Timor Leste > Parque Dom Boaventura. Comemoração, dos 20 anos do referendo sobre a independência da Indonésia (1999-2019).
A estátua de Dom Boaventura foi inaugurada em 23 de novembro de 2012, por ocasião comemoração do 37° Aniversário da Proclamação da Independência (28 de Novembro de 1975 – 28 de Novembro de 2012) e do centenário da Revolta de Manufai, liderada por Dom Boaventura (1912 – 2012).
Foto: cortesia de Wikimedia Commons (editada pelo Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné, 2024)
1. No tempo da República, Timor era, como as restantes colónias portuguesas, parte integrante de Portugal (segundo o artº 2º da Constituição de 1911).
A desastrosa, mal planeada e sangrenta participação de Portugal na I Guerra Mundial, foi justificada pelos políticos da República como o imperioso dever do país face ao imperalismo alemão que olhava, com olhos de rapina, territórios como Angola e Moçambique. Timor ficava mais longe e podia ter menos interesse para as grandes potências coloniais europeias, com exceção da Holanda (hoje Países Baixos)...
A República (1910-19269) sempre defendeu, para as colónias, um modelo de descentralização administrativa e financeira, com recurso a um Alto Comissário ou governador. A instabilidade política, militar, social e económica da República não permitiu o aprofundamento e aperfeiçoamento do modelo.
Com a Ditadura Militar (a partir de 1926) e o Estado Novo (a partir de 1933), há um claro retrocesso na autonomia administrativa e financeira das colónias. O Acto Colonial (1930) vai ser integrado na Constituição de 1933. É o triunfo da perspetiva imperial na relação metrópole-colónias.
A relação da República com Timor e os timorenses também não será pacífica... Há a "revolta indígena" de Manufai (1911/12), cuja história merece um poste â parte. O triunfo das autoridades portuguesas e seus aliados vai marcar a consolidação da até então precária soberania em toda a parte oriental da ilha.( A delimitação da fronteira só fica resolvida em 25 de junho de 1914, com a devcisão do tribunal de Haia sobre o diferendo relatibvamente ao enclave de Oecussi-Ambemo: a demarcação no terreno só vai acabar em abril de 1915.)
Só para se ter uma ideia da pulverização do poder político, o território (do que é hoje Timor Leste) estava dividido em 71 reinos !...
Segundo o autor que lemos (Fernando Figueiredo, "Timor (1910-1955), in: "História dos Portugueses no Extremo Oriente", 4º volume: Macau e Timor no Períod0o Republicano", dir. A. H. de Oliveira Marques, Lisboa: Fundação Oriente, 2003, pp. 521-575), haveria alguns causas próximas para explicar a revolta, réplica de resto da iniciada em 1895, sob o governo de Celestino da Silva (desta vez liderada por Dom Boaventura da Costa Sottomayor, filho de Dom Duarte da Costa Sottomayor):
(i) a "troca de bandeiras" , com o fim da monarquia: os timorenses davam (e ainda dão) muita importància a simbolos nacionais como a bandeira: a sua lealdade ia para o rei e para a bandeira "azul e branca" da monarquia, de repente (em 29 de novembro de 1910) substituída por uma outra, "verde e rubra", a da República, que lhes era totalmente estranha;
(ii) a instabilidade da transição política foi aproveitada pelos holandeses para incitar os timorenreses à revolta contra os "novos senhores" da metrópole, e pôr em causa as fronteiras do território:
(iii) substituição da "finta" pelo "imposto de capitação " (imposto de palhota na Guiné); vem afetar os poderes gentílicos, limitar o poder discriconário dos "régulos" (ou "liurais");
(iv) escassa presença militar portuguesa no território (agravada pela longa distância, por via marítima, entre Lisboa e Díli).
Sobretudo o aumento do imposto de capitação (implicando também o arrolamento de coqueiros e gados, a principal riqueza dos timorenses), a par da proibição do corte de árvores de sândalo (prática sancionada com multas), é uma das razões fortes para a revolta de Manufai (ou a sua segunda edição) que ocorreu, em grande parte, durante o governo de Filomeno da Câmara Melo Cabral (1911-1917). A partir do reino de Manufai, a revolta conquista grande adesão das populações e levará mais tempo a ser debelada.
A resposta foi militar, com o envio de tropas oriundas da metrópole, de Goa, de Macau e sobretudo de Moçambique (os "landins"). A artilharia fez grandes razias. As baixas entre os revoltosos vão reflectir-se mais tarde na demografia do território. Fala-se em 5 mil a 20 mil mortos, números difíceis de confirmar.
A par disso, e como seria de prever, a forte repressão vai agravar as relações entre colonizados e colonizadores... O Estado anexa terras dos vencidos (caso da futura Sociedade Agrícola Pátria e Trabalho). O poder dos "liurais" passou a ser mais simbólico, mas mesmo assim o governador Filomeno da Câmara soube depois imprimir uma dinâmica de desenvolvimento e pacificação efetiva do território, política que será prosseguida com algum êxito até à II Guerra Mundial.
A revolta do régulo de Manufai será o último dos grandes levantamentos contra a autoridade colonial. E tende hoje a ser vista como uma "revolta protonacionalista", de cariz anticolonialista, "avant la lettre".
(...) A nobreza nativa sairá muito enfraquecida destas campnhas, mas, mesmo assim, a autoridade portuguesa continuou a não pretender ser mais do que superestrutura aglutinadora e arbitral das autoridades nativas dos vários reinos, embora se tornasse marcante factor de identidade e unificação política através da influência de uma cultura luso-timotense e do catolicismo, contrapostos ao islamismo e à influência calvinista holandesa excercida na restante Indonésia, do que resultou o tão impressionante e conhecido culton dos Timorenses pela bandeira portuguesa" (pág. 333).
PS - Num próximo poste apresentaremos alguns dados sobre a demografia do território antes da II Guerra Mundial.
Para saber mais: Jornal Tornado > As Revoltas de Manufahi em Timor-Leste | Por M. Azancot de Menezes | 26 Agosto, 2018
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Nota do editor:
Último poste da série > 15 de dezembro de 2024 > Guiné 61/74 - P26268: Timor Leste: passado e presente (29): Uma viagem de mais de um mês de Lisboa a Díli, no N/M holandês Sibajac, em agosto/setembro de 1936 (Cacilda dos Santos Oliveira Liberato, "Quando Timor foi notícia: memórias", Braga, Pax, 1972)
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