Pesquisar neste blogue

sábado, 22 de fevereiro de 2025

Guiné 61/74 - P26517: As nossas geografias emocionais (46): Quem se lembra do Café Portugal, junto ao Hotel com o mesmo nome, na Praça Honório Barreto (hoje Che Guevara) ?


Guiné-Bissau > Bissau > 1993 > Postal ilustrado: (i) em cima, várias paisagens do país; (ii) em baixo:  o edifício onde era o antigo Café Portugal (à direita), junto ao Hotel Portugal, na antiga Praça Honório Barreto (rebatizada Pr Che Guevara, a partir de 1975)... A escultura do Honório Barreto já há muito tinmha sido derrubada... É uma das raras imagens que temos deste estabelecimento... (Ninguém se lembrava de tirar fotos às fachadas dos "tascos" lá do sítio...).

Este postal foi trazido pelo ex-fur mil António J. P. Magalhães, infelizmente já falecido: pertencia ao 1º Gr Comb CART 1525, Os Falcões (Bissorã, 1966/67) (grupo de combate comandado pelo ex-alf mil Rui César S. Chouriço) e terá sido dos nossos primeiros camaradas a fazer uma "viagem de saudade" à Guiné-Bissau, depois do fim da guerra, em 1993.

Foto (e legenda): ©  António J. P. Magalhães (1993). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



Guiné-Bissau > Bissau > Praça Che Guevara > 2008 > Antiga Praça Honório Barreto. Foto do domínio público, cortesia de Wikipedia.

Guiné > Bissau > s/d [. c 1969/70] > "Praça Honório Barreto e Hotel Portugal"... Bilhete postal, nº 130, Edição "Foto Serra" (Coleção "Guiné Portuguesa") (Detalhe). Coleção: Agostinho Gaspar / Edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2010)

Agora a Praça chama-se Che Guevara... e o antigo Hotel Portugal era, em 2008,  o Hotel  Kalliste (que também funcionava como casino)...


1. Antes que desapareçam, definitivamente das nossas memórias (*) (e dos nossos álbuns fotográficos), vamos lembrar aqui algumas referências ao Café Portugal, que fazia parte do roteiro dos nossos "comes & bebes" em Bissau, a par de outros já falados: Café Bento ou 5ª Rep, Café e Pastelaria Império, Café Ronda, Cervejaria Solmar, Solar dos 10, Zé da Amura, Grande Hotel,  Pelicano, Nazareno,  Chez Toi, etc.

O Café Portugal não existe mais, tal como o Café Bento,  a Solmar, o Pelicano, etc. Eram tudo lugares da "Bissau Velho", colonial, que prosperaram com a guerra e durante a guerra... Depois da independência, os seus donos arrumarama as malas, e deixaram lá as paredes...

Bissau Velho, símbolo do colonialismo, foi votada ao desprezo e abandono... Os bissauenses, os velhos e os novos, também não tinham "patacão" para gastar nas esplanadas...Deixou de haver esplanadas... E  à noite, não havia iluminação pública... 

Enfim, era preciso construir um "país novo", um "homem novo", uma "pátria nova"... Agira com a ajuda dos suecos, dos russos, dos cubanos... Os "tugas" só passaram a fazer "turismo de saudade" a partir do final do século XX... Bissau Velho tinha poucos ou nenhuns atrativos para estes "saudosistas"... Preferiam calcorrear o mato, à redescoberta de lugares de que tinham boas e más memórias...(Sabe.se que no final da guerra as NT tinham uma de rede de cerca de 220 guarnições e destacamentos, fora as tabancas em autodefesa e onde com maior ou menor regularidade também havia reforço da tropa...)

Alguns dos nossos camaradas deixaram, no blogue,  referência breves, pontuais,  ao Café Portugal, dos anos 60 e princípios de 70. Eis um apanhado:


(i) Nuno Mira Vaz, hoje cor pqdt ref, antigo comandante do CCP 121 / BCP 12  (Brá, 1966/68):

(...) Recordo o Quartel de Santa Luzia com a piscina de águas tão espessamente esverdeadas que nada se via a dez centímetros de profundidade, o UDIB onde passavam filmes de cowboys, a Associação Comercial com os torneios de bridge e o naipe de restaurantes e cervejarias: o Café Portugal, o Zé da Amura, o Solar do Dez e o Grande Hotel. (...) (**)

(ii) Veríssimo Ferreira (1942-2022) (ex-fur mil, CCAÇ 1422 / BCAÇ 1858, Farim, Mansabá, K3, 1965/67) 

(...) As noites eram famosas e já apareciam simulacros de boites. Em momentos vagos, visitei a Sé, o Liceu,  o palácio do Governador (Arnaldo Schutlz, então), o Pilão, a  fábrica da gasosas, o Café Portugal, o Pintosinho, a Ultramarina, a casa Gouveia, o  BNU, a  rádio,  as tascas que serviam ostras ao natural, as..., enfim!!! (..) (***)

(iii) Álvaro Mendonça de Sousa, ex-fur mil, Manutenção Militar, 1966/68, e que mora em Ermesinde:

(...) E as escapadelas ao Bairro do Cupelon [ou Pilão], e as noitadas da cerveja e das ostras no Café Portugal? E as codornizes fritas do Zé da Amura? Que será feito do célebre Hotel Berta, onde se comiam os melhores gelados do Mundo? Mas o que mais me emocionou foi ver, através das fotos, o estado de ruína desta cidade de terra vermelha. 

Ao lembrar-me de tudo isto e ao escrever estas linhas não consegui travar algumas lágrimas. Sobretudo, porque à distância de quarenta anos no tempo, não mais consegui reunir todos os camaradas desse tempo, todos esses amigos que, como muito bem sabe, eram a nossa família de afinidade durante 24 os 25 meses de comissão. (...). (****)

(iv) Carlos Pinheiro (ex-1.º Cabo TRMS Op MSG, Centro de Mensagens, STM/QG/CTIG, 1968/70)

(... ) Tínhamos, na Praça Honório Barreto: o Internacional, o Portugal e o Chave de Ouro, tudo cafés/cervejarias mas também onde se comiam umas febras ou uns bifes, quando havia. (...) 

(v) David Guimarães (ex-fur mil at inf, MA, CART 2716 / BART 2917, Xitole, 1970/1972):

(...) Daqui a pouco, ilha do Sal e logo depois Bissalanca... e lá estávamos nós outra vez na Guiné... Caminho para a pensão Chantra - ou Chantre, já não me lembro… Bom, não interessa, era uma residencial onde se dormia. Que não era má e sobretudo não era cara, aliás nada era caro naquela terra ... para quem tinha dinheiro. E isso havia. Uma coisa: os graduados tinham, os outros nem tanto, parecia injusto, mas enfim...

Café Portugal ... que lindo, comprámos uma navalha cada um, três estalos (é que as havia de cinco). Aquela era de três. Mais um ronco... Aproveitei e comprei um relógio Seiko: que maravilha, trabalhava bem, o outro que eu tinha já havia apanhado água do rio Poulom (...).

À noite, uma volta... Sim,  lá para o escuro, para lados de Pilão... Porra, a certa altura uma mulher a gritar por não sei quem... Poça, vamos lá, era o único lugar com luz... De trás da árvore surge uma voz:

- O
h furriel, furriel!?

Furriel ?... Mas nós estávamos à civil !... Bem, lá atendemos às solicitações da mulher, nem sei o que ela queria, e afastámo-nos rapidamente para os lados da luz, os canivetes de 3 estalos abertos no bolso… Correu tudo bem, lá chegámos à residencial... Bem, aconteceu nada, mas como é que nós éramos furriéis, vestidos à civil? Fiquei a matutar nessa:

- Mistério… (...)

(Seleção, revisão / fixação de texto, negritos e itálicos: LG)

________________

Notas do editor LG:




(***) Vd. poste de 3 de março de 2013 > Guiné 63/74 - P11188: Os melhores 40 meses da minha vida (Veríssimo Ferreira) (27): 28.º episódio: Memórias avulsas (9): Do inferno para o céu

6 comentários:

Tabanca Grande Luís Graça disse...

É verdade, não tirávamos fotos à fachada dos "tascos" onde entrávamos... E muito menos à saída!...

Anónimo disse...

Saudosas recordações. Passados 56 anos, ainda tenho na memória, muitos destes lugares. Estive em Bissau várias vezes, quando cheguei, quando parti, quando vim jurar bandeira com as C.Cart.11 e C,Caç.12, quando vim de férias, e evacuado para o Hospital. Os cafés e restaurantes, o QG, onde consegi uma cama quando estava de baixa, e frequentei a piscina. No Serviço de Material, onde me arranjaram uma cama, com lençois lavados e mosquiteiro, dispensados por malta da Amadora, que eu conhecia e eram da Sorefame. Em termos de camaradagem, não tenho nada a reclamar, pois felizmente conhecia muita da gente que encontrei na Guiné, quer fosse da infância, da escola primária, secundária do trabalho BNU. Sempre fui bem recebido, onde tive que aportar. Não esquecendo Bambadinca, onde o meu colega Zé Carlos Lopes, me desenrascava uma cama, comida e bioxene, sempre que eu ia aao Xime, e ao Xitole. Recordações.
Um abraço a todos aqueles, que por aquelas paragens, passaram alguns meses da sua juventude.
Abílio Duarte - C. Art.2479/C.Art.11.

Anónimo disse...

Olá meu grande amigo Duarte. Agora fui apanhado que nem como no mato quando saímos para emboscadas de dia/noite por três dias a ração de combate. Agora estou muito debilitado e acamado com uma máscara de oxigênio e sem poder andar pela casa. Também me lembro das várias vezes que estive em Bissau mas ficava numa Pensão junto da Meteorologia, excepto quando chegamos e quando foi do juramento de bandeira dos nossos soldados fulas e da CCaç.12. Lembro-me dessa vez, enquanto esperávamos transporte para Bambadinca ou Xime, que tivemos de serviço à noite e os soldados toda a noite acordados sentados sobre os calcanhares diziam “não nossa terra”. E já passaram 56 anos !!!. Obrigado ao Luís Graça por ter telefonado, assim como ao ganda Cunha e ao Estrela que enviou uma mensagem “das fortes”, que muito me sensibilizaram. Um grande abraço Duarte é bom recordar aqueles tempos que tínhamos vinte e poucos anos e conhecemos as matas do leste da Guiné e Bissau do bioxene e das ostras com molho picante. Valdemar Queiroz (feito no smartphone fatela)

Anónimo disse...

Nunca conheci o Hotel nem o café Portugal.
Não me lembro nada destas imagens.
Nem em 1984 e 1985 quando andei por lá 4 vezes, não existia nada de nada....
Quando me deslocava a Bissau ou ia para o QG e ficava no Biafra, almoçava por lá, mas nas noites lá ia Santa Luzia abaixo, na minha motoreta andar por todo o lado na cidade, os bares, os cafés depois os restaurantes, os petiscos do Zé D´Amura e aquelas esplanadas todas na Av da Republica e a outra paralela que ia dar à Marinha e Solar dos Dez.
Mas muitas vezes ficava no Grande Hotel, era outra musica!
Mantenhas

VT/

Carlos Vinhal disse...

Devo ter dormido algumas, poucas, vezes no Hotel Portugal, a última em fins de Janeiro de 1972. Dormimos, eu, o Furriel de Alimentação Gabriel Costa e o camarada Lourenço Maciel, 1.º Cabo Atirador que devia estar connosco na condição de "ajudante de campo" do Costa. Cada noite custou-nos 120 pesos. Conservo ainda a Factura que tem o n.º 103. Em Fevereiro já a 2732 estava em Bissau a aguardar embarque pelo que as dormidas eram nos Adidos por conta do patrão.
Carlos Vinhal

Carlos Vinhal disse...

Já que sim.
No res-do-chão funcionava o Café Portugal, célebre pelas constantes cenas de pancadaria entre a tropa, que por lá eram frequentes. Guardo na memória um almoço de favas com chouriço, verdadeiro achado naquelas latitudes.
Carlos Vinhal