terça-feira, 3 de julho de 2007

Guiné 63/74 - P1913: Bibliografia de uma guerra (20): A histórias das Enfermeiras Pára-quedistas (Beja Santos)

Título: Enfermeiras Pára-quedistas 1961 - 2002

Autor: Luis António Martinho Girão
Editora: Prefácio-Edição de Livros e Revistas.
Ano: 2006.
ISBN: 972-8816-90-1
E-mail: prefacio@mail.telepac.pt


ENFERMEIRAS PÁRA-QUEDISTASRecensão bibliográfica de Beja Santos (1)

A partir de 1956, as tropas pára-quedistas portuguesas marcaram presença em Portugal, na Guerra de África, no longínquo Timor e mesmo nos países balcânicos. Em 1961, Kaúlza de Arriaga leva o Governo a criar no âmbito do Batalhão de Caçadores de Pára-quedistas, o quadro de enfermeiras, que vão participar no auxílio a quem sofre, vestidas de uniforme camuflado. É essa a história que se conta em Enfermeiras Pára-quedistas, 1961-2002 (por Luís A. M. Girão, Prefácio, 2007).

A Força Aérea, em Março de 1961, desafiou enfermeiras voluntárias, já experientes, para prestarem assistência a feridos/doentes, evacuados por via aérea nas zonas de combate em Angola. Houve adesão imediata de 11 candidatas nas quais 6 alcançaram o respectivo brevê, sendo 5 delas antigas enfermeiras da Escola de Enfermagem Franciscanas Missionárias de Maria e uma da Escola de Enfermagem de S. Vicente de Paulo (2).

Foi nesta escola, teria eu 9,10 anos que assisti a uma festa de Natal em que participava a minha irmã como aluna ao lado da sua amiga Maria Arminda Lopes Pereira. Com o passar dos anos, antes, durante e depois de eu ter ido à guerra na Guiné, perguntava invariavelmente à minha irmã: “Tens sabido por onde anda a Arminda, a nossa pára-quedista?”

Este corpo de enfermeiras pára-quedistas era uma completa originalidade em Portugal, não havia tradição e cedo se revelaram transponíveis as dificuldades de encontrar candidatas com a qualificação necessária. O autor aproveita esta oportunidade para fazer um breve relato do historial da assistência sanitária em campanha, da presença da mulher na enfermagem e refere o aparecimento das enfermeiras pára-quedistas em França. Quanto à preparação, as candidatas tinham que ter treino no solo, treino no avião e praticar saltos de manutenção.

No caso português, para serem admitidas no curso de formação as candidatas deviam ter idade compreendida entre os 18 e os 30 anos e serem solteiras e viúvas sem filhos Em Maio de 61, definia-se o quadro de pessoal de enfermeiras, constituído por um tenente, 5 alferes e 5 sargentos, logo alterado no ano seguinte para 3 tenentes 9 alferes e 9 sargentos.

De acordo com a legislação portuguesa as missões e a dependência das enfermeiras pára-quedistas estavam definidas em Junho de 61 da seguinte maneira. Quanto às missões, deviam ser a prestação de assistência e enfermagem em locais de grande aglomeração de feridos e doentes, em hospitais militares e até mesmo em hospitais civis e noutras missões. Quanto à dependência, os enfermeiros equiparados a militares pára-quedistas ficavam subordinados ao regimento de caçadores pára-quedistas ou ao batalhões de caçadores pára-quedistas nº 21 ou 31.

Não foi pacífico, no seio das Forças Armadas, o aparecimento de mulheres com patente oficial e sargento, tais os preconceitos da época. No caso das tropas pára-quedistas, após alguma curiosidade inicial, o facto foi aceite com alguma naturalidade. À cautela, saiu uma ordem de serviço recordando que o pessoal feminino com graduação militar prestava e tinha direito às honras e saudações militares correspondentes aos seus postos.

Em Agosto de 61, duas enfermeiras partiram para Angola, actuando em zonas de combate, em inúmeras missões de acompanhamento de feridos e doentes evacuados de África para Lisboa. As enfermeiras foram plenamente aceites, alvo de respeito e carinho, o autor cita testemunhos de jornalistas acerca da solicitude por elas demonstrada.

Os boletins militares da época saudavam as “digníssimas enfermeiras pára-quedistas”, exteriorizando o orgulho que sentiam na sua colaboração e missão. Estas enfermeiras estiveram presentes nas missões de evacuação dos militares portugueses aprisionados pela União Indiana, em 1961 e 62, tendo recebido louvores pelo seu espírito de sacrifício e devoção.

O autor enuncia os cursos subsequentes, a partir de 1962. Em 73, é publicada a legislação que vai permitir a continuação do aproveitamento do pessoal de enfermagem nas organizações com carácter hospitalar da Força Aérea, mesmo quando perdesse esta qualificação. O ano de 1974 marcou o termo dos cursos de pára-quedismo destinado a enfermeiras, com a descolonização. Em 1975, as enfermeiras pára-quedistas regressaram a Portugal e foram nomeadas para desempenhar funções em serviços de saúde da Força Aérea. Mas em Agosto e Setembro de 76, estas enfermeiras tiveram a sua última missão, participando em acções de evacuação de civis, de Timor para Lisboa.

Em 1980, é publicada a legislação que determina a extinção progressiva do quadro de pessoal especializado em pára-quedismo equiparada a militar. Os oficiais e sargentos graduados enfermeiros pára-quedistas em serviço efectivo podiam, desde que o requeressem, transitar para a categoria de pessoal militar permanente.

Em Janeiro de 94, abria-se um novo capítulo para as tropas pára-quedistas portuguesas, extinguindo-se o corpo de tropas pára-quedistas e criando-se, no exército, o Comando das Tropas Aerotransportadas e a Brigada Aerotransportada Permanente.

Estas enfermeiras estiveram nas frentes de combate com desvelo, como tantos feridos e sinistrados recordam. Uma perdeu a vida, numa lamentável sinistro. Outra ficou marcada por uma bala traiçoeira. Foram boinas verdes abnegadas, cuja coragem foi escrita nalgumas das páginas mais ilustres e dignificantes das nossas Forças Armadas.
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Notas de L.G.

(1) Como diz o Beja Santos, "estas enfermeiras são uma das nossas recordações da Guiné".

(2) Hoje integrada no Instituto de Ciências da Saúde da Universidade Católica Portuguesa

1 comentário:

Luís Graça disse...

O acidente mortal aqui referido aconteceu na Guiné, em fevereiro de 1973, com a enfermeira pára-quedista Celeste Pereira. Segundo leio no post nº 1668, de 17 de Abril último, "ao correr para uma DO que se preparava para levantar voo a fim de proceder a evacuação, [a Celestse] foi morta pela hélice da avioneta que lhe cortou a cabeça, no aeroporto de Bissalanca" (Nota de rodapé do autor de 'Diário da Guiné', António da Graça Abreu, p. 64).