
Boa noite Carlos Vinhal
Espero que já estejas recuperado dos "desencontros" do V Encontro...
Mando mais uma das minhas "estórias" do blogando e andando, que me aconteceu em passado recente.
A vida não pára de nos surpreender!
Um abraço e até um dia destes. No V Encontro de 2010.
JERO
Na “prisão” é que está a dar!
Começo por declarar que sou um felizardo em termos de amigos. Tenho um “património de afectos” que não é brincadeira.
Sempre que posso dou uma saltada para visitar o meu amigo Moreira. Um amigo especial. Amigo das tropa.
Podemos estar alguns meses sem nos falarmos mas quando o telefone toca não são precisos nomes.
Como estás e onde estás?
Estive com ele na semana passada.
Nesta fase do “campeonato da vida” deu em agricultor.
Levei-lhe uma prenda simbólica e obrigou-me a trazer laranjas e limões. E contou-me uma história da vida… Lindíssima. Pelo menos eu achei. Vou partilhá-la com quem tem a paciência de me ler de quando em quando.

Até ao ano passado tive neste barracão com rede cerca de 150 pássaros. Tinha alguns melros e disseram-me que eram aves protegidas, que não podia ter em cativeiro. Por essa e outras razões chateei-me com tanta passarada e resolvi devolvê-los à liberdade.
Tinha alguns pombos e poucos dias depois apercebi-me que, contra a sua vontade, já tinham feito parte do “petisco” de uns caçadores que moravam por perto.
O Moreira, que é transmontano, disse seguidamente uns palavrões, que não reproduzo, mas que queriam dizer que mais valia ter estado quieto.
Mas como nem tudo é mau na vida teve recentemente uma boa surpresa.

O Moreira via-o entrar e sair, trazendo materiais para a sua “habitação”. Sentia-se em casa, desfrutando com à vontade a segurança da sua antiga prisão. Dias depois o ninho estava pronto e tinha 3 bonitos ovos.
Disse ao Moreira:
- Agora é que o teu melro, da tal espécie protegida, está efectivamente protegido. Vais pô-lo fora?
- Nem pensar. Aqui é que ele (ou ela) está bem.
Tirei umas fotos, dei um abraço ao meu amigo da tropa, e regressei a Alcobaça.
Apanhei pouco trânsito e fartei-me de pensar no melro do Moreira.
Um pássaro “diz-nos” que a “prisão” é opção mais segura do que viver em liberdade! Dá que pensar!
Nos dias anteriores serviços noticiosos das televisões e jornais nacionais tinham referido o suicídio de uma criança em idade escolar e a morte de um professor que (eventualmente) não aguentou a pressão da sua profissão e acabou com a vida.
Afinal que tempos são estes em que vivemos?
A segurança para viver está na cadeia?
A opção do melro dava-me que pensar.
Uma espécie protegida pela lei estava bem porque estava em cativeiro…
Segurança para viver… precisa-se!
JERO
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Nota de CV:
Vd. último poste da série de 9 de Março de 2010 > Guiné 63/74 - P5959: Blogando e andando (José Eduardo Oliveira) (5): Em terras com nome de santo...
3 comentários:
Pois é, JERO, estas situações dão-nos muito que pensar...
E olha, realmente muito mal vão as coisas quando se começa a pensar (e se calhar a sentir) que a 'liberdade e segurança' estão em qualquer 'prisão', por muito 'aberta' que seja.
Um abraço
Hélder S.
Camaradas,
Regressei da Guiné. Uma manhã, ao sair de Bissau, um polícia fez sinal para encostar. Aproximou-se e pediu matabicho. Feitos desentendidos, estendemos-lhe os passaportes e documentos da viatura. Olhou-nos de viés e referiu que não queria documentos, apenas matabicho.
Recebeu uma nota, agradeceu, e fez sinal para avançarmos.
Soubemos que há vários meses a função pública, a polícia, os professores e outras classes, não recebem salários, apesar de continuarem a exercer funções.
Também ouvi referências a negócios combinados com libianos e angolanos. Com os chineses que terão promovido a troca de dois sacos de arroz por cada um de caju originário da Guiné. Quase cessou a produção de arroz, e hoje a troca de arroz por caju é paritária.
Para além do mundo nebuloso da droga.
Por estas e outras, os guineenses vivem reféns da "liberdade" que ousaram alcançar, e que, hipocritamente, a comunidade internacional incrementou para gerar um país pleno de dependências e ao sabor de qualquer desmando.
É, por isso, muito curiosa a estória contada pelo Jero, e que nos pode ajudar à compreensão de incongruências sociais e à incapacidade dos homens para se organizarem e conviverem justamente.
Abraços fraternos
JD
José Manuel,
essa do "matabicho" (gorjeta, suborno ou o nome que se queira), faz parte do dia a dia, de algum estrangeiro em áfrica.
Só que o suborno, dizem nas ex-colónias portuguesas, que foi uma herança que os Portugueses lá deixaram.
E os brasileiros recorrem tambem a essa desculpa ao fim de 200 anos.
Mas como o dizem em português...porreirinho!
Antº Rosinha
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