sábado, 16 de janeiro de 2010

Guiné 63/74 - P5661: FAP (44): Aerocross (Miguel Pessoa, Cor Pilav Ref)


1. Mensagem do nosso Camarada Miguel Pessoa, Cor Pilav Ref (ex-Ten Pilav, BA 12, Bissalanca, 1972/74), com data de 12 de Janeiro:

Camaradas,

Fui encontrar no meu "baú dos tesourinhos deprimentes", esta pérola que escrevi há já uns meses e que ponho agora à vossa disposição. Ando a dosear bastante o envio dos meus "escritos", pois já não tenho muitos...

E faltando-me a memória para relembrar factos ocorridos há tanto tempo, também já não tenho imaginação para tentar reconstruir outros, que pudessem aproximar-se razoavelmente da realidade... Por isso, para já, terão que se contentar com esta estória, como agora se diz.

AEROCROSS

De vez em quando os aviadores da BA12 eram solicitados para missões que, por fugirem à rotina da actividade diária, eram sempre bem recebidas. Apareceu um dia um pedido de transporte de jornalistas estrangeiros para uma visita a Varela, no âmbito das "operações de charme" que o regime organizava periodicamente.

Um dos problemas apresentados era o de que a pista de Varela estava há bastante tempo desactivada - talvez porque se encontrava localizada a uma certa distância do aquartelamento e isso implicasse um empenhamento exagerado das nossas tropas na protecção aos aviões, quando ali se deslocavam.

Mas, dado o interesse em avançar com esta deslocação, foi considerado importante reabrir a pista, pelo menos para permitir a execução daquela missão. Sabia-se pouca coisa das condições do aeródromo naquele momento, pelo que o piloto teria que fazer uma prospecção cuidadosa da área de aterragem, antes de ali pousar.

Dado o número de jornalistas envolvidos, houve necessidade de se programar a ida de dois DO-27, tendo sido designados dois pilotos para esse fim - um Furriel já batido no território e um tenente ainda em princípio de comissão - eu... Já não me lembro como me calhou ir nesta missão, mas desconfio. Sucede que era eu quem indicava os pilotos da Esquadra para as missões que estavam programadas e certamente aproveitei para me nomear a mim mesmo para este trabalho, na perspectiva de aprender mais qualquer coisa e ganhar experiência.

A esta distância, parece-me que ultrapassei os limites do razoável ao meter-me nesta cena, pois não se sabia o que iríamos encontrar no terreno. A tal prospecção cuidadosa da área de aterragem era pouco praticável dado que o capim elevado não deixava ver o chão e não sabíamos se haveria obstáculos no terreno, como paus ou pedras, ou irregularidades que pudessem provocar um desequilíbrio repentino do avião durante a sua progressão, ou até o seu capotamento. E desconheço se o pessoal do aquartelamento terá analisado o local.

Tem-se por norma que no transporte de altas entidades ou de pessoal estranho à Força Aérea (que nos importa tratar bem) as regras de segurança são ainda mais rígidas que o normal. Não sei bem os antecedentes desta missão, mas não me parece que tenha sido este o caso, porque à descolagem ainda não sabíamos bem o que iríamos encontrar.

Sei que, à chegada ao local, depois de termos solicitado ao aquartelamento que montasse a segurança aos aviões junto à pista, ficou assente que um dos pilotos faria uma aterragem cuidadosa e só depois aterraria o outro avião.

Foi decidido (?) então que eu faria essa aproximação inicial. Parece-me que terá havido aqui uma passagem da batata quente feita de modo perfeito pelo outro piloto e o periquito viu-se com o menino (ou os jornalistas) nos braços e avançou destemidamente. Destemidamente é uma maneira de dizer. O facto é que arrisquei mais do que devia pois, para além dos eventuais obstáculos, que já referi, nem sabíamos se teriam colocado alguma mina naquela zona.

Pese embora os meus receios, a aterragem até foi perfeita e o capim ajudou mesmo o avião a travar a corrida de aterragem. Vendo o êxito da manobra o outro piloto avançou e aterrou a seguir, estacionando o avião ao lado do meu.A missão não tem muito mais a referir, pois o regresso decorreu sem problemas de maior, com uma descolagem normal de Varela, na tarde do mesmo dia (depois de termos verificado melhor as condições do terreno...).

Não pretendo aqui questionar as decisões tomadas a nível superior, porque não tinha conhecimento à data, nem tive depois, dos factores que foram tomados em linha de conta. Por outro lado, há muitos aspectos desta missão que começam a ficar esbatidos na minha memória. Porém, penso que no meu caso pessoal deveria ter tomado maiores precauções (claro! - mas quais?...).

Suponho que, afinal, muitos passaram por situações semelhantes. Quantas vezes nos encontrámos nós em situações em que sentíamos dificuldade em questionar as decisões tomadas a nível superior, quando já estávamos metidos numa engrenagem que nos arrastava e levava a situações para as quais muitas vezes já não tínhamos fuga possível e apenas nos restava avançar?

Um abraço,
Miguel Pessoa
Cor Pilav Ref

Foto: © Wikipédia, Enciclopédia livre - Exemplar em exposição no Museu do Ar (Polo de Sintra). Direitos reservados.

Emblema da BA12: © Carlos Coutinho (2009). Direitos reservados.

Emblemas do Esquadrão 121 Tigres Fiat G91 e GO1201: © Miguel Pessoa (2009). Direitos reservados.
___________
Nota de M.R.:

Vd. último poste desta série em:


4 comentários:

Luís Graça disse...

Miguel:

Todos nós, pessoal de terra, ar e mar, violou regras de segurança, ultrapassou os limites, pôs à prova o material, fez asneiras, adoptou comportamentos de bravata, esticou os nervos até à franja...

Não tenho aqui falado muito de mim, mas um dia deu-me na cabeça de ir de Bambadinca ao Xime (cerca de 12 km), sozinho, com o Tchombé - um puto, órfão de guerra, que era a 'mascote' (!) do bar de sargentos e furrriéis de Bambadinca - e com o condutor de uma viatura Daimler, uma caixa de lata... (O meu amigo José Luís Vacas de Carvalho, o comandante do pelotão de cavalaria, nem deu conta do desenfianço)...

Se tivessemos apanhado uma mina pelo caminho, eu não estaria aqui para te contar esta história... Tínhamos vinte e poucos anos, e precisávamos, de vez em quando, de testar a nossa resiliência e resistência... para não darmos em doidos.

Fui ao Xime, bebi um copo, paguei o lanche ao Tchombé e ao condutor da Daimler, e regressei nas calmas a casa, com uma visita aos camaradas que estavam a guardar a ponte do Rio Udunduma...

Era um privilégio dos "velhinhos", eu estava farto de conhecer e fazer segurança àquela estrada (em contrução e, mais tarde, asfaltada, já depois do meu regresso à Metrópole).

Todo o mundo que esteve no leste, conheceu o célebre e temível troço Xime-Bambadinca, por onde se entrava para o leste (actuais regiões de Bafatá e Gabu).

Fico feliz pelo teu regresso... Um beijinho para a Gisela.

Colaço disse...

Consoante as suas responsabilidades assim as suas aventuras,nunca cheguei a saber porque é que o ex-alferes José Augusto Rocha a qualquer hora da noite viajava de ou para Capé de Cammude ou Cantacunda armado em cowboy de pistola Walther á cinta de jipe só acompanhado pelo motorista o Eugénio Duarte que hoje vive isolado do mundo desde o dia em que uma das suas duas filhas faleceu vitima de um desastre de viação.
Recordo do Eugénio me dizer que fazia a seguinte pergunta, o meu alferes não tem medo?
Resposta do alferes se eles aparecerem a gente entrega-se.
Nós suspeitávamos que o alferes Rocha por ser oposicionista ao governo de Salazar tivesse a ser protegido pelo Carlos de Capé, por alguma razão todas as industrias naquela zona tinham sido incendiadas e a fábrica de aguardente de cana do Carlos em Capé continuava a sua laboração normal.
Mas posso dizer que o Carlos de Capé era muito comunicativo com toda a tropa portuguesa, pois quando se lhe pedia uma garrafa de agua-ardente ele aos militares não cobrava dinheiro oferecia.
Mas da fama não se livrava de Capé ser um posto de intercâmbio entre a guerrilha e a tropa portuguesa.

Um abraço para o Miguel e um beijinho para a Gisela.

Anónimo disse...

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