1. O nosso camarada Mário Fitas, enviou-nos, do seu livro, Putos, Gandulos e Guerra, um trecho onde conta o episódio do rebentamento de uma mina AP que vitimou um alferes da Arma de Artilharia, militar que à partida estaria a salvo deste lamentável episódio. CV
Capa do livro de Mário Vicente, Putos, Gandulos e Guerra (2000).
Foto: © Luís Graça & Camaradas da Guiné (2007). Direitos reservados.
2. “Putos Gandulos e Guerra”
(Transcrição de IX – Guerra 2)
Mário Fitas
Foto: © Luís Graça & Camaradas da Guiné (2007). Direitos reservados.
2. “Putos Gandulos e Guerra”
(Transcrição de IX – Guerra 2)
Mário Fitas
Foto 1> Estrada Cufar-Catió> Elementos da CCAÇ 763 em progressão
Foto 2> Estrada Cufar-Catió> Elementos da CCAÇ 763 em progressão
Foto 3> Estrada Cufar-Catió> Elementos da CCAÇ 763 em progressão
Havia apenas oito dias, sobre a varredela em Cabolol, e eis que o 2.º Grupo de Combate tem de partir para Catió e levar o Pelotão de Artilharia. Nessa noite, um grupo da milícia estacionado em Priame, detecta que a estrada foi minada, pelo que temos de voltar ao sistema de picagem da mesma. Sorte!...
Mesmo ao cimo da leve subida, quando a estrada entra no túnel da mata após o vale de capim que separa aquela do cruzamento do Cabaceira, foram detectadas duas “meninas simpáticas, blenorrágicas prostitutas Anti/Carro” que por nós esperavam, para nos “fornicarem” o corpo. Que grande porra!... As viaturas e os obuses no vale e, se somos emboscados, estamos com as calças na mão. Há que deitar mãos à obra rapidamente e rebentar as minas, coisa que ainda dá problemas pois, o maluco do Chico Zé as quer levantar em vez de rebentar. Não pode ser!... E se estão armadilhadas? Felizmente que ele é o único com essa ideia, e o Almeida não autoriza. Vagabundo brinca com Chico Zé:
- Oh pá, Zé, porra!... estás farto da malta? Queres-te ir embora já?...
E era verdade, porque estavam armadilhadas.
Mesmo ao cimo da leve subida, quando a estrada entra no túnel da mata após o vale de capim que separa aquela do cruzamento do Cabaceira, foram detectadas duas “meninas simpáticas, blenorrágicas prostitutas Anti/Carro” que por nós esperavam, para nos “fornicarem” o corpo. Que grande porra!... As viaturas e os obuses no vale e, se somos emboscados, estamos com as calças na mão. Há que deitar mãos à obra rapidamente e rebentar as minas, coisa que ainda dá problemas pois, o maluco do Chico Zé as quer levantar em vez de rebentar. Não pode ser!... E se estão armadilhadas? Felizmente que ele é o único com essa ideia, e o Almeida não autoriza. Vagabundo brinca com Chico Zé:
- Oh pá, Zé, porra!... estás farto da malta? Queres-te ir embora já?...
E era verdade, porque estavam armadilhadas.
Foto 4> Estrada Cufar-Catió> Segurança montada enquanto se levantam as minas AC
Depois de rebentadas, deixaram uma cratera que cabia lá um Unimog! Toca a tapar o buraco para as viaturas passarem. Trabalho efectuado, viaturas passadas, pessoal em segurança, vai um minutinho para fumar um cigarrito. Em todos os trabalhos se fuma, como se diz na minha terra, costumava Vagabundo dizer.
Foto 5> Estrada Cufar-Catió> Um tempo para fumar um cigarro
Vamos então verificar como funciona a guerrilha, altamente organizada e eficiente contra a nossa ainda ingenuidade. Fumando o cigarro, juntaram-se em amena cavaqueira de guerra nada menos nada mais que: três alferes, três furriéis milicianos e um milícia, Zé de nome e Libanês de nacionalidade, sendo de alcunha portanto, o “Zé Libanês” e que também ninguém sabia porque é que aquela espécie aparecia fazendo a guerra.
Conversa animada no grupo quando, num repente, um clarão chama aflorou da terra, secundado de um grande estrondo e o grupo foi atirado cada um para seu lado. Chico Zé de gatas, em frente de Vagabundo, dizia para este:
- Estou ferido!… Estou ferido!...
Vagabundo vergado, apalpando-se todo da cabeça aos pés, sem olhar para o seu companheiro e tendo em atenção apenas a confirmação da apalpação que a si próprio fazia e só com o sentido em si, respondia ao companheiro:
- Não, não estás!
Por momentos a mente de todos entrou no vazio.
Um gemido, levou-os a voltarem à realidade. Olharam na direcção do gemer agora mais forte, e todos viram o alferes de Artilharia estendido na berma. Perna direita levantada, onde apenas uma óssea forca tíbio-perónia aparecia por entre a chamuscada calça camuflada, pois o pé direito tinha desaparecido. Porra!... uma mina Anti/pessoal.
- O enfermeiro depressa!
Gritou Almeida.
O artilheiro, que em princípio não ia p’ró mato nem andava no duro e na dança, ali estava agora a receber os primeiros socorros, com esfacelamento total do pé direito, fractura do terço inferior na mesma perna, queimaduras na coxa esquerda e nos braços. Mais um inválido com vinte e quatro anos!
O cabo de transmissões entra em contacto com o aquartelamento que de imediato, pede evacuação a Bissau que será depois feita de avião. Mas agora como vai ser? Há que levar o camarada para Cufar. Mais outra loucura. Mas a guerra é isto!... Chico Zé, cara toda chamuscada, camuflado cheio de terra, oferece-se:
- Eu levo o Évora para Cufar !
Todos conhecemos a perícia do Zé, autêntico condutor de ralis, mas é perigoso voltar só. Almeida decide rapidamente. Acede e manda subir para o Unimog o enfermeiro entregando-lhe uma G3 e nomeia outro soldado, que também salta para a viatura. Chico Zé dá a G3 ao condutor que sede o lugar e salta para o lugar deste e, com o ferido esticado na caixa, o enfermeiro e soldado segurando o infeliz, arrancam direito a Cufar. É assim a guerra: ou ficamos todos, ou salvamos um!...
Almeida manda o cabo transmitir para Cufar, de onde saem uma auto-metralhadora e o piquete para vir ao reencontro.
O enfermeiro depois contou que nunca tinha andado assim de carro.
Aquela “merda” até andava só sobre duas rodas!
Conversa animada no grupo quando, num repente, um clarão chama aflorou da terra, secundado de um grande estrondo e o grupo foi atirado cada um para seu lado. Chico Zé de gatas, em frente de Vagabundo, dizia para este:
- Estou ferido!… Estou ferido!...
Vagabundo vergado, apalpando-se todo da cabeça aos pés, sem olhar para o seu companheiro e tendo em atenção apenas a confirmação da apalpação que a si próprio fazia e só com o sentido em si, respondia ao companheiro:
- Não, não estás!
Por momentos a mente de todos entrou no vazio.
Um gemido, levou-os a voltarem à realidade. Olharam na direcção do gemer agora mais forte, e todos viram o alferes de Artilharia estendido na berma. Perna direita levantada, onde apenas uma óssea forca tíbio-perónia aparecia por entre a chamuscada calça camuflada, pois o pé direito tinha desaparecido. Porra!... uma mina Anti/pessoal.
- O enfermeiro depressa!
Gritou Almeida.
O artilheiro, que em princípio não ia p’ró mato nem andava no duro e na dança, ali estava agora a receber os primeiros socorros, com esfacelamento total do pé direito, fractura do terço inferior na mesma perna, queimaduras na coxa esquerda e nos braços. Mais um inválido com vinte e quatro anos!
O cabo de transmissões entra em contacto com o aquartelamento que de imediato, pede evacuação a Bissau que será depois feita de avião. Mas agora como vai ser? Há que levar o camarada para Cufar. Mais outra loucura. Mas a guerra é isto!... Chico Zé, cara toda chamuscada, camuflado cheio de terra, oferece-se:
- Eu levo o Évora para Cufar !
Todos conhecemos a perícia do Zé, autêntico condutor de ralis, mas é perigoso voltar só. Almeida decide rapidamente. Acede e manda subir para o Unimog o enfermeiro entregando-lhe uma G3 e nomeia outro soldado, que também salta para a viatura. Chico Zé dá a G3 ao condutor que sede o lugar e salta para o lugar deste e, com o ferido esticado na caixa, o enfermeiro e soldado segurando o infeliz, arrancam direito a Cufar. É assim a guerra: ou ficamos todos, ou salvamos um!...
Almeida manda o cabo transmitir para Cufar, de onde saem uma auto-metralhadora e o piquete para vir ao reencontro.
O enfermeiro depois contou que nunca tinha andado assim de carro.
Aquela “merda” até andava só sobre duas rodas!
Foto 6> Estrada Cufar-Catió> Elementos da CCAÇ 763 de novo em progressão
Quando a auto-metralhadora e o Unimog do piquete faziam a aproximação para entrar na estrada Cufar-Catió, o Chico Zé entrava no fundo da pista a alta velocidade deixando os outros para trás, fazendo a inversão de marcha.Primeira vítima da estrada maldita! Eles não perdoam!...
Foto 7> Estrada Cufar-Catió> Elementos da CCAÇ 763 junto de uma autometralhadora Daimler
Cufar informa e continuamos para Catió.Chegados a Catió não dá para mais nada: é largar os obuses e correr para o cais, pois há que embarcar para o Cachil na ilha do Como. Temos de fazer a segurança àquele desterro, enquanto os desterrados vão efectuar uma operação ao Tombali. É chegarmos nós e saírem eles.
Ficam o Primeiro Sargento e os cozinheiros, para nos darem as explicações sobre a defesa deste forte Apache. Também não tem explicação plausível pois, é já lugar comum, que só quem passou por terras da Guiné e pelos diversos aquartelamentos pode aquilatar do poder de adaptação do valoroso soldado português. Desfalcados, com cozinheiros e outros pobres de Deus, defender um aquartelamento daqueles?!... E se o IN soubesse, e fosse lá? Escaqueirava aquela “merda” toda e os que não morressem seriam apanhados à mão. Já não vale a pena comentar pois, por vezes, sente-se mesmo a tristeza e a impotência de uma tropa tipo pé descalço.
Quero antes Cufar onde há ar e espaço; quero ir para a estrada; prefiro morrer nas matas de Cabolol do que aqui entoupeirado neste pequenino murado "quintal.”
Mário Fitas
Fotos: © Mário Fitas (2007). Direitos reservados.
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Nota do co-editor CV
Vd. Post Guiné 63/74 - P2034: Bibliografia de uma guerra (22): Putos, gandulos e guerra, de Mário Vicente, aliás, Mário Fitas (CCAÇ 763, Cufar) (Carlos Vinhal)
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