terça-feira, 19 de outubro de 2010

Guiné 63/74 - P7146: Historiografia da presença portuguesa em África (40): António Silva Gouveia, fundador da Casa Gouveia, republicano, representante da colónia na Câmara dos Deputados, na 1ª legislatura (1911-1915) (Parte IV) (Carlos Cordeiro)
















Lisboa > Câmara dos Deputados > Excertos de duas Intervenções do deputado António Silva Gouveia, representante da Guiné, em 1914, na sessão de 14 de Janeiro e depois em   14 de Maio ...).

 Fonte:  Debates Parlamentares > 1ªRepública (1911-1926) > Câmara dos Deputados > Direcção de Serviços de Documentação e Informação da Assembleia da República > Assembleia da República (2010) (Com a devida vénia...)


1. Continuação da publicação de excertos de intervenções do deputado António Silva Gouveia, empresário, fundador dsa Casa Gouveia, representante da Guiné na Câmara dos Deputados, na legislatura de 1911-1915 (*).   Pesquisa de  Carlos Cordeiro, membro da nossa Tabanca Grande, Professor de História Contemporânea na Universidade dos Açores, São Miguel, Região Autónoma dos Açores  (foto à esquerda).

No caso destas intervenções do deputado Silva Gouveia (*), em 1914, elas incidem sobre dois temas específicos da actualidade de então:

(i) Em de 11 de Dezembro de 1913, na região do Cacheu, o "administrador da circunscrição da Guiné", ao proceder ao recenseamento (arrolamento) da população local para efeitos de cobrança do "imposto de palhota" (sic), é morto, juntamente com um negociante local que o acompanhava, bem como a tripulação do escaler a vapor em que o representante da autoridades portuguesas se tinha deslocado. Chegada a notícia a Bolama, capital da colónia, o governador [, José António de Andrade Sequeira,] decidiu levar a cabo uma acção punitiva contra os felupes (presume-se)... Foi organizada uma força de "48 praças regulares e 350 auxiliares" (sic). Não sabemos o número de vítimas entre a população civil, mas do lado das forças coloniais houve 7 mortos e cerca de 3 dezenas de feridos... Os mortos eram todos soldados do recrutamento local. E é sobre as indemnizações a apagar às respectivas famílias que se centra a primeira intervenção do nosso deputado...

(ii) A segunda intervenção do deputado é um pedido de esclarecimento ao Ministro das Colónias sobre o imposto local, "ad valorem", lançado sobre as exportações da mancarra da Guiné...  Silva Gouveia fala em seu nome, como comerciante (já então com negócios com a CUF, a quem irá vender a sua empresa, c. 1927) e em nome de uma "comissão de negociantes" da Guiné...

Ficamos a saber que nessa altura já se cultivava a mancarra e que em 1913 as oleaginosas tinham baixado substancialmente de preço nos mercados internacionais, de tal maneira que o negociante pagava de imposto "ad valorem" 46$00 por tonelada na Guiné e em Lisboa não a conseguia vender por mais de 26$00...

O deputado levanta igualmente o problema da qualidade do produto: cerca de 15% da mancarra que era exportada continha impurezas, desacreditando a exportações da Guiné e lesando os interesses dos negociantes...
É de recordar que, com a abolição do comércio de escravos, em 1815, passa a haver, progressivamente,  um maior desenvolvimento do comércio dos produtos locais, o óleo de palma, o coconote, o amendoím, desde meados do Séc. XIX) e depois a borracha (desde 1890).  Em rigor, a mancarra era o único produto de cultura, os outros eram de simples colheita ou recolha. Eram estes praticamente os únicos produtos que a Guiné exportava, em troca da importação de tecidos, álcool e pouco mais...

Os principais negociantes, no terreno, eram os franceses (CFAO- Companhia Francesa da África Ocidental,  com sede em Marselha) e os alemães (Rudolf Titzck & Ca, com sede em Hamburgo).
A única empresa portuguesa implantada no terreno  era então a do António Silva Gouveia, o fundador da Casa Gouveia e deputado na 1ª legislatura da Câmara dos Deputados (1911-1915). O amendoím e a borracha iam preferencialmente para França. A borracha para a Alemanha.  Menos de 1/5 das exportações, no ínicio do Séc. XX, até às vésperas da I Guerra Mundial, tinham como destino Portugal...

De qualquer modo, é justo referir que a 1ª República se interessou pelo potencial económico que representavam as colónias portuguesas em África. Com Norton de Natos (1867-1955), Angola vai tornar-ser a "jóia da coroa" da República (**)...

A Guiné ainda vai passar por sucessivas guerras de "pacificação" até 1936, em que se destaca, entre 1912 e 1915,  a figura do Capitão Diabo, o "herói do Oio", João Teixeira Pinto (efígie em selo de 1946,  imagem à esquerda; como se sabe, Teixeira Pinto, angolano, de origem transmontana, irá morrer em 1917 no norte de Moçambique na luta contra os alemães).

A partir de 1927, a CUF, através da sua filial, Casa Gouveia, passa a ter o monopólio, de facto, do comércio externo da Guiné. Um novo regime alfandegário, agravado em 1932, vem penalizar as trocas comerciais da Guiné com outros países que não fossem Portugal... E é já no início da década de 1960 que aparece, no nosso mercado, o Óleo Fula (à revelia dos pobres fulas...), marca registada da Sovena ligada ao Grupo CUF... (LG)

______________

Notas de L.G.:

(*) Vd. último poste da série > 14 de Outubro de 2010 > Guiné 63/74 - P7125: Historiografia da presença portuguesa em África  (39): António Silva Gouveia, fundador da Casa Gouveia, republicano, representante da colónia na Câmara dos Deputados, na 1ª legislatura (1911-1915) (Parte III) (Carlos Cordeiro)



(**) Exposição a não perder, todos os dias, das 10h00 às 18h00, até 1 de Dezembro de 2010, na Cordoaria Nacional, em Lisboa:  Viva a República, 1910-2010

Sem comentários: