Blogue coletivo, criado por Luís Graça. Objetivo: ajudar os antigos combatentes a reconstituir o "puzzle" da memória da guerra colonial/guerra do ultramar (e da Guiné, em particular). Iniciado em 2004, é a maior rede social na Net, em português, centrada na experiência pessoal de uma guerra. Como camaradas que são, tratam-se por tu, e gostam de dizer: "O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande". Coeditores: C. Vinhal, E. Magalhães Ribeiro, V. Briote, J. Araújo.
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sábado, 25 de outubro de 2025
Guiné 61/74 - P27352: Os nossos seres, saberes e lazeres (706): Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (227): Do Alto Tâmega até Pedrógão Grande, acabou-se a semana de férias – 6 (Mário Beja Santos)
Queridos amigos,
Não escondo que saímos da Galiza de monco caído, aquela sensação que mais uns dias de vadiagem na região nos poria o astral em cima, mas levantou-nos o ânimo saber que havia uma paragem numa belíssima cidade no Alto Tâmega, Chaves, falei da presença romana e de uma ponte chamada de Trajano, como não há outra igual em Portugal, e das fortificações, porque os flavienses tiveram muito que penar, logo o Rei de Leão que quis abocanhar este território; pelas minhas contas, não vinha a Chaves há quase meio século, com que prazer fiz a sua famosa Rua Direita, toda ela cheia de história, os vestígios medievais, barrocos, as prosperidades oitocentistas e novecentistas - e o resultado da gestão autárquica em democracia. Foi tudo a correr, pretende-se chegar a Pedrógão Grande, um estirão, ainda com luz do dia. Férias magníficas, temperaturas mais do que amenas, a canícula veio na semana seguinte. E, moral da história, vimos a Lousã, o sul da Galiza e Pedrógão Grande antes da devastação dos fogos. Amarga coincidência, findámos o roteiro desta viagem junto ao monumento das vítimas do grande incêndio do Pedrógão Grande de 2017. Nem nos passava pela cabeça que outros fogos vinham a caminho, poucas semanas depois.
Um abraço do
Mário
Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (227):
Do Alto Tâmega até Pedrógão Grande, acabou-se a semana de férias – 6
Mário Beja Santos
Era ponto assente que quando regressássemos do sul da Galiza havia uma paragem na cidade de Chaves, mais do que aqui amesendar os concelebrados pastéis e bom fumeiro que a região oferece tinha saudades de regressar a Aquae Flaviae, se a memória não me falha andei por aqui nos tempos em que fiz programas de televisão, isto entre as décadas de 1970 e 1980, estava mortinho de curiosidade de ver a diferença de quase meio século. E ganhei muito com a surpresa. Arrumado o carro, seguimos para a ponte romana, concluída no tempo do Imperador Trajano, entre o fim do século I e o princípio do século II d.C. Nos preparativos da viagem, folheei umas resmas de papel sobre Chaves, recordar a história faz sempre bem. Até porque há vestígios da Pré-História, a presença romana foi muito significativa, seguiram-se suevos e godos, muçulmanos, veio a Reconquista Cristã, foi um não mais parar de acontecimentos desde que a Póvoa de Chaves surgiu por iniciativa de D. Afonso III. Num livro de Paulo Dordio intitulado Chaves e as suas Fortificações andei a ver desenhos dos tempos medievais, da vila renascentista, das estruturas de fortificação e baluartes, tudo fruto da posição de Chaves, que foi muito apetecida por Leão, que se preparou para os embates da Guerra da Restauração.
Também pedi ajuda ao Google, para saber o que havia de mais significativo para admirar: a Torre de Menagem e o que resta do Castelo, há uns panos de muralha dispersos; a Igreja Matriz; não perdera a ocasião de mirar a meio da ponte os dois documentos epigráficos que falam do tributo das gentes flavienses e dos dez povos que ajudaram na sua construção; no meio daquela informação recordei as minas de volfrâmio, as águas minerais Campilho e Vidago, lembro-me perfeitamente de as ver em cafés e restaurantes; quer no Google quer na papelada lida recordava-se os Paços do Duque de Bragança, que aqui morrera e tem túmulo o primeiro Duque, D. Afonso, no Convento de S. Francisco; recordava-se também que se deveria visitar a Igreja da Misericórdia em estilo barroco, revestida de azulejos. Ponto final, começamos a atravessar a ponte de Trajano, à cautela, numa tentativa de dar a dimensão da ponte sobre o Tâmega, tirei a imagem à distância.
É uma obra notável de engenharia com cerca de 150 metros de cumprimento. Os doze arcos visíveis são de volta perfeita e formados por enormes e robustas aduelas de granito. Há pelo menos mais seis arcos soterrados pelas construções, de um lado e do outro do rio.
Um dos dois belos exemplares epigráficos vindos de outras proveniências. Recorde-se que por aqui passava a Via de Augusto.
Igreja Matriz, de raiz medieval, desse período conservou a imponente torre, rasgada por duas sineiras; tem portal românico. As transformações que ocorreram no século XVI são particularmente visíveis nos portais. O templo estava fechado, não pude contemplar os belos painéis de azulejos, ficará para a próxima.
Igreja da Misericórdia, construída no século XVII, portanto barroca. A fachada do templo granítica, antecedida de uma escadaria também de pedra, está pormenorizada e cuidadosamente decorada por pilastras e janelas. Pelo que me foi a ler, tem o interior de uma só nave, paredes inteiramente revestidas de azulejos. A fachada posterior do edifício tem a particularidade de assentar e aproveitar o paramento externo da cerca urbana medieval.
Câmara Municipal, começou por ser palacete para residência de António de Souza Pereira Coutinho, morgado de Vilar de Perdizes. Foi adquirido pela Câmara. Do seu corpo central sobressai o portal principal, ladeado por dois óculos ovalados, e no topo o frontão triangular com brasão no tímpano, encimado por relógio. Ainda fui espreitar a entrada da Câmara, a sua imponente escadaria em granito e os azulejos azuis com cenas campestres.
Há reminiscências da Chaves medieval. Reza um dos documentos que consultei que nesse tempo a população alojava-se em edifícios estreitos com dois ou três andares, onde predominavam varandas estreitas no primeiro andar e no segundo e terceiro andar varandas suspensas. As varandas avançadas para a rua eram a forma de rentabilizar o espaço intramuros. Hoje, as ruas conservam o velho aspeto medieval, exibindo da tipologia das suas casas elementos da construção dessa época. As varandas coloridas, em madeira de castanho ou pinheiro subsistem, ainda, por toda a cidade velha.
Esta é a Torre de Menagem. Mostro-vos a informação que encontrei ali perto, achei-a bem esclarecedora, é, sem margem para dúvida, de uma grande beleza este ponto de referência do que foi o Castelo de S. Estevão.
Condicionado pelo tempo, ainda calcorreámos a Rua Direita, era inevitável ver a fachada dos Paços do Duque de Bragança e o belo pelourinho. Porquê o Duque de Bragança em Chaves? Pela simples razão de que o senhorio foi doado a Nuno Álvares Pereira que o cedeu ao genro, o Conde de Barcelos, entrando assim na Casa de Bragança.
Tenho de voltar, e com alguma presteza. Esta sede de concelho, com uma área total de cerca de 591Km2, esta cidade de Chaves que é cidade desde 1929, tem monumentos nacionais relevantes, bem me apeteceu entrar na magnificente biblioteca, mas não me podia esquecer que íamos pernoitar a Pedrógão Grande, para uma outra romagem de saudade. Logo que possa, manda a curiosidade, hei de ler qualquer coisa sobre Chaves na Guerra de Restauração e como foram os combates de Chaves entre as forças de Paiva Couceiro e as do Governo Republicano.
Agora vamos amesendar e segue-se um estirão de viagem, ala morena que se faz tarde, fechei provisoriamente o livro flaviense e já começo a recordar os anos que passei em Pedrógão Grande e Pedrógão Pequeno, temos passado férias com um tempo magnífico, a canícula vem para a semana, e era impensável imaginarmos, quando fomos contemplar o monumento desenhado por Souto Moura em homenagem aos mortos do incêndio devastador de 2017 que estava para breve uma nova tempestade de fumo em 2025.
Não vou causticar o leitor repisando imagens desta região chamada Pinhal Interior, já mostrei as belezas do Cabril, uma região que fascinou o pintor Alfredo Keil, dizem que tirou elementos para a coreografia da sua ópera A Serrana, vinha acompanhado por Giuseppe Cinatti, cenógrafo do Teatro de São Carlos, por pudor não mostro as paredes incendiadas de uma casa recuperada no meio da floresta, mas não escondo o júbilo de mostrar a praia fluvial de Mosteiro, aprazível, na memória de familiares e amigos que fizerem vilegiatura em Pedrógão Grande ou Pedrógão Pequeno, a região tem belíssimas praias fluviais, esta está na memória de todos.
Antes de partirmos para Lisboa, viemos recordar os mortos daquele abominável incêndio de 2017, perto da estrada onde tanta gente morreu ergue-se uma fonte de vida, obra traçada pelo arquiteto Souto Moura, ao fundo, como se fossem lápides, estão esculpidos os nomes dos falecidos. Ensimesmados com tal tão dolorosa recordação, entramos no carro, é o regresso a Lisboa. E na conversa começamos a idealizar a próxima viagem, fala-se muito no Planalto Mirandês, há quem alvitre o início da primavera, há para ali um parque natural, de nome Montesinho, que se cobre de tapetes de flores. Porque a viagem nunca acaba, e aqui dentro do carro estão viajantes impenitentes. Até à próxima!
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Nota do editor
Último post da série de 18 de outubro de 2025 > Guiné 61/74 - P27331: Os nossos seres, saberes e lazeres (705): Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (226): Em S. Estevão de Ribas de Sil, no passeio termal de Ourense – 5 (Mário Beja Santos)
Guiné 61/74 - P27351: Humor de caserna (216): BA 12, Bissalanca: os tomates... da horta do capelão: uma história pícara que mete a nossa querida enfermeira pqdt Giselda e o seu "olheiro" na BA 12, o ex-ten pilav Miguel Pessoa... Um pequena homenagem póstuma ao major capelão Abel Gonçalves (1931-2019), que foi chefe do serviço de assistência religiosa da FAP.
Guiné> Bissalanca > BA 12 > s/d (c. 1972/74) > Uma enfermeira paraquedista, colhendo limões diretamente do limoeiro. Foto gentilmente cedida por Miguel Pessoa.. [Ele próprio acabou, em comentário ao poste P4065 (*) por identificar a enfermeira, que de resto é uma das protagonistas da história que se conta a seguir: a Giselda, Antunes, de solteira, Pessoa, de casada]
1. Mensagem, a seguir, do Miguel Pessoa (ex-ten pilav, BA 12, Bissalanca, 1972/74, hoje cor pilav ref, casado com a Giselda (nenhum deles precisa de apresentações, porque são justamente o casal mais mediático da guerra da Guiné e, mais do que isso, o casal mais "strelado" do mundo: se vivessem nos EUA e tivessem feito a guerra do Vietname, já estariam há muito no Guiness):
Data - 21 mar 2009
(...) envio-te este texto ligeirinho, um pouco "revisteiro", que, na minha ótica, embora não sendo escrito por nenhuma delas, me foi contado por uma das intervenientes, pelo que penso que talvez possas incluí-lo na série "As Nossas Queridas Enfermeiras Paraquedistas".
(...) Embora eu goste de escolher os títulos dos meus textos, deixo ao teu critério a escolha do título para este trabalho, por recear que possa ser mal aceite aquele que eu escolhi.(,,,) (*)
No meu tempo na Guiné, os tomates do capelão da BA12 eram muito cobiçados, muito por culpa das nossas enfermeiras paraquedistas que, sempre que podiam, faziam uma colheita na horta que o padre A... mantinha junto à igreja da Base.
Era generalizada a opinião, entre quem deles se servia, de que os tomates do nosso capelão, embora pequenos, eram sumarentos e saborosos e enriqueciam qualquer salada. E sabe-se o gosto que o pessoal tinha por tudo o que lhe lembrasse a metrópole. E era vê-los a "deitar abaixo" uma saladinha feita com tomates fresquinhos, acabadinhos de apanhar...
É claro que o padre A... calculava perfeitamente quem eram os malandros (neste caso as malandras...) que lhe andavam a "derreter" a fruta, mas pactuava simpaticamente com a situação, dado ser por uma boa causa.
Mas não se ficava pelos tomates a razia que as enfermeiras paraquedistas faziam na fruta da base. Para além da fruta que iam comprando ao responsável pela horta da Base, lá iam marchando de vez em quando uns limões, uma papaia, que o pessoal a alimentar era muito e de bom apetite.
Nem o cajueiro do Comandante escapava (do Comandante é um modo de dizer, que estava junto ao comando da Base), sendo que, um dia, havendo uma escada à mão, duas enfermeiras (de que não vou referir os nomes...) resolveram atacar o dito cujo.
O facto é que o Comandante não reconheceu "as intrusas", pois se viam apenas as calças do camuflado, pelo que invectivou energicamente as duas "delinquentes", julgando que eram soldados da Polícia Aérea; e as duas no topo da árvore também não reconheceram a voz do Comandante, pelo que reagiram verbalmente em termos que não vou reproduzir aqui...
Tendo as partes procedido à identificação mútua, o incidente acabou por ficar sanado, pese embora o Comandante tenha prosseguido a sua viagem resmungando contra a lata daquele pessoal, sublinhado por um sorriso complacente dos militares que o acompanhavam.
Miguel Pessoa
2. Comentário do editor LG:
Miguel: esta tua historieta pícara já "tem barbas", foi publicada por nós há 16 anos (!) (*)...
O humor (talvez mais do que a sorte) é que protege os audazes... Que me perdoem os nossos camaradas dos comandos, se lhes estou a glosar a divisa Audaces fortuna juvat [A sorte protege os audazes]...
O humor (temperado q.b.) era, na Guiné, na BA 12 ou em Bambadinca, o nosso talismã, a nossa mezinha, o nosso amuleto mágico, o nosso cinto de segurança, o nosso cordão detonante, a nossa "droga"... contra as balas de amigos e inimigos, contra a costureirinha, contra a Kalash, contra o RPG, contra o Strela (ainda não o havia no meu tempo, sou mais velhinho do que tu...), contra o tédio, contra o desânimo, contra o medo, contra a desesperança dos dias, contra as abelhas, contra os mosquitos, contra o cozinheiro, contra o vagomestre, contra o sargento, contra o RDM, contra o capitão, contra o comandante, contra o Com-Chefe, contra Deus e o Diabo...
O género, que tu cultivas tão bem, neste e noutros teus textos bem humoarados, não é fácil, é preciso muito talento para não se cair na grosseria, na boçalidade, na alarvice, registos com que muitas vezes, mas injustamente, se confunde o humor de caserna...
De facto, grande cultivador deste género era o nosso saudoso Jorge Cabral (1943-2021) a quem nunca, por nunca, ouvi dizer um palavrão, tanto lá como cá.
Tudo isto para te dizer que os tomates da horta do capelão, surripiados pelas nossas queridas enfermeiras paraquedistas, continuam a ser uma história de cinco estrelas, que merece ser republicada (os "periquitos" nunca a leram...) e figurar numa próxima antologia do nosso humor de caserna...
Um dos alferes comete a brejeirice, diz-lhe: "Sabes o que estavam os soldados a dizer? Que viram os limões ao capelão!”.
Não ficou sem resposta: “É para que fiquem a saber que os capelães também têm dessa fruta!”. (...)
Infelizmente o Pe. Abel Gonçalbes já morreu, em 1 de abril de 2019, aos 87 anos. Era natural de Pias, conselho de Cinfães, distrito de Viseu. nasceu no dia 1 de novembro de 1931 e foi ordenado Padre no dia 15 de agosto de 1958.
Foi capelão do Exército, acabando por ser transferido para a Força Aérea Portuguesa em 24 de novembro de 1969. Era major, esteve na Chefia do Serviço de Assistência Religiosa da FAP. passou à reforma em 14 de agosto de 1981 (Fonte: Ordinariato Castrense).
Miguel e Giselda, não sei se o padre Abel Gonçalves chegou a ler esta história. Ele devia conhecer o nosso blogue, através do Beja Santos. De qualquer, a sua republicação é também uma homenagem a ele e a todos os nossos capelães que passaram pelo CTIG: 113 no total, 102 no exército, 7 na FAP e 4 na Marinha.
Que Deus, Alá e os bons irãs o tenham em bom descanso, lá o assento etéreo para onde vão as nossas almas, dizem os crentes.
Notas do editor L.G.:
(*) Vd. poste de 21 de março de 2009 > Guiné 63/74 - P4065: As Nossas Queridas Enfermeiras Pára-Quedistas (7): Os tomates do Capelão da BA 12, Bissalanca... e outras frutas (Miguel Pessoa)
sexta-feira, 24 de outubro de 2025
Guiné 61/74 - P27350: Agenda Cultural: António Graça de Abreu, "Conversas Sábias: Os fascínios de uma grande cidade, Pequim"... 30 de outubro, quinta-feira, 17:30, Auditório do Centro Científico e Cultural de Macau (CCCM)
"Apareçam, meus Amigos. Vou falar e mostrar Pequim, de 1977 a 2025. Fotografias únicas, experiências curiosas. Um português à deriva pela capital da China, com os pés assentes na terra e na brisa." (Facebook, sexta-feira, 24 de outubro de 2025, 14:19)
Último poste da série > 22 de outubro de 2025 > Guiné 61/74 - P27342: Agenda cultural (905): Exposição do artista plástico António Carmo, "Diálogo das Cores", patente ao público até Dezembro, com entrada gratuita, no Museu Municipal Santos Rocha na Figueira da Foz
Guiné 61/74 - P27349: Em busca de... (329): Fur Mil Art Silva, de Rio Tinto - Porto, que fez parte da CART 6552/72 (Cameconde, Cacine e Cabedú, 1973/74), companhia que, estando mobilizada para S. Tomé, acabou por ir cumprir a sua comissão de serviço na Guiné (João Ferreira, ex-Fur Mil Art da CART 6254/72)
Caros camaradas
Procuro ex-Furriel Mil, Silva, de seu apelido, estampado na farda de trabalho. Somos do 2.º Turno/72, Leiria/Caldas, especialidade atirador na EPA Vendas Novas, (vínhamos os dois à boleia para o Porto, quando não havia autocarro).
Colocados no RAP-3 na Figueira da Foz, onde fomos mobilizados, eu para a Guiné, ele para S. Tomé e Príncipe (a Companhia/Batalhão, foi depois transferida/o para a Guiné, por interferência do Gen. Spínola).
Ele é de Rio Tinto-Porto, e a casa dele ficava à face da EN 15, que atravessa Rio Tinto, onde pernoitei uma vez devido ao avançado da hora, e já não haver comboio para a Póvoa de Varzim, onde moro.
Sei que os elementos de identificação que vos dou são muito poucos, mas com a vossa colaboração, talvez eu consiga ainda vir a dar um abraço a este amigo e camarada de armas.
Grato pela atenção, aguardo notícias do meu amigo Silva de Rio Tinto
Cumprimentos,
João Ferreira
Póvoa de Varzim
16cidral21@gmail.com
2. Mensagem enviada ao João Ferreira em 16 de Outubro:
Caro João Ferreira
Em relação ao teu camarada Silva, vai ser difícil encontrá-lo só pelo apelido.
Dizes que a Companhia/Batalhão dele ia destinada a S. Tomé, mas que foi desviada para a Guiné. Suponho que terá sido desviada no caminho, porque não aparecem registos de unidades de artilharia em S. Tomé e Príncipe depois de 1970.
Se ele viajou perto da tua data de ida para a Guiné, diz-nos quando foste, em que unidade, BART ou CART e quando regressaste.
Podes enviar a foto que possuis do Silva para este meu mail para eu publicar no Blogue.
Vê se te lembras de mais algum pormenor que possa ajudar a encontrá-lo.
Fico ao dispor
Abraço
Carlos Vinhal
Coeditor
3. Mensagem do João Ferreira, ex-Fur Mil Art da CART 6254/72, com data de 23 de Outubro:
Bom dia Carlos Vinhal
Obrigado pela resposta ao meu pedido de informação sobre o meu amigo Silva.
Efetivamente, a informação que prestei foi muito escassa. Como sugerido por ti, acrescento que fiz parte da CART 6254 (Companhia Independente) e a data de embarque com destino à Guiné, em conjunto com 1 Batalhão e mais 2 companhias independentes, foi a 16 de Março de 1973 (Paquete Uíge), com chegada a Bissau a 22 do mesmo mês, tendo sido encaminhados para o Cumeré, onde fizemos o IAO.
Desconheço se havia na Guiné mais algum quartel, além do Cumeré, onde as tropas fizessem o IAO onde, eventualmente, a companhia/Batalhão do Silva o tivesse feito. Também pode dar-se o caso de ele ter feito o IAO na metrópole, e então aí, a ida dele para a Guiné terá ocorrido mais de um mês depois da minha.
Espero que este acréscimo de informação, com a vossa prestimosa ajuda, possa fazer vislumbrar a luz ao fundo do túnel, onde eu possa ver este meu amigo.
Mais uma vez grato pelo vosso empenho, aguardo esperançosamente boas notícias.
Um abraço fraterno.
João Ferreira
Ex-furriel Mil.
4. Mensagem enviada hoje mesmo ao João Ferreira
Amigo João
Segundo o livro da Comissão para o Estudo das Campanhas de África (Estado-Maior do Exército), a tua Companhia de Artilharia 6254/72, foi mobilizada no RAP 2 (Vila Nova de Gaia).
Foi para a Guiné comandada pelo Cap Art Eduardo dos Anjos Costa. O RAP 3 (Figueira da Foz) não foi unidade mobilizadora, nem de Companhias, nem de Batalhões de Artilharia.
Em relação à Unidade do teu amigo Silva, achei muito estranho um Batalhão ser mobilizado para S. Tomé. Acho que nem havia lá condições para alojar tanta gente, mas posso estar enganado. Ainda se fosse uma Companhia?...
Procurei uma CART que tivesse ido para a Guiné depois de vocês, tendo encontrado a 6552/72, mobilizada pelo RAL 5 (Penafiel), que embarcou para a Guiné em 26 de Maio de 1973, indo de avião.
A partir daí foi só ir ao Blogue e lá estava, tudo explicadinho. Ainda em quartel, estava destinada a S. Tomé, mas foi desviada para a Guiné.
Lê aqui o que descobri (é só clicar): https://blogueforanadaevaotres.blogspot.com/2021/07/guine-6174-p22393-as-des-da-cart-655272.html
Vou fazer um post na série Em busca de com todos os elementos mais a foto.
Se entretanto quiseres fazer uma tentativa, tens aqui o contacto do Manuel Domingos Ribeiro [...] da CART 6552, pode ser que ele tenha ou saiba de alguém que tenha o contacto do Silva.
Boa sorte
Carlos Vinhal
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Notas do editor:
A propósito do "desvio" da CART 6552/72 de S. Tomé para a Guiné, lembremos o que escreveu o camarada Manuel Domingos Ribeiro no Poste 22393:
Falando um pouco sobre o desvio da CART 6552/72, de S. Tomé para a Guiné, quando se encontrava a aguardar embarque na carreira na de tiro de Espinho, embarque que já tinha sido adiado duas vezes, eu que me encontrava em casa de licença fui convocado por telegrama para me apresentar na unidade para seguir de imediato para o ultramar, mas não mencionava o destino final
Apresentei-me a uma sexta feira ao fim da tarde e tive de imediato fazer o espólio de algum fardamento para de seguida o pagar pois, como te deves de lembrar, recebíamos um valor monetário para compra de todo o fardamento e demais artigos necessários ao serviço militar, artigos esses que foram comprados no casão militar em Bissau.
Como me apresentei à última da hora só levei a farda que tinha vestida, algum fardamento que tinha no quartel e uma muda de roupa que transportava numa pequena mala de mão, foi nessa altura que nos foi comunicado que tínhamos sido desviados para a Guiné pelo nosso Comandante de companhia e encarregues de comunicar aos nossos militares e por pelotão o nosso destino.
Nós, os graduados, ainda ponderámos não embarcar, alguns ainda se deslocaram ao Porto já ao princípio da noite para falar com familiares e pedir algum conselho. Fomos aconselhados a embarcar pois as consequências seriam de certeza graves.
Depois de todos regressarem, reunimo-nos já ao principio da madrugada, explicámos a nossa situação e informámos que partiríamos ao início da madrugada em autocarros, com destino à Base Aérea de Figo Maduro, em Lisboa, onde embarcaríamos ao princípio da manhã de sábado.
Na altura de embarque surgiu alguma resistência por parte alguns soldados e graduados em embarcar por não nos terem alterado a nossa mobilização e não nos terem explicado por que razão estávamos a ser deslocados para a Guiné. Alguns elementos foram isolados da restante companhia e postos à guarda da policia aérea responsável pela segurança do aeroporto, foram confrontados por elementos civis e militares se não iam embarcar e as consequências de uma resposta negativa... Responderam, por fim, que embarcavam e seguiram para a pista, saindo o avião com cerca de uma hora de atraso.
Lembro-me de ver alguns familiares no aeroporto militar mas da parte de fora da rede, de ter entrado no avião a chorar de revolta por não nos terem dito a razão da nossa ida para a Guiné, da nossa chegada que foi cerca do meio dia, hora de muito calor, da saída do avião, o cheiro característico a que depois me habituei, o embarque quase de imediato em viaturas militares com destino ao Cumeré.
Último post da série de 5 de outubro de 2024 > Guiné 61/74 - P26013: Em busca de... (328): Rastrear o percurso do meu avô Joaquim Martins Beirão (1932 - † 1991), 1.º Sargento, enquanto militar na guerra do Ultramar (Osvaldo Beirão Germano)
Guiné 61/74 - P27348: Notas de leitura (1855): "Ecos Coloniais", coordenação de Ana Guardião, Miguel Bandeira Jerónimo e Paulo Peixoto; edição Tinta-da-China 2022 (3) (Mário Beja Santos)
1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá, Finete e Bambadinca, 1968/70), com data de 17 de Outubro de 2025:
Queridos amigos,
Ecos Coloniais não é nem um guia de viagem nem um almanaque de curiosidades histórico-culturais onde as memórias coloniais e imperiais se interpenetram. Juntaram-se académicos, ativistas, museólogos e jornalistas e fazem uma apreciação desses espaços, lugares, monumentos, instituições onde pulsam as tais reverberações que dão ensejo a encarar a História de Portugal na faceta que as marcas do Império nos arrastam à compreensão da nossa identidade, na dimensão do passado. Começámos no Arquivo Histórico Ultramarino, estamos hoje em frente ao monumento a Sá da Bandeira, vamos até ao Forte do Bom Sucesso, o monumento aí é outro, homenageiam-se os combatentes mortos nas guerras do Ultramar, seguimos depois para o Museu Nacional da Etnologia. Dá-se esta obra como relevante, é um exercício original para debates sobre passado e o presente, mostra como o património colonial está obrigatoriamente associado a uma memória inapagável.
Um abraço do
Mário
Império e colonialismo: reverberações na Lisboa atual - 3
Mário Beja Santos
Ecos Coloniais resulta de um exercício coletivo de investigação sobre o património histórico e cultural, aqui se interrogam instituições, entidades, monumentos, obras de arte, palácios onde se interseccionam a história colonial e imperial portuguesa, do passado ao presente, edição ilustrada com fotografias de Pedro Medeiros e o acervo de textos tem a coordenação de Ana Guardião, Miguel Bandeira Jerónimo e Paulo Peixoto, edição Tinta-da-China 2022. Logo na introdução, os organizadores referem que este levantamento é uma obra consciente e que há muito por investigar e por saber, importa evitar generalidades e simplismos mobilizadores para escapar aos engenheiros e empreendedores da “história” e da “memória”.
Encaminhamo-nos agora para o monumento a Sá da Bandeira, sito ali perto do Mercado da Ribeira e da Marconi, tendo a Avenida 24 de julho pela frente. O bravo Marechal, de nome Bernardo de Sá Nogueira de Figueiredo, de bravura incontestável, liberal e irredutível, está ligado à abolição da escravatura em Portugal. Como escrevem os autores deste texto, “Na década de 1850, quando vários decretos vão progressivamente libertando os escravos do Estado e das misericórdias, quando se estabelece o conceito da liberdade do ventre e aqueloutro de ‘libertos’. São estes dois bons exemplos de carácter gradual, feito de concessões e cedências, e hesitações, que marcou não só o abolicionismo português como a própria figura de Sá da Bandeira (…) A estátua de celebração do Marquês Sá da Bandeira não se esgota no movimento abolicionista. No sope, uma outra estátua, de uma mulher africana evoca aquilo que era um tropo na altura: o agradecimento do continente e seus habitantes, ao abolicionismo protagonizado pelas classes esclarecidas dos países ‘civilizados’. O problema da escravatura enquanto injunção moral que os poderes imperiais projetavam sobre si mesmo havia sido transformada num novo instrumento de geopolítica. A escravatura, real, que existia ainda no continente africano, apesar das várias ‘abolições’, era então identificada como problema congénito das sociedades locais a que estavam associados outros: poligamia, canibalismo, uso imoderado de álcool, predisposição para a indolência. A escravatura, alimentada que tinha sido ao ponto de alcançar uma dimensão quase industrial na sua versão transatlântica, era agora apresentada como o resultado do atavismo e violência de grupos socioculturais tidos por atrasados.”
O marechal e aquela mulher africana com a criança ao colo, no significado que a época lhe deu, representa a homenagem do país a quem deu a liberdade aos escravos, mas num quadro ideológico de tornar estes libertos indígenas com possibilidade de aceder à civilização.
Tomámos agora o rumo para Belém, vamos até ao monumento aos Combatentes do Ultramar. Diz a autora do texto: “Numa instrumentalização da dor, os monumentos aos mortos de guerra revelam que a morte não dá igualdade. A abstração do morto aniquila as diferenças dos que lutaram integrando-as num processo hegemónico.” Anteriormente, a autora apresentara assim o monumento inaugurado em 5 de fevereiro de 2000:
“Ao Forte do Bom Sucesso foram adicionadas placas talhadas com os nomes, dispostos cronologicamente, de cerca de 10 mil soldados mortos na Guerra Colonial, incluindo soldados africanos das Forças Armadas Portuguesas. A associação dos mortos procura fortalecer, por um lado, a ideia de uma linearidade histórica, sem as ruturas que momentos de crise como as guerras poderiam causar e, por outro lado, a integração orgânica dos membros do corpo nacional, onde também se encontra o colonial. A 11 de novembro de 2015, no 97.º aniversário do Armistício, foi integrado ao conjunto memorial o Soldado Desconhecido caído na Guiné durante a Guerra Colonial, depositado na Capela do Combatente. Tal como em 1921, o morto anónimo é colocado no centro do palco. O herói não identificado, figura idealizada e transversal, é chamada à função de regenerar a nação e transladado para o Panteão Nacional.”
Um monumento que esteve envolvido em controvérsia, e que tem a estatura de uma ferida histórica, há quem o encare como espelho de memória de uma descolonização acabada. Com o passar dos anos, este espaço público vai gerando o sentimento de uma memória comum, ganha o papel de reconciliador, torna-se numa memória comum, o país ajustou-se à veneração dos seus mortos, já são muito poucos os que, por razões ideológicas, pretendem instrumentalizar a dor.
A última viagem é ao Museu Nacional de Etnologia, a autora do texto revela-se bastante crítica quanto ao teor da exposição permanente e releva o papel do multiculturalismo que em Portugal se agigantou com as sucessivas vagas de imigração, logo a dos “retornados” após a revolução do 25 de abril, o que está patente no Museu oculta o lado violento e racista do colonialismo português, abre espaço para exibir narrativas como a panaria de Cabo Verde e Guiné Bissau, e a autora destaca a importância do Serviço Educativo que valoriza as coleções a partir do presente, contribuindo para a construção de relações recíprocas, tal serviço educativo volta-se hoje para a população afrodescendente, contribuindo de forma crítica para o combate à marginalização de grupos sociais que buscam sentido de cidadania, fora da ética dos Descobrimentos. “Coleções como as do Museu Nacional da Etnologia constituem uma oportunidade única para conhecer uma história profundamente desumana, permitindo-nos ativar práticas reparadoras no campo das temporalidades, das materialidades e da dignidade, e compreender melhor o mundo em que vivemos, para podermos assumir o compromisso de contribuir para a construção de um presente melhor.”
Ecos Coloniais, vale a pena repetir, debruça-se sobre um eco diversificado de espaços, atores, instituições e símbolos, permitem-nos ver ou refletir sobre histórias imperiais e coloniais que podemos ver em Lisboa e arredores. É um trabalho coletivo, envolve uma equipa em que há autores e um fotógrafo. Impondo-se uma súmula ou resenha desses espaços e lugares, falando de um quadro que está no Museu Nacional de Arte Contemporânea, “os Pretos de Serpa Pinto”, iremos depois ao Porto de Lisboa e à Sociedade de Geografia de Lisboa.
(continua)
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Notas do editor
Vd. post de 17 de outubro de 2025 > Guiné 61/74 - P27326: Notas de leitura (1852): "Ecos Coloniais", coordenação de Ana Guardião, Miguel Bandeira Jerónimo e Paulo Peixoto; edição Tinta-da-China 2022 (2) (Mário Beja Santos)
Último post da série de 20 de outubro de 2025 > Guiné 61/74 - P27336: Notas de leitura (1854): "Um Império de Papel", por Leonor Pires Martins; posfácio de Manuela Ribeiro Sanches; Edições 70, 2.ª edição, 2014 (2) (Mário Beja Santos)
Guiné 61/74 - P27347: A nossa guerra em números (43): afinal, a nossa ração diária de vinho era de 0,5 litros... O melhor assistente de IA, em matéria dos nossos comes & bebes, é o nosso vagomestre... Aníbal Silva (ex-fur mil SAM, CCAV 2483 / BCAV 2867, Nova Sintra e Tite, 1969/70)
1. O melhor assistente de IA para sabermos coisas sobre os nossos comes & bebes na Guiné ? São os nossos "intendentes" e os nossos "vagomestres", pois claro.
Infelizmente são poucos, os que integram a Tabanca Grande e estão ainda vivos. Mas felizmente que temos o nosso Aníbal Silva (ou Aníbal José da Silva, como está registado na Tabanca Grande) que tem sido inexcedível na sua vontade em partilhar informação (oral e escrita) sobre estas matérias, que já estão tão esquecidas da maior parte da malta... Além disso, ele é o autor da notável série "Vivências em Nova Sintra", de que se publicaram 16 postes, desde 4/3/2025 até 17/6/2025.
Perguntei a alguns de nós se se lembravam do "per diem", a verba para a nossa alimentação diária... Já ninguém se lembrava da quantia em escudos (24$50), que o gen António Spínola, no relatório do comando relativo à situação em 1971, propunha que passasse para 33$00 (um aumento de mais de 1/3), face ao agravamento do custo de #géneros de 1ª necessidade" bem como dos "transportes da Metrópole para a Província". (Não sabemos se até ao final da guerra houve alteração da verba para a alimentação diária no CTIG.)
Era com esses 24$50 que o vagomestre tinha de nos alimentar diariamente (3 refeições).
Além de informador privilegiado como vagomestre e como gestor da cantina de Nova Sintra, ao tempo em que esteve com a sua companhia, CCAV 2483 / BCAV 2867 (Nova Sintra e Tite, 1969/70), o Aníbal Silva é um excelente e afável contador de histórias e lembra-se de coisas do arco da velha.
O Aníbal (que fez a Escola Comercial e foi técnico de seguros) tem especiais competências em matéria de literacia e numeracia: só podia, pois, ser o homem certo no lugar certo. E ainda hoje guarda (o que é incrível!) documentação daquela época, rekatcionadas com a alimentação e atigos de cantina, e que faz questão de partilhar com o nosso blogue.
Mensagem recente, de 22/10/2025, 09:10Bom dia, caríssimo Luís
Depois da nossa conversa telefónica de ontem, que muito me honrou, procurei e encontrei o livro sobre a alimentação, o "missal" dos vagomestres, que tem umas dezenas de páginas e do qual envio em anexo meia dúzia dessas páginas, digitalizadas.
Caso pretendas, para os teus estudos e análises, posso enviar-te pelo correio os dois "documentos". Na afirmativa, fico a aguardar que me facultes o teu endereço. (...)
De acordo com as ementas nºs 5 e 6. a ração diária de vinho, dos militares, nos anos da guerra do ultramar, era de 0,5 l (0,2 l ao almoço, e 0,3 l ao jantar).
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Aníbal Silva, ex-fur mil SAM, CCAV 2483 / BCAV 2867 (Nova Sintra e Tite, 1969/70) |
2. O que transcrevo a seguir é um apanhado das conversas que vou tendo com ele ao telemóvel (ele vive em Arcozelo, se não erro, freguesia de Vila Nova de Gaia, já prometemos encontrarmo-nos quando eu for à Madalena).
2.1. São João, frente a Bolama, era abastecido diretamente por Bissau. Tite também. E Fulacunda. E Bambadinca. E, claro, Nova Sintra,
A via fluvial ainda era a mais rápida, económica e relativamente segura (rio Cacheu, na zona Oeste; rio Geba, na zona Leste; canal do Geba e de Bolama, para a região de Quínara; o rio Cumbijã e o rio Cumbijã e o rio Cacine, para a região de Tombali).
O vinho era transportado de Bissau em barris de 100 litros (mais tarde bidões de 200 l, mas já não é do tempo do Aníbal Silva, nem do meu, somos de 69/71,.
2.2. Em Nova Sintra, era através de um afluente do rio Grande de Buba.
Como não tinham outro sítio para os guardar os barris de 100 litros, utilizava um antigo galinheiro, que estava vago; claro que era um sítio de fácil acesso aos "ladrões de vinho" (não havia "guarda á adega").
Uma vez aberto um barril, durava dois a très dias... E a opinião que a malta ainda hoje tem é que vinho que se bebia em Nova Sintra até era de boa qualidade, tinha bom paladar; e de resto toda a gente bebia vinho.
E interessante a informação de que um barril de 100 l dava só para 2 ou dias. Ou seja, não havia risco de oxidar.Utilizava-se um tubo de borracha para encher recipientes mais pequenos como garrafões. Também já não é do seu tempo o uso de garrafões de 10 l, empalhados, para o transporte de vinho (deve ter sido prática dos primeiros anos de guerra).
2.3. Claro que também aqui havia pequenos furtos: havia sempre ums "jeitosinhos" que, com uma broca manual, fazia um furinho na tampa, e com uma borrachinha ia lá encher o cantil.. "Pró petisco".
Tal como havia malta que, no dia de descascar batatas para o rancho levava as calças de camuflado para encher os bolsos..."pró petisco". Os iam de calções, que era o traje habitual...
Tal como havia malta que era capaz de, numa coluna logística ao porto fluvial, no reabastecimento mensal, e antes da chegada ao quartel,. , "desviar uma ou duas caixas de cerveja", gurdá-las no mato em sítio seguro e ir lá depois buscá-las, passadas 24 ou 48 horas.
2.4. Mas também havia a ração de aguardente. A meio da comissão, a Intendência mandou perguntar se a companhia tinha barris de aguardente. O Aníbal disse que não. Passados uns tempos, foi abrir um barril (que julgava ser de vinho) e viu que era aguardente. Havia 300 litros (3 barris) de aguardente, em "stock", intactos!... Bom, deu para o resto da comissão, enquanto a malta esteve em Nova Sintra antes de ir para Tite. Uma ração de aguardente passou a ser distribuída pelos abrigos.
2.5. O Aníbal, vagomestre, tirou a especialidade em Póvoa do Varzim, na antiga Escola Prática de Administração Militar (hoje Escola de Serviços do Exército) ficou também, em Nova Sintra, com a cantina, ao tempo do segundo capitão da companhia que detectou irregularidades na gestão anterior.
Havia um "buraco" nas contas que era preciso sanear... E que ele saneou... (Como "prémio", ficou, no fim, na "comissão liquidatária" da companhia e do batalhão, um "pincel" que ninguém queria, podendo atrasar o regresso a casa.)
Não havia máquinas de calcular, naquele tempo, as contas eram feitas à mão, uma, duas, três, quatro vezes, até baterem certas. E havia um lençol, o famigerado mapa modelo 1, que era um a quebra-cabeças para qualquer vagomestre.
2. Falando há dias com um antigo comandante de companhia, hoje cor art ref, o nosso grão-tabanqueiro Morais da Silva, disse ele que "nunca bebeu vinho em Gadamael" (onde comandou a CCAÇ 2796, entre jan 1971 e fev 1972). Nem ele nem os seus alferes e furriéis,. Bebiam cerveja. Aliás, deixou de beber vindo desde que veio de Angola. onde fez o curso de comandos.
Já não se lembrava do "per diem" nem da ração de vinho diária...Vai perguntar ao vagomestre que é hoje um quadro superior do BCP, reformado. Gaba-se de ter tido excelentes colaboradores em todos os setores de apoio, da saúde (onde teve um 1º cabo aux enf excecional, e de quem toda gente perdeu o rasto) às transmissões, da intendência ao material.
Tem ideia, sim, que a malta se queixava que a Intendência punha uns "pozinhos no vinho".
O Humberto Reis, ex.fur mil op esp /ranger, da CCAÇ 12 (Bambadinca, 1969/71) e colaborador permanente do nosso blogue também confirma que os nossos soldados, pro serem resarranchados, recebiam mais 750$00 por mês.
Quando o Gr Comb dele, o 2ª, ia para o destacamento do rio Undunduma, o pessoal metropolitano recebia o seu rancho, confeccionado em Bambadinca, mas a viatura também trazia os "tachos de arroz" que as mulheres dos nossos soldados cozinhavam para eles na tabanca... Cada um tinha um lenço da sua cor.... Em operações no mato, também levavam a sua "marmita" (arroz cozido embrulhado num lenço)...
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Nota do editor LG:
Último poste da série > 2 de outubro de 2025 > Guiné 61/74 - P27340: A nossa guerra em números (42): com um "per diem" (verba de alimentação diária) de 24$50 (hoje 4,10 euros) dava para fazer uma... ometela simples mas saborosa!quinta-feira, 23 de outubro de 2025
Guiné 61/74 - P27346: Álbum fotográfico do Padre José Torres Neves, ex-alf graduado capelão, CCS/BCAÇ 2885 (Mansoa, 1969/71) - Parte XXX: o "choro" entre os balantas
Guiné > Zona Oeste > Região do Oio > Mansoa > BCAÇ 2885 (Mansoa, 1969/71)
Fotos do álbum do Padre José Torres Neves, antigo capelão militar.
Fotos (e legendas): © José Torres Neves (2025). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]
1. Mais um conjunto de fotos do padre Zé Neves sobre Mansoa, enviadas no passado dia 2 de agosto pelo nosso camarada e amigo Ernestino Caniço, que tem sido o zeloso e diligente guardião do álbum fotográfico da Guiné, deste padre missionário da Consolata, José Torres Neves, natural de Meimoa, Penamacor, merecendo os dois os nossos melhores elogios e saudações.
O Padre José Torres Neves, nosso grão-tabanqueiro, reformou-se recentemente de uma vida inteira, generosa, abnegada, dedicada às missões católicas, nomeadamente em África; tem já cerca de 4 dezenas de referências no nosso blogue.
As fotos trazem legendas muito sucintas, sem data.
Ainda hoje o “choro” continua a ser central na vida social guineense, tanto no meio rural como urbano (e nomeadamente em Bissau).. É uma cerimónia pública que combina tradição, espetáculo e religiosidade.
O tema merece um poste à parte.
Nota do editor LG:
Último poste da série > 13 de outubro de 2025 > Guiné 61/74 - P27312: Álbum fotográfico do Padre José Torres Neves, ex-alf graduado capelão, CCS/BCAÇ 2885 (Mansoa, 1969/71) - Parte XXIX: Mansoa











































