Blogue coletivo, criado por Luís Graça. Objetivo: ajudar os antigos combatentes a reconstituir o "puzzle" da memória da guerra colonial/guerra do ultramar (e da Guiné, em particular). Iniciado em 2004, é a maior rede social na Net, em português, centrada na experiência pessoal de uma guerra. Como camaradas que são, tratam-se por tu, e gostam de dizer: "O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande". Coeditores: C. Vinhal, E. Magalhães Ribeiro, V. Briote, J. Araújo.
quinta-feira, 11 de dezembro de 2008
Guiné 63/74 - P3604: Gloriosos Malucos das Máquinas Voadoras (15): Eu, o Duarte, o Coelho, o Nico... mais o Jubilé do Honório (Jorge Félix)
Foto: © Jorge Félix (2008). Direitos reservados.
1. Mensagem, com data de 30 de Novembro, enviada pelo Jorge Félix, ex-Alf Mil Pilav Heli Alouette III (BA 12, Bissalanca, 1968/70), membro da nossa Tabanca Grande e da Tabanca de Matosinhos, residente em Vila Nova de Gaia
Caro Luís:
Segue uma foto, arrancada no último 29 de Novembro de 2008, com um grupo de pilotos que voaram pelos ares da Guiné nos anos de 68/69/70. Alguns dos nossos tertulianos devem conhecê-los, com um pouco de esforço e 40 anos em cima. Eu, o Duarte e o Coelho voavam helis. Os restantes voavam T6 e o Nico também voava Fiats, ou para os mais puristas, era piloto de Fiats e também voava T6.
Esteve lá mais malta que te enviarei se achares apropriado. Não voaram nas bolanhas, um pecado ...
Falou-se de guerras imperdíveis (*)...
Pedias-me há dias uma explicação sobre o nome de guerra do Honório (**). Segue-se o esclarecimento: quando eu e o Pinto fomos render o Arada e Ruana, quem tinha o nome de Guerra de Jagudi era o Arada. Era o mês de Setembro de 68.
O Honório até esta data utilizava o Jubilé como nome de guerra. Eu desconhecia isso, pois não estava lá. Os anos já lá vão, mas na ideia ficou-me que o Honório se auto-intitulava de o verdadeiro Jagudi. Devo ter-lhe escutado falar para a torre como sendo o Jagudi. Neste encontro com malta da Guiné fui esclarecido por gente que tem melhor cabeça que a minha que o indicativo do Honório era Jubilé.
Se na altura soubesse disto era eu que me intitularia como sendo o Jagudi. Fica para a proxima.
Este mail vai também para a nossa Tabanquinha de Matosinhos.
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Notas de L.G.:
(*) Vdf. úkltimo poste da série > 1 de Dezembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3546: Gloriosos Malucos das Máquinas Voadoras (14): Em Junho de 69 havia bajudas a alternar no Tosco, na Conde Redondo (Jorge Félix)
(**) Vd. postes de:
23 de Setembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3226: Gloriosos Malucos das Máquinas Voadoras (1): Honório, Sargento Pil Av de DO 27 (Jorge Félix / J. L. Monteiro Ribeiro)
6 de Novembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3412: Gloriosos Malucos das Máquinas Voadoras (11): Ainda o Honório, o Jagudi... ou o puro gozo de voar (Jorge Félix)
Guiné 63/74 - P3603: Não venho falar de mim... nem do meu umbigo (Alberto Branquinho) (13): Quatro actos para um ponto de vista...
Especialmente para o Luís: Obrigado pelas referências aos meus textos.
Para todos UM ABRAÇO do
NÃO VENHO FALAR DE MIM… NEM DO MEU UMBIGO (13)
QUATRO ACTOS PARA UM PONTO DE VISTA
No bar da messe de oficiais de sede de batalhão, estavam um jornalista e o seu “cameraman”, encostados ao balcão, bebericando whisky com gelo. Tinham chegado nessa tarde, na Dornier do correio. Aliás, a tez pálida de ambos denunciava que não eram gente da terra nem da guerra. Faziam horas para o jantar.
Entrou um alferes em traje civil, que se sentou ao balcão.
- Boa tarde, cumprimentou-os. – Oh Bigodes, sai um whisky com Pérrier.
- E gelo?
O alferes fez que sim com a cabeça.
- Permita-me que me apresente. Sou Amplexo da Silva do “Notícias Dia-a-Dia”.
- Alferes… quer dizer, Manuel Gonçalves. Prazer.
Cumprimentaram-se.
- O prazer é meu, em estar aqui entre combatentes da Pátria. Estou, quer dizer… estamos em missão de reportagem sobre a guerra na Guiné.
- Guerra?! Oh senhor jornalista, afinal há guerra aqui? O que aqui temos é uma insurreição armada, vinda e alimentada do exterior.
- Pois, mas há acções armadas, tanto quanto sei e eu sou… repórter de guerra.
- Mas o senhor sabe que aqui não há guerra, segundo a TV e os jornais da Metrópole.
- Já tive o prazer de conversar com o Senhor Comandante do Batalhão, a quem venho recomendado. Amanhã vou ter um briefing com o Sr. Oficial de Operações e depois de amanhã espero sair para o mato com uma unidade operacional, para sentir a realidade.
- Eu disponho-me já para o enquadrar no meu pelotão quando formos para uma zona de… porrada. Não é preciso ir muito longe.
- Sr. Alferes, muito obrigado. Vou falar da sua disponibilidade ao Sr. Comandante. Para onde o Sr. Alferes sugere que se deva ir?
- Sabe, estas coisas não dependem de irmos para norte ou para sul. Depende mais das fases da lua, da orientação do vento ou da humidade do ar…Com sorte ou com azar, pode alcançar a verdade e a vida a pouco mais que quatro/cinco quilómetros. Sempre será melhor que estar para aí a filmar a mata com meia dúzia de figurantes de armas na mão, tendo o homem da câmara encostado ao arame farpado…
Quando o Comandante chegou para jantar, convidou o jornalista para a sua mesa.
No dia seguinte o Comandante mandou chamar o Capitão Gomes. Disse-lhe para, com cuidado, dar umas voltas com o jornalista pelas tabancas mais próximas e terminou:
- Faça-me o favor de dizer ao seu alferes Gonçalves para ter tento na língua.
ACTO 2 – Passeios
A Dornier sobrevoou o aquartelamento e começou a fazer uma volta larga, para aproximação à pista.
- Segurança à pista!! Olh'ó correio!
Mal a aeronave descolou e tomou altura, abandonaram as posições defensivas à volta da pista e regressaram, ansiosamente, ao quartel.
Imediatamente o escriturário, à porta da secretaria, começou a gritar os nomes dos destinatários das cartas e aerogramas, à medida que os retirava do saco. Tinha à sua frente um amontoado de caras ansiosas, que levantavam a mão e empurravam os outros, quando ele berrava um nome.
O Fabiano recebeu o aerograma e afastou-se, com o coração aos pulos. Sentou-se contra uma parede e, ao abri-lo, quase rasgou a folha de papel. Começou a ler: “ Tu dizes que sais para batidas, patrulhas, operações e emboscadas. Ainda dás uns passeios. Eu para aqui estou e é só de casa para o trabalho e do trabalho para casa. Passear, passear é só à missa nos domingos e……”
Voltou atrás para ler de novo.
Desolado, amarrotou o aerograma com a mão direita e ficou longo tempo a olhar para as biqueiras das botas.
Nunca mais escreveu.
Na aldeia constou que tinha morrido.
ACTO 3 – Conselhos de mãe
O Capitão, apontando no mapa colocado na parede, fazia, depois, uns traços, círculos e semicírculos sobre o papel branco colado ao lado, expondo aos quatro alferes o plano e a missão de cada um dos quatro pelotões quanto à operação que a Companhia iria executar, com a duração de três dias, saindo do quartel às três horas da madrugada.
Acabada a explanação, perguntou:
- Alguma dúvida?
- Meu capitão, eu não posso ir, disse o alferes Branco.
- Deixe-se de merdas! Porquê?
- Recebi hoje uma carta de minha Mãe, que me diz para eu não sair à noite e não apanhar muito sol.
ACTO – O problema é de “isolamento”
A professora de ensino primário, a exercer numa localidade próxima da fronteira com Espanha, lia pela terceira vez a carta acabada de receber:
“Prima Isabel,
Estou cansado, saturado e desiludido com tudo isto aqui na Guiné, para não falar da brutalidade e dos riscos que aqui corremos. Depois te contarei em pormenor.
Não sei se já te disseram que vou aí de férias em Julho.
Queria pedir-te que vás pensando e, com cuidado, fazendo contactos para me arranjares um “passador” que me leve para Espanha e, depois, me entregue a alguém que me passe para França. Preferia que fosse para o sul de França, saindo pela fronteira a norte de Barcelona, para, depois, ir para Marselha, onde tenho uns amigos.
Não fales disto a ninguém da Família, muito menos à minha Mãe ou ao meu Pai.
Um beijo do
Augusto."
A prima acabou de ler e ficou a olhar pela janela. Ao fundo, no horizonte, eram terras de Espanha.
Não demorou a resposta. Foi no dia seguinte. Com a autoridade que assumia por ser uns anos mais velha, foi assim:
"Augusto,
Tens que ter paciência e, além disso, ter juízo. Já viste o disparate que ias fazer?
Eu também estou para aqui isolada no meio da serra e só vou à Guarda de mês a mês. Daqui a dois anos espero ser colocada numa ……"
Notas de vb:
1. Alberto Branquinho foi alf mil da CArt 1689, 1967/69. Andou por Gandembel, Empada, Bambadinca, Buba, Bedanda, Bafatá, Banjara...
2. para além de trabalho é uma diversão publicar estes "umbigos" do Alberto Branquinho. A série pode ser vista/revista em
2 de Dezembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3554: Não venho falar de mim... nem do meu umbigo (Alberto Branquinho) (12): Há momentos em que um homem sente culpa e angústia...
Guiné 63/74 - P3602: Viagem à volta das minhas memórias (Luís Faria) (5): Bula - Gratidão
Luís Faria, ex-Fur Mil Inf MA da CCAÇ 2791, Bula e Teixeira Pinto, 1970/72
1. Mensagem de Luís Faria com data de 6 de Dezembro de 2008:
Caro Vinhal e Luis
Antes de mais, obrigado por terem publicado as duas imagens que pedi. Agradeço no entanto que a do emblema seja sempre publicada, mas trocada pela que enviei e é original (as cores são diferentes). Peço isto na esperança de que ela chame a atenção de mais algum camarada da CCaç 2791, de alguém relacionado ou que lá se
tivesse cruzado connosco e que possa vir também a contribuir com os seus dizeres.
Segue o capítulo 5.º das Viagens à volta das minhas memorias
Um Alfa Bravo a todos
Luis S Faria
Bula – Gratidão
Novembro foi o mês de adaptação à nova realidade, sobreposição com a velhice do BCav 2628 que nos mostrou parte da zona e passou o testemunho.
É altura de apresentar os Quadros iniciais da CCaç 2791, que muito contribuíram para a sua coesão e muito bom desempenho:
Comandante:
Cap Mil Art Mamede de Sousa (Arqt.º - casado)
Operacionais:
1.º GCOMB
Alf Mil Op Esp J. Manuel Quintas (casado)
Fur Mil Joaquim Mesquita
Fur Mil Luís Madaleno
2.º GCOMB
Alf Mil Caetano de Barros (Guineense)
Fur Mil Op Esp Carlos Castro
Fur Mil Santos Marques
3.º GCOMB
Alf Mil Ornelas Gomes
Fur Mil Amaral Almeida
Fur Mil Francisco Ferreira
4.º GCOMB
Fur Mil Luís Faria
Fur Mil Jorge Fontinha
Fur Mil Moura Chaves
Não operacionais
2.º Sarg Francisco Guerreiro
2.º Sarg Simão Bastos
Fur Mil Enf Urbano Silva
Fur Mil Trms Luís Lourenço
Fur Mil Vag A. Belchiorinho
Fur Mec Joaquim Mealha
Nota :
Aos Praças da 2791 (Força) , de quem no geral muito me orgulho e a quem, como disse o Urbano em comentário, ficou gravado parte do mapa da Guiné debaixo da pele, não os menciono aqui por a lista ser muito extensa. Alguns serão evocados / retratados ao longo dos capítulos que se irão seguir.
Aos furiéis não operacionais devo, para além da amizade, o meu agradecimento por todo o apoio de retaguarda que nos foi indispensável nas nossas deambulações pela Guiné:
Ao Mealha, algarvio de Estói que ao que sei, recebeu algumas viaturas em peças, não se chateou muito. Quantas mais, mais trabalho vão dar!! Partindo deste pressuposto deitou mãos à obra com os seus muchachos e de duas GMC conseguiu montar uma. Jipe Willys, isso era um luxo desnecessário e como tal só houve um para o Capitão. Unimogues… isso sim, eram muito necessários e como tal andavam sempre um brinquinho.
Era uma jóia e toda a gente gostava dele inclusive as Bajudas! (... Onde pára o Mealha?... se calhar foi à tabanca esvaziar óleo !!!?) Gostava de se embrenhar sozinho, a pé ou de GMC, pela povoação e uma noite que foi à fonte onde nos abastecíamos de água e pelos vistos o IN também, teve que se pirar à pressa para não ser apanhado à mão, disse!
Passou a ter mais cuidado, mas não parou.
Para além destes gostos, também era ferrinho nas Cerimónias, e julgava-se exímio a tocar na minha viola, que só arranhava com um dedo !!
E era este, numa pincelada geral, o Joaquim dos Santos Mealha daqueles tempos.
Desde o regresso, nunca mais soube nada dele, procurei-o via telefone, pessoalmente em Estói, mas nada consegui. Se algum Tertuliano souber algo, agradeço.
Ao Lourenço (Metralhinha), que com aquele seu ar ensimesmado por detrás dos grandes óculos que lhe davam um aspecto de Irmão Metralha intelectual, lhe conferiam o estatuto do eu é que sei…(?!) e que por vezes sabia ser chato, corrosivo e exasperante com’o caraças, que não só gostava de olhar de ladegos para as Bajudas (…o Metralhinha? …acho que foi à cagadeira…! !?), mas também apreciava uma boa Cerimónia.
Também era, diga-se, um fotógrafo de truz e a sua máquina - creio que Pentax - era uma companheira pronta a entrar em acção.
No que tocava a equipamento de transmissões o Lourenço não deixava os créditos em mãos alheias e que me lembre, nunca tive um problema de recepção / emissão com os banana, o que foi muitas vezes importantíssimo. Como ele dizia… são os cristais,…são os cristais… ! .
Actualmente pertence aos quadros da PT e por vezes encontramo-nos em almoços da Companhia.
Ao Belchiorinho, alentejano de Évora, que com a sua educação, honestidade, benevolência, pacatez e simplicidade era querido de toda a Jericada (rapaziada -Castro). Não gostava que o pessoal passasse fome, e como tal fazia vista grossa aos assaltos ao Depósito de géneros, para que pudessem alimentar o corpo e o espírito! Quem não achava muita piada a isto, era o Sarg Guerreiro que estava sempre a por o desgraçado do Belchiorinho à pega. E este por sua vez mandava-o p’ro caraças em pensamento e refugiava-se numa bazucada!
Nas Cerimónias era presença assídua e alegre e ainda hoje não falha, com a Esposa, a um almoço da Companhia ou do Batalhão. Eng Téc Agrónomo é Funcionário Público em Alcácer do Sal.
Ao Urbano, nortenho de Salreu, com o seu olhar perspicaz, observador atento de fisionomias e de estados de espírito, era o nosso Doutor carismático e amigo. De forte carácter e personalidade vincada não se deixava enrolar pelo pessoal, mas zelava diligentemente pela nossa saúde e pelas condições higiénico - sanitárias do pessoal, que defendia numa base de Justiça, fosse contra quem fosse! Desde obrigar a tomar o quinino às vistorias ao pessoal e ao abastecimento medicamentoso dos enfermeiros dos GComb, nunca nada faltou.
De andar gingão à cowboy cirandava pela povoação, em contacto directo com a população, observando e conhecendo. Muitas estórias pode contar…! Com a sua faca de caça submarina, treinava o lançamento comigo e era difícil falhar o alvo a 10/11 passos. E poker de cartas? Vá lá vai… os Capitães que o digam!! Para além do mais, também era ferrinho nas Cerimónias em que sobre assuntos da Companhia era fácil ouvir-lhe o vai -te f… não sabes nada…eu é que sei..!! e desbobinava o acontecimento.
Assim era o Urbano, grande amigo com quem volta e meia me encontro, juntamente com mais meia dúzia de Ex-2791 em almoçaradas bem animadas.
A todos eles mais uma vez o meu muito obrigado
Entretanto, os operacionais, coadjuvados pelos eteranos, foram fazendo segurança às colunas, umas patrulhas e emboscadas ao longo da estrada Bula –S. Vicente e um verdadeiro tirocínio aos ataques cerradíssimos de milhares de esquadrilhas de mosquitos que, quais kamicazes, atazanavam a paciência dos mais serenos. Dita a sabedoria que se gostarmos muito de uma comida e a tivermos em demasia, enjoamos e não queremos mais (origem L.F.).Seguindo esta douta máxima, o que comecei a fazer para enjoar os kamicazes e ao mesmo tempo dar exemplo de auto - domínio ao pessoal, foi desabotoar o camuflado e oferecer-me de peito aberto à voragem voadora! E não é que resultou?! Ao fim duas ou três noites já nem os sentia!! Até fazíamos apostas!!!
Nota:
Cerimónia - Reunião do pessoal à volta de uma ou mais garrafas com conteúdo alcoólico, se possível (não obrigatório) com alguns elementos sólidos a acompanhar e em que a motivação principal era dar asas ao nosso stressado Eu. Seguem-se exemplos…!
Bula > Cerimónia - Início
Bula > Cerimónia - Meio
Bula > Cerimónia - Fim
ATENÇÃO
PROCURA-SE para UM ABRAÇO
Joaquim dos Santos Mealha, ex-Fur Mec da CCAÇ 2791
Um abraço à Tertúlia
Luís S Faria
_________________
Nota de CV:
Vd. último poste da série de 6 de Dezembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3574: Viagem à volta das minhas memórias (Luís Faria ) (4): Conhecer a realidade de Bula
Guiné 63/74 - P3601: VIANA/CACHEU - Construir um abraço - 20 anos de Geminação/8 de Cooperação
VIANA/CACHEU Construir um abraço
20 anos de Geminação / 8 de Cooperação
Data Actividade de 05/12/2008 a 17/01/2009
05/12/08 às 21h45 - Cinema Guineense
Bissau d´Isabel, de Sana Na N´Hada (2005)
Colaboração da Ao Norte, No Auditório do Grupo Desportivo e Cultural dos Trabalhadores dos ENVC
12/12/08 às 21h45 - Documentário José Carlos Schwarz – a Voz do Povo, de Adulai Jamanca (2006)
Colaboração da Ao Norte, No Auditório do Grupo Desportivo e Cultural dos Trabalhadores dos ENVC
13/12/08 às 10h – Abertura da Exposição “Viana-Cacheu: Construir Um Abraço, 20 anos de Geminação / 8 de cooperação” nos Antigos Paços do Concelho, Praça da República
15 a 18/12/08 às 9h30; 11h; 14h30 e 16h
Visitas orientadas para alunos e professores das escolas (pré-inscrição)
19/12/08 às 21h45 - Documentário “As duas Faces da Guerra”, de Diana Andringa e Flora Gomes (2007)
Colaboração da Ao Norte, No Auditório do Grupo Desportivo e Cultural dos Trabalhadores dos ENVC
20/12/08 FÓRUM “Abraçar a Guiné - 2008”
Cooperação Internacional e Direitos Humanos
Local / Museu de Arte e Arqueologia/ Viana do Castelo
9h – Recepção
9h30 - Sessão de Abertura
9h45 – Painel Cooperação Internacional e Direitos Humanos
Cooperação Internacional - Professor Carlos Teijo Garcia (Faculdade de Direito/Universidade de Santiago de Compostela).
África: Cooperação e Direitos humanos – Pedro Neto (Formador e gestor do sector de voluntariado) e Joana Prata (Acessoria Jurídica e de Direitos Humanos na ONGD ORBIS )
11h00 – Intervalo para café
11h30 - Testemunhos de cooperação na Guiné
Humberto Vitorino
(ONGD “Saúde em Português” )
Sónia Pinho
(ONGD “ORBIS” )
Júlio Santos
(ESE e ONGD “ISU” Viana
12h30m – Debate
13h00m – Encerramento da sessão da manhã / almoço
15h00m - Cacheu, hoje - Leonel Baticã Ferreira (Vice-Presidente da AFASCA/Cacheu)
15H30m - ACGB – Cooperação com Cacheu / Do passado ao futuro:
-Visita guiada à exposição (vídeo)
-ACGB – o futuro
17h00 – Debate
17h30m – Encerramento
04/01/09 às 21h30 – Espectáculo com Música Guineense (a confirmar)
… a favor da Construção da Maternidade de Cacheu
Teatro Municipal Sá de Miranda
15 ou 16/01/09
OBS.: data a confirmar
21h30m – Painel com:
Comércio Justo
Manuel Pinto (Equação,CRL)
Micro-crédito
Manoel Pombal (Associação Nacional de Direito ao Crédito)
Antigos Paços do Concelho
De 12 a 16 Janeiro de 2009 às 9h30; 11h; 14h30 e 16h
Visitas orientadas para alunos e professores das escolas (pré-inscrição)
CONTACTOS
* ACGB / Associação de Cooperação com a Guiné-Bissau
Tel. 966057830; e-mail: cdaponte@portugalmail.pt
* GRIC / Gabinete de Relações Internacionais e Cooperação e Secretariado das comemorações dos 750 anos de Viana do Castelo
Tel. 258 820 678 Fax. 258 824 223 e-mail: gric@cm-viana-castelo.pt
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Nota de CV:
Vd. poste de 20 de Outubro 2005 > Guiné 63/74 - CCLI: Cooperação, caridade ou negócio ? (2)
Vd. Apontamento da Rádio Universitária do Minho
Guiné 63/74 - P3600: A propósito do referendo Amigos/Inimigos. António Matos, Bula, ex-Alf Mil da CCaç 2790, Augusto Barros, Bula.
António Matos
Gostava de me reportar à sondagem que está a decorrer sobre a possibilidade da existência ou não de amigos dos dois lados da barricada.
É curiosa a questão, e dá que pensar.
Desde logo a dificuldade em se entender o verdadeiro sentido da pergunta.
1ª Hipótese – é ou não possível termos um amigo que por qualquer razão se passou para o outro lado?
Claro que é! A sua passagem para outro ideal poderá nada ter a ver connosco! Tem a ver com o sistema!
Conclusão: serão amigos em campos diferentes
Neste blog há vários relatos de confrontos que o não foram, aquando do encontro fortuito entre 2 combatentes amigos (mas separados pelo ideário).
2ª Hipótese – equacionar o problema na dualidade de “amigos/inimigos” parece-me um contra-senso.
Inimigo é, por definição, um não-amigo, logo não existem “amigos-inimigos”.
Ou são amigos (e caímos na conclusão da 1ª hipótese) ou são inimigos (que, em guerra, se matarão por verem no outro a razão da sua beligerância).
Em tese, preferiria intitular a questão em amigos e adversários ou então, pura e simplesmente, estamos a falar em inimigos.
Parece-me, contudo, uma discussão demasiado filosófica e os resultados que a sondagem apresenta não se me afiguram claros.
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Notas de vb:
1. Referência aos artigos em30 de Novembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3544: O segredo de... (2): Santos Oliveira: Encontros imediatos de III grau com o IN
30 de Novembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3543: O segredo de ... (1): Mário Dias: Xitole, 1965, o encontro de dois amigos inimigos que não constou do relatório de operações
2. Do Autor em
10 de Dezembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3596: O famoso desenrascanço...(António Matos)
Guiné 63/74 - P3599: As Boas Festas da Nossa Tabanca Grande (4): Victor Condeço, Catió, Ex-Fur Mil Mec Arm, CCS/BART 1913, Catió, 1967/69
1. Mensagem, com cartão de boas festas, do Victor Condeço (*), enviada a 7 de Dezembro:
Que a alegria do Natal ilumine os vossos espíritos trazendo a todos um sorriso. E que a esperança que esta data nos traz, transforme em realidade todos os vossos sonhos de alegria.
São os meus votos sinceros para todos os amigos e camaradas da Tabanca Grande e suas famílias.
Victor Condeço
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Nota de L.G.:
(*) Vd. poste de 19 de Janeiro de 2008 > Guiné 63/74 - P2453: O que fazia um militar da ferrugem como eu ? (Victor Condeço, ex- Fur Mil Mec Armamento, CCS/BART 1913, Catió, 1967/69)
(**) Vd. postes desta série:
6 de Dezembro de 2008 >Guiné 63/74 - P3575: As Boas Festas da Nossa Tabanca Grande (3): A minha mensagem para todos os que passaram pela Guiné. (Valentim Oliveira,Oio,Como)
5 de Dezembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3571: As Boas Festas da Nossa Tabanca Grande (2): Onde pára o espírito do Natal? (António Matos)
3 de Dezembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3558: As Boas Festas da Nossa Tabanca Grande (1): Está na Hora (Santos Oliveira)
Guiné 63/74 - P3598: O segredo de... (4): José Colaço: Carcereiro por uma noite
Guiné > Zona Leste > Bafatá > CCAÇ 557 (1963/65) > Resultado de um aula de fula, dada por um prisioneiro do PAIGC durante a noite em que o Sold Trms José Colaço, por ordem do comandante, teve de fazer o papel de carcereiro, fazendo horas para o entregar à PIDE...
Fotos: © José Colaço (2008). Direitos reservados.
1. Texto enviado pelo do José Colaço (*), com data de 3 de Dezembro:
A minha relação com um prisioneiro de guerra durante uma noite em Bafatá (**)
por José Colaço
Uma pequena estória com E mas que também podia ser integrada dentro das histórias com H.
Numa das saídas das explorações que nos eram confiadas, foi apanhado um guerrilheiro e feito prisioneiro.
Quando o pessoal chegou, já era noite. Não eram horas de entregar o prisioneiro à PIDE. Então o capitão lembra-se da brilhante ideia, como o Colaço está de serviço permanente ao posto rádio, fica a guardar o prisioneiro. Ordens são ordens e não há que contestar.
A única alteração foi alterar o local da pistola Walther, pois esta estava sempre pendurada num cabide na parede do posto rádio. Nessa noite andou no coldre mas na cintura do militar.
Era um homem mais ou menos dos seus cinquenta e picos anos. Eram cerca das 3 horas e 30 minutos, depois de termos tido uma conversa, posso dizer de amigos. Olhei para ele, de olhos nos olhos, e notei o seu estado de fraqueza. Fiz-lhe a seguinte pergunta:
- Não tens fome? - Ao que ele respondeu com um sim tímido. Então disse-lhe:
- Fica aí sossegado, está bem ?!, que eu vou arranjar comida.
Na cozinha havia uma celha com bacalhau de molho, a padaria ficava na rua quase em frente ao quartel, fui lá trouxe pão quente, bacalhau que gamei - o que vi que chegava - , no posto rádio havia sempre azeite, vinagre, alho e cebola porque era normal durante a noite o pessoal de serviço fazer aquele petisco - desculpem o nome mas aquilo que se faz à mão (punheta)... Vinho também não faltou.
A seguir, depois da refeição servida no posto rádio, voltou o diálogo e uma lição, uma tradução de fula para português. O prisioneiro ensinou-me como se conta em fula, algumas palavras que na altura me lembrou de perguntar, e que ainda guardo o original, uma folha de bloco em papel fino a que se chamava carta de avião.
Envio também em anexo o original da capa do bloco. De certeza que o camarada Mário Dias vai ver que tem manga de erros ortográficos mas foi o que consegui perceber.
Um alfa bravo.
Colaço
Nota: se os camaradas acharem que merece honras de blogue, publiquem.
_________
Notas de L.G.:
(*) José Colaço, ex-Sold de Trms da CCAÇ 557, Cachil, Bissau e Bafatá, 1963/65:
Vd. postes de:
2 de Junho de 2008 > Guiné 63/74 - P2912: Tabanca Grande (73): José Botelho Colaço, ex-Soldado de Trms da CCAÇ 557 (Cachil, Bissau e Bafatá, 1963/65)
(...) José Botelho Colaço, morador em São João da Talha, foi Soldado de Transmissões na CAÇ 557 (1963/65). Embarcou para a Guiné em 27 de Novembro de 1963, chegou a Bissau a 3 de Dezembro e, em 15 de Janeiro de 1964, seguiu de batelão patra Catió. No dia 23 de Janeiro desembarcou numa LDM , com quase toda a Companhia, na mata do Cachil, Ilha do Como, no âmbito da Operação Tridente (Janeiro-Março de 1964), a maior operação realizada no TO da Guiné.
Saiu do Cachil no dia 27 de Novembro de 1964, rumo a Bissau onde a CCAÇ 557 permaneceu cerca de 3 meses. O resto da comissão foi passado em Bafatá de onde saíram em 27 de Outubro de 1965, no final da comissão. De regresso a casa, desembarcou em Lisboa a 3 de Novembro. Foi Técnico Metalúrgico de profissão. Está actualmente reformado. (...)
20 de Junho de 2008 > Guiné 63/74 - P2970: Ilha do Como, Cachil, Cassacá, 1964: O pós-Operação Tridente (José Colaço)
29 de Julho de 2008 > Guiné 63/74 - P3099: Os Nossos Regressos (13): Fundeámos ao largo, com as luzes de Cascais...(José Colaço, Cachil, Bissau, Bafatá, 1963/65))
9 de Outubro de 2008 > Guiné 63/74 - P3287: Controvérsias (2): Repor a realidade vivida, CCAÇ 557, Cachil, Como, Janeiro-Novembro de 1964 (José Colaço)
19 de Outubro de 2008 > Guiné 63/74 - P3334 O meu baptismo de fogo (14): Cachil, Ilha do Como, meia-noite, 25 ou 26 de Janeiro de 1964 (José Colaço)
(**) Vd. postes anteriores desta série:
6 de Dezembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3578: O segredo de... (3): Luís Faria: A minha faca de mato
30 de Novembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3544: O segredo de... (2): Santos Oliveira: Encontros imediatos de III grau com o IN
30 de Novembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3543: O segredo de ... (1): Mário Dias: Xitole, 1965, o encontro de dois amigos inimigos que não constou do relatório de operações
Guiné 63/74 - P3597: O meu Natal no mato (13): De Cutia (1970) ao CAOP1, em Teixeira Pinto (1971) (Jorge Picado, ex-Cap Mil)
Foto nº 2 > CAOP 1. Teixeira Pinto. Alguns oficiais do CAOP dirigindo-se para o almoço de Natal de 71. Cap Art Borges, meu camarada de quarto; Maj Barroco, de camuflado; Maj Santos Costa, com a sua inseparável bengala e de quem era adjunto; eu próprio, já bem lavadinho, de barbinha feita e bem vestidinho.
Foto nº 3 > CAOP 1. Teixeira Pinto. Na mesa da presidência distinguem-se: Cor Rafael Durão, de pé; um soldado Pára servindo o Maj Santos Costa; creio que o Maj que substituiu o Maj Inocentes (será o Maj Pára citado por Graça de Abreu no seu livro a pág 18?); o autor. De costas distingue-se um 1.º Sarg Pára.
Fotos e legendas: : © Jorge Picado (2008). Direitos reservados
1. Mensagem de Jorge Picado, ex-Cap Mil da CCAÇ 2589/BCAÇ 2885, Mansoa, CART 2732, Mansabá e CAOP 1, Teixeira Pinto, com data de 7 de Dezembro de 2008:
Caros Luis, Carlos e Briote
Seguem-se umas simples palavras sobre o tema do Natal e Final do Ano que, de tão repetidas, nada têm de extraordinário.
A novidade está apenas no aproveitar para enviar 3 fotografias da passagem pelo CAOP 1, retratando-se mais alguns rostos de militares que igualmente por lá andavam.
Abraços
Jorge Picado
2. O meu Natal no mato (13) > De Cutía (1970) ao CAOP1, em Teixeira Pinto (1971)
por Jorge Picado
Aproximando-se uma das épocas mais festejadas da Humanidade, Natal (principalmente para o Mundo Católico) e Mudança de Ano (para todos) (1) (2), sempre com o sentimento de que a celebração dum Nascimento e o terminar de Ano Velho sempre cheio do mesmo – miséria, fome, guerra, desnivelamento económico cada vez mais acentuado, apesar dos enormes avanços científicos que quando verdadeiramente se deu o grande salto (pós II Guerra Mundial) diziam ser para beneficio de Toda a Gente, mas que tem sido apenas para os bolsos sempre dos mesmos – em que todos manifestam a esperança dum Renascimento e dum Novo Ano que augure o início do fim de todas as misérias, guerras, mais solidariedade e se entre, já não digo no Éden (porque não sou crente), mas pelo menos num reino de Harmonia e Bem Estar, em primeiro lugar quero desejar a todo o Pessoal da Nossa Tabanca um Bom Natal e que pelo menos o 2009 não seja pior do que este 2008, pois a esperança anda pelas ruas da amargura.
De seguida, contribuir para as memórias das mesmas épocas passadas naqueles tempos da Guiné.
Essas recordações são muito vagas e ao fim e ao cabo iguais hás de tantos outros, ainda que as minhas não fossem tão sofredoras quando comparadas com a daqueles que tiveram de passar longas horas no mato a fazer segurança ou dos que sofreram ataques.
Dobrei dois Anos.
No que diz respeito ao primeiro, finais de 1970, fi-lo numa estância de veraneio , a Pousada de CUTIA.
A ceia de 24, comida como sempre sob a protecção das frondosas (e seculares?) árvores que ladeavam a estrada (era aí a messe e bar desta Pousada), foi naturalmente melhor do que nos outros dias, pois na véspera tínhamos feito coluna a MANSOA para reabastecimento de géneros mais frescos.
Só não recordo se foi uma ceia madrugadora por causa dos que foram emboscar, pois a indicação que tenho na Agenda sucintamente refere para este dia, tal como para o seguinte, [Grupo no Mato (18-24)]. Quer dizer que esteve um grupo fora das 18H até 24H.
É muito mais provável que para equilibrar os serviços, o grupo que foi fazer a segurança externa fosse dos efectivos africanos, já que estes comiam nas suas tabancas e a 25 foram os metropolitanos.
O almoço de 25 foi igualmente melhorado e possivelmente com algum excesso, pelo menos de cerveja. Existe aquela foto que enviei em que algumas mulheres de militares do Pel Caç Nat 61, me cercam contra uma das tais árvores, apadrinhadas pelo Simeão, procurando sacar-me mais alguns pesos para os festejos deles…
O que posso dizer é que não tivemos prendas oferecidas pelos nossos vizinhos do MORÉS, quer a 24 quer a 25.´
Julgava eu que esta falta de prendas tinha por origem o que se passou a 28 e que era para ser a 27, como já contei, mas perante as informações que o Senador Vítor Junqueira fez o favor de nos transmitir, num dos seus saborosos e brilhantes testemunhos, já fico na dúvida se foi afinal devido à boa Actividade Psicológica do Alf Simeão!
A primeira Passagem de Ano e o Dia de Ano Novo, passados igualmente no mesmo local também nada teve de especial, a não ser algum champanhe, para intervalar com as bazucas de cerveja, misturadas com cânticos de saudade e felizmente sem qualquer fogo de artificio, acabando por se recolher cada um ao escuro do bunquer e na solidão da noite carpir as respectivas mágoas. As esperanças eram apenas para aqueles que visionavam o fim do inferno daí a 45 dias.
Na segunda época só me recordo das Festas Natalícias.
A noite da Consoada passei-a, em representação do CAOP 1, no Destacamento do BACHILE, situado um pouco a Norte de TEIXEIRA PINTO na estrada para o CACHEU cujos trabalhos de reabertura e pavimentação decorriam nessa altura um pouco mais a Norte.
Neste aquartelamento estava pelo menos (não tenho a certeza se havia igualmente uma CCaç Africana) uma CCaç cujo Cmdt era o Cap Mil do QC Branco (em 1974, antes do 25ABRIL, vim a reencontrá-lo na minha terra onde veio morar, enquanto esteve colocado no RI de Aveiro onde apanhou a revolução, na qual esteve enquadrado) e que não tenho a certeza se seria a 3461, mas pertencia ao BCaç 3863 que tinha chegado ao Chão Manjaco em 20H30 do dia 24 de Outubro de 1971.
Não resisto a transcrever o que o camarada António Graça Abreu, que chegou ao CAOP 1 cerca de 5 meses depois de eu o ter deixado, escreveu no seu DIÁRIO DA GUINÉ sobre o BACHILE que visitou ao fim de 6 dias.
“O Bachile, um aquartelamento pequeno rodeado por fileiras duplas de arame farpado. Ao lado um reordenamento, isto é, umas dezenas de casas pintadas de branco com telhados de zinco destinadas aos negros que, vindos das zonas libertadas, se apresentam à tropa portuguesa. As casas não estão habitadas.
"O aquartelamento é deplorável. Logo atrás do arame farpado há dezenas e dezenas de bidões cheios de areia rodeando umas tantas tabancas. Depois há telhados em cimento armado cobrindo os tegúrios semi-afundados na terra habitados pelos nossos soldados, uns setenta a oitenta. É a protecção possível contra flagelações e bombardeamentos. E dão uma certa segurança aos homens brancos expatriados na terra dos negros comandados pelo alferes Rocha, …creio ser uma miniatura exemplar de dezenas e dezenas de aquartelamentos portugueses espalhados pela Guiné... ”.
Bem, como estas forças tinham, entre outras missões, efectuar a segurança aos trabalhos de reconstrução da estrada, é muito possível que, naquela data, 5 de Julho de 1972, parte dos efectivos tivesse avançado para a zona mais a N onde andaria já a frente de trabalhos e se aqui estava o Alf Rocha a comandar, das duas uma, ou o Cap Branco estava de férias ou estava na frente dos trabalhos.
Quanto às condições do aquartelamento, havia-os muito bem piores, como de certo ele posteriormente encontrou, nas suas deambulações por MANSOA e CUFAR.
Voltando ao meu percurso direi que era mais uma deslocação a esta povoação, deslocação essa que em regra não oferecia, naquela época de 71, grande perigo.
Entretanto quanto à pernoita e, numa noite daquelas, é que já a desconfiança era maior.
Lembro-me perfeitamente que, embora não manifestando, senti sempre uma sensação de desconforto durante tal permanência. Era talvez um certo nervoso miudinho, que não me deixava gozar o prazer de saborear uma refeição de certo modo melhorada, nem uma estadia tranquila. Dormitei em cima dum colchão de camuflado vestido, sempre com os ouvidos abertos, à espera do rebentar da bernarda.
Felizmente nada aconteceu e bem cedo pela manhã de 25, abalei para a sede onde o almoço de Natal me esperava na messe da CCP 122.
Junto 3 fotografias referentes a este evento:
1.ª CAOP 1, Teixeira Pinto. A caminho do almoço de Natal de 1971. Da esquerda para a direita respectivamente, Cmdt do BCaç 3863 (?), Cmdt do CAOP, Cor Pára Rafael Durão, e Ten Pára da CCP 122.
2.ª CAOP 1, Teixeira Pinto. Alguns oficiais do CAOP dirigindo-se para o almoço de Natal de 71. Cap Art Borges, meu camarada de quarto; Maj Barroco, de camuflado; Maj Santos Costa, com a sua inseparável bengala e de quem era adjunto; eu próprio, já bem lavadinho, de barbinha feita e bem vestidinho.
3.ª CAOP 1, Teixeira Pinto. Na mesa da presidência distinguem-se: Cor Rafael Durão, de pé; um soldado Pára servindo o Maj Santos Costa; creio que o Maj que substituiu o Maj Inocentes (será o Maj Pára citado por Graça de Abreu no seu livro a pág 18?); o autor. De costas distingue-se um 1.º Sarg Pára.
Nestas fotografias apresento um visual mais risonho, fruto talvez de me encontrar a menos de 2 meses do termo da comissão.
É tudo por hoje.
Jorge Picado
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Nota de L.G.:
(*) Vd. postes desta série
24 de Dezembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2379: O meu Natal no mato (12): Mansoa, 1971: Uma de caixão à cova... para esquecer o horror (Germano Santos)
24 de Dezembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2378: O meu Natal no mato (11): Saltinho, 1972: O melhor bolo rei que comi até hoje, o da avó Clementina (Paulo Santiago)
22 de Dezembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2374: O meu Natal no mato (10): Bissau, 1968: Nosso Cabo, não, meu alferes, sou o Marco Paulo (Hugo Guerra)
22 de Dezembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2373: O meu Natal no mato (9): Embarquei no N/M Niassa a 21 de Dezembro de 1971... Que maldade! (João Lima Rodrigues)
21 de Dezembro de 2007 > Guiné 63/74 - 2372: O meu Natal no mato (8): Bissorã, 1964 (João Parreira, CART 730)
21 de Dezembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2370: O meu Natal no mato (7): Destacamento do Rio Udunduma, 1969, Pel Caç Nat 52 (Beja Santos)
19 de Dezembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2366: O meu Natal no Mato (6): Peluda, 1969: a Fátria, Manel (Torcato Mendonça)
19 de Dezembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2364: O meu Natal no mato (5): Mato Cão, 1972: Com calor, muito calor, e longe, muito longe do meu clã (Joaquim Mexia Alves)
18 de Dezembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2361: O meu Natal no mato (4): Cachil, 1966: A morte do Condeço e do Boneca, CCAÇ 1423 (Hugo Moura Ferreira / Guimarães do Carmo )
17 de Dezembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2357: O meu Natal no mato (3): Banjara, 1965 e 1966: um sítio aonde não chegavam as senhoras da Cruz Vermelha (Fernando Chapouto)
17 de Dezembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2356: O meu Natal no mato (2): Bissorã, 1973: O Milagre (Henrique Cerqueira, CCAÇ 13)
16 de Dezembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2355: O meu Natal no mato (1): Jumbembem, 1965: Os homens às vezes também choram... (Artur Conceição)
(2) Vd. outros posts sobre o nosso Natal em tempo de guerra, série Feliz Natal, Próspero Ano Novo e Até ao Meu Regresso:
17 de Dezembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1373: Feliz Natal, Próspero Ano Novo, Adeus e Até ao Meu Regresso (1): As Nossas Festas... Quentes e Boas (Luís Graça / José Martins)
17 de Dezembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1374: Feliz Natal, Próspero Ano Novo, Adeus e Até ao Meu Regresso (2): Seguindo a Estrela, de Missirá a Belém (Beja Santos)
18 de Dezembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1375: Feliz Natal, Próspero Ano Novo, Adeus e Até ao Meu Regresso (3): A LFG Sagitário no Rio Cacheu (Manuel Lema Santos)
19 de Dezembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1379: Feliz Natal, Próspero Ano Novo, Adeus e Até ao Meu Regresso (4): Mansambá, 1970 (Carlos Vinhal, CART 2732)
19 de Dezembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1380: Feliz Natal, Próspero Ano Novo, Adeus e Até ao Meu Regresso (5): Poema: Missirá, 1970 (Jorge Cabral)
19 de Dezembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1381: Feliz Natal, Próspero Ano Novo, Adeus e Até ao Meu regresso (6): comandos de Brá em 1965, crime e castigo (João S. Parreira)
19 de Dezembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1382: Feliz Natal, Próspero Ano Novo, Adeus e Até ao Meu Regresso (7): No longínquo ano de 1968 em Gandembel/Ponte Balana (Idálio Reis)
20 de Dezembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1383: Feliz Natal, Próspero Ano Novo, Adeus e Até ao Meu Regresso (8): CART 2732, Mansabá, 1971 (Carlos Vinhal)
21 de Dezembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1387: Feliz Natal, Próspero Ano Novo, Adeus e Até ao Meu Regresso (9): Catió, 1967 (Victor Condeço)
22 de Dezembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1390: Feliz Natal, Próspero Ano Novo, Adeus e Até ao Meu Regresso (10): Os Maiorais de Empada, 1969 (Zé Teixeira)
2 de Janeiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1396: Feliz Natal, Próspero Ano Novo, Adeus e Até ao Meu Regresso (11): 1969, na Missão do Sono, em Bambadincazinho (Luís Graça)
quarta-feira, 10 de dezembro de 2008
Guiné 63/74 - P3596: O famoso desenrascanço...(António Matos)
Isto sem desprimor para o reverso da medalha, isto é, para os valentes e valorosos profissionais que tivessem passado pela Academia Militar ainda que, lá na Amadora, por muitos e bons livros que tivessem lido, não apurassem o olfacto ao cheiro a carne humana assada, nem o ouvido ao grito lancinante de quem levava um tiro ou pedia ajuda ao sentir as forças esvaírem-se no clamor do combate.
Claro que nestas situações, e atendendo a que naquela altura (há quase 40 anos!!) a tecnologia bélica ainda não era tão apurada como nos dias de hoje, consegue-se entender alguma necessidade de criatividade, serôdia, é certo, na resolução de problemas do dia-a-dia, mas sem a qual o equilíbrio entre os contendores se desiquilibraria definitivamente para um dos lados.
Alferes António Matos aos comandos de um "blindado" da CCaç 2790.
Um certo amadorismo próprio de quem resolvia a guerra dando ordens em cima duma carta militar, distribuindo soldados como peças de xadrez e espantando-se quando o IN conseguia "furar" aquelas barreiras tão bem desenhadas nas salas das operações não percebendo que na realidade o território era "ligeiramente" superior ao desenho no tabuleiro, esse amadorismo, dizia, justifica verdadeiras catástrofes vividas bem assim como cenas trágico-cómicas que no fundo completam um verdadeiro cenário de guerra.
Que as coisas acontecessem, tudo bem, ninguém nasce ensinado e portanto vigora a máxima de que à primeira todos caem ...
Que dessa má experiência não se tirassem as ilações adequadas para obviar futuras situações semelhantes, já era comprometedor!
Certo dia, estava eu sediado no destacamento de Augusto Barros, comandei a deslocação a Bula, em coluna motorizada, a bordo duma tão fabulosa quanto velha GMC que, julgo, gastava aí uns 100 litros aos 10 kms !
Conduzia-a um possante soldado (reconhecia-lhe a cara no meio duma multidão mas esqueço-lhe o nome) quando nos preparávamos para o regresso.
As últimas 2 horas tinham sido passadas à volta da equipa de mecânicos "comandada" pelo furriel Perdigão afim de se arranjarem os arames mais convenientes que suportassem a resolução dum problema técnico até ao dia seguinte.
Posta a trabalhar à semelhança dum verdadeiro fórmula 1, fomos de roda batida para a nossa "casinha".
Os primeiros 4 ou 5 quilómetros eram em estrada alcatroada e só depois, na Placa, se infletia à esquerda para a picada.
Era noite.
Atraz da GMC vinha um Unimog 411 onde se abrigava o capitão.
Eu mantinha-me empoleirado na frente da coluna.
Faltava vencer a última subida na estrada quando, repentinamente, se ouve um grande estrondo seguido dum enorme solavanco e a chamada de atenção do condutor que não conseguia travar aquela massa metálica ...
Ao nível do melhor desenho animado, a viatura foi perdendo velocidade até que parou, começando de imediato a andar às arrecuas por força da ausência dos travões.
Ora agora descia em marcha à ré, ora subia ao pr'a frente até que, finalmente, establilizou.
O que teria acontecido ?
Demos, entretanto, pela falta do unimog e o breu da noite não esclarecia o mistério...
Oh capitão ! capitão ! oh capitão, onde está ?
Nada ...
Deve ter sido uma mina ! Cuidado, coloquem um dispositivo de segurança ! Atenção àquele amontoado de arbustos que os turras podem lá estar emboscados !
Levou algum tempo a serenar os ânimos até que o discernimento apareceu.
Tão simplesmente, o motor da GMC, caiu, e o unimog "atrolelou-o" despistando-se, obviamente!
O Perdigão foi chamado com a sua equipa e não sei o que fizeram mas o certo é que, A BORDO DA MESMA GMC, chegámos a Augusto Barros 2 horas depois!
Aqui fica a minha homenagem aos mecânicos milicianos que aguentaram aquele conflito durante tantos anos nas condições logísticas mais desprezíveis mas que permitiam aos operacionais o apoio mínimo à sua função.
António Matos
ex-Alf Mil da CCaç 2790
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Notas de vb:
Último artigo do António Matos em
5 de Dezembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3569: Ao chegar à Guiné ainda pensei em safaris, leões, elefantes...(António Matos)
Guiné 63/74 - P3595: Estórias avulsas (23): O Cuco (Jorge Teixeira)
Caro Luís
Aqui vai mais uma estória das minhas, que se achares por bem podes colocar no blogue.
O Cuco
Não me refiro à ave, em geral, mas sim a um homem que fez parte do meu Pelotão.
O Cuco, sobrenome, - tantas vezes escrevi o nome dele e hoje que o quero recordar, não me lembro - era a pessoa mais pacata, amigo de todos os companheiros, de todas as bajudas, de todas as lavadeiras, de todos os meninos, de todos os africanos, enfim, de todo o mundo, que não conheci outro igual. Não havia zangas com ele, mesmo que o aperriassem por tudo e por nada ou quando bebia uns copos. Dava o que tinha, e que me lembre nunca tinha nada, e o que não tinha. Quando recebia o pré, dava cabo dele num instante, com os camaradas ou com a população, pagando umas cervejas ou um copo de vinho no Taras Buba, ou em qualquer outro "bar" de Catió. Distribuía pesos pelos meninos, pelas bajudas, só pelo prazer da conversa. Não adiantava nada chamar-lhe a atenção do aproveitamento que faziam da sua maneira de ser.
O Cuco queria estar em todas. Evitava escalá-lo para saídas, mas ficava zangado e aparecia sempre na hora da partida. Por vezes com a arma sem carregadores. Ou os carregadores sem munições. Para ele também não era importante. A G3 era um acessório. Um patrulhamento, uma segurança, um reabastecimento ou outra acção, para o Cuco era igual. O que precisava era de estar com a malta. Esquecer-se da arma em qualquer picada, numa bolanha ou numa tabanca, era coisa corrente. Por isso o Cuco tinha sempre um guarda-costas com ele.
Nos desafios de futebol lá estava ele, mesmo sem ser convocado. Era o segundo guarda redes efectivo ou entrava em campo quando o adversário corria para a nossa baliza isolado, para o tentar desarmar. Nada era a sério com o Cuco. Melhor, tudo era a sério para ele.
Notava-se, mesmo para leigos, que o Cuco precisava de evacuação, ou no mínimo, de consulta externa de psiquiatria. Demorou a conseguir-se esta consulta, com o seu consentimento pois claro, mas no dia da partida o Cuco não partiu. Pura e simplesmente desapareceu.
Assim, o remédio foi aturá-lo o resto da comissão.
Quando chegámos a Lisboa, o Cuco não tinha ninguém a esperá-lo. Disse-me certa vez, que vivia em Lisboa, só com a mãe, senhora idosa, creio que doente. Mas foi sempre difícil, talvez impossível mesmo, saber algo de concreto sobre ele. Não escrevia nem recebia correspondência. E alguma que recebesse era de uma possível madrinha de guerra que um camarada lhe tentava conseguir; mas nada a que o Cuco desse continuidade.
Despedi-me dos rapazes e lá os consegui meter nos camiões directos a Tomar para a desmobilização, onde depois das formalidades do desembarque, expedição das coisas deles, etc., fui ter no dia seguinte para a minha própria desmobilização. Acabada a burocracia, fui despedir-me dos meus açorianos, que aguardavam ordem de marcha para o próximo barco - acreditam que estavam alojados em tendas de campanha? - e quando não foi o meu espanto, vi o Cuco com eles. Não os quis largar até embarcarem. Não achava justo que ficassem ali sozinhos. Claro que não adiantou nada pedirmos-lhe para vir comigo, pois o traria para Lisboa.
Naquela altura, o meu sentimento era esquecer aqueles dois anos infindáveis. Nunca me lembrei de tomar nota das moradas dos rapazes com quem vivi aquele período da vida. Todo o meu fardamento ficou em Lisboa, pois nem isso quis trazer para o Porto.
Hoje em dia, a esperança de encontrar algum deles é muita. Mas o Cuco seria talvez de todos, aquele que eu mais gostaria de abraçar.
Jorge/Portojo
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Notas de CV:
(*) Vd. poste de 9 de Dezembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3587: Controvérsias (12): Chicos, furras e ripanços em Catió, 1968 (Jorge Teixeira)
Vd. último poste da série de 13 de Setembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3202: Estórias avulsas (22): Missão Católica ou Missão Heróica? (José Nunes)
Guiné 63/74 - P3594: Fotos actuais da Guiné-Bissau (José da Rocha Sousa/Ferreira Neto)
Estas fotos foram enviadas pelo camarada Sousa ao nosso tertuliano Ferreira Neto, ex-Cap Mil da CART 2340, que por sua vez as enviou ao Blogue.
O nosso obrigado a ambos.
Jumbembem > Abrigo
Canjambari > Casa Comando
Jumbembem > Casa Comando
Jumbembem > Actual Escola
O meu faxina
Jumbembem > Padaria
Jumbembem > Poço da água
Guiné 63/74 - P3593: História da CCAÇ 2679 (9): Boas recordações da PIDE (José Manuel Dinis)
Boas recordações da PIDE
É verdade. Que me perdoem os mais puristas de esquerda, os que já denotavam ideias anti-situacionistas, a memória do Cardia e o Barreto, que em páginas douradas do jornalismo espingardavam contra os pressentimentos e desempenhos do Estado-Novo, contra a sua máquina repressiva, esses que, mais tarde, viriam a integrar governos com pastas na educação e agricultura, onde representaram hipocritamente, tão pouco tempo volvido. Pois bem, eu, ao contrário, desde logo guardei boas recordações da PIDE.
Em Buruntuma, localidade que acolhia uma Companhia do BArt 2857, sediado em Piche, sector L-4, havia um Agente daquela instituição que desenvolvia a sua actividade de compra e troca de informações, em regime de residência permanente. Todavia, apesar de independente da tropa e de exercer o seu importante mister com toda a autonomia, dependia do BArt para efeito de recebimento salarial. Nessas ocasiões, o individuo, de fraca figura, mas arguto e importante pela benção do regime, apanhava boleia numa das colunas de ligação a Piche, onde tinha o hábito de permanecer uma ou duas noites.
Os dias lúdicos em Piche podiam caracterizar-se por passeios solitários de fim de tarde, à tabanca, onde, por vezes, se verificavam encontros com bajudas, simpáticas e acolhedoras. Não vou descrever o que todos sabem, que as meninas eram normalmente ternas, fisicamente elegantes e bem delineadas, prontas e generosas a aceitar os vigores dos milicianos, que, mais tarde ou mais cedo, acabariam por esportular algum patacão, quando não, géneros. Satisfeito o corpo, havia que dar largueza ao espírito, em conciliábulos com parte da camarilha, os que não tinham actividades noturnas, conversas sempre animadas com estímulos etílicos, e, não raro, acabavam com um jogo de cartas.
Quando o agente da secreta passava a noite em Piche, procurava integrar-se nestas reuniões e o pessoal, apesar da moderação dos assuntos falados, nunca se opôs à sua participação, provavelmente, até antecipávamos a jogatana.
Eu pertencia à tertúlia do pocker, o único jogo de batota onde me sentia à vontade, nunca tendo tido êxito em participações noutras modalidades que não me despertavam qualquer interesse. O pocker era adrenalina, o fetiche do jogo, o controle sobre os adversários, que me permitia ganhar com cartas favoráveis ou com bluff. De entre os parceiros, porque éramos todos habituées, distinguia-se o representante da Santa Madre Igreja, que não nos garantia o mais desejado, mas estimulava na passagem do tempo. Assim, por vezes, à roda da mesa contavam-se dois notáveis, o Capelão e o Pide. Este, reservado, com poucas iniciativas, pouco conversador, pouco perspicaz, pois optava com frequência pela decisão errada da jogada, era, no entanto, um parceiro de boas contas e por isso, honrava o regime.
Aconteceu por duas vezes ter participado em jogatanas com o referido quadro administrativo. Jogava-se com regras, com educação, ninguém achincalhava e ninguém se queixava. Os intervalos eram para molhar o bico. E os gins, como os whiskies, nunca foram rogados, deviam temperar os calores da noite e alguma excitação pelas cartas.
Numa jogada de vulto, o referido funcionário público, quiçá estribado na sorte das cartas, decidiu que aquela seria a sua hora.
Aguentou-se, encavou, pagou para ver, e, azar dos azares, eu tinha melhor jogo. Com dignidade, apresentou o pedido para deixar de participar, pouco depois levantou-se, apresentou despedidas com delicadeza e retirou-se.
Da segunda vez, parecia já conhecer os nossos truques. Se ganhava numa jogada, ganhava confiança. Se perdia, metia-se em brios, para, tão breve quanto possível, recuperar o estrago e consolidar a fé. Parecia cheirar-nos, como o pedrador na savana. Respirava confiança. Andei por ali, passava com frequência, estava em casa, quando numa súbita jogada, o homem abusou. Afastou a caça. Que raio, tão cedo, interrogava-me. Fui a jogo. Subiu a aposta, acompanhei e ultrapassei. Mais um lance e cheirou-me a esturro. Ganhei confiança. E ele encolheu-se, refugiou-se desconfiado. Piquei e ele desistiu.
Alguma luz enganadora lhe perpassou a mente, pois o meu jogo era de fraca compustura. Ambos fazíamos bluff. Ele perdeu, outra vez, com dignidade e educação.
Por duas vezes ganhei-lhe o ordenado, ou uma parte de leão do salário. Daí as boas recordações que tenho.
Nesta fotografia pode apreciar-se uma parte do esquema defensivo de Piche, onde abundavam valas arejadas, a partir das quais, os façanhudos recepcionavam as maluqueiras inimigas, procedendo sem dó nem piedade à limpeza dos mais afoitos que, seguidamente, sugeitavam-se à aprendizagem dos bons ensinamentos do corão. Finalmente, a fraternidade celebrava-se com música.
Foto e legenda: © José Manuel Dinis (2008). Direitos reservados
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Nota de CV:
Vd. último poste da série de 3 de Dezembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3560: História da CCAÇ 2679 (8): Três apontamentos (José Manuel Dinis)
Guiné 63/74 - P3592: Do Fundão, com insónias: Bambadinca, meu amor... (Torcato Mendonça)
Guiné > Zona Leste > Sector L1 (Bambadinca) > Mansambo > CART 2339 (1968/69) > Fotos Falantes III: Bem vindo, Welcome, Bien Venu, Biene Venidos, Willkomenn ... a Mansambo, uma estância de férias onde o turista se pode instalar confortavelmente e usufruir um conjunto de actividades excitantes, da caça à pesca...
Imagem que faz parte de um conjunto de 60 slides a que o ex-Alf Mil Torcato Mendonça chamou Fotos Falantes III... Por muito que eu vasculhasse estas e outras (centenas de) Fotos Falantes, não encontrei o nosso querido chato trajado à civil, a rigor... Quando muito lá aparece com uma t-shirt, branca (?), como é o caso da primeira das três fotos, tirada no abrigo do temível morteiro 81...
Os poucos que eram paisanos e não trajavam de verde oliva, no campo fortificado de Mansambo (como dizia a Maria Turra, na rádio Libertação, do PAIGC, difundida a partir de Conacri...) era a bela Mariema e as poucas bajudas e mulheres grandes que lá viviam, familiares dos picas e dos guias da tropa... Não admira, por isso, que a cidade mais próxima, Bambadinca - posto administrativo e sede de batalhão - , representasse, no imaginário dos sitiados de Mansambo, uma espécie de ícone da civilização... Era pelo menos uma das portas da saída do inferno... (LG)
Fotos: © Torcato Mendonça / Luís Graça & Camaradas da Guiné(2008). Direitos reservados.
1. Mensagem do Torcato Mendonca, enviada hoje, já passava da meia-noite:
Queridos Editores, o sono está a dar-me problemas. Mesmo a dormir pareço que já falo (de falar) alto. Vou continuar até que o sono me venha.
Entretanto vai este escrito. No Blogue há insónias também...não há ????
Um abração para cada do TM
2. Comentário de L.G.:
Meu querido José: Na Tabanca Grande também há insónias, sim, senhor. E, nalguns casos, criativas como as tuas. De qualquer modo, ficarei preocupado com as tuas (insónias) se elas forem um sintoma (fisiológico) de stresse...
A seres chato, és o chato mais inclassificável da nossa Tertúlia (já sei que não gostas da expressão Tabanca Grande... Elitismo ? Medo do escuro ? Alergia ao pó do capim ?... Enfim, estás no teu direito, que esta casa da malta tem mesmo que ser como o Sempre em Festa, aberto 24 horas por dia, frequentado por toleradas e tolerantes...
É isso, somos uma casa de tolerância e onde há gente com problemas de sono... O Humberto Reis chamava ao nosso quarto em Bambadinca o quarto das putas e com muita propriedade: não por que a gente as levasse para lá, mas sim por que levámos vida de putas: trabalhávamos de noite e dormíamos de dia)...
E a propósito da morança onde por vezes ficavas, na tabanca de Bambadinca, no lado esquerdo da rampa, no sentido descendente (no teu tempo, à direita, dizes tu ?, talvez tenmahs razão, houve obras, cortaram a tabanca ao meio, em 1970), tenho histórias, dramáticas umas, divertidas outras, que um dia ainda hei-de escrever... se para tanto não me faltar o tempo, o engenho e a arte. Algumas centenas de tugas em Bambadinca, com 20 ou pouco mais anos, patacão no bolso e ganas de viver, tinham necessariamente que animar a economia local...Ainda hoje te dizem, com alguma nostalgia e sinceridade, quando por lá passas, armado em turista, máquina de filmar ou fotografar a tiracolo: 'Tuga, pai di nós'... Coitado do Amílcar, daria voltas no panteão nacional da Amura se ouvisse tal heresia...
Acredita que não és nenhum chato. E, a sê-lo, és o chato mais querido de todos nós. De resto, somos todos chatos, dirão as nossas caras-metades, os nossos filhos, os nossos genros e noras e, daqui a uns tempos, os nossos netos, se a gente lá chegar. (A propósito, já os tens ?). Por que, como diz o provérbio, "esta vida não chega a netos... nem a filhos com barba"... Felizmente que a nossa esperança de vida é hoje o dobro dos nossos avós de mil e novecentos, geração em relação à qual era apropriado dizer:
"A morte não escolhe idades";
"Até aos 40 bem eu passo, dos 40 em diante 'ai a minha perna, ai o meu braço' ";
"De quarenta arriba não molhes a barriga";
"Na era de 31, poucos moços, velhos nenhum"...
Tudo isto para te reconfortar e assegurar que tens muitos fãs, que há muitos fãs da tua escrita, na nossa Tertúlia e no nosso Blogue. E eu sou o primeiro deles. Podíamos formar até o Clube do José. Tu és, por outro lado, o único a passar a crivo, semanalmente, o nosso blogue. É uma leitura pessoalíssima, intimista, única, do produto das nossas insónias todas juntas.
Obrigado, José.
PS - Um Alfa Bravo. Um bj para a tua Ana, que é uma mulher de armas e que já sei que voltou ao trabalho... A vida é dura, José, aqui ou em Mansambo... Mas também pode ser bela, se tiver afecto(s): amor, paixão, amizade, camaradagem, emoção, compaixão, poesia... Diverte-te, se puderes: "Esta vida são dois dias e o Carnaval são três"... Mas há, pelo menos, uma certeza: "Quem de novo não morre de velho não escapa"... Uma coisa que a guerra da Guiné não nos deu, foi serenidade... Pelo contrário, trouxe-nos inquietude (que é mais do que inquietação). Em contrapartida, aprendemos a enfrentar a morte e a não temê-la: "Temer a morte é morrer duas vezes" ... E tu és, para nós todos, um exemplo vivo e corajoso, de como um homem pode sorrir à morte com meia cara ou meio coração, parafraseando o título da narrativa autobiográfica do grande escritor José Rodrigues Miguéis, um lisboeta de Alfama (1901) que morreu longe da Pátria, da Mátria e da Fátria (Manhattan, N.Y., 1980). Que esta tertúlia seja, ao menos para ti, um pouco da Fátria perdida em Mansambo, em Bambadinca e em tantos lugares da Guiné onde sofremos e fomos solidários... LG
Bambadinca, Meu Amor
por Torcato Mendonça
1 – Sem dúvida era para mim a cidade mais desejada. Curiosamente, hoje olho para uma foto aérea e, se não tem legenda, de pouco me lembro. O pequeno aeródromo ali, as messes, bares e quartos de oficiais e sargentos acolá, mais um ou outro edifício e pronto.
A igreja... fui lá uma vez assistir à colocação do Bessa no caixão. Escola, o posto administrativo, a tasca de A ou B, não sei. Memórias perdidas. Só agora soube da existência do mestre-escola, Professora D. Violete.
Recordo a tabanca e uma morança, à direita de quem desce a rampa da estrada na direcção do porto, Missiré, Fá ou Bafatá – essa a grande cidade.
Nessa morança pernoitei algumas noites. Certamente por lotação esgotada nas instalações dos oficiais. Dormia-se bem, mais fresco, mais... melhor.
Mas é bonito ver hoje fotos de militares à civil. Calças, camisas brancas e, pasme-se, sapatos reluzentes. Deus meu e por todas as virgens, não me recordava! Creio que a minha pouca roupa civil devia estar na arrecadação que a Companhia, [a CART 2339,]tinha no Batalhão. Estava bem guardada por um soldado básico e esperto como um rato. Bela especialidade: básico.
Para que queria eu roupa civil em Mansambo e por outros lados onde me aquartelava? Claro que tinha botas, vários tipos e formatos, umas quantas t-hirts brancas (brancas?), chinelos de plástico e panos de fulas e outras peças de vestuário para alguma falta. O resto era verde ou camuflado. Bem bom.
Mas porquê Bambadinca, eu, amor? Pois, porque, além de se fazer o dito, era local de boa cama e boa mesa, bar de bebida fresca. Por vezes o líquido era tão fresco, deslizava tão docemente goela abaixo, que, no regresso a Mansambo, os olhos viravam detectores de minas e ala que é sempre em frente.
2 – Apareceram recentemente várias questões, [no blogue]. Algumas creio que ainda no activo. Vai demorar a acalmar ou, devagarinho, vai-se apagando…
A questão dos Capitães, Comandantes de Companhia, milicianos ou do quadro, indo e vindo, era ou ainda é uma dessas questões. Pois eles que digam… Pode dar-se uma ajudinha. Compreende-se nuns a chatice da ida depois de anos de descanso. Noutros a comissão agora, espera um ano no Puto e nova comissão numa p*** (perdão) – província (colónia?) qualquer. Aborrecido…
3 – Outra questão relaciona-se com perdas e lucros ou o deve e haver de Companhias e não só. Essa não, essa não e… fica para depois. Continuem…
Parece-me ser assunto para 2009, depois de fechar e aprovar o balanço de 2008. Será que os balanços de 1961 a 1974 estão fechados? Interessante. Provas. Prova o quê? O uísque, caneco, o uísque… é novo ou velho?
4 – Questão que não pode bulir com a moral de cada um. Refiro-me aos amigos e inimigos e aos inimigos amigos. Calma.
Relembro: Faz anos, a 18 de Dezembro, que um Capitão, Comando do Exército Português, foi fuzilado. Seu nome era Zacarias Saiegh. Como ele, muitos, muitos mesmo, demasiados, foram fuzilados. Crime: terem servido o Exército do meu País, nessa época o deles. A Guiné era independente…
Amigos e inimigos ou inimigos e amigos ou a estrutura moral…ou…
5 – Os antigos Combatentes cá, mais ainda os Deficientes das Forças Armadas, continuam com problemas. Até quando?
Por vezes preocupamo-nos com a pila do S. Gabriel ou S. Rafael… PORRA!
6 – O Coronel Alexandre da Costa Coutinho e Lima vai apresentar, em livro, a sua versão sobre a retirada de Guilege.
É membro desta Tertúlia.
A ler. Quem gostar de ler, claro. Eu tenciono fazê-lo.
Só assim conseguirei, penso ser assim, melhor compreender certos acontecimentos. São controversos? Por isso mesmo.
7 – A tolerância...
O respeito pelos que pensam diferente da mim.
A liberdade de escrever, opinar, falar, divergir (se feito dentro das mais elementares regras do civismo) sem ser incomodado, humilhado, preso.
Exagero meu. Que exagero. Houve isso?! Não te lembras? Tu também não? Perdão o Senhor…não se recorda… claro. Tudo bons rapazes…
Há tanto tempo, tanto, para quê falar disso? Até dizem, nessa altura não haver democracia. Tantos anos. Que importa isso agora? Só os velhos se lembram e, se houve algo, foi há tantos anos. Mais de três décadas… Olha, prescreveu!
Agora que é Natal, podíamos fazer analogia com as luzinhas das árvores do Natal. Fazíamos intermitências… Não concordas, claro… Tudo escuro, outra vez… Não, sempre com luz aberta, eu sabia que concordavas comigo.
8 – És um chato.
Perdão, chato não que é bicho feio e incómodo.
Mesmo por isso. És um chato.
Porquê?
Porque dizes cada uma. Olha à tua volta e vê a vantagem de estar calado.
Mas aqui é diferente.
Aqui onde?
Neste sítio.
Qual sitio?
Pronto, eu calo-me e vou bardamerda.
És malcriado.
Sou. Por isso paro aqui e continuo a pensar só para mim e escrevo noutro lado.
(continua tentando vencer a insónia…)
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Nota de L.G.:
(*) Vd. último poste do nosso querido amigo e camarada Torcato Mendonça, ex-Alf Mil, CART 2339, Mansambo, 1968/69, um meio alentejano e meio algarvio que se apaixonou por uma Ana da Cova da Beira (que a geografia do amor tem estes acidentes de percurso):
2 de Dezembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3553: Lança Afiada, Março de 1969. Frio, noite, damas...(Torcato Mendonça, CArt 2339)
Vd. também os seguintes postes (entre as largas dezenas que já publicámos do TM):
26 de Novembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2304: Humor de caserna (2): Welcome to Mansambo, a melhor colónia de férias do ano de 1968 (Torcato Mendonça / Luís Graça)
19 de Novembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1295: Fotos falantes (Torcato Mendonça, CART 2339) (7): Mariema, a minha bajuda...