segunda-feira, 6 de fevereiro de 2023

Guiné 61/74 - P24043: Fauna & flora (22): Algumas boas notícias para os mais de 700 chimpanzés (ou "daris") do Boé, graças ao fantástico trabalho de conservação da Chimbo Fundation&Daridibo, com sede em Béli


Um pequeno documentário baseado em vários vídeos, obtidos por câmaras de vigilância,  de chimpanzés no Boé, Guiné-Bissau.  Narração, em fula, por Bacari Camará, que vive em Béli, e é gestor de projeto. Legendas em inglês.

Vídeo (12' 30''), da Foundation Chimbo, alojado no You Tube.  Aqui reproduzido com a devida vénia.


1. Temos dado aqui  alguma atenção à fauna & flora" da Guiné-Bissau, e em particular aos chimpanzés do Boé e do Cantanhez (temos 11 referências ao nosso "dari"),  

No tempo da guerra, entre 1961 e 1974, provavelmente nenhum de nós, antigos combatentes portugueses, deve ter visto um chimpanzé, a não ser infelizmente em cativeiro. São animais, primatas como nós, territoriais e sociais (e os mais próximos de nós, em termos genéticos e evolutivos) mas de difícil observação na natureza...

Oxalá o visionamento deste vídeo (falado em fula, com legendas em inglês) contribua também para sensibilizar os nossos leitores para a problemática da proteção do chimpanzé e da preservação do seu habitat. O chimpanzé da África Ocide
ntal (Pan troglodytes)  é considerada uma espécie ameaçada, "criticamente em perigo".

Como diz um provérbio fula, uma única árvore não poder fazer uma floresta... Daí ser fundamental trabalhar em rede, envolver outras organizações, regiões, a sociedade civil e  o Estado da Guiné-Bissau, bem como empresas mineiras, parcerias (caso da ASI - Aluminium Stewardship Initiative) e países vizinhos, mas sobretudo a população local, que, no caso do Boé, é maioritariamente fula. A caça ilegal, a pressão demográfica humana, a construção de estradas e os projetos de mineração são alguns dos factores de risco para a preservação desta espécie.

Felizmente, ao que parece, têm  sido bem sucedidos os projetos da Chimbo Foundation and Daridibo no domínio da conservação desta e doutras espécies animais, emblemáticas da Guiné-Bissau, como por exemplo o leopardo (predador do chimpanzé).

Na primavera de 2022, 178 locais sagrados do Boé, que já estavam registados como ICCA (Áreas Indígenas e Comunitárias Conservadas), foram aceites como áreas protegidas de categoria III da IUCN (International Union for Conservation of Nature / União Internacional para a Conservação da Natureza) na WDPA (World Database on Protected Areas / Base de Dados Mundial sobre as Áreas Protegidas) (Ler mais sobre isto, no boletim informativo da Fundação, de maio de 2022.)

Mais de 50 estudantes e cientistas da Holanda, Alemanha, França, Bélgica, Índia, Brasil, Itália, Suíça, Portugal, Espanha, Senegal, Guiné-Bissau e Canadá, já realizaram pesquisas que contribuíram para a conservação do Boé.  


Doações são bem vindas:

Conta bancária

Stichting Chimbo

IBAN: NL05INGB0002734651

BIC: INGBNL2A

Contactos:

Telef +31-6-17280797 (The Netherlands)
E-mail: info@chimbo.org


2. Reprodução de uma notícia da Lusa / Porto Canal, 2/1/2015 (com a devida vénia...)

Câmaras revelam um dos últimos recantos de chimpanzés 
em terras lusófonas

Béli, Guiné-Bissau, 02 dez (Lusa) - Chimpanzés a tomar banho num lago, a encestar pedras como num "afundanço" de basquete entre ramos de uma árvore ou simplesmente em passeio.

São animais em vias de extinção a nível global, mas há horas e horas de vídeo a mostrar a intimidade destes primatas que habitam nas florestas do Boé, sudeste da Guiné-Bissau.

Nestes filmes há também leopardos a desfilar como numa passarela, imagens de búfalos, gazelas, javalis e o que parece ser a cauda de um leão - do qual já foram encontradas pegadas.

Os membros da fundação Chimbo ficam ansiosos de cada vez que penetram na densa vegetação para ler os cartões de memória das câmaras de vigilância: sabe-se lá que animais vão ver.

Alguns, como o leão, eram dados como extintos na Guiné-Bissau desde a guerra pela independência, na década de 60 e até 1974.

Há que aguçar os sentidos: "os chimpanzés gritam quando se deitam e quanto se levantam", explica Piet Wit, ecologista, especialista em Agronomia e Gestão de Recursos Naturais, um dos responsáveis pela Chimbo.

Assim, quando a noite cai é possível saber aproximadamente em que árvores fazem os ninhos para dormir, para de manhã a busca avançar até perto desses locais e esperar que acordem.

A sede da Chimbo está montada na aldeia de Béli e dali parte a maioria das saídas de campo, mas é difícil deitar olho aos chimpanzés.

"Aqui no Boé, por cada cinco saídas, há talvez duas em que os consigo observar. E por vezes só ao longe", descreve Piet.

Daí a extrema utilidade da rede de câmaras de vigilância. A rede foi montada há cinco anos, primeiro em dez locais, hoje abrange 25 e com outras tantas câmaras prontas a entrar em ação, se necessário.

"Não as usamos todas em simultâneo porque não teríamos capacidade para as gerir", explica. Só com o conjunto que está ativo "já há muitas centenas de horas de vídeos acumuladas para ver".

Esta história de observação e preservação da natureza começa com um momento trágico na vida de Piet e da esposa, Annemarie Goedmakers.

David, filho do casal holandês, faleceu inesperadamente em 2006, aos 18 anos, devido a um problema vascular na aorta. Juntos já tinham passado férias na Guiné-Bissau. Annemarie, presidente da Chimbo, bioquímica e ecologista, ainda hoje mostra a foto de David a dormir num ninho de chimpanzé quando tinha 10 anos.

"Já tínhamos a ideia de fazer algo pelo Boé, mas depois de ele morrer, isso ganhou outra força".

Um dos primeiros trabalhos da Chimbo, com financiamento da MAVA -- Fundação para a Natureza, e outros doadores, consistiu num levantamento que permitiu chegar à estimativa de que haja cerca de 700 chimpanzés no Boé.

Nos últimos dois anos, o trabalho tem sido financiado por um dos institutos Max Planck, no caso, o Instituto Para a Matemática nas Ciências, com sede em Leipzig, Alemanha.

A Chimbo está incluída no grupo de pesquisa dedicado exclusivamente aos chimpanzés. "O nosso foco é o chimpanzé. Vemo-lo como uma espécie que é o símbolo de todo um meio-ambiente importante e com benefícios para as pessoas que aqui vivem", conclui Piet.

LFO // EL
Lusa/fim

[ Seleção / revisão e fixação de texto / negritos, para efeitos de publicação neste blogue: LG]
__________

9 comentários:

Valdemar Silva disse...

Muito interessante, este pequeno filme dos chimpanzés do Boé.
Pelos vistos não foram extintos pela guerra ou por circos de Natal.
Não sei se as câmaras estavam visíveis, mas foi notório ver os chimpanzés a olhar para o local em que estavam instaladas.
A particularidade das pedradas contra o tronco de árvores não se sabe ao certo do que se trata. Marcas nas árvores e várias pedras de anteriores arremessos não faltam, parece ser só os machos que têm este ritual que pelo menos dois eram canhotos.
Já lá vão mais de 50 anos de conviver com os soldados fulas da nossa CART11. Gostei de ouvir falar fula e ainda apanhei algumas palavras do locutor, que eram familiares mas só percebi 'sapo' quando se referiu a '10' anos.

Saúde da boa
Valdemar Queiroz

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Valdemar, e no fim, na ficha técnica, está "Djamara", obrigado ao narrador, o Bacari Camará, que vive em Béli, e é gestor de projeto, colaborador da Fundação. Aliás, achei muito bem que a locução fosse em fula, em não neerlandês ou inglês... Mas podia haver pelo menos legendas em português: quer-se goste ou não,é a língua oficial do país...

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Bolas, Valdemar, já não me era "familiar" esta fala, em fula... Convivi muito com os meus/nossos soldados da CCAÇ 12, muitos deles teus instruendos na recruta... E, claro, com a população das tabancas... Mas procuravamos que eles, sobretudo os militares, aprendessem e melhorassem o português.

Tens aqui cinco postes com um pequeno dicicionário de fula/português...o Luís Borrega infelizmente já morreu...


14 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3889: Dicionário fula / português (Luís Borrega) (5): Jubi, ala poren, iauliredu... / Miúdo, avião, tem medo...

https://blogueforanadaevaotres.blogspot.com/2009/02/guine-6374-p3885-dicionario-fula.html

Valdemar Silva disse...

Luís
Julgo que o dicionário fula/português, do Luís Borrega, tem algumas fulacriouladas e até portucriouladas.
"Jubi", não é crioulo nem fula. Jubi é uma corruptela de 'djubi', que quer dizer 'olha', 'está a ver'. Os portugas apanharam o chamar djubi(olha) e adaptaram como se fosse rapaz (crioulo=rapas=rapasse) e passou a ser 'ó jubi vem cá', que seria percebido como 'olha vem cá'. E assim ficou jubi como sendo rapaz. Não sei como se diz rapaz/miúdo em fula.
Mas no dicionário do Luís Borrega tem mais algumas fulacriouladas e até nem sei em qual o dilecto de "catota" e "cabaço".
Espero que nosso amigo Cherno Baldé e entendido nestas coisas, nos dê uma lição de fula e sobre estas belas palavras do dicionário portuseilaoque.

Continuação de boa recuperação para uma peladinha no areal da "Areia Branca"
Valdemar Queiroz

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Sim, Valdemar, concordo contigo. O Luís Borrega não era lexicografo nem etnografo... Acho uma ternura a pequena recolha que ele fez. Coisa que eu próprio poderia ter feito, quando estive destacado numa ou noutra Tabanca... Faltou-me arte, engenho e sobretudo motivação... Foi um tempo absurdo e inutil... Mas de que guardo alguma saudade... Das pessoas, das paisagens...


Valdemar Silva disse...

Luís, realmente nós, fazendo parte de Companhias de soldados fulas, bem poderíamos ter feito um glossário de palavras e expressões no dialecto fula.
Mas, a vontade era mais para ensinar português aos soldados que eles nos ensinassem fula ou crioulo.
Nos últimos dois meses em Guiro Iero Bocari nem me lembro como ocupava o tempo, mas teria muito tempo para aprender pelo menos 'quero ir embora pra casa'.

Valdemar Queiroz

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Nós só tínhamos um primeiro cabo guineense, o José Carlos Suleimane Baldé e talvez uns dez ou doze soldados arvorados... Estes se tirassem a terceira classe eram promovidos a cabos. Nunca aconteceu no meu tempo, ou seja, até Março de 71. Alguns deles aplicavam-se e estudavam no intervalo da nossa intensa atividade operacional. Falavamos sempre em português, até no interesse deles. Passar de soldado de segunda classe para primeiro cabo, era a sorte grande... Infelizmente não tinhamos
os recursos humanos suficientes para lhes dar aulas ou explicações... Mas arranjos tempo, logo em Contuboel, para ajudar o primeiro sargento a preparar-se para a Escola Central de Sargentos, em Águeda...

José Botelho Colaço disse...

Ver post 3598 carcereiro por uma noite.

Valdemar Silva disse...

Em Nova Lamego dei "escola de Cabos" a cinco dos soldados fulas do meu Pelotão para serem promovidos. Não me recordo o que aconteceu com os soldados doutros Pelotões.
Também dei explicações de matemática, a minha especialidade, ao 1º. Sargento para ele arranjar alguns conhecimentos, visto ir para a Escola Central de Sargentos, em Águeda.
O 1º. Sargento Ferreira Júnior (já falecido), que tinha que "levar" com a rapaziada, dormia ao nosso lado, tinha de ouvir rockadas e Zeca Afonso e bocas contra a situação. Ele comigo teve sempre bom tratamento, talvez por saber que eu trabalhava desde os doze anos num escritório, mas com os outros Furriéis mil. havia uma certa clivagem.
Julgo que voltou a ser mobilizado para Angola, já como Oficial do Serviço Geral e que teria chegado a Major(?), ultimamente Director do Aeródromo Clube de Espinho.
Lembro-me, até parece impossível, estar numa mesa na varanda da nossa messe e ter apanhado um grande bioxene de "Antiquary" a ler uma carta chegada da metrópole, e ele me dizer muito serenamente 'então Queiroz, passa-se alguma coisa'. Isto passa, teria eu respondido antes de me levarem a tomar uma banho à fula e dormir toda a tarde.

Valdemar Queiroz