segunda-feira, 18 de novembro de 2019

Guiné 61/74 - P20362: Agenda cultural (714): 26 de novembro, 3ª feira, na Livraria-Galeria Municipal Verney, Oeiras, lançamento da 10ª edição do livro "Longas Horas do Tempo Africano", de Manuel Barão da Cunha. Prefácio de Isaltino Morais, presidente da CM Oeiras.


Capa da 10ª edição de "Longas Horas do Tempo Africano", do nosso camarada Manuel Barão da Cunha, cor cav ref,  que foi cmdt da  CCAV 704 / BCAV 705, Guiné, 1964/66. Em 1961, esteve em Angola  como alferes. Já em tempos foi-lhe feito um convite para integrar a nossa Tabanca Grande. Embora honrado pelo convite,  declinou, face às suas responsabilidades como animador de outras tertúlias.  Tem 70 referências no nosso blogue.


Manuel Barão da Cunha (n. 1938),
Alf cav,  Angola, c. 1961.
Foto de Fernando Farinha-


LANÇAMENTO DO LIVRO “LONGAS HORAS DO TEMPO AFRICANO”

O Município de Oeiras vai proceder ao lançamento da 10ª edição do livro “Longas Horas do Tempo Africano”, de Manuel barão da Cunha, no dia 26 de novembro, às 15:00, na Livraria-Galeria Municipal Verney. Rua Cândido dos Reis, 90, em Oeiras, cenro históricvo.

A apresentação estará a cargo de dr. Isaltino Morais, general Tomé Pinto, coronel Ataíde Montez e Daniel Gouveia, editor.



 

PREFÁCIO DE DR. ISALTINO MORAIS
PRESIDENTE DA CÂMARA MUNICIPAL DE OEIRAS

Alguém disse um dia que, nos bons livros, os prefácios sobejam e, nos maus, pouco adiantam. Incluindo desde já Longas Horas do Tempo Africano no rol dos títulos com qualidade, darei o melhor para que estas linhas possam, ainda que muito discretamente, valorizar esta edição reestruturada que agora se apresenta ao público.

Prefaciar este livro de Manuel Barão da Cunha representa para mim, quer como Presidente de Câmara, quer como simples cidadão, uma total
identificação com aquilo que sustento no dia-a-dia: uma Oeiras sempre a afirmar-se no terreno da promoção e da divulgação da Educação, da Cultura, do Conhecimento e do Multiculturalismo.

Enquanto narrativa literária, Longas Horas do Tempo Africano sustenta-se também no multiculturalismo e na interculturalidade,
evidenciando uma arquitetura centrada à volta da guerra e envolvida por um discurso ritmado, bem estruturado e tendencialmente autobiográfico.

Além disso, não tenho dúvidas que se trata de um título que dá visibilidade ao conceito de lusofonia no sentido em que, de forma lúcida e competente, aborda sonhos e inquietações da comunidade de povos e de etnias na antiga África de expressão portuguesa, designadamente de Angola e da Guiné-Bissau.

Ocorre que, da mesma maneira que nem todos estamos aptos a pintar uma tela ou a esculpir a pedra, a aptidão para a escrita é privilégio só de alguns. E se nem todos sabemos escrever livros, será certamente porque para isso é necessário motivação e talento, a par de uma boa dose de experiência, de maturidade, enfim, de “mundo”.

Quem se atrever a contar uma história sem tais atributos corre sérios riscos de ver desaparecer os leitores. E um livro sem leitores é como uma livraria sem livros. De facto, para contar uma história há que saber cativar a atenção de quem lê, porque contar uma história é saber reproduzir emoções e sentimentos. É saber interpretar o mundo que nos rodeia. E Manuel Barão da Cunha abalançou-se, com sucesso, a essa árdua tarefa em Longas Horas do Tempo Africano.

Feito nómada por via da condição de militar de carreira, desde muito cedo e em contexto de guerra, começou a pôr à prova a sua capacidade para, nos diversos cargos e funções por si desempenhadas, liderar e
desenvolver um conjunto de esforços para ajudar e cooperar na ajuda às populações africanas mais carenciadas. Em certo sentido poder-se-á dizer que Barão da Cunha praticou no terreno aquilo que alguns se limitam a defender na teoria: mesmo durante a guerra soube construir o bem comum, ajudando terceiros, por paradoxal que isto possa parecer.

Vem à colação recordar que Oeiras acolheu e realojou aquela que será provavelmente a maior comunidade cabo-verdiana na diáspora, ou seja, se o município de Oeiras se preocupou – e continuará a preocupar – com questões relativas ao bem-estar e à coesão social, também Manuel Barão da Cunha, em pleno teatro de guerra, sentiu a preocupação de contribuir para a melhoria da qualidade de vida das populações angolanas e guineenses com as quais contactou de perto, o que, naturalmente, merece desde logo o nosso franco louvor.

No meio de metralhadoras, de carros de combate e de morteiros, este militar dinâmico, culto e meticuloso, reaprendeu, digamos assim, tudo aquilo que sabia do mundo, no meio do mato. Tal como no cinema há uma educação apoiada a partir do olhar, e na filosofia uma reflexão sobre as mais diversas situações, Barão da Cunha terá reaprendido a ver o mundo, baseando-se no poder da interrogação e no poder do silêncio. Na esteira dos velhos filósofos, também o autor de Longas Horas do Tempo Africano faz caber a essência humana dentro dos quatro elementos naturais. O mesmo é dizer que conhecimento, energia, matéria e sentimento, estáveis ingredientes deste livro, se fundem com Ar, Fogo, Terra e Água, somados a muito esforço e a muita dedicação.

Parece ser que o autor se antecipou ao grande desafio do século XXI: a construção de novas formas de colaboração entre todos, em lógicas adequadas às complexas e exigentes expectativas dos tempos modernos.

Veja-se portanto em Longas Horas do Tempo Africano um belíssimo exemplo da proximidade entre povos e entre culturas, e em Manuel Barão da Cunha um novo explorador do continente africano, no sentido etnográfico e antropológico da palavra, fazendo-me até recordar Almada Negreiros no Portugal Futurista, obra com mais de 100 anos mas sempre atualíssima. Dizia Almada: «Eu não pertenço a nenhuma das gerações revolucionárias. Eu pertenço a uma geração construtiva».

Para nosso deleite este é um livro alimentado por uma narrativa bem medida e melhor organizada, confirmando estarmos na presença de alguém que domina a língua portuguesa e que sabe comunicar de forma interessante as suas ideias. De alguém que terá tido, na sua juventude, bons mestres na aprendizagem do idioma materno. Basta verificar como, ao longo de todas as páginas de Longas Horas do Tempo Africano,a estética direta e despretenciosa da frase coteja com a elegância e o rigor da análise, pormenor só mesmo ao alcance dos bons escritores.

Como se este atributo não fosse bastante, Barão da Cunha revela-se mestre na arte da observação de territórios e de almas, compondo ideias, descrevendo cenários, retratando gentes, criando diálogos e não se cansando nunca de refletir sobre vivências e de se interrogar sobre a natureza humana. Do mesmo modo que Almada, também Barão da Cunha pertence a uma geração construtiva. Associado à sua sensibilidade, tudo isto se traduz num inegável contributo para a historiografia portuguesa contemporânea sobre um dos acontecimentos mais impactantes da vida do nosso país: a guerra colonial ou a guerra de África (1961-1974) que, nos seus 14 anos de duração, mobilizou quase um milhão de jovens portugueses e que − 45 anos depois da “Revolução dos Cravos” − ainda terá abundantes feridas por cicatrizar e traumas por sarar.

Conveniente será destacar que a contribuição de Manuel Barão da Cunha é, neste campo, muito robusta. Basta ver a sua biobibliografia onde, para além de Longas Horas do Tempo Africano avultam – entre outras - obras como A Flor e a Guerra e Radiografia Militar. Depois, há também as dinâmicas preponderantes que impôs ao projeto editorial designado por Colecção Fim do Império, uma iniciativa de responsabilidade tripartida por Câmara Municipal de Oeiras, Liga dos Combatentes e Comissão Portuguesa de História Militar, com o propósito cívico de evitar o esquecimento sobre matéria tão dominante e tão influente na nossa História. Aos militares – e não militares – participantes neste projeto, aqui ficam as minhas mais sinceras felicitações.

Como antes afirmei, mais do que um mero exercício de escrita como memória de um mundo que tão bem conheceu, a obra que concentra agora a minha atenção, comporta-se como um registo autobiográfico ao espelhar a personalidade do autor. Na verdade Barão da Cunha convive bem com este conceito de memória cultural pois não tem qualquer fixação traumática com o passado, procurando tão-só que este funcione como uma espécie de bagagem necessária para que a sociedade saiba construir melhor o seu futuro. Consegue até evitar que aquilo vulgarmente designado por “passado negativo” se transforme em memória verdadeiramente ativa. E se o faz é justamente para não despertar revanchismos já que a memória pode ser perigosa e destrutiva caso desenterre ódios e rancores. Felizmente, nada disso sucede nesta obra de Barão da Cunha.

Longas Horas do Tempo Africano é, pois, um repositório de tolerância, bem como uma coletânea sobre confiança e sobre liderança.

Desperta-nos igualmente para três outras realidades: a primeira tem a ver com a importância do coletivo, em contraponto com o “cada um por si” ou com o “salve-se quem puder”. A outra relaciona-se com a necessidade de nós, em todas as circunstâncias – não nos limitarmos à compreensão de apenas uma parte do problema. Temos de fazer sempre o possível para compreendermos o todo. Mal comparado, será como olharmos para um puzzle tentando encaixar umas peças nas outras até encontrarmos uma imagem final que nos permita compreender todo o painel. Por último, uma terceira realidade: o peso e o valor de rápidas decisões, pese embora as tensões e as pressões do momento.

Longas Horas do Tempo Africano tem o mérito de tratar sensatamente todas estas questões. Todavia, em minha opinião, a virtudemmaior vai direitinha para a capacidade do autor, ele próprio um ex-combatente, analisar as fronteiras dos atos de bravura ou de cobardia.

Atente-se agora, com maior profundidade, no início do título escolhido por Manuel Barão da Cunha para esta obra: Longas Horas... São duas palavras que avançam a ideia de que, numa guerra, a momentos de extrema violência podem seguir-se horas de tédio e tremendo fastio.

Enfim, Manuel Barão da Cunha nesta sua revisitação de terras africanas deixa também antever muita imaturidade em termos de organização no dealbar de tudo, o que não deixa de ser natural num país que, quase de repente, se viu confrontado com uma guerra em três frentes:Angola, Guiné-Bissau e Moçambique. Curiosamente, também António Lobo Antunes, no seu romance Até que as pedras se tornem mais leves que a água, 2017, escreve sobre a vivência dos nossos jovens soldados, muitas vezes submetidos às desorientações e aos caprichos dos seus superiores.

Mas a guerra aprende-se a fazer e, passados os anos iniciais, cerraram-se fileiras e as tropas portuguesas tornaram-se num extraordinário exemplo de coragem e de superação.

Sei do que falo porque estive “lá”. Sei que a guerra nos afeta a todos, embora afete mais diretamente quem está no terreno. Dói mais na alma de quem, por força das circunstâncias, tem de estar alerta para tanto sacrifício e para tanta tormenta e desespero. E aquela terrível dúvida sempre a vir à superfície “naquelas longas horas”: para quê lutar? Porquê lutar? Incertezas a atravessarem-se no espírito dos soldados, como relata Manuel Barão da Cunha.

Quando se faz a guerra há que conhecê-la por dentro como Manuel Barão da Cunha procurou sempre fazer nos teatros de operações por onde passou. Acredito que não será fácil conhecê-la, nem será fácil esquecê-la.

Lembro-me ainda do impacto que tiveram Os Cus de Judas ou Memória de Elefante, outros notáveis livros de Lobo Antunes sobre esta temática.
– Mas porquê falar da guerra e escrever sobre a guerra? Porquê revisitá-la? Por catarse? Para se experimentar a liberdade em relação a uma memória opressora? Não sei, mas de uma coisa tenho a certeza: os efeitos traumáticos da guerra colonial ainda não deixaram de ser um assunto tabu em Portugal, talvez pelo sentimento de perda de que se reveste. Por isso mais valor dou a Longas Horas do Tempo Africano e a toda a historiografia da guerra colonial. Parabéns, Dr. Manuel Barão da Cunha, quer por este livro, quer pela Cruz de Guerra que lhe foi atribuída, premiando atos e feitos de bravura, por si praticados em campanha.

Concluo, esperando com este Prefácio não ter sido formal e redundante. Pela minha parte podem crer que procurei ser útil, objetivo, compreensível e conciso q.b. Muito mais poderia ser dito, é certo, sobre o livro, sobre o autor, sobre a guerra colonial e sobre regimes políticos. Até sobre o Município de Oeiras poderia ter falado um pouco mais. Vontade não me faltou… mas já fico feliz se tiver conseguido motivar todos para a leitura das páginas que se seguem, pois o autor merece-o.

E enquanto ficamos à espera do próximo livro de Manuel Barão da Cunha, deixem-me então findar o Prefácio – que vai longo – citando o Acto Constitutivo da UNESCO, Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura: «Nascendo as guerras no espírito dos homens, é no espírito dos homens que devem ser criados os baluartes da paz». Nada mais verdadeiro!»

_______________


FICHA TÉCNICA:

10.ª Edição: Câmara Municipal de Oeiras (CMO).

Título: Longas Horas do Tempo Africano.

Autor: Manuel Barão da Cunha (mbaraocunha@gmail.com , MBC).

Prefácio: dr. Isaltino Afonso de Morais, presidente da CMO.

Outros textos: drs. João Aguiar e M. Beja Santos; ten gen A. Tomé Pinto, V. Rocha Vieira, A. Sousa Pinto e J. Chito Rodrigues; alm J. Ribeiro Pacheco; gen A. Ramalho Eanes; eng.º M. Anacoreta Correia; prof. doutor H. Coutinho Gouveia; cor tir J. Costa Matos; drs. M. Homem de Mello, Sena e Silva, Luís Rosa e António Carrelhas; pintor e poeta A. Neves e Sousa, profs. doutores António Barreto, Manuel Belchior, Teresa Rita Lopes e René Pélissier; jornalista J. Paulo Guerra; ator Michael Caine; cor Ruben Domingues, José A. Montez, L. Dias Antunes, Álvaro Varanda e Paulo Domingos; outros: combatentes Fernando Farinha, Hélder Teixeira, Armando Inácio, Constantino de Brito, Edgar Silva, Vítor de Jesus, Manuel Dá Mesquita e Góis Pinto; luso-angolanas Teresa Richter, Açucena Arruda e Helena Pinto Magalhães; luso-moçambicana escultora Maria Morais.

Fotografia da capa: rapariga macua do Norte de Moçambique, de Pedro Cunha.

Edições anteriores:

Aquelas Longas Horas, narrativas sobre a atual epopeia africana, Serviço de Publicações da Mocidade Portuguesa, 1968.12, 1.ª edição, 115 pp, 4.000 exemplares;

Aquelas Longas Horas, 2.ª edição revista, do Autor, depositária EditorialmAster, Lisboa, 1970.12, 3.000 exemplares;

3.ª edição revista, do Autor, distribuição Didática Editora, Lisboa, 1971.12, 3.000 exemplares;

4.ª edição revista, do Autor, distribuição Agência Internacional de Livros e Publicações, Lisboa, 1972, 2.500 ex.; num total de 12.500.

1.ª e 2.ª Edições de Tempo Africano: Lisboa, Didática Editora, 1972, 3000 + 3.500 exemplares, 175 pp, num total de 6.500;

Tempo Africano, aquelas longas horas em sete andamentos, 3.ª/7.ª edição reorganizada e aumentada, Câmara Municipal de Oeiras, 2008.11, 368 pp, 500 exemplares; 

Tempo Africano, aquelas longas horas em 8 andamentos, 4.ª/8.ª edição
revista e aumentada, coleção Fim do Império, n.º 2, DG Edições, 2010.11, 508 pp,750 exemplares; 

Tempo Africano, aquelas longas horas, 5.ª/9.ª edição reestruturada, coleção Fim do Império, n.º 2, DG Edições, 2016, 366 pp, 300 exemplares; num total de 1.550 ex.; 

e um total global de 12.500 + 6.500 + 1.550 = 20.550 exemplares.
Composição e maquetagem: DG Edições.

_____________

Nota do editor:


Sem comentários: