quinta-feira, 25 de dezembro de 2008

Guiné 63/74 - P3669: Blogpoesia (27): A velha Amura dos tugas (Luís Graça)








Guiné-Bissau > Bissau > Fortaleza da Amura > 7 de Março de 2008 > Amura, um lugar repleto de história e de histórias... Visita no âmbito do Simpósio Internacional de Guiledje, no último dia do evento. Homenagem aos heróis da Guiné Bissau...

Nas fotos, vemos o Coronel de Cavalaria do Exército Português, Carlos Matos Gomes, na situação de reforma, um homem do MFA da Guiné e um celebrado autor de romances de guerra (sob o pseudónimo literário de Carlos Vale Ferraz) como Nó Cego, de cuja 1ª edição que se celebra este ano o 25º aniversário ; a seu lado, o o catalão Josep Sánchez Cervelló, professor universitário, em Tarragona, especialista em história sobre o 25 de Abril e a descolonização portuguesa...

Por detrás, o edifício, em ruína, da antiga 2ª Rep do Comando-Chefe, a famosa Rep Apsico, onde trabalhou Otelo Saraiva de Carvalho e Ramalho Eanes. Matos Gomes, na altura capitão dos comandos, foi um dos protagonistas do 25 de Abril neste palco da história... Recorde-se que a velha fortaleza da Amura é hoje o panteão nacional da Guiné-Bissau, onde repousam os restos mortais de Amílcar Cabral e de outros heróis da pátria guineense, como Osvaldo Vieira, Domingos Ramos, Tina Silá, Pansau Na Isna, Rui Djassi, etc.

Noutra das fotos, vemos o Matos Gomes a servir de cicerone ao Paulo Santiago e a mim próprio. Entre os edifícios históricos, há o do antigo Com-Chefe. Foi aí que um grupo de conspiradores deu voz de prisão a General Bettencourt Rodrigues, no 25 de Aril de 1974. Desse grupo de oficiais revoltosos faziam parte Ten Cor Mateus da Silva (Eng Trms), Ten Cor Maia e Costa (Eng), Maj Folques (Cmd), Maj Mensurado (Pára), Cap Simões da Silva (Art),Cap Sales Golias (Eng Trms), Cap Matos Gomes (Cmd), Cap Batista da Silva (Cmd), Cap Saiegh (Cmd Africanos), Cap Ten Pessoa Brandão (Armada ) e Cap Mil José Manuel Barroso.

Nas duas últimas fotos, vemos a Maria Alice Carneiro com: (i) o Pepito, junto a um dos grandes poilões que cobrem a Amura; (ii) a Carmen Pereira, um das militantes e dirigentes históricas do PAIGC.

Fotos e legendas: © Luís Graça (2008). Todosos direitos reservados.


A velha Amura dos tugas
agora cercada de guinéus
por todos os lados.
Ilha de areias movediças
num mar de belugas,
foi rampa de lançamento de lançados.
Dizem que aqui nasceu Bissau.
De linhas tortas,
as ruas direitas da capital.

Saúdo os ilhéus,
figuras de museu de cera,
de faces mortiças:
à frente, o capitão-diabo,
o bigode farfalhudo,
espadeirando a torto e a eito,
de peito feito
ao fogo do canhangulo.
Mais os seus soldadinhos de chumbo,
que eram uma ternura:
em linha,
em formatura,
nas suas fardas multicolores,
coloniais,
do tempo dos Cabrais.
Davam vivas à Pátria
e à Rainha.
Aqui como em toda a parte,
onde o Império tinha engenho e arte.

Ah! A velha Amura,
inútil baluarte,
com os seus canhões
de bronze,
incandescente...
Casamata,
prisão,
dormitório,
agora panteão,
nacional,
coberto de poilões.

Eram onze
os soldadinhos,
como no jogo de matraquilhos.
E combatentes da liberdade da Pátria,
contei-os pelos dedos da mão.

Que fazes aqui, Amílcar,
que já te mataram, Cabral ?
E de que traições podias falar,
se fosses vivo,
tu, Osvaldo ? E tu, Vieira ?

E quanto a ti, Titina,
que incendiavas paixões
pelo Oio ?
Que fazes também aqui,
jazida entre os poilões,
debruados de branco,
da triste Amura ?
Cuidado, Silá,
que os tugas montaram-te a cilada
na cambança do Rio Farim.

Vejo mais à frente o Domingos,
O valente Ramos,
herói de banda desenhada,
que irá morrer de morte matada
em Madina do Boé.

E tu, Rui Demba Djassi,
de quem eu não sei nada,
a não ser que morreste em 1964,
depois do mítico Congreso de Cassacá ?
Sei ainda que tens nome de rua,
suja e esburacada,
na capital da tua terra...

E o camponês balanta,
Pansau Na Isna,
herói do Como,
guerrilheiro-cowboy,
enfrentando as naves loucas dos tugas
com a sua Kalash de contrafacção ?

Na Amura fez-se história,
diz-me o guia.
Ou a história dos vencedores
que contam a história
de como venceram
os vencidos.

Luís Graça
Bissau, 7 de Março de 2008

________

Nota de L.G.:

(*) Vd. poste de 26 de Setembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3243: Blogpoesia (26): 35 anos de Guiné-Bissau: A minha contribuição para a tua festa, meu irmão, minha irmã (Luís Graça)

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