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terça-feira, 15 de abril de 2025

Guiné 61/74 - P26692: Vivências em Nova Sintra (Aníbal José da Silva, Fur Mil Vagomestre da CCAV 2483/BCAV 2867) (7): Coluna de Reabastecimento a S. João - Coluna a S. João em 08/12/69 e Colunas de reabastecimento a Lala

CCAV 2483 / BCAV 2867 - CAVALEIROS DE NOVA SINTRA
GUINÉ, 1969/70


VIVÊNCIAS EM NOVA SINTRA

POR ANÍBAL JOSÉ DA SILVA


17 - COLUNA DE REABASTECIMENTO A S. JOÃO
Saída de uma coluna
Regresso da coluna
Chegada ao quartel

Sempre que estava presente em Nova Sinta e havia colunas de reabastecimento a S. João, eu fazia todas. As localidades distam cerca de dezoito quilómetros. Era sempre necessário picar a estrada para detetar e levantar minas e foram algumas que se conseguiram. Demorava algumas horas a percorrer a distância.

Numa dessas colunas chegamos a S. João ao final da tarde. Estacionamos as viaturas em local devido e preparamo-nos para comer a ração de combate. 

O alferes do destacamento veio falar comigo e muito gentilmente propôs para não comermos a ração e ofereceu uma refeição quente, nada mais nada menos que um bacalhau com batatas, com a promessa da minha parte de lhe devolver a quantidade de géneros utilizados. Oferta irrecusável. Lá arranjei dois cozinheiros improvisados e que estiveram à altura da tarefa.

 Depois da refeição o pessoal preparava-se para ir dormir num colchão muito duro. Nada mais nada menos que o estrado das viaturas, sem cobertores e sem mosquiteiros ficando à mercê dos mosquitos. Só nesse momento me apercebi que os alferes e furriéis do pelotão, tinham ido para Bolama atravessando o rio, bastante largo, num barco de fibra de vidro.

Eu lá fiquei a dormir junto dos soldados, naquele confortável colchão. O batelão que transportava a carga, estava previsto atravessar o rio, de Bolama para S. João, ao raiar da manhã. Creio que devido a questões de maré ou de segurança, a travessia foi antecipada. O alferes do destacamento recebeu uma mensagem de Bolama a informar o facto. Procurou-me e disse o que se estava a passar e que teríamos de ir fazer a segurança ao batelão. Acabou com o nosso repouso. 

Acordei os 1.ºs Cabos e estes os restantes soldados. Lá fomos para a beira rio montar o perímetro de segurança. Mais ou menos duas horas depois começamos a ouvir o motor do barco. Chegado a S. João mantivemos o plano traçado.

Aos primeiros raios de sol começamos a tarefa de descarga e a carregar as nossas viaturas. Do alferes e dos furriéis nada. Efetuada a tarefa e enquanto esperávamos por eles, a maioria do pessoal aproveitou para se banhar no rio. Depois de ter suado na trasfega da carga, comecei a suar muito mais, desta vez com o nervoso miudinho. Numa viatura sentado em cima dos caixotes, perguntava a mim mesmo o que fazer.

 Entretanto o alferes do destacamento veio informar, que o motor do barco que os levou para Bolama tinha avariado e que o capitão daquele quartel não autorizava a cedência do barco deles. Enviar uma mensagem para Nova Sintra a informar o que se estava a passar e pedir instruções? Isso iria de certeza criar problemas disciplinares aos fugitivos.

 Aguentei mais duas horas. Suava por todos os lados, até que ouvi o barulho do motor. Eram eles. Chegados, não houve tempo para conversas e iniciamos o regresso, sem que a estrada fosse novamente picada, o que era um risco muito grande. Chegamos bem ao destino. O alferes teve o bom senso de ir informar o capitão do que se tinha passado e o assunto morreu aí, salvo eventual raspanete.

Mas a história não acabou aqui, é que dois soldados também foram para Bolama e por lá adormeceram numa qualquer tabanca e ficaram. As férias antecipadas custaram-lhes sanções disciplinares


18 - COLUNA A S. JOÃO EM 08/12/69
Estrada Nova Sintra – S. João
Regresso à saída de S. João
Cais de S. João. Do outro lado é Bolama

A determinada altura a coluna parou. Foram verificados vestígios da passagem de elementos do PAIGC, tendo sido de imediato iniciada uma incursão na mata, para ver o que se passava. Ouviu-se um rebentamento. Fora acionada uma mina antipessoal, por um soldado da CCAV 2482, cujo pelotão estava destacado, temporariamente, em Nova Sintra.

De imediato foi pedida a evacuação e iniciada a preparação para a sua efetivação e na qual participei. Foi encontrada uma clareira na mata, mas mesmo assim foi necessário desmatar à catanada, mais alguma vegetação.

O helicóptero começou a sobrevoar o local e o piloto exigiu que a clareira tinha de ser alargada e devidamente sinalizada. As catanas voltaram à ação. Como sinalização tive uma ideia que foi posta em prática. Coloquei no centro do local de aterragem, duas t-shirts brancas, uma que levava vestida e outra que levava na viatura para servir de pijama, que foram cravadas ao solo com umas pequenas estacas.

Assim o helicóptero pousou em segurança e consumada a evacuação.


19 - COLUNAS DE REABASTECIMENTO A LALA

Lala é um local situado à beira de um rio, sem qualquer tipo de cais de acostagem, onde só iam as LDM que quase encostavam à margem, tendo as descargas de ser feitas rapidamente, conjugadas com as marés, para evitar que na maré baixa ficassem assentes na terra, correndo o risco de serem flageladas.


No final do trabalho toda a malta aproveitava para dar uns mergulhos e braçadas no rio.

(continua)

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Nota do editor

Último post da série de 8 de abril de 2025 > Guiné 61/74 - P26664: Vivências em Nova Sintra (Aníbal José da Silva, Fur Mil Vagomestre da CCAV 2483/BCAV 2867) (6): Pelotão de Caçadores Nativos 56 - Primeira vez debaixo de fogo e Emboscada virtual

4 comentários:

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Aníbal, cada companhia tem o seu cronista. Tu és o cronista dos "Cavaleiros de Nova Sintra". E está mais que aprovado. Tenho adorado ler as tuas crónicas. E nesta coluna logística a São João, frente a Bolama, e eu revi também o filme das que fiz, no penoso tempo das chuvas, de Bambadinca - Mansambo - Xitole - Saltinho, 60 km que levavam um dia inteiro...

Bem vistas as coisas, gastavamos uma energia do caraças a abastecermo-nos uns aos outros...Que guerra "divertida", a nossa!... Boa e santa Páscoa. Daqui de Candoz (Marco de Canveses), com um teleabraço fraterno (ainda haveremos de dar um ao vivo!|). Luís

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Olhem-me esse capim medonho com quase 3 metros de altura, estrangulando o trilho!... Parece que já ninguém se lembra destes "campos de trigo" semeados por um irã gigante... Passava-se na picada por ele, com o "cu apertadinho" e de dedo no gatilho...

Eduardo Estrela disse...

O chão de S. João também eu pisei. Em meados de outubro de 1969 as Ccaç 13 e 14 andaram praticamente durante uma semana em operações ao lado do itinerário S João - Nova Sintra.
Grande abraço
Eduardo Estrela

Anónimo disse...

Muitas vezes patrulhei a picada São João/Nova Sintra (Nov71/Dez/72) onde havia um fornilho plantado por um Furriel vindo de Bolama. Na altura eram poucas as colunas de abastecimento vindas de Nova Sintra.
Abraço transatlántico.
José Câmara