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quarta-feira, 16 de julho de 2025

Guiné 61/74 - P27020: Humor de caserna (203): O aerograma e a (in)comunicação (Alberto Branquinho)



Capa do livro de Alberto Branquinho, "Cambança: Guiné, morte e vida  em maré baixa", 2ª ed. revista. Lisboa, SeteCaminhos, 2009, 99 pp.




1. Pode o humor ser "cruel" ? Sim, não tem que ser "meigo". Sobretudo o "humor de caserna"... 

Numa folha A4, de 24 linhas, o nosso camarada Alberto Branquinho (ex-alf mil art, CART 1689 / BART 1913, Fá, Catió, Cabedu, Gandembel e Canquelifá, 1967/69), escreve um tratado sobre a (in)comunicação e os desastres que pode causar, agravada pela distância e a impossibilidade de "feedback" imediato. 

Há 60 anos atrás, recorde-se, não havia o telemóvel, a internet, as videochamadas, o whatsapp... Nem sequer, na maior parte dos casos, na Guiné, rede telefónica analógica...  

É um pequena obra-prima, esta história.  O aerograma, tão ansiado na volta do correio (por ambas as partes), também podia ser cruel, um punhal espetado no peito, a 4 mil km de distància, quando entre o emissor e o recetor surgia a dúvida, o equívoco, o mal-entendido, ou então, o ciúme, a suspeita, a repreensáo, o desalento, a incompreensão, a "boca foleira"...É um microconto de antologia, este. Parabéns, Alberto!



Humor de caserna  > O aerograma e a (in)comunicação

por Alberto Branquinho






Fonte: Título original "Acto 2 - Passeios".  In" Quatro Actos para Um Ponto de Vista", excerto de "Cambança", op. cit. pág. 18

(Seleçáo, digitalização, recorte, introdução e título: LG)
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Nota do editor LG:

Último poste da série > 1 de julho de 2025 >Guiné 61/74 - P26971: Humor de caserna (202): Dormir nu por causa do clima à noite e ter sonho "manga di bom": aerograma datado de Bambadinca, 1 de dezembro de 1969, dirigido à sua amada pelo nosso saudoso Fernando Calado (1945-2025)

9 comentários:

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Este trocadilho é genial: "tu a passear aí pela Guiné, de um lado para o outro, e eu que me f*da a trabalhar!", diz a mulher para o soldado, no aerograma...

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Em boa verdade, as famílias não sabiam o que é que os militares andavam a fazer, "lá fora"...

Tabanca Grande Luís Graça disse...

"Lá fora' era...no ultramar, a 4 mil, 8 mil, 12 mil km longe de casa...

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Afinal, quem não ouviu umas "bocas foleiras" dessas ? E logo de quem menos se esperava, de cunhados, primos, vizinhos, amigos, colegas...

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Afinal, quem não ouviu umas "bocas foleiras" dessas ? E logo de quem menos se esperava, de cunhados, primos, vizinhos, amigos, colegas...

Tabanca Grande Luís Graça disse...

"E que tal, hã!?... A comer e a beber do melhor, a f*der umas catraias e, ainda por cima, com graveto para comprar um mini!?"....

Eduardo Estrela disse...

Meus queridos amigos, camaradas e companheiros!!
Não sabiam e continuaram a não saber. Ainda me interrogo se realmente andei numa guerra ou se foi um sonho malvado.
Nunca a verdade foi comunicada. Após Abril de 1974 , os que andaram na lama quiseram esquecer o passado doloroso e os que deviam ter tido a sensatez de o contar, ignoraram-no.
Um país que ignora a história arrisca-se a regressar ao passado.
Abraço
Eduardo Estrela

Anónimo disse...

Naquele dia de 1973, um Furriel Atirador, da companhia de Nhala, deslocado com o seu pelotão em reforço da segurança aos trabalhos da estrada para Nhacobá, recebera um aerograma de uma irmã. Ela dizia-lhe, num registo implorativo, ainda que num discurso suave, mas denotando claramente pretender convencê-lo a aderir a algo crucial : " ...já te matriculei no curso x, espero por isso que logo que chegues comeces a frequentá-lo, porque tens que te preparar para a vida...". As palavras se não foram estas foram outras do mesmo sentido. Chamou-me, enfurecido com a irmã, para reler o aerograma perante mim. No fim decretou : ..." não volto a escrever-lhe ! ...pensa ela que eu estou aqui de férias , mas eu sempre que saio para o mato, situo-me entre a vida e a morte ! quero lá saber do Instituto ! quando escapar disto, se escapar, só penso em percorrer os caminhos do Algarve, livre como um passarinho, sem me preocupar com minas nem emboscadas" .
Era o João Calado, um grande amigo, um camarada de grande categoria. Morreu, sem precisar que o matassem, poucos anos depois de ter percorrido em liberdade, sem minas
nem emboscadas, os caminhos que escolheu.

Um grande abraço
Carvalho de Mampatá

Alberto Branquinho disse...

Obrigado Luís
Abraço
Alberto Branquinho
P.S. - Depois desse livro "Cambança" saiu um outro, com quase o triplo de páginas, a que chamei "Cambança final".