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segunda-feira, 19 de maio de 2025

Guiné 61/74 - P26817: Notas de leitura (1798): "Pára-quedistas em Combate 1961-1975", por Nuno Mira Vaz; Fronteira do Caos Editores, 2019 (2) (Mário Beja Santos)


1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá, Finete e Bambadinca, 1968/70), com data de 3 de Maio de 2024:

Queridos amigos,
Importa exaltar o meritório de trabalho do Coronel Nuno Mira Vaz, dá-nos um amplo enquadramento do desempenho dos paraquedistas nos três teatros de operações, no caso que mais nos toca, a Guiné, oferece-nos uma visão do que mais relevante esta tropa de elite ali praticou, entre 1963 e 1974. O autor deve ser leitor atento do nosso blogue, nele foi colher diferentes testemunhos daqueles momentos cruciais, como o de Gandembel, o nosso confrade Idálio Reis invoca o papel determinante que eles tiveram, designadamente nos ataques do PAIGC em dezembro de 1968; tropa que andou nos trilhos mais difíceis, no Morés e no Sul, esteve nos palcos de Guidage e de Gadamael, nos terríveis meses de maio e junho de 1973; e convém não esquecer que o BCP 12 infligiu ao PAIGC duros golpes no decurso da Operação Grande Empresa, na reocupação do Cantanhez. Um livro para ler e guardar.

Um abraço do
Mário



Paraquedistas em combate na Guiné (2)

Mário Beja Santos

A obra intitula-se "Pára-quedistas em Combate 1961-1975", por Nuno Mira Vaz, Fronteira do Caos Editores, 2019, abarca o histórico da participação dos paraquedistas nos teatros de Angola, Guiné e Moçambique, e não esquece a extremosa e indispensável intervenção das enfermeiras no decurso da guerra. Houve um grupo de trabalho que desafiou o autor a coligir a obra destinada a guardar a memória desta tropa de elite.

No texto anterior, procedeu-se a uma síntese dos acontecimentos ocorridos em Angola em 1961, partiram a 16 de março com destino à Base Aérea n.º 9, em Luanda, era o primeiro contingente, o autor dá nota do desempenho da força paraquedista, refere as operações com salto em paraquedas, onde foi possível praticar tais iniciativas, não deixando de mencionar aquela que foi a mais emblemática e temerária mas que não se concretizou, e que tinha a ver com a reunião em Cap Skirring onde decorreu uma reunião entre o General Spínola e o Presidente Senghor. Como necessário, o leitor acompanha a atividade operacional dos paraquedistas em Angola.

Reportando-nos à Guiné, deu-se a visão da intervenção dos paraquedistas desde 1963 até à sua presença em Gandembel, em dezembro de 1968. O autor cita algumas expressões que o nosso confrade Idálio Reis, presença marcante em Gandembel, deixa no blogue:
“Os paraquedistas eram, inquestionavelmente, a tropa de elite melhor preparada para este tipo de guerra de guerrilhas, na busca perseverante ao agressor (…) a sua ação foi de uma extraordinária valia, revelou-se fundamental para o futuro dos homens da minha Companhia, muito em especial no aspeto anímico, e inclusive conseguiu também criar um clima de muito maior segurança para as demais tropas fixas e imóveis que estavam de algum modo envolvidas com Gandembel (…) Indubitavelmente, foi capaz de incutir uma outra serenidade a estes desalentados homens, renovar estados de espírito abalados, sobrepujar contrariedades inúmeras, remoçar réstias de esperança, que se revelaram cruciais no aumento da autoestima. E esta extraordinária proeza, este feito inigualável, ninguém lhe consegue dar a devida dimensão, tão-só o peso e o testemunho da gratidão dos que a sentiram.”

Estamos agora na era de Spínola, a reformulação da atividade operacional também atingiu as forças paraquedistas: foram criados Comandos Operacionais, Comandos de Agrupamentos de Operacionais e Comandos Operacionais Temporários. Deu-se seguimento ao projeto “Por Uma Guiné Melhor”, as populações das zonas mais disputadas eram transferidas para aldeamentos em locais estrategicamente escolhidos. Um coronel paraquedista foi escolhido para comandar o Comando de Agrupamento Operacional n.º 1, em Teixeira Pinto, em 1969, os paraquedistas alcançaram resultados assinaláveis. Eles também estiveram presentes na Operação Titão, a 24 de abril de 1969, na região do Morés, houve guerrilheiros capturados, bem como muito material de guerra. Em 13 de junho de 1969, eles irão intervir na Operação Orfeu, assalto à base de Choquemone, nos resultados, um número assinalável de material capturável.

A Operação Jove, executada nos dias 17 e 18 de novembro de 1969, no corredor de Guileje, deu como resultado a captura do capitão cubano Pedro Rodriguez Peralta. Irão realizar-se outras operações no corredor de Guileje. Em território bem distante, na região de Pirada, estamos em julho de 1970, decorrerá a Operação Elefante Roxo, o PAIGC tinha lançado um violento ataque ao aquartelamento, com fogos de canhão sem recuo, lança-granadas foguete, metralhadoras e armas ligeiras, procurava-se infiltrar elementos na povoação, a guerrilha tentou assaltar as instalações da DGS, uma secção de paraquedistas impediu que o assalto se concretizasse, contra-atacando e perseguindo os guerrilheiros.

Em janeiro de 1972, os paraquedistas voltam ao Morés em vários agrupamentos, batem o terreno, capturam material e provocam baixas à guerrilha. Por essa altura, o Comando-Chefe decidiu realizar entre a fronteira com a Guiné-Conacri e Salancaur Jate, perto do corredor de Guileje, a Operação Muralha Quimérica, entrou-se em acampamentos e apreendeu-se material. As forças paraquedistas tiveram um papel determinante na reocupação do Cantanhez, este local, severamente fustigado em 1968, dava sinais de que o PAIGC voltara a ocupá-lo. A Operação Grande Empresa envolveu forças de intervenção, entre elas três Companhias de Caçadores Paraquedistas, forças de quadrícula, várias companhias de caçadores e um pelotão de artilharia, forças de apoio, a Marinha e Força Aérea. Os páras participaram na implantação de aquartelamentos em Cadique, Caboxanque, Cafal Balanta, etc. Observa o autor que em maio de 1973, apesar de todos os progressos alcançados ninguém podia afirmar que se vivia em paz no Cantanhez. Todo este esforço se acabou por diluir com as ofensivas do PAIGC na região de Guileje e Gadamael e no norte, em Guidage, nesta altura a guerrilha já operava com os mísseis terra-ar Strela.

Mais uma vez os paraquedistas vão intervir em pontos convulsivos. Depois da retirada de Guileje, em 22 de maio, o PAIGC cerca Gadamael, vêm os paraquedistas, chegam a 3 de junho, desembarcam debaixo de uma concentração de artilharia e morteiros, os paraquedistas vão encontrar Gadamael em estado de grande devastação, o PAIGC pressiona, uma companhia de paraquedistas patrulha. Em 23 de junho, vários grupos de combate de paraquedistas saem de Gadamael e vão rumo a Cacoca, é a Operação Cobra Ondulante, vão desarticular um “quartel” do PAIGC. Os combates a norte foram igualmente ferozes, o PAIGC preparou o cerco de Guidage com um efetivo de 650 homens, provoca o inferno, quase que destrói o aquartelamento, faz repelir as colunas de reabastecimento. Os paraquedistas irão apoiar a Operação Ametista Real, a missão é estabelecer e garantir a segurança de um corredor por onde se fará a recolha do Batalhão de Comandos Africanos, na sequência do assalto a Cumbamori, e partem depois para Guidage, pelo caminho serão emboscados, a resposta é rápida, a guerrilha provoca baixas aos paraquedistas. A 30 de maio, uma companhia de paraquedistas, os destacamentos de Fuzileiros e o remanescente do Batalhão de Comandos Africanos deslocam-se para Binta, a companhia de paraquedistas saíra 17 dias antes para apoiar a Operação Ametista Real, trazia vestida a mesma roupa e menos quatro dos seus homens.

O autor chama a atenção que o empenhamento operacional no Cantanhez tinha exigido aos paraquedistas um esforço enorme. Os homens regressaram a Bissalanca mais magros, fisicamente cansados pelas consecutivas ações de combate e psicologicamente afetados pelos bombardeamentos suportados em noites insones. Mas voltaram às operações em junho. A última ação de combate com expressão relevante ocorreu em 30 de janeiro de 1974, na região de Bissum, os paraquedistas procederam a uma batida, encontraram uma canoa com armas, capturaram elementos do PAIGC e abateram outro. Em 10 de abril de 1968 foi concedida a medalha de Cruz de Guerra de 1.ª Classe ao Batalhão de Caçadores de Paraquedistas n.º 12, o diploma legal destaca as reais qualidades desta tropa de elite: “O Batalhão tem-se destacado, através dos seus oficiais, sargentos e praças, que formam um grupo equilibrado e homogéneo, exemplo da tropa de intervenção como uma verdadeira unidade de elite, contribuindo, de maneira decisiva para a viragem da situação no sul da província, honrando, assim, as Forças Paraquedistas e tendo a sua atuação na província considerada brilhante e altamente honrosa, resultando prestígio para a Força Aérea e admiração e reconhecimento das outras Forças Armadas.”

Cumpre dizer que o autor dedica um amplo capítulo à presença dos paraquedistas em Moçambique e um tocante capítulo às enfermeiras de camuflado.

Uma importante investigação que traz luz à performance dos paraquedistas nos três teatros da guerra colonial.

Coronel de Cavalaria Paraquedista Nuno Mira Vaz
Fez uma comissão em Angola, duas comissões na Guiné e uma em Moçambique. Condecorado com a Cruz de Guerra, de 1.ª classe
Testemunho de paraquedista recolhido do jornal Correio da Manhã, não consta o nome, fez comissão na Guiné de 1966 a 1968 no 1.º pelotão da Companhia de Caçadores Paraquedistas 122:

“Faltavam oito dias para regressarmos a Lisboa com a nossa missão cumprida. Entre nós já ninguém pensava na guerra, os dias eram contados a cada instante. Mas o inesperado aconteceu. O nosso Comandante Coronel Sigfredo Ventura da Costa Campos mandou formar a companhia de caçadores paraquedistas 122 e disse o que passo a citar: "Meus senhores, nós vamos embora daqui a oito dias, mas os camaradas que nos veem substitui, vão precisar de um mês para ficarem 100% operacionais. O problema é que os rapazes de Tite estão constantemente a ser atacados. Eu sei onde estão as armas pesadas com que eles os flagelam... Vocês querem ir lá buscá-las?" - E aqueles 120 rapazes responderam em uníssono, "Queremos!".


Fomos de novo cumprir com o nosso dever e trouxemos os canhões sem recuo, os morteiros 82 e armas ligeiras; e para além de algumas baixas infligidas, ainda trouxemos ferido o irmão do chefe do grupo que ali atuava. E assim aliviámos os nossos irmãos, pelo menos por algum tempo. No final fomos condecorados com a medalha de Cruz de guerra de primeira classe coletiva. Mas se me perguntassem se faltou alguma coisa... Bem, diria que faltou alguém com bom senso dizer: Obrigado, Pá! A Pátria está-te agradecida!”

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Notas do editor:
Post anterior de 12 de maio de 2025 > Guiné 61/74 - P26793: Notas de leitura (1796): "Pára-quedistas em Combate 1961-1975", por Nuno Mira Vaz; Fronteira do Caos Editores, 2019 (1) (Mário Beja Santos)

Último post da série de 16 de maio de 2025 > Guiné 61/74 - P26806: Notas de leitura (1797): "As Raças Humanas", de Louis Figuier, editado em Lisboa em 1881, no tempo em que se acreditava nas raças superiores e inferiores… (Mário Beja Santos)

sexta-feira, 18 de outubro de 2024

Guiné 61/74 - P26056: Tabanca Grande (564): António Galinha Dias, ex-fur mil pil, BA 12 (Bissalanca, 1968/70): natural de Torres Novas, senta-se à sombra do nosso poilão no lugar nº 894

 


António Galinha Dias, ex-fur mil pil, BA 12, Bissalanca (1968/70)

Foto (e legenda): © António Galinha Dis (2024). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné].



Ribamar da Lourinhã, Festa de N. Sra. de Monserrate > 14 de outubro de 2024 > António Galinha Dias,
 
Foto (e legenda): © Luís Graça (2024). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné].

Sintra > Mira-Sintra / Meleças > 2018 > Convívio de pessoal da FAP que voou na Guiné. O segundo a contar da esquerda é o ex-fur mil pil António Galinha Dias, que fez a helievacuação do cap cubano Pedro Rpodriguez Peralta, em 18 de novembro de 1969, sendo a enfermeira paarquedista a Maria Zulmira André Pereira (1931-2010), uma das "Seis Marias", as histórica do 1º curso de enfermeiras paraquedistas (1961), juntamente com a Maria Arminda Santos, a Maria Ivone Reis (1929-2022), a Maria de Lurdes ("Lurdinhas"), a Maria do Céu Policarpo e a Maria da Nazaré (falecida em 1984)

Foto (e legenda): © Miguel Pessoa (2021). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné].


1. Costumamos dizer, aqui entre nós, que o Mundo é Pequeno e a Nossa Tabanca... é Grande... E nomeadamente quando, nos nossos convívios, vamos encontrar antigos combatentes que, como nós, conheceram a Guiné, por terra, ar e mar... Foi o caso do Antóno Galinha Dias que vive em Torres Novas e eu fui encontrar a 70 km de distância, em Ribamar da Lourinhã. Veio com o mano mais vellho, o Alcides Galinha Dias (rapaz da colheita de 1945) para o tradicional convívio de velhos condiscípulos que se realiza todos os anos, na segunda feira da segunda semana de outubro, por ocasião das festas da padroeira daquela terra de pescadores, a N. Sra. de Monserrate (este ano, de 11 a 16 de outubro)... 

Pois foi justamente em Ribamar da Lourinhã que eu fui descobrir, na passada segunda feira, mais um camarada da Guiné, neste caso da FAP,  o António Dias Galinha, ex-fur mil pil, BA 12, Bissalanca, 1968/70, que foi piloto de AL III, de helicanhão, DO 27 e de C-130...

Já tínhamos no nosso blogue alguns referências a este camarada (**). Um dos aspetos mais marcantes do seu currículo militar terá sido a circunstância de ter sido ele a fazer a evacuação Ypsilon, de helicóptero  "com escolta", do mais célebre dos "internacionalistas cubanos", o cap Pedro Rodriguez Peralta, do local onde foi gravemente ferido e capturado por forças do BCP 12 (Op Jove, 18nov69) até o HM 241, Bissau (**)...A enfermeira paraquedista de serviço nesse voo foi a saudosa Maria Zulmira André Pereira (1931-2010) (**).

Quem é o António Dias Galinha Dias, para além de ter estado seis anos, como voluntário na FAP ?E mais conhecido por Galinha, apelido materno. Voltou a terra natal, depois de se reformar:  foi durante anos  sócio-gerente da firma Agroar - Trabalhos Aéreos Lda, com sede em Évora.  É um homem calmo, discreto, mas afável.
 
Fiquei com o email do António Dias Galinha e desafiei-o a juntar-se à nossa Tabanca Grande, onde tem cá conterrâneos (como o César Dias) e amigos e vizinhos (como o Carlos Pinheiro), mas também gente do seu tempo da FAP como o Jorge Narciso, o Jorge Félix, o Jorge Caiano (que está no Canadá), o Mário Santos, ou mais novos como o Gil Moutinho (teu conhecido da Tabanca dos Melros), o Victor Barata,  infelizmente já falecido  (1951-2021) ou o Eduardo Jorge Ferreira, que também já nos deixou prematuramente (1952-2019)... Sem falar da malta do BCP 12, sem esquecer as enfermeiras paraquedistas Maria Arminda, da Giselda Pessoa, da Rosa Serra... nem os nossos "pesos pesados", os ex-ten pilav Miguel Pessoa  e António Martins de Matos... (Enfim, alguns dos nomes de malta da FAP que se sentam à sombra do nosso poilão,e  que me vêm de repente à memória.)

Segundo ele me contou é do tempo das enfermeiras paraquedistas Rosa Serra, Rosa Exposto, Maria Zulmira, Eugénia... Depois de ter pilotado o AL III e a DO-27, fez o curso de C-130.

 "Amigo" da nossa página no Facebook (temos 19 amigos em comum. incluindo o Carlos Pinheiro e o Jorge Narciso), está na altura de sentar o nosso camarada (e já amigo) Galinha, à sombra do poilão da Tabanca Grande, no lugar nº 894. 

As regras de convívio da nossa Tabanca Grande são amplamente conhecidas e reconhecidas. Todos nos tratamos por tu, como camaradas de armas que somos (e que de algum modo continuamos a ser). Cabemos aqui todos com tudo o que nos une e até com o que nos pode separar (política, religão, futebol...). Estamos aqui para partilhar memórias (e afetos) e honrar a memórias dos nossos camaradas que já deixaram a Terra da Alegria e que não queremos ver inumados na vala comum do esquecimento.

Sê bem vindo, António, e rapa lá das tuas memórias mais algumas fotos e outras lembranças (como episódios que te tenham marcado como piloto). Um alfabravo, camarada, novo grão-tabanqueiro. (Luís Graça)

PS - O teu nome passará a figurar na lista alfabética da Tabanca Grande (n=894), constante da badana, a coluna estática do blogue, do lado esquerdo.

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 Notas do editor:


(**) Vd. postes de:


terça-feira, 15 de outubro de 2024

Guiné 61/74 - P26045: O Mundo é Pequeno e a Nossa Tabanca...é Grande (131): António Galinha Dias, o ex-fur mil pil, que helievacuou o cap cubano Peralta, o mais célebre dos "internacionalistas cubanos", em 18/11/1969... Fui ontem encontrá-lo na famosa caldeirada de Ribamar da Lourinhã, e convidei-o a sentar-se à sombra do nosso poilão (Luís Graça)

 


Ribamar > Festa de N. Sra. de Monserrate > A famosa caldeirada da segunda feir da segunda semana de outubro > 14 de outubro de 2024 >   O António Diass Galinha




Ribamar > Festa de N. Sra. de Monserrate > A famosa caldeirada da segunda feira da segunda semana de outubro > 14 de outubro de 2024 >   O Alcides Dias Galinha, de Torres Novas, o irmão António, e o Alfredo, que veio do Algarve (!), com a esposa (foi piloto de helicóptero, AL III, em Angola, ao tempo do Jaime Silva, um dos organizadores deste fantástico convívio, que tem já cerca de 3 dezenas de anos.)



Ribamar > Festa de N. Sra. de Monserrate > A famosa caldeirada á  pescador, confeccionada na segunda feira da segunda semana de outubro > 14 de outubro de 2024 >   O grupo era de cerca de 8 dezenas de comensais.

Fotos (e legendas): © Luís Graça (2024). Todos os direitos reservados. [Edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné].



1. Na realidade, o Mundo é Pequeno e a Nossa Tabanca... é Grande (*)... São pouco mais do que 70 km a distância que nos separa, entre Torres Novas e Lourinhã... Pois foi justamente em Ribamar da Lourinhã que eu fui encontrar, ontem, o nosso camarada António Dias Galinha, ex-fur mil pil, BA 12, Bissalanca,  1968/70.  

Quem é o António Dias Galinha Dias (Galinha, apelido materno) ? 

Terá ficado na história da guerra da Guiné por ter helitransportado o mais célebre dos "internacionalistas cubanos", o cap Pedro Rodriguez Peralta, do local onde foi gravemente ferido e capturado por forças do BCP 12 (Op Jove, 18nov69) até o HM 241, Bissau (**)...

 A enfermeira paraquedista de serviço nesse voo foi a saudosa  Maria Zulmira André Pereira (1931-2010) (***). 

O hoje ainda vivo coronel Pedro Rodriguez Peralta, membro do comité central do Partido Comunista Cubano (pelo menos até há uns anos atrás) deve-lhes a vida. A eles, e ao ex-cap pqdt João Bessa (recentemente falecido em 13set2024) e ao 1º cabo Regales.

Já tinhamos notícia do Galinha Dias, aqui no blogue: sabíamos, por exemplo, que em 2018 era  sócio-gerente da firma Agroar - Trabalhos Aéreos Lda,  com sede em Évora. Vive hoje em Torres Novas. Reformado. Veio à famosa caldeirada de Ribamar com o irmão, mais velho, Alcides Galinha Dias.

Na caldeirada de Ribamar, evento que tem quase 3 dezenas de anos, juntam-se familiares, amigos, vizinhos, condiscípulos, colegas e camaradas do Eduardo Jorge Ferreira (1952 - 2019) (****)

 Sobre o Galinh osa Dias, escreveu o seu conterrâneo Cèsar Dias (***):

(...) "Estivemos juntos em Mansabá em finais de 70, o Galinha Dias estava com o Helicanhão nesse periodo em proteção aos trabalhos na estrada Mansabá - Farim. Recordo-me por porque no bar de sargentos termos reunido três torrejanos, um piloto, um sapador e um comando da 27a. (...)."

 Fiquei com o email do António Dias Galinha e desafiei-o a juntar-se à nossa Tabanca Grande. Para  já passa a ser "amigo" da nossa página no Facebook. Temos vinte amigos em comum (incluindo o Carlos Pinheiro e o Jorge Narciso). 

Convidei-o a sentar-se à sombra do poilão da Tabanca Grande. O convite é "irrecusável":  do seu tempo já  cá estão o Jorge Narciso, o Jorge Félix, entre outros camaradas da FAP... E para o ano, espero, António e Alcides,  ver-vos sentados de novo à nossa grande mesa de Ribamar: este ano fomos cerca de 80!... Haja saúde!

PS - Soube, pelo camarada Galinha, da morte de mais uma antiga enfermeira paraquedista, a Rosa Exposto, naturald e Bragança. A sua primeira comissão foi na Guiné. Ainda náo conseguimos confirmar por outras fontes (a Rosa Serra, a Giselda Pessoa, a Maria Arminda, que são nossas tabanqueiras; a Rosa Serra não sabia da triste notícia).
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Notas do editor:

(*) Vd. poste de 13 de agosto de 2024 > Guiné 61/74 - P25835: O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande (130): Algarve, 2 de agosto de 2024: juntando à mesa amigos e camaradas, da CCAÇ 2585, CCAÇ 14, 27ª CCmds... (Manuel Resende / Eduardo Estrela)


Vd, também poste de 17 de março de 2021 > Guiné 61/74: P22014: Memórias cruzadas: 18 de novembro de 1969: uma dia (a)normal no HM 241, Bissau, um dia na vida do cap cubano Pedro Rodriguez Peralta, ferido em combate e helievacuado [Jorge Narciso, ex-1º cabo esp, MMA, BA, 12 (Bissalanca, 1969/71) / Jorge Teixeira 'Portojo' (1945-2017), ex-fur mil, Pel Can s/r 2054 (Catió, 1968/70 ) / Manuela Gonçalves (Nela), esposa do ex-alf mil Nelson Gonçalves, cmdt Pel Caç Nat 60 (São Domingos, 1969)]

quarta-feira, 7 de dezembro de 2022

Guiné 61/74 - P23852: Notas de leitura (1529): Paparratos e João Pekoff: as criaturas e o criador, J. Pardete Ferreira - Parte IV: Os cafés de estudantes e a crise académica de 1962 em Lisboa (Luís Graça)

 


Capa do livro de José  Pardete  Ferreira - O paparratos : novas crónicas da Guiné : 1969-1971. Lisboa : Prefácio, D.L. 2004. 169 p., [12] p. il. : il. ; 24 cm. (História militar. Memórias de guerra). ISBN 972-8816-27-8.

1. O ex-alf mil médico José Pardete Ferreira (1941-2021), membro da nossa Tabanca Grande,  que, infelizmente,  nos deixou há quase dois anos (em janeiro de 2021),  é o autor de "O paparratos", um livro que pode ser classificado  como um misto de narrativa histórica e de autobiografia,  em que a realidade e a ficção se misturam. Já fizemos, no passado,  três notas de leitura do livro (*),

A obra, a que o autor chama "romance", tem como subtítulo "novas crónicas da Guiné, 1969/71". Mas o arco temporal da acção   é maior, abarcando, no essencial, a década de sessenta e de setenta (até ao 25 de Abril), com dois acontecimentos marcantes de que o autor foi, ele próprio, protagonista: (i)  a crise académica de 1962; e (ii)  e a sua mobilização, em fevereiro de 1969, para o teatro de operações da Guiné, como alferes mil médico.

 Uma das personagens da narrativa é o João Pekoff (um "alter ego" do autor, José Pardete), apresentado como estudante activista da crise académica de 1962, em Lisboa, ligado à JUC - Juventude Universitária Carólica,  e depois médico no CAOP, em Teixeira Pinto  (de fevereiro a junho de 1969) e no HM 241, em Bissau (até ao princípio de 1971).

Lisboeta, nascido em 1941, filho único, morava, com os pais, no Bairro das Colónias, frequentando, desde cedo, o Café Colonial (que ainda hoje existe, na Av Almirante Reis, aos Anjos; inaugurado em 1934, foi tertúlia e café de estudantes, transformado entretanto em pastelaria, em 1978, hoje Café Pastelaria Colonial).

João Peckoff / José Pardete passou pela Mocidade Portuguesa e a JEC (Juventude Estudantil Católica), enquanto estudante de liceu, e depois pela Acção Católica, a JUC e a Pax Romana - Movimento Internacional de Estudantes Católicos, enquanto estudante de medicina.  Praticou desporto de alta competição na CDUL e no Sporting (onde foi, nomeadamente, guarda-redes nas equipas de andebol)...Além de cirurgião, especializou-se mais tarde em medicina desportiva...

Participou também na organização da assembleia mundial do Movimento Internacional de Estudantes Católicos — Pax Romana, que se realizou em Lisboa, 1960 (vd. cap 16º, "A Pax Romana", pp. 111), ao lado de outros católicos portugueses, como Antero Silva Guerra / António Sousa Franco (?),   Márcia Luisa Piriquita / Maria de Lurdes Pintassilgo, Telma Santana Guera / Teresa Santa Clara Gomes... e outros/as (que não conseguimos identificar). 

2. Interessa-nos dar a conhecer, melhor, aos nossos leitores, essa época da Lisboa dos anos 60, e nomeadamente da crise académica de 1962, vista pelos olhos de João Pekoff, sobre o qual, aliás, o autor diz que  "não tinha grande formação política" (p. 47), o que não o impede ser um dos  "atores" que pisaram o "campus universitário" desse ano histórico (e sobretudo  sua testemunha privilegiada e, ao mesmo tempo,  um crítico da liderança estudantil em Lisboa)... 

Delicioso, como já o dissemos,  é o retrato que ele faz faz de alguns dos históricos dirigentes  do movimento estudantil dessa época: não é difícil descobrir por detrás do pseudónimo Ernesto Figueira, estudante de medicina, a  figura do futuro psiquiatra Eurico Figueiredo (n. 1939, em Vila Real), ou do João Santos, estudante de direito, o futuro presidente da República, Jorge Sampaio. Ambos frequentavam, tal como o João Pekoff, o Café Roma, junto à Praça de Londres, na Av de Roma (pp.  23 e ss). 

Também achámos, na altura, interessante "a ronda dos cafés" (pp. 81 e ss.), uma reconstituição do roteiro histórico dos cafés de estudantes e tertúlias da Lisboa dos anos 50, 60 e 70 (até ao 25 de Abril). Tínhamos prometido falar deste roteiro. Surge agora a oportunidade.(**)

Mal ou bem, os cafés das Avenidas Novas (Roma, Vá-Vá, Monte Carlo...) estão associados, nos anos 50/60/70, à boémia estudantil, animação cultural e sobretudo uma certa atmosfera de "contestação e conspiração" dos jovens que frequentavam a universidade naquele tempo em Lisboa (nomeadamente a Universidade Clássica de Lisboa: letras, direito, filosofia, história...;  mas  também a Universidade Técnica de Lisboa (UTL), frequentada igualmente pelos alunos da Academia Militar que cursavam as engenharias, sem esquecer, na 7ª colina, no Quelhas, o Instituto Superior de Ciências Económicas e Financeiras (ISCEF), hoje ISEG. (Desde os anos 30 que estava integrado na UTL.) 

Ainda não havia em 1962, o ISCTE - Instituto Universitário de Lisboa (criado em 1972, no Campo Grande e depois com instalações modernas (que eu fui inaugurar) na Av das Forças Armadas. A sua criação está associada ao nome de outro "católico progressista", o Adérito Sedas Nunes.

Já existia, isso, sim, o Instituto Superior de Ciências Sociais e Política Ultramarina (ISCSPU), designação criada em 1962, para o antigo Instituto Superior de Estudos Ultramarinos (ISEU), herdeiro da Escola Superior Colonial (fundada em 1906)... Mas em 1962 era rapaziada ordeira, "situacionista", que tinha emprego garantido no Utramar português, como admistradores coloniais, antropólogos, assistentes sociais, etc. O que não impediu que a contestação estudantil de 1969 lá chegasse, e forte, sobretudo entre a malta de economia... E, claro, também ainda não havia a Universidade Nova de Lisboa, criada no fim do marcelismo, em 11 de agosto de 1973...

Fiquemo-nos pela "cidade universitária", circunscrita ao Campo Grande/Saldanha, ou seja, afinal, à Universidade Clássica de Lisboa.... Dizia-se que o Salazar, provinciano e coimbrão, sempre quis, em Lisboa, os diferentes estabelecimentos de ensino superior universitário, "higienicamente" separados no espaço... Ele lá tinha as suas razões.

O maior destaque é dado ao Café Roma... Mas havia outros cafés frequentados por estudantes, escritores, intelectuais, jornalistas, homens e mulheres do cinema e do teatro,  e demais figuras da vida cultural da cidade no início dos anos 60:

(...) Continuando a ronda alargada dos cafés lisboetas que acolhiam estudantes, é de lembrar o Café Minabela, na Amadora,  não esquecer o Café Monte Carlo, onde pontuava o imponente Pena Peres  [não descortinamos quem fosse o personagem por detrás deste pseudónimo]. , nem a Leitaria próxima, na Duque d'Ávila, que tinha sofrido uma carga a cavalo da GNR (...). 

Não se olvida , do mesmo modo, o Monumental, nem o D. Rodrigo, na Avenida D. Rodrigo da Cunha, aquela via larga que liga a Avenida Gago Coutinho às traseiras da Igreja de São João de Brito, em Alvalade. No D. Rodrigo um castiço trauteava, quase em permanência, as canções de Jacques Brel, muito em voga naquele período, tais como "Le Diable"  e "Les Flamandes" (...).

Provavelmente o mais famoso e icónicos dos cafés desta época é o Monte Carlo, a par do Vá-Vá, duas referências obrigatórias dos roteiros históricos dos cafés lisboetas da época ... Mas, ainda de acordo com o autor que temos vindo a citar:

(...) A Pastelaria Biarritz e a Casa dos Caracóis (...) mantêm-se de pedra e cal. Já o mesmo não se pode dizer do celebérrimo Monte Carlo que deu lugar a uma loja de uma cadeia espanhola de venda de vestuário  [Zara].  Tão pouco o Monumental cumpriu as promessas de antanho. (...). (pág,  81).

(...) É um risco calculado não se citar  com deferência o Vává, o Londres, a Mexicana, e tantos, tantos, tantos mais que, embora omissos, bem por sombras estão esquecidos. Neles, não eram só os estudantes que faziam pulsar a cidade e que viviam 'nessa Lisboa que eu amo', como diz a marcha (...).

Como em Lisboa não havia a típica república da Academia de Coimbra, cada estudante  vvivia com uma família, que por vezes coincidia com a sua, em quarto alugado, ou em algunas das poucas casas próprias para estudantes (...) (pág. 82).

Pardete Ferreira descreve muito bem o que era "o Café, naquete tempo",  enquanto local de sociabilidade (pág. 85):

(...) Era um local onde nasciam e eram alimentadas amizades que perduaravam ao longo de uma vida inteira. Tal como no mato.  Aquela instituição substituia, com naturalidade, aquela grande árvore do largo da igreja lá da aldeia, em torno da qual as gentes se sentavam para cavaquear, cultivando assim a camaradagem e a amizade. (...) Hoje,  o Café está ultrapassado e a maioria das pessoas já não o usa como tertúlia, nem os estidantes o utilizam  como local de estudo institucionalizado".

Estamos de resto a falar de uma época, os primeiros anos da década de 60, em que a população universitária lisboeta seria ainda da ordem dos  escassos milhares (c. 12 mil - 15 mil), oriundos da classe média e classe média alta, com apenas uma irrisória representação (da ordem dos 6-7%) das classes trabalhadoras, segundo um estudo do sociólogo Sedas Nunes.

E conclui o autor de "O Paparratos":

(...) Poderá parecer que se tenta dizer que o Portugal de hoje nasceu à volta da mesa de um Café, algures em Lisboa, provavelmente no Roma, saboreando um bica que ia arrefecendo, fumando um cigarro (...). Pensa-se não ser questionável que muitos dos estudantes de 1962 e seguintes, tornados oficiais milicianos, nados e criados tal e qual como o Paparratos, em qualquer aldeia anónima deste país ou em urbe mais ampla, também tenham sido o fermento de um modo de pensar (...) que, uma vez consolidado, permitiu que a sociedade portuguesa acolhesse com tanto entusiasmo os acontecimentos de 1974 (...) (pág. 84.)


3. O Pardete Ferreira dedica o capítulo II, de "O Paparratos",  ao café Roma (pp. 23-28), que descreve nestes termos:

(...) Em Lisboa, junto à Praça de Londres, na Avenida de Roma,  havia um café com cerca de duzentos metros quadrados que dava pelo nome de Roma.  Era um lugar preferencialmente frequentado por estudantes que, a troco de uma simples bica e de um copo de água, nele faziam biblioteca, com livros, sebentas,  cadernos, papéis e outros objectos  ligados à vida escolar pejando as mesas e cadeiras" (pág. 23).

Dois dos conhecidos líderes da crise estudantil de 1962 frequentavam o Roma: o José Santos (pseudónimo de Jorge Sampaio), já licenciado  em direito (em 1961), e Ernesto Figueira (pseudónimo de Eurico Figueiredo, n. 1939, em Vila Real), estudante de medicina, futuro pisquiatra.

Jorge Sampaio (1939-2021) foi presidente da Associação Académica da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, em 1959-1960 e em 1960-1961, e secretário-geral da Reunião Inter-Associações Académicas (RIA), em 1961-1962.

João Santos /Jorge Sampaio é descrito, em "O Paparratos", nestes termos, de fino recorte literário:

(...) Numa das mesas do fundo, no lado essquerdo de quem entrava,  não muito longe do balcão, tinha foral um rapaz de vinte e tal anos, discretamente sobre o ruivo, testa alta, olhos não muito exressivos, por vezes parecendo duros, metálicos, de tom azulado, transportando óculos grossos. Possuía tez clara, era algo magro e tinha uma estatura ligeiramente superior à média. Vestia preferencialmente fato  azul, não muito escuro, sendo a gravata quase sempre a condizer com este último, repousando sobre leito de camisa branca. Interrompia frequentemente o estudo  e passava grande parte das suas tardes a ler Camus ou o último Libération que comprara nas bancas" (...) (pág. 23).

(...) Filho de boas famílias, educado no estrangeiro (...), o José Santos tinha sobretudo a estrutura de um ideólogo. Paradoxalmente, não tinha ainda ideais muito claras e, mesmo desprovido de um carisma marcado de líder, impunha-se pela cordialidade de um discurso escorreito e pela conversa erudita, apoiada em citações de Camus, não descurando Nietzsche, Kant, Engels, Marx e Lenine, à mistura de Baudelaire e Jean-Jacques Rousseau ou, ocasionalmente Voltaire" (pág. 25).

Além disso, "confessava-se agnóstico. Com frequência, era o centro de atenções, juntando à sua volta uma meia dúzia de interlocutores, a  quem por vezes se via obrigado a pagar a despesa (...). Cursava direito e não  escondia uma certa ambição" (...).

João Santos e Ernesto Figueira encontravam-se com frequência no Café Roma, mesmo pejado de informadores da "Pevide" (PIDE), a começar pelos empregados de mesa.  Enquanto o primeiro era "uma  espécie de ideólogo" , o segundo era o "comandante operacional do movimento estudantil" (pág. 35).  

Também se encontravam na Cantina Universitária. Os estudantes também frequentavam o bar do Estádio Universitário onde "por mais cinco ou dez tostões", se comia "francamente melhor" do que na Cantina. "O bitoque, o pão, a imperial e a bica, por doze escudos e cinquenta centavos  [equivalente, a preços de hoje, a 6 euros].

A crise académica de 1962, em Lisboa, é desencadeada quando, a 24 de março,  o Governo de Salazar proíbe, estupidamente,  as comemorações tradicionais do Dia do Estudante, tendo a  Polícia de Choque invadido a Cidade Universitária, e carregado sobre centenas de jovens, rapazes e raparigas.  

Passados dois dias, os estudantes de  todas as escolas superiores de Lisboa declaram "luto académico" (na prática, greve geral às aulas, usando uma forma de luta que era proibida pelo regime). Mês e meio depois, a 9 de maio, há uma escalada do conflito, com a adoção, num plenário de estudantes,  de uma nova forma de protesto: uma greve de fome coletiva, na cantina. 

A medida, arriscada,  for proposta por Eurico Figueiredo e seguida por centenas de estudantes como António Correia de Campos, que eu vou encontrar mais tarde como colega na Escola Nacional de Saúde Pública.

A 11 de maio, a cantina foi cercada pela polícia de choque e os estudantes foram detidos (cerca de 800, segundo a versão da PSP ou cerca de 1200 segundo as associações de estudantes). Terá sido a maior operação policial realizada pelo Estado Novo.

Seguiu-se uma enorme onda de indignação, tendo todos os estudantes detidos sido libertados  libertados a 14 de maioEntretanto, um mês depois, em 14 de junho, um plenário realizado no Instituto Superior Técnico ditou o levantamento da greve.

Um despacho ministerial em final de junho  veio punir 21 grevistas com uma pena de expulsão, durante 30 meses, de todas as escolas de Lisboa.

Mas "poucos foram efetivamente convocados para a primeira incorporação militar que se seguiu ao Luto Académico" (...) "A grande maioria voltou progreessivamente  à sua vida habitual" (...) (pág. 39). Afinal, ninguém queria perder o ano, e isso explica que o fim do "Luto Académico" (eufemismo para não se dizer greve...) foi recebido com alívio... Mas a verddae é que nada ficou como dantes...

Jorge Sampaio, Eurico Figueiredo, Medeiros Ferreira e outros dirigentes estiveram detidos.

A crise académica de 1962 foi um acontecimento de grande significado político e sociológico. Hoje, passados 60 anos, alguns dos seus protagonistas recordam a resposta do movimento estudantil à repressão salazarista.  Caso de António Correia de Campos, antigo ministro da saúde, e conhecido dirigente socialista, em entrevista à Lusa, em 22/3/2022, e citado pelo "Observador":  (..) " enumera três 'dirigentes de grande envergadura', cujo papel foi determinante na gestão da crise: Jorge Sampaio, no centro ideológico — sociais democratas, mais socialistas, Eurico Figueiredo, então militante do PCP, e Vítor Wengorovius, o católico progressista." 

Mais houve mais dirigentes estudantis, a merecer destaque: Alberto Torres da Silva, Afonso de Barros, Manuel Lucena e José Medeiros Ferreira (que viria a suceder a Jorge Sampaio como secretário-geral da Reunião Inter-Associações,  a RIA). Poucos mas corajosos foram os professores que se solidariezra,m com os estudantes, como Lindley Cintra ou Pereira de Moura, por exemplo.

Octávio Quintela, em "Algumas considerações a propósito da crise académica de 1962" (Ler História, 62, 2012, pp. 187/192) escreveu:

(...) A greve de 1962, na sequência da proibição do Dia do Estudante, foi o resultado da luta de milhares de jovens católicos, sem partido, mas muito também da ação dos comunistas. Em cada Faculdade de Lisboa é possível destacar três ou quatro ativistas de um vasto conjunto:

(i) Em Direito, Jorge Sampaio, Vítor Wengorvius, Correia de Campos, J. Felismino, Macaísta Malheiros, Pedro Ramos de Almeida. 

(ii) Em Letras, Medeiros Ferreira, Mário S. M. Cardia, João Paulo Monteiro, Alberto Teixeira Ribeiro, Maria Assunção Franco, Maria João Gerardo e eu próprio;

(iii) Em Ciências, António Ribeiro e Ernani Pinto Basto;

(iv) Em Medicina, Isabel do Carmo, Rui de Oliveira, Eurico Figueiredo, Alexandre Ribeiro, Dante Marques;

(v) No Técnico, João Cravinho, Crisóstomo Teixeira e José Bernardino." (...)

Curiosamente não sabemos em que ponto ficou a situação militar destes jovens. Relatuvamente a Jorge Samapio, sabemos que ficou isento do serviço militar, pro razões de saúde.

Alguns terão ido parar á Guiné. É o caso de José Augusto Rocha (1938-2018), que foi alf mil, CCAÇ 557, (Cachil, Bissau e Bafatá, 1963/65): director da Associação Académica de Coimbra, em 1962, foi expulso de todas as Escolas Nacionais, por dois anos, na sequência da crise académica de 62, esteve preso no Forte de Caxias; liberto sem culpa formada, ao fim de 4 meses, acabando por ser chamado para a tropa e mobilizado para o CTIG. (Só terminaria a licenciatura em direito, na Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, depois de ter regressado do TO da Guiné, em novembro de 1965.)

Um outro caso, mais conhecido dos leitores do nosso blogue, é o do açoriano José Medeiros Ferreira (1942-2014) (tem 7 referências): depois de se destacar na crise estudantil de 1962, foi chamado em 1967 a cunprir o serviço militar; mobilizado para a Guiné, não comparaceu ao embarque da sua companhia, a CCAÇ 2402 (Có, Mansabá e Olossato)/ BCAÇ 2851 (Mansabá e Galomaro) (1968/70), no T/T/ Uíge, em 24 de julho de 1968.

È provavelmente o mais conhecido dos desertores da guerra colonial: viveu na Suiça, onde se licenciou em História, pela Universidade de Genebra (1972). Depois do 25 de abril, foi eleito deputado à Assembleia Constituinte (1975), pelo Partido Socialista, e exerceu o cargo de Ministro dos Negócios Estrangeiros do I Governo Constitucional (1976–1978), chefido por Mário Soares. Foi professor universitário (Faculdade de Ciências Sociais, Universidade NOVA de Lisboa).



Amadora > RI 1 > 1968 > CCAÇ 2402, em formação > De pé e da esquerda para a direita, o Raul Albino, o Francisco Silva e o Medeiros Ferreira, aspirantes milicianos.  [Os dois primeiros são membros da nossa Tabanca Grande, e o Raul, infelizmente já falecido.]

O João Bonifácio, ex-furriel mil SAM, CCAÇ 2402 (Mansabá e Olossato, 1968/70) e que vive no Canadá, evocou aqui no poste P1592, o exemplo do Medeiros Ferreira que, como é publicamente sabido, não compareceu ao embarque, para a Guiné . Ele é, das nossas figuras públicas, talvez o mais conhecido dos desertores da guerra colonial.

Na foto acima, o antigo Ministro dos Negócios Estrangeiros de Mário Soares (I Governo Constitucional, 1976/78), historiador e professor universitário (FSCH/NOVA), já falecido, José Medeiros Ferreira (Ponta Delgada, 1942 - Lisboa, 2014), aparece assinalado com um círculo a vermelho.  

Foto (e legenda) : © Raul Albino (2006). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]

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Notas do editor:

(*) Vd. postes de:

15 de março de 2021 > Guiné 61/74 - P22008: Notas de leitura (1346): Paparratos e João Pekoff: as criaturas e o criador, J. Pardete Ferreira - Parte III: Rui Angel, aliás, Pedro Rodriguez Peralta, capitão do exército cubano, o mais famoso prisioneiro da guerra colonial... Aqui tratado com humor desconcertante (e humanidade) (Luís Graça)

23 de fevereiro de 2021 > Guiné 61/74 - P21939: Notas de leitura (1343): Paparratos e João Pekoff: as criaturas e o criador, J. Pardete Ferreira - Parte II: os "mentideros' de Bissau (Biafra, 5ª Rep) e ainda e sempre a retirada de Madina do Boé (Luís Graça)

 
(**) Último poste da série > 5 de dezembro de 2022 > Guiné 61/74 - P23848: Notas de leitura (1528): Guevara versus Amílcar Cabral: Divergências estratégicas na guerrilha (1) (Mário Beja Santos)

quinta-feira, 24 de junho de 2021

Guiné 61/74 - P22313: FAP (124): Memórias de lugares da guerra... A Base Aérea 12 de Bissalanca (Mário Santos, ex-1.º Cabo Especialista MMA)



1. Em mensagem de 22 de Junho de 2021, o nosso camarada Mário Santos (ex-1.º Cabo Especialista MMA da BA 12, Bissalanca, 1967/69) fala-nos das suas memórias na BA 12 de Bissalanca


MEMÓRIAS DE LUGARES DA GUERRA...
A BASE AÉREA 12 - BISSALANCA


Embora tenha noção de que tudo isto é parte de um passado longínquo, ele será sempre parte intrínseca de todos nós e da nossa história, que perdurará não só enquanto vivermos, mas também para além da vida, consubstanciado nos nossos contos e narrativas. Esse passado sofrido e glorioso, que são pedaços das nossas vidas....

Foi assim, historiando um pouco... que decidi narrar-vos o início atribulado da minha viagem para a Guiné; recordo-me que na escala pela Ilha do Sal, o C-54 H - Skymaster parecia uma lata velha, com o pessoal assustado com a turbulência, a pista transformada em lago e depois o dilúvio, numa terra onde há muitos meses não chovia uma gota.

Ainda recordo o banho de chuveiro no "Hotel abarracado" ... de água salgada... e depois, o arrastar de camas a tentar fugir das goteiras que caíam dos tectos esburacados. Acabei na rua em cuecas a tirar do corpo a água salgada com água da chuva... e a fugir dos percevejos que se passeavam pelos lençóis... e que tinha visto pela primeira vez na vida.

Depois, já no dia seguinte na BA12, quando abriram a porta do avião, aquela sensação de ar rarefeito, desagradávell quente e húmido, bafiento, pegajoso... e o pensamento de que tínhamos chegado a um local amaldiçoado... e tudo isto, aos 18 anos, ainda com a personalidade e experiências de vida apenas na fase de formação.

Alguns dias depois, já na linha da frente da Esquadra de Fiat G-91 onde fui colocado, a famosa 121... tive o bizarro conhecimento de que vários camaradas de outras Esquadras que tinham sido companheiros de Liceu, Escolas Comerciais e Industriais, alguns até colegas de turma nos mesmos estabelecimentos de ensino, eram, pasme-se: Furriéis, Sargentos e Alferes Milicianos.
Alguns de nós com habilitações académicas para Sargentos ou Oficiais, éramos simples 1.°s Cabos... Especialistas...

O clima, quente e húmido, a má qualidade da água, comida e sofriveis instalações, completaram o quadro de tudo com que não sonhávamos ou desejávamos...

As grandes amizades, companheirismo, convivência, solidariedade, cumplicidade, começaram a tomar conta de todos nós... Começámos a perceber que nos 2 anos seguintes, estes eram os valores a que nos teríamos de agarrar para conseguirmos passar pela missão o melhor possível...

A responsabilidade e o espírito de missão foi-se enraizando e pouco tempo passado, já faziam parte do grupo. Aos poucos, fomo-nos familiarizando também com os nossos chefes, que nos introduziram nos procedimentos técnicos de manutenção e apoio de voo. Inspecções, segurança, procedimentos pré e pós voo...

A vida na Guiné não era para ninguém uma pera-doce... contudo a nossa irreverência era uma arma poderosa.

As linhas da frente da BA12, em placa de cimento, chegavam fácilmente por volta do meio-dia, bem acima dos 40° graus centígrados... Não havia sombras, água... e o protector solar ainda não era uma opção.

Eu, e os meus camaradas da Linha dos G-91, tínhamos todos terminado o Liceu ou Escola Técnica e este era o nossa primeira actividade... como especialistas FAP. Todos entre os 18 e 20 anos de idade, com excepção do Chefe de Linha, o 1.° Cabo Especialista R/D Fernando Vilela, que tinha sido nomeado a partir da Linha da Frente dos T-33 na BA2, e era o único já com alguma experiência na manutenção e apoio de voo. Todos os Sargentos, tal como outros 1.°s Cabos mais antigos, permaneciam no "conforto" do hangar onde se efectuavam as inspecções programadas, ou se resolviam reparações mais complexas.

A expectativa dos primeiros voos era enorme, tal como a curiosidade em conhecermos os nossos Aviadores a quem nos dois anos seguintes iríamos dar a nossa imprescindível colaboração...
Não houve qualquer apresentação formal, chegavam de Jeep, vindos das Esquadras, cumprimentavam, fazíamos a inspecção prévia juntos, retirando as cavilhas de segurança do Trem de aterragem, subíamos a escada, eram amarrados à Martin Baker e depois de retiradas as seguranças, estavam prontos para partir...

Foi assim que as minhas rotinas diárias, no G-91, com o Ten Cor Costa Gomes, Capitão Vasquez, Capitão Costa Pereira, Tenentes Vasconcelos, Nico, Balacó e Neves se iniciaram no último trimestre de 1967. Mais tarde, com o decorrer da Comissão, os mais antigos, como o Capitão Costa Pereira e Tenente Vasconcelos, foram respectivamente rendidos pelo Capitão Amílcar Barbosa e Tenente Roxo da Cruz, tal como o Coronel Manuel Diogo Neto, futuro Comandante da Zona Aérea Cabo Verde/Guiné, (CZACVG).

Como tudo na vida, todos nós desenvolvemos personalidades, maneiras de ser e actuar diferentes. Foi assim também relativamente aos nossos Pilotos da Esquadra de Tigres. Havia a classe mais extrovertida e faladora, assim como os economizadoras da palavra, que só diziam o que era absolutamente indispensável...

Os G-91 eram entregues, diáriamente,  ao mesmo Mecânico, até por uma questão de responsabilização... Já com os Pilotos creio ser sido diferente, uma vez que chegavam do GO (Grupo Operacional) com missões já atribuídas...

Em boa verdade, começaram a haver preferências de quem dava saída a quem... Nenhum de nós gostava de apanhar o nosso Ten Cor, era antipático, pouco comunicativo e com uma postura de quem pertencia a um outro mundo...

Depois, havia também preconceito com alguns dos Tenentes... Porque eram empertigados, oriundos da AM, um porque se dizia que era de sangue azul e nem sequer olhava a direito para nenhum de nós... outro porque tratava todos os subordinados com afastamento e até algum desprezo... Parecia terem esquecido que estávamos todos envolvidos numa guerra terrível e de que necessitávamos da solidariedade e cooperação de todos. Eram, todavia todos bons Pilotos, apesar da inexistência da experiência de combate.

Eu, cá por mim, tinha preferência por um par de jovens Tenentes, que tinham chegado à Base no mesmo dia que eu, e a quem podia pedir para fazer umas piruetas, ou uma rapada, caso ainda chegássem com algum JP4 no Fuel Collect Tank... (reserva).


Verificação do Pylon

Bissalanca 1968

Bissalanca 1968

No final, direi que foi com grande orgulho e espírito de missão que contribuí para que a actuação da Esquadra de Intervenção Tigres de Bissalanca tivesse sido um sucesso e tivesse contribuído para a protecção dos nossos camaradas do Exército e Marinha. No final, numa guerra assimétrica, estávamos todos dependentes uns dos outros. Quem nos dera ter o poder de fazer rewind ao relógio da vida, e voltarmos todos aos bons tempos da nossa meninice e juventude...

Um lamento sincero por todos os que não foram bafejados pela sorte, e não conseguiram regressar... ou voltaram fisicamente diminuídos.

Grande abraço
Mário Santos

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Nota do editor

Último poste da série de 18 DE MARÇO DE 2021 > Guiné 61/74 - P22015: FAP (123): Em louvor do ex-fur mil pil av António Galinha Dias e da tenente enfermeira paraquedista Maria Zulmira André Pereira (1931-2010) que fizeram a evacuação Ypsilon do cap cubano Pedro Rodriguez Peralta, em 18 de novembro de 1969, na sequência da Op Jove (Jorge Narciso / Maria Arminda)

sexta-feira, 9 de abril de 2021

Guiné 61/74 - P22085: FAP (124): António Galinha Dias, o ex-fur mil pil, que fez a helievacuação do cap cubano Peralta, em 18 de novembro de 1969 (Miguel Pessoa, cor pilav ref)


Foto nº 1 A > Mira-Sintra / Meleças > 2018 > O ex-fur mil pil António Galinha Dias, BA 12, Bissalanca, 1968/70. É hoje sócio-gerente da firma Agroar - Trabalhos Aéreos Lda. com sede em Évora.


Foto nº 1 >  Mira-Sintra / Meleças > 2018 > Convívio de pessoal da FAP que voou na Guiné. O segundo a contar da esquerda é  ex-fur mil pil António Galinha Dias, que fez a helievacuação do cap cubano Pedro Rpodriguez Peralta, em 18 de novembro de 1969, sendo a enfermeira paarquedista a Maria Zulmira.

Foto (e legenda): © Miguel Pessoa (2021). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné].


1. Mensagem do Miguel Pessoa, herói dos céus da Guiné, ferido em combate por um míssil Strela, ex-ten pilav, BA12, Bissalanca, 1972-74, hoje cor pilav ref, com mais de 2 centenas de referências no nosso blogue:

Date: quinta, 8/04/2021 à(s) 14:50
Subject: Piloto do heli que evacuou o Peralta (*)

Olá, Luís.

Encontrei esta foto do Galinha Dias,  tirada num convívio de pessoal que voou na Guiné, realizado em 2018. 

O Galinha Dias é o 2º da esquerda, de blusão cor de tijolo [. Foto nº 1, acima]

Abraço.  Miguel
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quinta-feira, 18 de março de 2021

Guiné 61/74 - P22015: FAP (123): Em louvor do ex-fur mil pil av António Galinha Dias e da tenente enfermeira paraquedista Maria Zulmira André Pereira (1931-2010) que fizeram a evacuação Ypsilon do cap cubano Pedro Rodriguez Peralta, em 18 de novembro de 1969, na sequência da Op Jove (Jorge Narciso / Maria Arminda)


O ex-fur mil pil António Galinha Dias 
e a tenente enfermeira paraquedista Maria Zulmira (1930-2010)


1. Comentário, ao poste P22014,  do Jorge Narciso, ex-1.º cabo esp, MMA, BA 12, Bissalanca, 1969/71, membro da nossa Tabanca Grande, desde 2009:

Abraço para o editor de serviço

Há algum tempo que não passava pelo Blogue, o que por mero acaso resolvi fazer hoje e, surpresa, vejo uma foto minha neste 1.º Post, visível,

Li e percebi a associação dos dois eventos relatados.

Sem aparentemente nada a recordar, notei no entanto a dúvida quanto a quem seria o Piloto da evacuação e lembrei-me que num almoço de convívio de pessoal da BA12 tal assunto veio à baila e, através do próprio, soube (apesar de ter participado, jamais me relembraria) que o Piloto foi o António Galinha e a enfermeira a Maria Zulmira

Mais um Abraço
Jorge Narciso

18 de março de 2021 às 01:15

2. Comentário do editor LG:

Em informação complementar,por email, o Jorge Narciso precisou que se trata do António Galinha Dias, ex-fur mil pil av. É de Torres Novas, vive hoje em Évora e tem página no Facebook (embora inativa desde 1 de julho de 2019), e donde com a devida vénia fomos buscar a foto que publicamos acima. 

Sem querer fazer concorrência ao excelente blogue dos Especialistas da Base 12, Guiné 1965/74, e muito menos melindrar o seu fundador e editor principal nosso querido amigo, camarada e nosso grã-tabanqueiro, Victor Barata, convidamos o António Galinha para se juntar à Tabanca Grande, a mãe de todas as tabancas, onde, de resto, o pessoal da FAP, que andou pelos céus da Guiné daquele tempo, está também muito bem representada.

Por sua vez. a Maria Zulmira [André Pereira] [1931-2010] tem 8 referências no nosso blogue.


3. Reprodução, com a devida vénia de um testemunho da Maria Arminda [Santos],  ex-ten enf pqdt, publicado no blogue dos Especialistas da Base Aérea 12, Guiné 65/74, em  17 de outubro de 2010 (**):


(...) Como sempre refiro: A vida São os Dias que nos Lembramos. Quando o contrário acontece, em que já não estamos cá fisicamente ou a nossa memória partiu para outros universos de pensamentos, a vida deixa de ser real.

São essas as razões porque a memória dos Homens, anda por vezes distraída mas enquanto a minha não se ausentar totalmente,  quero, não só recordar mas ainda para que fique para a história, pelo menos como registo neste blogue, quem foi a Enfermeira Paraquedista que assistiu e tratou o Capitão do Exército Cubano ao serviço do PAIGC, Pedro Rodriguez Peralta, ferido e evacuado da zona do Guileje.

Sempre que se fala da captura do Capitão Peralta, fico muito triste e decepcionada. Na recente publicação pelo jornal Correio da Manhã, intitulada “As grandes Operações Militares da Guerra Colonial “, e até noutras publicações anteriores por outros órgãos de comunicação social, são referidos os nomes dos oficiais que planearam e executaram a “Operação Jove”, realizada em 18 de Novembro de 1969 pelas Tropas Paraquedistas na zona do Guileje. Foi nessa operação que foi ferido e capturado o referido oficial cubano e mais não dizem, ficando a narrativa incompleta.

Quando foi solicitada, pelo Sr. Capitão Paraquedista Bessa uma evacuação urgente, foi enviada de helicóptero uma enfermeira paraquedista a quem foram dadas ordens expressas,para fazer tudo, mesmo tudo o que estava ao seu alcance,  para salvar aquele ferido que se encontrava em péssimas condições físicas e em estado de choque, não podendo falhar nada para que o doente chegasse vivo ao hospital e em condições gerais estáveis para ali ser intervencionado de imediato.

A enfermeira iria fazer o que sempre fez aos feridos em situações semelhantes, mas a carga emocional foi grande pelo tom imperativo que envolveu a recomendação.

Logo que o ferido lhe foi entregue procedeu de forma adequada,  estabilizando o seu estado geral, terminando com a colocação do seu casaco de camuflado para o aquecer até chegar ao hospital.

No fundo não fez mais do que fazia habitualmente; a carga emocional é que foi muito maior, porque ela sentiu o peso da importância daquela vida para os militares envolvidos na operação, a importância para a própria organização militar e logicamente para o país, dadas as características do prisioneiro ferido. Só começou a aliviar o seu stress depois de o entregar no Hospital Militar de Bissau, vivo e em condições para novas intervenções só feitas a nível hospitalar.

Parece que a enfermeira não teve importância nenhuma, muito menos mérito nenhum em toda esta história.

Nós éramos tão poucas, não seria difícil aos investigadores e autores dos artigos informarem-se dos nomes da enfermeira, do piloto e eventualmente do mecânico, que tal como a enfermeira passaram por níveis acrescidos de stress na missão deste acontecimento muito especial e que foi sem dúvida com grande mérito para as nossas tropas, tendo ficado por esse facto, na história da guerra da Guiné.

Para que conste, e para que pelo menos fique registado no blogue dos Especialistas da Base Aérea 12 o nome da citada enfermeira: Maria Zulmira Pereira André, tenente graduada enfermeira Paraquedista, foi a enfermeira que foi buscar nas matas do Guileje o Cubano, senhor capitão Peralta.

Tenho pena de não referir os nomes do piloto e do mecânico porque na questão de evacuações, éramos um todo, cabendo a cada um a sua tarefa específica, complementávamo-nos para que a missão fosse bem sucedida. Mas também eu desconheço quem foram eles.
Sempre que falava com a Zulmira sobre este acontecimento e que ia dizer aos distraídos que tinha sido ela a tal enfermeira, respondia-me com esse seu modo conciliador: "Deixa lá, Maria Arminda, não te aborreças, não tem importância nenhuma não falarem de mim, isso hoje não interessa, já passou".

Não é bem assim, minha amiga, e agora que já não estás entre nós, tomo esta atitude para honrar a tua memória, pela pessoa boa que sempre foste, pelos amigos que fizeste, pelo extraordinário desempenho profissional e com espírito de missão que sempre puseste ao serviço de todos.

Grata pela oportunidade de dar a conhecer este pormenor da Operação Jove e da importância que a enfermeira Zulmira André teve na vida do Capitão Peralta e na projecção do êxito da mesma captura pelas tropas paraquedistas.

Com os meus Cumprimentos

Maria Arminda
ex-tenente enfermeira paraquedista
 

(**) Vd. poste:

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