sexta-feira, 31 de janeiro de 2020

Guiné 61/74 - P20611: Historiografia da presença portuguesa em África (197): "Nha" Carlota (1889-1970) e Artur Lopes Nunes (1909-2007), dois portugueses de antanho



Guine-Bissau > Bissau > Av Amílcar Cabral (antiga Av República) > Foto do estabelecimento de Nunes & Irmão Lda, hoje Coimbra Hotel & Spa.

"Um hotel no centro da cidade, junto a Catedral de Bissau. Oferece aos hóspedes um espaço com piscina, ginásio, spa e também sala de reuniões para os hóspedes em viagem de negócios. O restaurante do hotel tem um buffet variado e segundo os hóspedes, muito saboroso. O pequeno almoço é servido num bonito e bem tratado jardim. O hotel fica a poucos metros de locais que merecem a sua visita, como por exemplo, o do Porto de Bissau, a zona mais antiga da cidade, Bissau Bedjo e a Praça dos Mártires de Pindjiguiti."

Tem também uma livraria, a livraria Coimbra. O Hotel está instalado no antigo estabelecimento, um dos mais importantes ds época colonial, da firma Nunes & Irmão Lda, fundada por Artur Lopes Nunes (1909-2007). O negócio continua na família há 3 gerações.

Cortesia da página do Facebook de Hotel Coimbra




1. Há figuras, civis,  que atravessaram a história do séc. XX da Guiné-Bissau (*), e que merecem ser aqui recordadas, como é o  caso das "mulheres grandes" retratadas em livro pelo nosso amigo e camarada António Estácio, "Nha" Bijagó (1871-1959)  e "Nha" Carlota (1889-1970) (**) ... Ou "africanistas" como "Manel Djoquim", o homem do cinema ambulante (1901-1977), cuja história de vida é-nos contada pela sua filha mais nova, Lucinda Aranha. Mas também empresários como António da Silva Gouveia, que criou a Casa Gouveia, ou Artur Nunes, fundador, com o seu irmão Gentil, da firma "Nunes & Irmão Lda". (***)

A história que o Estácio conta do Artur Nunes e da "Nha" Carlota merece ser aqui recordada, como testemunho da forte personalidade desta mulher grande, que foi Carlota Lima Leite Pires (1889-1970) mas também dos valores (honradez, bom nome, reputação, integridade, palavra dada, lealdade, hospitalidade, morabeza, etc. ...) de uma época e que hoje parecem arredados do código de ética do mundo dos negócios.

"Apesar da sua avançada idade, Artur Lopes Nunes, que chegou à Guiné em 1927, referiu que 'Nha' Carlota era cliente  da firma 'Nunes & Irmão', a qual lhe fornecia, a crédito, entre outros produtos, aguardente, tabaco, tecidos, etc., que, por sua vez, ela revendia na loja que possuía no Cumeré e, mais tarde, em Nhacra." (pag. 81).

Entrevistado, em 2006 (, se não erro,)  por António Estácio, que reconheceu a sua "lucidez impressionante", declarou que ambos, ele e "Nha" Carlota, "sempre se deram bem mas isso não impediu que, a dado passo, tivesse ocorrido  uma situação mais delicada".

Ora o que é que aconteceu? "Certa vez, 'Nha' Carlota pretendia adquirir uns produtos sem que, como aliás era hábito, houvesse saldado o montante do fornecimento anterior."

O Artur Lopes Nunes aproveitou o ensejo para lhe lembrar essa dívida, e o respetivo valor. "Sem dar resposta, e naturalmente ofendida, 'Nha' Carlota continuou a ver a mercadoria e, pouco depois, retirou-se sem levar nada".

Passa-se um ou dois dias, até que a mulher grande voltou a Bissau, foi direita à loja do seu fornecedor, "trazendo um saco que entregou ao propietário, informando-o que era o pagamento da dívida." (pág. 82).

Artur Nunes (1909-2007).
Foto; cortesia
de António Estácio
Não sem surpresa, o Artur Nunes abriu o pesado saco e verificou que "estava cheio de moedas de um escudo e cinco tostões". Tanto quanto se lembrava a dívida rondava os dois mil escudos (ou "pesos"), ou seja, cerca de 2 contos, um valor razoável para a época.

(...) "Com sorriso, rematou dizendo:
- E eu pra ali fiquei a contar todo aquele montante em moedas! Como era de esperar, a quantia estava certa."

Moral da história: "Esta foi a melhor forma que 'Nha' Carlota encontrou para responder ao comerciante fornecedor onde tinha uma dívida por saldar e onde continuou sempre a gozar de crédito" (pág. 83).

Artur Lopes Nunes (1909-2007) era natural de Cadafaz, Góis, concelho do distrito de Coimbra. Morreu na Parede, Cascais, com 98 anos feitos. Tinha ido  para a Guiné, em 1927, com 18 anos, na qualidade de empregado da firma João Marques de Carvalho & Companhia, com sede em Bolama. Viajou no N/M "Aboím", na companhia do patrão e da esposa deste, bem como do novo governador da Guiné, o major de infantaria António Leite de Magalhães, nomeado para substituir o tenente coronel Jorge Frederico Velez Caroço.

Fonte: António  Estácio . Nha Carlota, figura esquecida da História Guineense – Ed. do autor, 2010, 116 pp. 
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Notas do editor:

(*) Último poste da série > 29 de janeiro de 2020 > Guiné 61/74 - P20605: Historiografia da presença portuguesa em África (196): Relatório do Governador da Guiné, Contra-Almirante Francisco Teixeira da Silva, referente a 1887-1888 (Mário Beja Santos)


(**) Vd. poste de 20 de maio de 2010 > Guiné 63/74 - P6434: Notas de leitura (109): Carlota Lima Leite Pires, 'Nha Carlota' (1889-1970), de António Estácio (Mário Beja Santos)


(***) Vd. poste de 30 de janeiro de 2020 > Guiné 61/74 - P20608: Roteiro de Bissau: fotos de c. 2010, de um amigo do Virgílio Teixeira, empresário do ramo da hotelaria - Parte III

Vd, também poste de 3 DE MARÇO DE 2015

Guiné 63/74 - P14317: Historiografia da presença portuguesa em África (60): O caso da empresa Nunes & Irmão Lda., dos irmãos Gentil e Artur Nunes GENTIL E ARTUR NUNES. (Jorge Araújo)

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