, tanques, metralhadoras, fome, pântanos, crocodilos. Com a loucura: é incontável o número de todos os outros que deixaram ali a vida e regressaram a Moscovo, Havana ou Joanesburgo contrabandeando a sua bagagem de pesadelos. O Cuíto Cuanavale é um epicentro do nada mas possui a única pista asfaltada da região preciosa para o transporte de tropas e material. O seu controlo podia decidir a guerra, como veio a acontecer”.
O repórter anda por perto, deambula por ruínas de alvenaria, ali não há eletricidade, água canalizada ou potável, é a desolação absoluta. As histórias sucedem-se, nenhuma é verdadeiramente feliz, Pedro Rosa Mendes prossegue viagem num doloroso anda-pára, tomas notas sobre vidas fantasmáticas e a descida aos infernos prossegue com minas à frente, atrás, à esquerda, à direita, mais dor parece impossível, como ele escreve:
“Andar de dia. Andar de noite. Comer fuba ou não comer nada. Poupar a última lata. Ferver chá colhido em arbustos. Cozinhar em panelas negras na terra lavrada pelos pneus. Comer a última lata. Comer à mão em pratos de esmalte esboroado. Imaginar água fresca. Salivar línguas de sal. Quebrar de frio uma hora depois da Lua. Abafar de calor uma hora depois do Sol. Sonhar com uma cama. Acordar com ratos. Adormecer com um susto. Desprezar as lágrimas. Evitar os cães. Defecar à frente dos outros. Tomar banho nos rios, nadar na sesta dos crocodilos, fugir das cobras, secar o corpo com as mãos. Colher os arrepios por fora dos ossos, vestir a pele da roupa imunda. Vomitar o próprio cheiro. Dormir ao relento, dormir em alerta, em trânsito, em casas abandonadas, em colchões de palha e piolhos, em cobertores com buracos e sarna”.
O repórter tem que atravessar a Jamba, é retido, ali passa horas intermináveis à espera de autorização para continuar. Sabe escutar, apercebe-se de dramas, daquelas guerras em que rapidamente se passa de herói a traidor, de quinta-essência a refugo. E vamos sendo atormentados com histórias macabras com a do Fogacho:
“Fogacho estava condenado. Como oficial das FALA, foi integrado no exército único ao abrigo do Protocolo de Lusaca. Era uma das patentes da UNITA nas FAA; tenente-coronel. Há um ano que tinha trocado o mato pela cidade. Agora ia à Jamba, por terra, buscar a mulher, os filhos e duas viaturas que lá continuavam. Mas ninguém chega à Jamba por terra. Nem mesmo um tenente-coronel da casa. Ou talvez, melhor: muito menos um tenente-coronel que trocou de casa.
- Luanda é só traição. Esses ditadores se passeiam lá nos governos, comendo do nosso petróleo. Eles financiam o totalitarismo com o petróleo. Enquanto lhes bastar o petróleo não vamos ter cheiro de pluralismo. Devíamos ter estendido a guerrilha nas plataformas. Quando lhes estoirar nas mãos, aí eles percebem.
(…) Fogacho era estrangeiro. De Angola para Angola, do Bailundo para Luanda, mudara para sempre de país. Na UNITA, que sempre fanatizou a pureza, não há dupla nacionalidade. Fogacho foi para não voltar. Além disso, a cidade é uma sedução em si, depois de 20 anos no mato”.
A viagem prossegue, o escritor desorienta-nos com histórias e situações entre Angola, a Zâmbia e Moçambique, histórias de horror, de corrupção, daquela pura maldade que só é possível nas guerras insanas, onde foram esquecidos todos os princípios.
(Continua)
____________
Nota do editor
Último poste da série de 17 de fevereiro de 2017 > Guiné 61/74 - P17055: Notas de leitura (930): “O PAIGC perante o dilema Cabo-Verdiano (1959-1974)”, por José Augusto Pereira, Campo da Comunicação, 2015 (3) (Mário Beja Santos)
Guiné 61/74 - P17064: Meu pai, meu velho, meu camarada (53): Feliciano Delfim dos Santos (1922-1989), ex-1.º cabo, 1.ª Comp /1.º Bat Exp do RI 11, Cabo Verde (Ilhas de Santiago, Santo Antão e Sal, 1941/43) (Augusto Silva Santos) - Parte V: Restos de espólio: o orgulho de ter pertencido ao Onze... E mais duas fotos de Pedra de Lume
Emblema comemorativo do 25.º aniversário da passagem do "11" por terras de Cabo Verde.
Cabo Verde > Ilha do Sal > Pedra Lume > 1943 > O Feliciano no topo da pirâmide. [Foto nº 24]
Cabo Verde > Ilha do Sal > Pedra Lume > 1943 > Aquartelamento do “11” [Foto n.º 25]
Fotos (e legendas): © Augusto Silva Santos (2017). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]
Folha 9 da caderneta militar
Passaporte militar
Os "expedicionários do Onze" partiram do Cais da Rocha Conde de Óbidos, em Lisboa, no vapor "João Belo", a 16 de junho de 1941, com desembarque na Praia, ilha de Santiago, a 23 do mesmo mês. Estiveram grande parte do tempo (cerca de 20 meses) na então desoladora ilha do Sal, em missão de soberania. Publicam-se mais duas fotos desse tempo [fotos nº 24 e nº 25].
No final da comissão, fizeram um passagem pela ilha de Santo Antão (de meados de março a dezembro de 1943), para retemperar forças antes do regresso a casa. Ao todo estes "nossos pais, nossos velhos e nossos camaradas" cumpriram cerca de dois anos e meio de comissão de serviço em Cabo Verde. O RI 11 teve 16 mortos por doença na ilha do Sal.
2. Mensagem mais recente do nosso camarada Augusto Silva Santos:
Data: 16 de fevereiro de 2017 às 11:37
Assunto: Espólio de Feliciano Delfim dos Santos / RI 11
Olá, Luís, bom dia!
No seguimento da minhas pesquisas sobre a passagem do meu pai pelo RI 11 / Cabo Verde (*), vim a descobrir mais uma "preciosidade".
Estou a juntar foto do emblema que o meu pai orgulhosamente ostentava na lapela do seu casaco, aquando da realização dos almoços / convívios anuais em que quase sempre participava, referindo-se o mesmo ao 25.º aniversário da passagem do "11" por terras de Cabo Verde [, 1941-1966].
Tanto quanto me lembro, esses almoços eram sempre (ou quase sempre) realizados na margem sul, ou seja, em localidades do distrito de Setúbal (ex., Setúbal, Montijo, Palmela, Alcochete, etc.)
A título de curiosidade, estou também a juntar cópia de página da minha caderneta militar, em que consta que a minha unidade de desmobilização foi precisamente o RI 11, a qual na altura escolhi como forma de homenagear o meu pai, que muito orgulho tinha na "sua unidade".
Foi mesmo propositadamente, pois poderia até escolher qualquer outra que, na altura, até me seria bem mais fácil em termos de deslocação, visto viver em Almada.
Quando o RI 11, os seus arquivos foram dispersos por outras unidades (foi-me assim explicado na altura), sendo que no meu caso passei a pertencer ao Regimento de Infantaria de Queluz, onde me dirigia para obter os "passaportes militares", sempre que tinha necessidade de me ausentar do país, quer em serviço ou em férias, pois durante anos fiz parte, como todos nós, da chamada reserva territorial (julgo que era assim que se chamava).
Foi numa dessas vezes que tomei conhecimento que havia sido "promovido" a 2.º Sargento Miliciano, coisa que nunca me havia passado pela cabeça (as coisas que a pessoa descobre). Apenas por curiosidade junto igualmente cópia desse documento.
Publica o que achares de interesse.
Um forte abraço e boa continuação da tua situação de reformado.
Augusto D. Silva Santos
Data: 16 de fevereiro de 2017 às 11:37
Assunto: Espólio de Feliciano Delfim dos Santos / RI 11
Olá, Luís, bom dia!
Foi mesmo propositadamente, pois poderia até escolher qualquer outra que, na altura, até me seria bem mais fácil em termos de deslocação, visto viver em Almada.
Augusto D. Silva Santos
________________
Nota do editor:
(*) Vd. poste de 10 de fevereiro de 2017 > Guiné 61/74 - P17039: Meu pai, meu velho, meu camarada (52): Feliciano Delfim dos Santos (1922-1989), ex-1.º cabo, 1.ª Comp /1.º Bat Exp do RI 11, Cabo Verde (Ilhas de Santiago, Santo Antão e Sal, 1941/43) (Augusto Silva Santos) - Parte IV: Ilha do Sal, Feijoal
Nota do editor:
(*) Vd. poste de 10 de fevereiro de 2017 > Guiné 61/74 - P17039: Meu pai, meu velho, meu camarada (52): Feliciano Delfim dos Santos (1922-1989), ex-1.º cabo, 1.ª Comp /1.º Bat Exp do RI 11, Cabo Verde (Ilhas de Santiago, Santo Antão e Sal, 1941/43) (Augusto Silva Santos) - Parte IV: Ilha do Sal, Feijoal
Subscrever:
Mensagens (Atom)