O Luís Carvalhido, membro da Associação Portuguesa dos Veteranos de Guerra (APVG), foi soldado de transmissões da CCS do BART 3873 (Bambadinca, 1972/74). É natural de (e residente em) Barcelos. Pertence à nossa tertúlia desde Abril de 2005, tendo entrado pela mão do Sousa de Castro, do mesmo batalhão (CART 3494, Xime e Mansambo, 1972/74).
Foto: Jornal de Barcelos. 9 de Julho de 2003 (com a devida autorização) (1)
1. Mensagem do nosso camarada Luís Carvalhido, com data de 14 de Julho:
Assunto - Barcelos Popular, 27/06/2007, página 5
Meu caro Luís:
Na data supra referida o Director do jornal Barcelos Popular, no seu editorial, fez uma análise medonha ao comportamento dos veteranos de guerra, nas províncias ultramarinas.
Segue a resposta que amanhã lhe vou entregar em mão. Se achares de interesse, podes redestribuir.
Um abraço,
Luís Carvalhido
2. O editor do blogue mandou-lhe, entretanto, a seguinte mensagem, em resposta ao camarada Luís Carvalhido:
Luís: Não tens cópia, em suporte digital, do editorial em causa ? Fui ao sítio do jornal mas não consegui localizar o dito editorial. Eles chegaram a publicar a tua resposta ? Se sim, diz quando, em que data...
Temos que ser objectivos e imparciais, publicando os dois pontos de vista... Não gostaria que isto parecesse uma polémica local, paroquial, no contexto de Barcelos (cidade, de resto, de que eu gosto, tal como toda a região)...
Tens que me dizer o que se passou exactamente: Barcelos inaugurou um monumento aos mortos do ultramar, o jornal (que é ideologicamante mais próximo da esquerda, é isso ?) não gostou e desancou... Tu respondeste, usando o trocadilho e a ironia (director inferior / geração superior)... Enfim, para garantir o pluralismo, eu preciso da outra peça... Pode ser ? Um abraço do Luís Graça e dos co-editores, CV e VB.
3. Em 27 de Julho último, o Carvalhido eslcareceu as minhas dúvidas:
Meu caro Luís:
Para que entendas a questão: Em Barcelos criou-se uma comissão para a feitura de um monumento ao combatente, vulgo veterano de guerra.
Este Director, presumivelmente homem de esquerda, contra a qual nada tenho, malha em tudo aquilo que lhe parece espiga, caindo na tentação de misturar alhos com bogalhos. Nada disso me importa desde que os factos relatados coincidam com total verdade e imparcialidade histórica.
Em nome de coisas que assisti na Guiné, tal como vós aliás e em nome do princípio de quem não esteve lá não pode saber nem pode sentir, considerei importante vir a terreiro dar a minha humilde opinião.
Como saberás, para nós nesta causa não deve existir esquerda nem direita, mas tão sómente aquilo que cada um perdeu... aquilo que cada um sentiu... mas muito mais importante: aquilo que cada um ainda não esqueceu.
Um abraço do companheiro ao dispor, relançando daqui o apelo a qualquer um de vós que por perto passe não hesite em me contactar. Estarei sempre disponível para um abraço.
Em breve recebes tudo aquilo a que me estou a referir.
Um abraço
Luis Carvalhido
4. Nova mensagem do nosso camarada de Barcelos:
Caro Luís:
Tal como combinado sou a enviar o artigo [editorial de 27 de Junho de 2007, publicado na página 5, sob o título Guerra Colonial: o último dos monumentos] que me levou a ir ao Barcelos Popular, entregar em mão aquela resposta que te enviei. Segue, noutro email, a resposta que adequei ao Jornal de Barcelos, uma vez queo Director editorialista [do Barcelos Popular] não foi capaz de me dizer nada, ou de escrever nada daquilo que eu lá deixei.
Um abraço
Luis Carvalhido
5. Artigo de opinião enviado pelo Luís Carvalhido ao Barcelos Popular ( auto-intitulado "semanário regional, democrático e independente "):
Um Director inferior faz parecer inferior uma geração superior
Senhor director do Barcelos Popular, li o seu editorial de 27 de Junho findo [vd. imagem em anexo, em cópia digitalizada do polémico artigo]. Devagar, devagarinho, como mandam as regras, tentei entender as suas críticas, à feitura do tal monumento que classifica de várias maneiras, todas elas muito pouco abonatórias.
Naturalmente que a sua opinião face ao monumento não me incomoda muito, até porque não faço parte da Comissão Organizadora. No entanto, como homem da tal ocupação, já não posso calar-me ao ler tamanhas obscenidades, provocadas a meu ver, por uma enorme falta de conhecimentos da realidade, ou por qualquer tipo de obaudição. Naturalmente que se fosse uma pessoa qualquer, não perderia tempo com a questão mas como o senhor é um ilustre Director, de um jornal da cidade, não posso deixar de lhe perguntar algumas coisas importantes, para depois lhe poder dar outras informações mais próximas da realidade.
Que idade tinha em 1961, no início da guerra colonial? E que idade tinha em 1974, data em que a mesma acabou? Era filho de uma família rica? Que formação política tinha nessa ocasião? Naturalmente que lhe faço estas perguntas porque penso, que foi um dos que fugiu graças ao poder económico da família.
Não quero crer que seja mais um daqueles que em Abril ainda andavam com as fraldas sujas e que pouco tempo depois já arvoravam em pseudo qualquer coisa. Já agora, antes de lhe dizer o que representa o monumento, porque me parece que o senhor Director nunca terá investigado o suficiente acerca do assunto, ou então terá lido aqueles que escrevem o que o momento dita, permita-me que lhe diga que fui um SOLDADO deste país e que prestei serviço na Spinolândia de Janeiro de 1972 até Abril de 1974.
Por este tempo de aprendizagem, atrevo-me a deixar-lhe outro tipo de informações que não contêm qualquer saudosismo bolorento. Inicio esta lição, dizendo-lhe que um batalhão com cerca de seiscentos homens apenas tinha cerce de dúzia e meia de SOLDADOS do quadro. Sendo assim e se ainda se lembra da regra de três simples, pegue num milhão de homens e veja quantos são os tais que mataram sadicamente, acobertados pela cédula salazarista.
Depois, senhor Director, deixe-me dizer-lhe o que pode representar o tal hediondo monumento: ele simboliza enaltecimento ao tal milhão de oprimidos que não tinham condições económicas para fugir.
Sim, senhor Director, ou será que já se esqueceu que éramos um povo pobre e que muitos, desse tal milhão, viviam na miséria? O senhor não, de certeza, por aquilo que as suas palavras deixam entender. Ele também simboliza a perda dos melhores anos da vida de um jovem; tempo de procura e tempo de decisões.
Embora só sejam cerca de onze mil os oficialmente reconhecidos, o monumento, senhor Director, também representa aqueles que caíram, vitimados pela tal opressão e pela falta de meios de fuga. Ele representa coxos, cegos, manetas e amputados da mente, vítimas para a vida inteira de outro tipo de opressão.
E não estarão lá representadas as mulheres e os filhos daqueles a quem ofende? Não serão estas mulheres e estes filhos tão sofredores, como aqueles que aprecem em primeiro plano? E, se o senhor soubesse um pouco de nada, disto, perceberia que esse monumento também lembra, pelo menos na nossa memória, os soldados africanos que tombaram do outro lado e do nosso lado. Mas isso, senhor Director, só nós é que sabemos porque o senhor e os outros não aprenderam.
Eu sei que isto já vai longo e eu teria muito, mas mesmo muito mais, para dizer se não soubesse o quanto é difícil arranjar um cantinho de opinião no seu jornal. Eu sei, que a si, tudo isto lhe parecerá pouco e eu até o compreendo, mas espere até lhe dizer o que representa o monumento. Ele representa um milhão de mães Portuguesas que não tinham dinheiro para mandar fugir os filhos e que sabiam menos de objecções de consciência que o senhor Director e os outros politicamente instruídos.
E para não mencionar muitas outras coisas, deixe só lembrar-lhe que o monumento também representa aqueles que, a um tempo, matavam e estropiavam; no outro, abriam estradas, construíam hospitais, ensinavam a ler e a escrever Português, curavam feridas, davam vacinas e praticavam medicina.
Não queremos branquear nada, senhor Director, e tal como o senhor não desejo a guerra. O monumento também afirmará isso, mas esta é a nossa história que só peca pela falta de qualidade com que os intelectuais deste país a escrevem ou a pintam. E já agora, para terminar, deixe lembrar-lhe, que o senhor, ao chamar a Câmara para o assunto, cometeu um erro, mais um, pois devia lembrar-se que também ocupa o lugar de director de um jornal, porque existem assinantes, pelos quais não demonstrou qualquer respeito, uma vez que usou o seu poder para entrar pelas casas dentro, ofendendo muitos que nelas moram.
Envergonhemo-nos, sim: da sua pequeníssima e pobre análise à questão e da utilização medíocre que deu à página cinco do Barcelos Popular da data supra referida.
Luís Carvalhido – Guiné 1972 / 1974
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Excertos do editorial do director José Santos > Guerra colonial: o último dos monumentos
A iniciativa de construir, no concelho, um monumento de homenagem aos ex-combatentes nas antigas colónias não é nova nem tampouco inédita no nosso país.
De facto, em muitas outras terras de Portugal (…) , esta mal disfarçada intenção de branquear um passado de crime e ocupação selvagem que a todos nos devia envergonhar, tem sido intencionada omitida a pretexto de um alegado tributo aos que ingloriamente tombaram no campo de batalha (…).
Para este peditório não damos. Mesmo que por detrás do movimento barcelense se encontre gente de bem e imbuída das melhores intenções. E a Câmara – eleita em regime democrático – tem a obrigação de obstar à concretização de 8uma obra que (…) só nos envergonha.
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Nota de L.G.:
(1) Vd. 21 de Julho de 2006 > Guiné 63/74 - P977: Antologia (52): A guerra que Portugal quis esquecer (Luís Carvalhido, ao Jornal de Barcelos)
Meu caro Luís.
Na data supra referida o Director do jornal Barcelos Popular, no seu editorial fez uma análise medonha ao comportamento dos veteranos de guerra, nas províncias ultramarinas.
Segue a resposta, que amanhã lhe vou entregar em mão. Se achares de interesse, podes redestribuir.
Um abraço
14/7/07
Um Director inferior, faz parecer inferior uma geração superior.
Senhor director do Barcelos Popular, li o seu editorial de 27 de Junho findo. Devagar, devagarinho como mandam as regras, tentei entender as suas críticas, à feitura do tal monumento, que classifica de várias maneiras, todas elas muito pouco abonatórias. Naturalmente que a sua opinião face ao monumento não me incomoda muito, até porque, não faço parte da Comissão organizadora, no entanto, como homem da tal ocupação, já não posso calar-me ao ler tamanhas obscenidades, provocadas a meu ver, por uma enorme falta de
conhecimentos da realidade, ou por qualquer tipo de obaudição. Naturalmente que se fosse uma pessoa qualquer, não perderia tempo com a questão mas como o senhor, é um ilustre Director, de um jornal da cidade, não posso deixar de lhe perguntar algumas coisas importantes, para depois lhe poder dar outras informações mais próximas da realidade.
Que idade tinha em 1961, no inicio da guerra colonial? E que idade tinha em 1974, data em que a mesma acabou? Era filho de uma família rica? Que formação politica tinha nessa ocasião? Naturalmente que lhe faço estas perguntas porque penso, que foi um dos que fugiu graças ao poder económico da família. Não quero crer, que seja mais um daqueles, que em Abril ainda
andavam com as fraldas sujas e que pouco tempo depois, já arvoravam em pseudo qualquer coisa. Já agora, antes de lhe dizer o que representa o monumento, porque me parece que o senhor Director nunca terá investigado o suficiente acerca do assunto, ou então terá lido aqueles que escrevem o que o momento dita, permita-me que lhe diga que fui um SOLDADO deste país e que prestei serviço na Spinolandia de Janeiro de 1972 até Abril de 1974. Por este tempo de aprendizagem, atrevo-me a deixar-lhe outro tipo de informações, que não contêm qualquer saudosismo bolorento. Inicio esta lição, dizendo-lhe que um batalhão com cerca de seiscentos homens apenas tinha cerca de dúzia e meia de SOLDADOS do quadro. Sendo assim e se ainda se lembra da regra de três simples, pegue num milhão de homens e veja quantos são os tais que mataram sadicamente, acobertados pela cédula salazarista.
Depois senhor Director deixe-me dizer-lhe o que pode representar o tal hediondo monumento: ele simboliza enaltecimento ao tal milhão de oprimidos que não tinham condições económicas para fugir. Sim senhor Director, ou será que já se esqueceu que éramos um povo pobre e que muitos, desse tal milhão, viviam na miséria? O senhor não, de certeza, por aquilo que as suas palavras deixam entender. Ele também simboliza a perda dos melhores anos da vida de
um jovem; tempo de procura e tempo de decisões. Embora só sejam cerca de onze mil os oficialmente reconhecidos, o monumento senhor Director, também representa aqueles que caíram, vitimados pela tal opressão e pela falta de meios de fuga. Ele representa coxos, cegos, manetas e amputados da mente, vitimas para a vida inteira de outro tipo de opressão. E não estarão lá representadas as mulheres e os filhos daqueles a quem ofende? Não serão
estas mulheres e estes filhos tão sofredores, como aqueles que aprecem em primeiro plano? E, se o senhor soubesse um pouco de nada, disto, perceberia que esse monumento também lembra, pelo menos na nossa memória, os soldados africanos que tombaram do outro lado e do nosso lado. Mas isso senhor Director, só nós é que sabemos porque o senhor e os outros não aprenderam.
Eu sei que isto já vai longo e eu teria muito, mas mesmo muito mais para dizer se não soubesse o quanto é difícil arranjar um cantinho de opinião no seu jornal. Eu sei, que a si, tudo isto lhe parecerá pouco e eu até o compreendo, mas espere até lhe dizer o que representa o monumento. Ele representa um milhão de mães Portuguesas que não tinham dinheiro para mandar fugir os filhos e que sabiam menos de objecções de consciência que o senhor Director e os outros politicamente instruídos. E para não mencionar muitas outras coisas, deixe só lembrar-lhe que o monumento também representa aqueles, que a um tempo, matavam e estropiavam; no outro, abriam estradas, construíam hospitais, ensinavam a ler e a escrever Português, curavam
feridas, davam vacinas e praticavam medicina. Não queremos branquear nada senhor Director, e tal como o senhor não desejo a guerra. O monumento também afirmará isso, mas esta é a nossa história, que só peca pela falta de qualidade com que os intelectuais deste país a escrevem ou a pintam. E já agora, para terminar, deixe lembrar-lhe, que o senhor, ao chamar a Câmara
para o assunto, cometeu um erro, mais um, pois devia lembrar-se que também ocupa o lugar de director de um jornal, porque existem assinantes, pelos quais não demonstrou qualquer respeito, uma vez que usou o seu poder para entrar pelas casas dentro, ofendendo muitos que nelas moram.
Envergonhemo-nos sim: da sua pequeníssima e pobre análise à questão e da utilização medíocre que deu à página cinco do Barcelos Popular da data supra referida.
Luís Carvalhido – Guiné 1972 / 1974
Blogue coletivo, criado por Luís Graça. Objetivo: ajudar os antigos combatentes a reconstituir o "puzzle" da memória da guerra colonial/guerra do ultramar (e da Guiné, em particular). Iniciado em 2004, é a maior rede social na Net, em português, centrada na experiência pessoal de uma guerra. Como camaradas que são, tratam-se por tu, e gostam de dizer: "O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande". Coeditores: C. Vinhal, E. Magalhães Ribeiro, V. Briote, J. Araújo.
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1 comentário:
Ao Luís Carvalhido, em particular;
a Todos os Veteranos de Guerra, em geral.
O que no "post" acima ficou transcrito, motiva-me apenas o seguinte "comentário":
A minha incondicional solidariedade para com quem ousa, nos tempo que correm, ser cidadão-de-corpo-inteiro e, assim, socialmente "incorrecto".
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