Assunto - Ruminações
Caríssimo Luís Graça ( e outros camaradas-irmãos, se o nosso comandante quiser “partilhar” estas minhas “ruminações” )
Acabo de abrir o computador para me pôr em dia com os meus camaradas da Tabanca e verifico que estou mesmo a ficar atrasado. Tanta coisa boa:
- poesias do Manuel Gouveia Oliveira que merecem admiração e aplauso;
- uma homenagem do Joaquim Caldeira ao “desconhecido herói' Adriano ( e quantos outros merecem um post destes e muito mais e nunca são lembrados por ninguém!);
- crónicas do Juvenal Amado que nos fazem lembrar algumas situações semelhantes nas nossas vidas mas que na maioria dos casos, nunca passam de "luzes debaixo de alqueires”, por nunca serem partilhadas…;
- um comentário muito apropriado do Eduardo Estrela ao post do Adão Cruz (ambos me fazem inveja porque eu não sei dizer tanto com em tão poucas palavras; … etc etc…
Mas há um post muito especial que me causou uma cascada de emoções, frustração e inveja por não poder participar melhor do que sentir um nó no peito. Entre outras, muitas saudades. Saudades dum encontro semelhante (um festival do mexilhão ) onde eu e a Vilma fomos e em que, parece-me, estiveram toda a gente mencionada nesta "batatada de peixe seco”: O saudoso Eduardo e a São; o Rui Chamusco; os duques do Cadaval Pinto de Carvalho e Céu Pintéus; O Jaime ; e tu e a Alice…
E fez-me lembrar os meus tempos de miúdo: eu ainda não estava na escola primária, portanto devia ter os meus quatro ou cinco anos ; quando em Peniche havia peixe com fartura vinham sempre uma ou duas carrinhas vender o peixe pelas aldeias ; quando chegavam à minha aldeia, a Bombardeira, geralmente já só havia chicharro que vinha em bruto, na parte de trás da carrinha . E não era vendido ao quilo mas "em atacado" ( é assim que se diz certo?) aos cestos. Se me não engano chegava a ser cinco tostões por um cesto de chicharro.
Não vou fazer comentário a este teu post pois que não tenho o que é necessário para o fazer . Mas mais uma vez, aproveito quem sabe falar e escrever melhor do que eu: “ Grande texto, Luís, estas a escrever como um principe, dos bons, da excelente literatura” diz o António Graça de Abreu. Ele tem razão. E a ambos eu tiro o meu chapéu.
E já que estou no computador, aproveito para te dar notícias nossas. Estamos bem, mais ou menos, pois na nossa idade, pelo menos no que me diz respeito, quando dizemos que está tudo bem, geralmente estamos a mentir: se não é a perna que dóe .. são os dentes a atrapalhar ou as costas a lembrar que estamos nos “entas” avançados. Agora ando quase sempre de bengala, por vezes até dentro de casa.
A Vilma essa parece cada vez mais nova: neste momento está em Maryland ( um “estado" perto de Washington) numa convenção relacionada com meditações e coisas assim . Ela bem me quis convencer a ir com ela mas eu pus os pés no chão: tive e fiz mais retiros e meditações, nos meus tempos de colégio, mais que suficientes para o resto da vida… Mas ela lá está contente e feliz. Falamos pelo WatsApp todos os dias duas ou três vezes. Quando ele me disse que gostava de ir a esta convenção eu pus as minhas reticências e objeções; mas evidentemente que não me opus, desde que fosse sozinha! ; e agora vejo que agi bem: ela está tão feliz que ao olhar para ela não posso deixar de sentir a sua alegria contagiante!
E não estou a dizer isto porque sou católico. “Voltei"ao catolicismo depois de muitas "visitas e viagens” que incluíram o ceticismo e agnosticismo… Muita gente pensa que o facto de eu por vezes ter muitos contactos com autoridades e líderes religiosos quer dizer que sou muito “religioso.” E não é bem assim. Na verdade sou católico , mas não sou “fanático”. Acho que antes de ser cristão um indivíduo é um ser humano. E por vezes até digo que me sirvo dos meus "contactos religiosos” para atingir fins sociais, independentemente da sua ligação ou não com religiões. Mas … chega de ruminações religiosas para hoje.
Bom, agora vou fazer uma pausa, que tenho de ir pintar o meu "back yard” (um pequeno quintal na traseira da minha casa.). Volto logo. Ou então faço como tu que te levantas às três da manhã para falar com os teus amigos e camaradas.
Estou de volta .
Disseste-me há tempos ( em comentário ao 4 de Julho americano com sabor a bacalhau ) que sou um "homem de ideias práticas, gostas de bricolagem” …. Deixa-me responder a esta tua afirmação/suposição. Porque parece-me que tens razão. Mas primeiro deixa-me fazer as devidas "ressalvas” para não ser mal compreendido e fazer figura de charlatão.
Lembro o que o meu pai dizia: "alguém que diz ter sete ofícios, pode ter quantos ofícios quiser mas não é bom em nenhum deles.” Portanto o que segue não em qualquer intenção de ridícula gabarolice. Os meus “ofícios" de alguma maneira foram-me impostos… tomei-os por pura e simples necessidade, nada mais. Sobrevivência ….
Pergunto-me o que diria hoje o meu pai , ao ver que o seu filho “virou” ( "virar “era uma palavra que ele usava para dar ênfase a uma ideia fora do vulgar) mesmo um homem de sete ofícios…As voltas da minha vida depois da Guiné deram mesmo nisso. É que "a necessidade faz o ladrão”. Quis estudar línguas e para isso tive de começar a lavar pratos e panelas… e eu que nunca tencionava trabalhar em restaurantes, de repente fizeram de mim um garçon, depois “virei” maitre d’hotel, gerente de restaurante, e finalmente mordomo.
Se "virei activista” também não tive culpa. As circunstancias em que me encontrava quando as coisas “apareciam" não me permitiam fazer diferentemente do que fiz. O acaso trouxe-me a Nova Iorque; o acaso levou-me a ser mordomo. Outra pessoa a quem o acaso levasse a encontrar-se nas mesmas circunstâncias teria com certeza feito igual, talvez mesmo mais e melhor.
E quanto a bricolage (em português europeu, bricolagem), é a tal necessidade de se desenrascar: reconheço e admito que tenho muita imaginação. E, dizem que sou “perseverante”. Sou pior do que isso: o que eu sou é um teimoso do caraças quando a minha cabeça me diz que uma coisa é ou pode ser duma maneira, mesmo que a maioria das pessoas afirme diferentemente. E quando é assim não desisto. Essa a razão porque por vezes me apelidaram de "berbequim".
A tal engenhoca para cortar o bacalhau em postas com uma catana da Guiné (imagem à esquerda) é um exemplo de imaginação, faceta que não nego.
Bom já chega. Hoje aconteceu-me ter inesperado tempo livre e deu-me para isto .
Um grande abraço
Lourinhã > Ribamar > Tabanca de Porto Dinheiro > 12 de julho de 2015 > Restaurante O Viveiro > Convívio anual da Tabanca de Porto Dinheiro. Régulo: Euardo Jorge Ferreira (1952-2019).- No grupo dos tabanqueiros da saudosa Tabanca da Porto Dinheiro, falta o fotógrafo, o Álvaro Carvalho (casado com a Lena do Enxalé, de está azul, entre o João Crisóstomo e a Vilma). Faltam ainda os "duques do Cadaval" (Joaquim Pinto Carvalho e Céu Pintéus)...A Dina já não está entre nós nem o Eduardo... O Lopes está doente, acamado. Do nosso capelão Hirácio (e da Milita) também não temos notícias recentes. Falta ainda o Rui Chamusco, o Carlos Silvério e a Zita...
Foto (e legenda) : © Álvaro Carvalho (2015) Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camnaradas da Guiné]
john crisostomo
6 agosto 2025 | 08:05
Às 02.03 AM, sem conseguir dormir, levantei-me e reli as "ruminações" que te enviei ontem. Vejo que há muito mais que podia acrescentar ou que podia ser dito de melhor maneira.
Sobre outros assuntos mais sérios mais havia para dizer também, mas acho melhor deixar para quando nos encontramos pessoalmente, não vás tu achar que estou a abusar da tua boa vontade, esperando que tenhas pachorra suficiente para ouvir as minhas deambulações de pensador barato.
Bom, vou voltar à cama ( neste momento a Vilma está na sua convenção em sérias meditações e eu estou sozinho!) e vou ler o James Michener que é sempre uma leitura agradável e por vezes apaixonante. Dorme bem.
João
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(*) Último poste da série > 6 de agosto de 2025 > Guiné 61/74 - P27095: Felizmente ainda há verão em 2025 (11): uma crónica pícara das minhas (des)venturas em abril de 1965, quando, com o meu amigo Manuel Salazar, decidi ir a Santiago de Compostela, à boleia, de capa e batina, praticamente sem um tostão no bolso (Virgílio Teixeira)